Capítulo 10 - Sorrisos Maliciosos
Bell estava de certa forma certo ao pensar que a criatura tinha recebido algum dano, mas enganou-se ao pensar que o seu ataque poderia ter acabado com a criatura de uma só vez. Para desgraça de Bell ele havia cometido o maior erro que se pode cometer numa batalha, baixou a guarda. Uma nova corrente de chamas surpreendeu Bell esquivou-se atrapalhadamente do ataque o mesmo não aconteceu quando a mão da criatura cortou o ar e o lançou contra as casas mais próximas, se não fosse pela enorme flor que ele invocara assim que se apercebeu do ataque a esta altura podia estar morto.
Estava desnorteado, sentia tudo á sua volta girar, porém ainda mantinha uma boa noção da realidade, via a criatura a aproximar-se para ele com o seu olhar maldoso e a sua boca ameaçadoramente aberta. Estava mesmo de frente contra a casa quando algo atingiu a criatura em cheio na cara, várias explosões de som seguiram-se depois que uma luz azul o cegou a ele à criatura.
-Bell !!- Gritou uma voz cujo o seu dono saltou da parte de cima do telhado mesmo na direção da criatura.
-Bill!! - Bell levantou-se com dificuldade, mas depois de poucos segundos já corria novamente com um sorriso na cara, escondendo o cansaço e a dor.
Sentia todos os músculos a romperem, os ossos a fraturar e já nem via direito, mas continuava a correr, o ataque tinha sido brutal, mas ainda não era o suficiente para os derrotar, em parte Bell sabia que aquele anel tinha haver alguma coisa com o facto de ele ainda não estar morto.
-Pronto!! - Gritou-lhe Bill já com algo a formar-se nas suas mãos.
Bell acenou ao irmão percebendo a sua ideia. Bill ia atacar pela direita, cabia a Bell cuidar da esquerda. Usando uma corda feita de água como gancho e um bocado de impulso, Bell usou a maior parte das suas restantes forças para subir a parede de uma casa e saltar em direção à besta ao mesmo tempo que nas suas mãos se ia formando algo de tamanho colossal. O monstro ainda tentou pará-los atirando algumas chamas para o ar, mas era tarde demais quando deu por si estavam dois enormes martelos, um de água e outro de pedra, a atingir-lhe a face.
O choque foi o suficiente para rachar a sua pele negra e vários fios de material incandescente escorriam pela sua cara destroçada. Ainda de pé tentou atacar Bill que a surpreendeu fazendo com que vários pedaços de construções voassem contra ela através de uma rajada de vento poderosa. A criatura abriu a enorme boca e quase que engolia Bill juntamente algumas construções, no entanto um novo ataque impediu-a, vindas do céu centenas de espadas feitas de vento cortavam o ar e a sua pele, ao mesmo tempo que Bill despertava do solo inúmeras lanças de água que com algum esforço começaram a penetrar na tão rija pele negra. Levantando-se num sobressalto a criatura pôs se de pé tentando sacudir da sua pele as espadas de vento e as lanças de água que ainda estavam cravadas na sua pele.
-Ainda não terminou? - Avisou Bill confiante quando lançou contra a criatura duas esferas de vento que explodiram assim que chegaram à criatura, atraindo de novo a sua atenção.
Bill atacava constantemente a criatura, nomeadamente com lâminas de ou esferas de vento causando apenas ferimentos superficiais na criatura que se mostrava mais cautelosa depois de ver o potencial dos dois. Enquanto Bill mantinha a criatura ocupada o irmão aproveitava para se esgueirar por entre as construções até ficar mesmo atrás da criatura. Só nesse momento é que Bell teve a oportunidade de conjurar um outro feitiço antes de partir para a ofensiva, do chão ergueram-se inúmeras raízes que se entrelaçaram umas nas outras até obterem uma forma similar a uma corda. Bell fez cada ponta da corda de raízes se enroscar á volta do máximo de construções possíveis, tendo o cuidado de manter a corda sempre esticada. No fim de conferir que a corda estava bem presa Bell saltou de parede em parede até chegar a uma casa parcialmente destruída, uma parte do telhado tinha cedido assim como parte da base, mas o espaço que ainda estava de pé era o suficiente para Bell. Dando sinal a Bill de que já estava pronto. Lançou uma pequena esfera incandescente para o ar que depois de subir alguns metros explodiu e libertou um intenso fumo vermelho, em resposta Bill provocou novas explosões azuladas dando sinal a Bell que podia continuar.
