6 . Troféu de Carne
A Conceição voltou para Sobral antes do ano letivo acabar. A Intermediária me contou que ela havia chorado porque eu dei o pé nela, se isso era verdade, não tinha como eu saber. Nunca mais vi a Conceição.
Se passou três meses, o ano de 2010 acabou. O meu aniversário passou em Janeiro. A merda foi que eu não passei em duas provas finais. Matemática e Física. Teria que fazer dois trabalhos para ganhar a nota e passar para o 2° ano do ensino médio. E se tinha algo que eu detestava, era trabalhos escolares. Eu preferia uma prova, porque sempre fui preguiçoso.
Houve uma discussão foda com a Cecilia. Era a primeira vez que eu ficava de recuperação. Além disso, ela soube sobre a minha bebedeira. Ninguém contou. Ela viu quando eu cheguei em casa, caindo no sofá da sala, fedendo a álcool. Esperou até o outro dia para cuspir injúrias na minha cara.
— Tu quer ser que nem o teu pai?! Torrar o dinheiro com cachaça! Tu tem 16 anos e agora? Vai repetir de ano? Vai usar droga também?! Esse caminho não leva a nada!
— Foda-se — gritei — a porra do caminho! Meu pai? Ele não tem nada a ver comigo! EU — apontei pro meu peito — bebo porque gosto!
— Agora só fala palavrão! Não na minha casa, aqui é o lar do Senhor! E não aceito isso aqui dentro. Se quiser viver no mundo, pega suas coisas e vai embora!
— A boca é minha, caralho! Não é do "Senhor"... Quer saber?! Vai se foder a senhora e Deus. Vou me mandar daqui!
Ela enlouqueceu. Ficou tão vermelha quanto uma dinamite de desenho animado e explodiu em lágrimas de raiva. Rasguei a ferida. Se eu quisesse acertar ela, cuspia na crença e o fanatismo fazia o resto.
— Tu vai pagar caro, menino! Cala a boca! Deus é justiça! Ninguém pode dizer isso!
Fui no quarto dela, peguei minha mochila e enfiei algumas roupas e o meu gel de cabelo. Quando fui até a cozinha, procurei pela chave da porta da frente. Deveria estar em um gancho na parede, mas não estava em lugar algum.
— Cadê a chave, porra?!
— Você não vai sair!
— Vou! Você me expulsou do "lar do Senhor"! Não fico mais nessa merda!
Ela barrou a porta da frente com aqueles cento e poucos quilos de gordura, chorando feito uma criança barulhenta.
— Me dá a chave! Bora logo! Tu me expulsou! Agora me deixa sair!
— NÃO!
Fiquei puto, tão puto que tive uma ideia. Sim, eu era desses! Quanto mais raiva sentia, mais maquiavélico eu ficava. Minhas palavras viravam facas. Preferia violência verbal nessas situações e aterrorizar sem encostar um dedo na vítima, que neste caso, era minha mãe. E era lógico que eu não bateria nela.
Fui até a porta do quarto dela e fechei com uma batida pesada. Logo comecei uma sessão de chutes na madeira fraca. A porta foi abaixo em segundos.
— Seu merda! Isso é meu dinheiro! Batalhei duro por isso! — Ela veio para cima.
Pulei por cima da porta e fui para dentro do quarto.
— NÃO ENCOSTA EM MIM, SUA VACA! — As lágrimas desceram pelos meus olhos. Apontei meu dedo na cara dela numa distância segura.
— Tu vai me bater?! Vai?! Responde! — Vi o medo nos olhos dela. O meu grito e minhas lágrimas cortaram a fúria da Cecilia.
— Não! Não vou! Me deixa ir embora, por favor! Fica com o seu deus! — Minha respiração desacelerou e continuei com a voz trêmula. — Ele não serve pra mim. Não vou deixar de fazer o que eu gosto porque é "pecado". Sendo assim, vou continuar pecando até no inferno.
— Tá certo, Caio. Fiz tudo por ti, Deus é testemunha disso. Agora, eu lavo as minhas mãos. Se tu escolheu esse caminho... E veja bem! O caminho do lago de fogo e ranger de dentes ETERNO — apontou para cima —, que Jesus tenha misericórdia da tua alma.
Senti o peso equilibrado dos dois lados, ao modo dela, a dona Cecilia também falava merda. Confesso que fiquei abalado com aquele cenário escroto pintado pelos cristãos. Ranger de dentes? Ui! Costumava sonhar com meus dentes caindo depois disso.