Elevando-se vários metros no ar com a ajuda de duas poderosas chamas vermelhas uma em cada mão, Bell, colocou-se ao nível dos joelhos da criatura. Nos momentos em que ficou suspenso no ar, Bell criou duas pequenas lâminas de água uma em cada pé apontadas para a criatura. Novas chamas, mais fortes do que aquelas que o tinham ajudado a elevar-se no ar, irromperam das suas mãos impulsionando-o contra a criatura. Ao mesmo tempo que isto acontecia também Bill preparava uma surpresa para a criatura, recitando apressadamente um feitiço ao mesmo tempo que se esquivava das mãos da criatura e ocasionalmente de uma ou outra rajada de fogo. Quando Bell já estava a escassos metros das pernas das criaturas Bell fez com que as duas lâminas aumentassem de tamanho e quando finalmente atingiu a pele dura da criatura voltou a liberar uma rajada ainda mais potente de chamas impulsionando as suas lâminas contra a criatura a obrigaram a inclinar para trás no exato momento em que um relâmpago desceu do céu e atingiu a cabeça da criatura. Atordoada com o ataque de Bill e surpresa com o ataque de Bell, a criatura tentou a custo recuperar o equilíbrio, mas acabou por tropeçar na corda de raízes de Bell que cumprira com distinção a sua função antes de ser consumida pelas chamas. Sem qualquer opção para evitar o que ia acontecer a criatura deixou-se cair no chão, esmagando as poucas casas que não tinham sido consumidas pelas chamas.
Ainda a criatura não tinha tombado e já Bill procurava pelo irmão. Viu que no momento do impacto do relâmpago Bell tinha cortado uma parte das pernas da criatura seguindo sempre em frente e aterrando numas casas ali perto. Encontrou-o meio a dormir meio acordado em cima de um monte de pedras.
-Porque demoraste tanto? - Perguntou Bell quando Bill o pôs às suas costas o pequeno saco que Bell trazia juntamente com o seu e colocando-o em seguida em cima deles esperando que o irmão se sentisse minimamente confortável.
-Depois daquilo que disseste eu pensei um bocado e cheguei á conclusão que para remediar as minhas palavras a única coisa que podia fazer era tentar ajudar o máximo de pessoas que estivessem na cidade enquanto tu eliminadas a maior parte dos perigos e sabes que mais assim como todos os outros nós vamos sair daqui.
-Que...bom... - Respondeu Bell antes de desmaiar de exaustão, e mesmo a tempo, Bill mal podia conter as lágrimas.
A verdade é que ele havia tentado ajudar as pessoas encaminhando todas aquelas que ele conseguiu salvar para o portão da cidade mas acabou por não conseguir salvar ninguém, quando deu a última volta á espera de ver mais alguém que precisa-se de ajuda notou que o portão apesar de não estar destruído estava fechado e trancado. Os guardas tinham ido embora e trancaram o portão só para garantirem que aquelas criaturas não iriam atrás deles, sem pararem para pensar sobre todas as pessoas que estavam a deixar para trás entregues às mãos daquelas coisas. O que escurecia ainda mais o coração de Bill era a imagem que não lhe sai da cabeça, a imagem de várias pessoas carbonizadas junto ao portão, algumas com pequenos embrulhos nas costas que Bill esforçava-se para não tentar descobrir o que poderiam ser, outras com os braços esticados pelas fendas do portão, e o pior de tudo era que se sentia culpado por aquelas mortes. Enquanto se encaminhava para a parte da cidade que ainda não tinha sido consumida pelas chamas, pensava para si sobre o que poderia ter feito, deveria ter adivinhado que os guardas corajosos como eram iriam fechar os portões usando as pessoas da cidade como distração para as criaturas. Deveria ter averiguado se o portão estava aberto talvez assim algumas pessoas pudessem ter-se salvo, mas ao invés disso optou por cobrir uma maior área esperando salvar mais pessoas do que as criaturas pudessem apanhar. Tinha sido um idiota e a única coisa que o consolava era o pensamento de que finalmente iria abandonar aquela maldita cidade.
Já estavam junto à muralha quando Bell recuperou a consciência, e somente a consciência ,o seu corpo estava demasiado cansado para caminhar ou mesmo para se pôr a pé, e portanto deixou que Bill o carrega-se durante mais algum tempo.
-Não acredito!! - Praguejou Bill quando se aproximou de uma estrutura que se assemelhava a uma torre de vigia.
Algumas torres de pedra tinham sido construídas dentro da cidade com o objetivo de serem pontos de vigia e servirem para se acessar a parte superior da muralha. Contudo só os guardas eram autorizados a acessar tal parte da muralha havendo sempre mais que um soldado a guardar a entrada de cada torre,mas neste caso era diferente uma vez que todos os guardas tinham abandonado a cidade Bill só precisava de arrombar a porta e subir pelas escadas em caracol, algo que não seria possível uma vez que a torre tinha desmoronado.
Bill pousou Bell no chão apoiando a cabeça do irmão num dos sacos enquanto ele vasculhava apressadamente o conteúdo do outro. Estavam demasiado longe da próxima torre de vigia e Bill duvidava seriamente que conseguisse alcança-la antes das chamas, frustrado por o seu plano ter falhado e por pensar que estaria a desiludir Bell, atirou o saco para longe e dirigiu-se para a muralha com os olhos em fúria e os punhos cerrados.
-Não chegamos até aqui para sermos travados por um maldito monte de pedras - Bill estava decidido a atravessar a muralha nem que tivesse de derrubá-la. Com o coração a palpitar e os braços revestidos de pedra, começou a atacar o muro com a esperança de o conseguir atravessar confiando apenas na sua força bruta, e embora Bill não soubesse o irmão tinha recuperado mais um pouco da sua consciência e observava calado a raiva, o medo, e o pânico que cada golpe do irmão transmitia.
Com um último colocou as suas mãos no chão paralelas ao corpo e começou a sussurrar algo. Não sabia o que estava a fazer, sentia os movimentos rápidos e suaves dos lábios, sentia a língua a estalar e o mesmo raciocínio de quando se articulam palavras difíceis, no entanto não ouvia nada vindo da sua boca. A mente estava num lugar distante enquanto os lábios se moviam sozinhos e os olhos acompanhavam os tristes e desesperados socos de Bill.
Bill parou de esmurrar a muralha quando um dos seus braços de pedra partiu quando só tinha feito uma pequena cratera na muralha. Sentou-se desanimado ao lado de Bell que voltou a adormecer instantes antes do irmão se sentar ao seu lado. Bill quase que abaixava a cabeça quando notou que na muralha começavam a aparecer manchas verdes. Primeiro pensou que deveria ser uma alucinação da sua mente cansada, mas depois de ouvir a pedra da muralha a estalar levantou-se e voltou para junto desta mal acreditando no que via.
Ainda estava convencido de que a mente lhe estava a pregar partidas quando tocou num dos diversos ramos de uma planta que parecia estar a crescer de dentro para fora da muralha. Depois de ter a certeza que aquela planta estava mesmo lá e que não era um devaneio da sua mente, Bill tentou escalar a muralha usando sempre os ramos da planta para se segurar. A chama nos seus olhos voltou a acender depois de ter escalado alguns metros da muralha mais do que ele pensava ter subido. Desceu a muralha com a mesma cautela com que havia subido, apoiando firmemente as mãos e os pés onde podia. Assim que voltou a sentir a terra debaixo dos seus pés Bill dirigiu-se para o irmão inconsciente. Voltou a remexer no saco mas desta vez não demorou a encontrar aquilo que queria. Bill tirou uma pequena corda do saco, que não devia medir mais de dois metros, depois de colocar ambos os sacos às costas ,cada um devidamente fechado, foi a vez de carregar Bell e de dar uso á corda que tirara do saco. Através de um nó apertado Bill prendeu o irmão á sua cintura, ao mesmo tempo que usava o corpo de Bell para prender os dois sacos, podia não estar perfeito mas dava para o gasto.
Já com a camisola colada às costas devido ao calor que as chamas emetiam, Bill fez mais um esforço para subir com o irmão às costas.
A medida que iam escalando a muralha ganhando cada vez mais altura,também o calor aumentava fazendo com que todo o corpo de Bill transpira-se em dobro, por vezes quando tentava amarrar num dos ramos a mão escorregava-lhe de tão húmida que estava, só de vez em quando e só quando se sentia seguro é que Bill parava uns segundos para limpar as mãos á camisola suja para depois retomar a subida.E numa dessas paragem Bell retomou a consciência tão exponencialmente que fez Bill desequilibrar-se por um momento.