E no final das contas, eu não saí de casa. Continuei morando com ela por mais um bom tempo. Não fiz os dois trabalhos valendo nota. Reprovei. Foi aí que percebi que o ano de 2011 seria promissor. Faria o 1° ano pela segunda vez como um repetente podre de preguiça.
Alguns dos meus amigos souberam da briga pela boca da Cecilia, muitos deles quiseram me bater. Ficaram apenas no querer. Eles gostavam da minha mãe. O ponto positivo dela era que ela tratava o meu bando com dignidade, inclusive, melhor do que eu. Minha mãe não entendia como eu fazia amigos, eu também não.
Para ser meu amigo, o sujeito tinha que aguentar a minha falta de ânimo com a vida e minha brutalidade vingativa e imediata. Mas poderia dizer o seguinte: eu prezava pela lealdade, não no sentido moralista, porque eu comeria a namorada de um amigo, o meu diferencial seria contar para ele; eu era um cara sincero na maioria das vezes.
Minha sala de aula estava cheio de fedelhos. Exceto pelo Leo, que também repetiu de ano comigo e outros repetentes de outras salas do 1° ano de 2010. Em pouco tempo formamos um grupo dos mais velhos: Alana, Marcelo, Felix e Eu. O meu amigo gordo, o Leo, interagia pouco com eles.
Ganhei mais intimidade com Alana, falávamos sobre sexo. Ela me explicava muita coisa. Descobri que o buraco da vagina por onde o pau entrava, não era o mesmo que saía xixi. Fiquei impressionado.
Doce virgindade!
— Isso é sério, mesmo? — Me inclinei para perto dela.
— Claro, Caio! Se fosse o mesmo buraco, seria uma cachoeira de mijo a cada mijada. — Ela sorriu.
Gargalhei alto. A professora de biologia pediu silêncio. A Alana era uma garota maneira. Tinha os maiores peitos que já vi, uma bunda legal em cima das pernas grossas. Esbelta e gostosa, uma combinação fidedigna com a juventude. O defeito era o namorado babaca. Aquele pau no cu enchia o meu saco no ensino fundamental e já havia sido expulso de dois colégios, o A e o C. Agora, o Arthur estudava no B.
Nas primeiras semanas de aula, o uso da farda não era obrigatório. Como Fortaleza estava em época de chuva, eu usava uma blusa preta de capuz e manga comprida com uma estampa da banda Gun's Roses. Eu dava mais atenção para o Leo nos intervalos, quando nos protegíamos da chuva. A escola estava cheio de novatos zanzando pelos corredores.
Estava sentado ao lado dele, quando uma novata baixinha me abordou. Bonita, cabelo preto, pele morena e muito corpo para uma pirralha.
— Você é roqueiro, né? — Ela tinha um sotaque familiar.
— Curto rock.
Ela se sentou do meu lado.
— Vi você andando de skate outro dia.
Aquela informação me impressionou. Significava que ela prestava atenção em mim a mais tempo do que eu imaginava. Costumava andar de skate ao lado da escola na época das férias, dezembro e janeiro.
— Legal. E esse sotaque? De onde você é?
— Campina grande, Paraíba.
— Tenho família em João Pessoa, achei seu sotaque familiar.
A conversa se bandeou para o lado da música. Descobri que ela era fã de J-Rock e que J-Rock era rock japonês. Ela gostava de animes. Falei sobre Death Note com ela. O Leo ficou mudo ao meu lado. A conversa seguiu até a sirene nos mandar de volta para aula. O nome dela era Beatriz. E ela soube o meu.
Os dias seguiam, chovia mais, as aulas eram mais chatas do que cabeça de cearense. Ainda bem que não sou paulista, e posso fazer essa piada. Aliás, ainda não falei o que eu pensava sobre preconceito. Isso todo mundo tem, inclusive eu. E na escola aprendemos ligeiro. Na época do fundamental, a garotada fazia umas piadas de mal gosto com a mãe do coleguinha, com o físico do coleguinha, com a cor do coleguinha. Alguns saiam na porrada. A vida era foda.
Logo percebi que havia um "viado" na sala de aula, ele fazia questão de dizer que gostava de pica. Vivia conversando com as fedelhas e em pouco tempo começou a tirar brincadeira comigo. Gostei dele. Ele falava muita putaria e eu gostava de ouvir, até incentivava. Só tinha um defeito, ele atrapalhava as aulas dos professores descaradamente. O engraçado era que eles não eram duros com o Natanael.