-Opa!! - grasnou Bill ao mesmo tempo que procurava restabelecer o equilíbrio.
-Acordei em má altura - Desculpou-se Bell com um sorriso que depressa esmoreceu.
-Achas? - Perguntava Bill sarcasticamente enquanto amarrava em outro ramo e se preparava para subir mais um bocado.
-Bill posso fazer-te uma pergunta? - Perguntou Bell quase num sussurro.
-Não pode ficar para depois? - Respondeu Bill sem desviar os olhos do seu próximo alvo.
-Enquanto eu estava lá embaixo, pensei para mim - Bell parou por um segundo verificando se o irmão o estava a ouvir - Quem é que nos ensinou tudo isto?
-Então foi avô claro - Respondeu Bill muito certo de si.
-Sim...mas tu lembras te de quando ele nos ensinava ou de como nos ensinava?
-Lembro-me de ele sempre ter estado lá quando nós precisávamos, lembro-me de alguns treinos, e das comemorações que fazíamos quando um de nós aprendia uma nova magia.
-Sim, mas nunca pensaste como isso era possível? - A voz de Bell parecia enfraquecer a cada palavra era quase como se tivesse medo de falar.
-Onde é que queres chegar? - Perguntou o irmão confuso com as perguntas de Bell.
-A cidade podia não ser muito bem guardada mas nunca achaste estranho o avô nos ter ensinado tanto nestes anos e nunca ninguém ter reparado?
-O avô sabia muito de magia decerto que tinha um método para nos esconder enquanto treinávamos - Respondeu Bill revivendo as memórias do passado.
-Suponho que sim... - Consentiu Bell com desânimo - Bill ainda te lembras como era o avô?
-Mas é lógico - Parou um bocado para pensar - era tão gentil como era exigente ,um homem que sempre se esforçava para não nos faltar nada à mesa, e também era bastante preocupado, por acaso não te lembras de quando...
-Não estou a falar disso - Pela primeira vez desde que acordou Bell falou a plenos pulmões, ainda estava longe de gritar e apesar das palavras se ouvirem melhor, a maneira calma e determinada com que as palavras saiam da boca de Bell provocava em Bill uma sensação que ele não sabia interpretar.
- Estou a falar de como ele era, o aspecto dele.
Quando o irmão não estava eufórico nem ansioso por algo a sua voz era igual à daquele momento, no entanto Bill sentia que desta vez tinha algo a mais nas suas palavras.
-Deves estar demasiado cansado, para te lembrares - Desviou Bill.
-Às tantas tens razão...- Novamente a falta de forças forçou Bell a adormecer e mesmo no momento certo.
Mas Bill continuou a pensar nisso, por mais que tentasse não consegui-a recordar se do rosto do seu avô, nem da sua voz e quanto mais pensava apercebeu-se que pouco se lembrava dele, como se fosse um lembrança a muito esquecida ou então um imagem muito embaçada.
Enquanto continuava a sua escalada Bill pensou seriamente nas palavras do irmão. Tentava a custo lembrar-se de todas as memórias que envolviam o avô. Esses momentos passavam na cabeça de Bill como um filme a preto e branco onde a cara do avô aparecia sempre coberta por uma mancha escura. Mesmo os dias inesquecíveis que tinha passado em companhia do avô e do irmão, a sua face estava enegrecida. Era estranho conseguir-se lembrar de tudo o que tinham aprendido com ele e de todos os bons momentos quando não se lembrava do seu aspeto. Os pensamentos de Bill foram interrompidos quando notou que já não havia mais ramos a que se agarrar tinha finalmente alcançado o topo da muralha.
Ao subir para cima da muralha Bill decidiu tirar o irmão das suas costas e deita-lo por cima dos dois sacos, focando de seguida a sua atenção para a segunda coisa mais importante naquele momento. O enorme horizonte que se estendia mesmo em frente aos seus olhos, uma visão bela que sonhava todos os dias desde pequeno, e apesar de estar de noite Bill via claramente a paisagem iluminados pela luz triste da lua. Um único trilho de pedra estendia-se ao longo de vários quilômetros de planícies verdes, com enormes árvores um pouco mais afastadas, e mesmo no limiar da sua visão Bill via enormes montes totalmente cobertos com aquilo que ele supunha serem mais árvores. Enquanto Bill se deslumbrava com aquela visão e sonhava com a sua nova vida, Bell olhava para trás, para as casas ainda a arder, para a montanha escurecida devido ao fumo e imaginava a quantidade de pessoas que tinha perecido tentando fugir da cidade.
A única coisa que o consolava era pensar na quantidade de pessoas que tinham sobrevivido graças a Bill. Foi esse o motivo que possibilitou a que Bell se levanta-se e abraça-se o irmão com lágrimas nos olhos, enchia-o com um sentimento estranho pensar que aquilo que fizeram na cidade ajudou a salvar quem fora vítima do tratamento egoísta dos soldados.
Imerso nos seus pensamentos, Bell demorou para perceber a enorme sombra que se sobrepõe sobre ele e o irmão, os seus olhos não podiam acreditar, girando sobre o seu próprio corpo Bill pôs se de frente para a cidade já com um mau pressentimento.
Com a cabeça partida e vários fios de lava a jorrar de todas as partes iluminando o corpo escuro, um sorriso ainda mais distorcido de uma alma louca e um dos chifres partido a meio, a criatura que ele pensou estar morta tinha ressurgido mesmo á sua frente com um braço estendido para trás que logo cortou o ar dirigindo-se aos irmão com uma força selvagem. Por sorte Bill conseguiu-se desviar levando consigo o irmão. A criatura tinha trepado a muralha de maneira a que eles não a tivessem ouvido chegar, o que Bill não entendia ao olhar para os enormes buracos ao longo da muralha, a criatura tinha destruído partes da muralha para colocar os pés o que fazia ainda menos sentido uma vez que eles devia ter notado no barulho que a criatura fazia só a andar. Bill rapidamente deixou de se preocupar como meio que a criatura utilizou para subir a muralha, estava mais interessado em descobrir um meio de a deitar abaixo da muralha. O último golpe dela tinha atirado vários blocos da muralha para as construções mais abaixo e o mesmo aconteceu com os golpes a seguir. De cada vez que os seus braços se moviam mais uma parte da muralha cedia e cada vez mais construções eram esmagadas.
Bill atacava sem misericórdia com esperança de que o impacto dos seus e dos ataques da criatura depressa destruíssem a parte da muralha a que ela se segurava tão firmemente.
-«Não acredito nisto» - Pensou Bell enquanto via o irmão a combater sozinho contra a criatura - «Não acredito que vou ser novamente salvo pelo meu irmão» - Por alguma razão o tempo pareceu abrandar e Bell recordou-se do que acontecera na caverna, tinha acabado por ser salvo pelo irmão e seria novamente salvo.
Nesse momento Bell sentiu algo, um sentimento forte, algo que lhe dizia que podia fazer mais do que ser um fardo, afinal ele tinha treinado desde cedo para não ser um empecilho, alguém que Bill pudesse sempre contar e não um peso morto que dificultava o trabalho.
-NÃO!! - Acabou por gritar, com os olhos cheios de determinação, o sorriso a transbordar de entusiasmos e correndo para Bill. Assim que teve oportunidade amarrou na gola de Bill puxando para fora do alcance da criatura.
Bell sabia muito bem, não era ele que se estava a mexer, alguma coisa tomou conta do seu corpo, mas pensando nisso ele só conseguia ficar agradecido.
Chamas de um vermelho vivo surgiram dos seus pés, enegrecendo ainda mais o topo da muralha, deixando em brasas o lugar onde se encontrava antes de se atirar contra a criatura. Bell atirou-se contra a criatura com tal força que ela parou de atacar e prendeu-se de imediato à muralha com as suas enormes mãos negras. No entanto, o que percorria Bell era mais forte que a força bruta e descomunal da criatura, as chamas nos seus pés desapareceram por um momento dando lugar a uma corrente de chamas azuis. Os dedos da criatura escorregaram e levando consigo pedaços da muralha, mas a criatura ainda na sua sede irracional por matar cravou os dedos ainda mais fundo na muralha impedindo de ser empurrada por Bell.
Bill assistia ao espetáculo paralisado, não só pela brutalidade da criatura mas também pela quantidade de magia que o irmão estava a gastar, sendo que não fazia nem alguns minutos que ele estava deitado no chão quase inconsciente.