E por que não?
Eu tinha a leve impressão de que os professores não queriam parecer intolerantes e preconceituosos. E o Natan fodia com eles, o cara era esperto, sabia tirar proveito disso.
Depois de algumas semanas, apareceu uma aluna nova na sala. Ela havia pedido transferência do D para o A. Em pouco tempo ela se aproximou da Alana, logo conheci a novata. Rebeca e eu começamos a nos conhecer. Ela gostava de falar mal do namorado e eu me esforçava para aconselhá-la sobre uma merda que nunca havia experimentado: namoro.
— Ele tá mentido pra mim. Ele já me traiu antes. Ele pensa que me engana. Ele... — Parei de ouvir aquela voz enjoativa. Mas balançava a cabeça fingindo que ouvia tudo. Comecei a abstrair enquanto ela contava sobre a história da traição.
— Sabe, vocês precisam conversar e esclarecer tudo. Hoje em dia, tem menina que não quer O namorado, e sim UM namorado. Tá me entendo?
— Mais ou menos. — Rebeca pôs a mão no queixo.
— Elas namoram com qualquer cara fodido, simplesmente porque qualquer mané serve. Ficam presas em um relacionamento para manter uma imagem moral. Porque se elas saíssem ficando com vários, todo mundo iria taxar ela de puta, o que é uma pena... Puta deveria ser um elogio.
— O quê?! — Ela fez uma careta horrível. Vi aqueles dentes gigantes pingarem saliva.
— É isso, puta é uma mulher livre, que tá se fodendo pra sociedade. Gosto delas.
Ela gargalhou e tocou no meu joelho.
— Aí, Caio! Tu é estranho. O meu namorado vive correndo atrás dessas putas. Já terminei com ele várias vezes e ele fica pedindo para voltar comigo. Diz que me ama... — Parei de ouvir de novo. A história se resume com o cara comendo na mão dela, segundo ela, ele era doente de ciúmes porque alguns rapazes davam em cima dela, e isso era motivo de brigas.
Sim, me perguntei porque o namorado trairia ela se realmente a amasse desse jeito. Rapazes dando em cima dela? Esses caras deveriam estar mais secos do que eu. Rebeca tinha uma testa gigante em um corpo miúdo, pernas finas e bunda perdida na calça. Agora, os peitos! Eram peitões!
— Conversa com ele, vocês se resolvem logo, logo.
— Não tem jeito! Vou terminar o namoro. O que você acha disso? — A Rebeca se inclinou na cadeira.
— Você deveria escolher o que vai ser melhor pra você. Pensa bem e escolhe se continua ou acaba de vez. O pior deve ser, ficar sem o sexo. É... sei lá. Ainda sou virgem — disse com naturalidade.
Ela se inclinou mais, as pupilas se dilataram. Me senti absorvido.
— Sério?!
Me arrependi de ter dito aquilo. Mas fui em frente.
— É sério mesmo. Ainda não tive oportunidade.
— Eu também sou.
— O quê? Você disse que namora esse cara há dois anos, e ele não transou com você? — Acho que a Rebeca entendeu isso errado. Ela abriu um sorriso como se eu tivesse dito que ela era um mulherão. Sendo que, de maneira velada, eu tava chamando o namorado dela de frouxo.
— É que eu quero perder a minha virgindade com outro virgem. E ele não é mais virgem.
— Por quê?
— Porque se eu perder a virgindade com ele, vou ficar como um troféu na coleção dele.
— Um troféu? — desatei a rir. Ela me encarou séria. — Grande coisa, tirar a virgindade de uma menina, o que tem de demais nisso? Eu prefiro trepar com uma profissional. Alguém teria que me ensinar no final das contas — falei.
Comecei a ligar os pontos. Ela vivia falando mal do namorado pra mim, ok. Ela se acha muito gostosa, ok. Disse que era virgem, ok. Quer perder a virgindade com outro virgem, ok. E não quer ser um troféu, ok.
O conteúdo bruto dessa conversa se repetiu durante o resto da semana. Até que finalmente marcamos um encontro às setes da noite numa sexta-feira.
Esperei ela no final da linha de ônibus do Mondubim. Ela apareceu usando um vestido branco e florido. Sim, sem a farda escolar, os peitões me chamavam.
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