Bill recuperou o controle dos movimentos mesmo pronto a ajudar o irmão a derrotar aquela coisa quando sentiu algo a tremer por debaixo dos seus pés. Ao olhar para o resto da muralha e para as enormes falhas e fendas que cobriam a muralha Bill apercebeu-se que uma parte bem maior ,que os blocos que a criatura atirava lá para baixo, estava a ceder face às duas forças opostas exercidas no seu cimo. Com um encantamento rápido, Bill fez com que vários pilares de pedra surgissem do meio da terra e apoiassem a estrutura da muralha que estava prestes a ruir, os pilares tinham sido invocados bastante á pressa de modo a que vários deles ficaram de tal modo inclinados que quase que se podia subir pela muralha, o que provavelmente não daria certo. Os pilares cumpriam o seu papel na perfeição permitindo a Bill juntar-se ao irmão sem se estar a afligir com aquele assunto. Bastou alguns passos e Bill ouviu um dos seus pilares a ceder seguido de outros e a muralha começou a movimentar-se lentamente. Bill voltou a realizar o feitiço mas desta vez invocou ainda mais pilares, algo que não fazia a mínima diferença, sempre que dava por terminado o trabalho e se encaminhava para Bell os pilares cediam novamente, era como ver palitos a tentar segurar um pedregulho. Não tinha outra opção se não se concentrar unicamente nesse feitiço caso contrário estaria a correr o risco de deixar que aquela parte da muralha desabasse.
Bill pensou que tanto a criatura como Bell já estavam no limiar das suas forças e que deviam ceder a qualquer momento quando aconteceu algo que nenhum dos três conseguia explicar. Uma enorme corrente de energia vaporizou uma parte do peito da besta assim como uma parte da muralha do outra lado da cidade, as chamas nos pés de Bell apagaram-se no mesmo instante em que este raio brotou das suas mãos. A criatura morreu no mesmo instante em que a luz lhe atravessou o peito formando um círculo perfeito tanto nela como na muralha. A cena passou na mente de Bell inúmeras vezes, não devido à maneira como a criatura havia morrido, não pelo poder destrutivo do ataque que ele não compreendia de todo mas sim pelo que viu quando a criatura estava a cair para trás.
Bell simplesmente desistiu de se mover e quase que ia cair junto com a criatura mas Bill tinha outros planos. Correndo pelo ar através de plataformas de ar que ele conjurou amarrou em Bell e levou-o até á parte da muralha que ainda estava segura. e Bell ainda estavam numa zona perigosa da muralha quando num último de suspiro de vida maligna a besta soltou uma bola de fogo antes de morrer definitivamente.
-Desta vez não - disse muito confiante nas suas palavras e conjurou um feitiço.
Uma lâmina de vento com a forma de meia lua voou até à bola de fogo e cortou-a no meio fazendo as duas partes da bola de fogo explodirem em seguida. Ainda não estavam seguros, os pilares de Bill cediam um atrás do outro juntamente com partes da muralha que aos poucos escondiam o cadáver hediondo da criatura. Bill voltou a amarrar Bell, desta vez convicto de que não o soltaria até estarem longe de tudo e qualquer perigo possível. Já estavam a uma distância segura quando uma parte da muralha ruiu, desfazendo-se à medida que caia e esmagando tudo o que estivesse por baixo dela.
Bill soltou o irmão que no mesmo instante cedeu ao peso do próprio corpo acabando de joelhos em frente à cidade que ainda era consumida pelas chamas iluminando aquela noite escura e tortuosa. Bateu inúmeras vezes com os punhos no chão praguejando e cuspindo insultos ao destino por lhes forçar a ver uma cena daquelas e ao mesmo tempo que o jovem rapaz se ia lamentando e se desfazendo em lágrimas, algumas gotas finas começaram a cair do céu, engrossando à medida que enormes nuvens escuras se formavam por cima da cidade. Era para Bell como um ato de misericórdia por parte do destino, lavando as cinzas das ruas e apagando as chamas que consumiam tudo aquilo em que tocavam.
Apesar de Bill não se voltar, sabia qual era o motivo do desespero e raiva de Bell, recusou-se, porém, a voltar-se não aguentava ver mais aquele cenário. E mesmo estando ambos banhados em lágrimas, feridas e cinzas algo dentro deles brilhava intensamente, apesar de trágico aquele seria muito provavelmente o início de algo que nenhum deles estava á espera.
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