16. Matias
Não sei se estou vivendo ou ouvindo meu pai reclamar. O assento é muito apertado, os filmes são desatualizados, a comida é sem sal...
Estamos na merda da primeira classe - quero gritar. Mas respiro fundo. Finjo que durmo, encaro a tela da pequena televisão insistentemente.
Ele pede mais vinho, mais um travesseiro e um novo fone de ouvido.
A aeromoça continua com um sorriso simpático. Como ela consegue fazer isso, eu não sei.
O resto da nossa comitiva está na classe executiva, o que me garantiu mais de dez horas seguidas de tête-à-tête com meu pai.
Depois do sexto copo de vinho, ele começa a roncar.
Leio mais uns capítulos do livro, mas não estou conseguindo me concentrar. Já passa de meia-noite no Brasil, mas me pergunto se a secretária Letícia está dormindo.
É estranho me sentir assim tão curioso em relação a uma mulher. Essa situação de não saber como é seu rosto, de ter visto apenas trechos dela, está me deixando doido. Eu já a imaginei de todas as formas possíveis: olhos grandes, pequenos, nariz arrebitado, grosso, de batata... Já imaginei que ela tem uma pinta sensual no queixo e também já pensei que pode ser uma verruga terrível.
Seria bem-feito pra mim.
Eu teria que pagar a indenização por nada.
A wifi no avião não é muito boa, mas é suficiente para que eu possa mandar algumas mensagens...
- Acordada?
Eu não tinha muita esperança, mas ela logo fica online.
- Infelizmente.
- Por que diz isso?
- Estou tendo uma crise de insônia...
- Que merda... Eu também tenho insônia.
Não sei porque eu disse isso, mas suspeito que o fato de não saber o rosto da Letícia está permitindo que eu me abra com ela de um jeito que não é adequado.
Mas foda-se: nada entre nós dois é adequado.
- Não tem nada que você possa tomar? Tipo um remédio?
- Não... E, além disso, minha avó teria um treco. Ela é daquelas que acham que chás resolvem tudo. Já tomei dois chás de camomila hoje.
- Eu detesto chás...
- Nem me fale!
- Tem só um chá que eu gosto e acho que realmente tem um efeito em mim.
- Já sei qual é...
Ela me manda um áudio.
Sou esperto o suficiente pra colocar fones para ouvir qualquer coisa que saia da boca dessa doida.
O áudio é um sussurro tão baixo que quase não entendo o que ela diz, mas na terceira vez que dou play, já coloco o travesseiro por cima da minha calça para esconder o efeito que suas palavras causam em mim: - Aposto que é um sabor que tem entre as minhas pernas.
Eu estava falando de um chá de verdade que a Ruth prepara em dias muito frios, mas a sugestão da Letícia é bem melhor.
- Quero ouvir, nos mínimos detalhes, como é esse chá - mando, me levantando para entrar no banheiro apertado do avião. Felizmente, ele está vazio e a maioria dos passageiros já dorme.
A mensagem seguinte chega quando eu já estou sentado na tampa da privada, esperando o melhor de Letícia. O áudio é sussurrado novamente e sensual o suficiente para fazer uma gota de suor escorrer pela minha têmpora. Mesmo assim, o conteúdo está longe de ser o que eu esperava.
- Foi mal, gato. Tenho que tentar dormir. Amanhã meu patrão está na área e preciso estar bem descansada pra atendê-lo.
Caralho.
Minhas expectativas estão voando mais alto que esse avião.
- Ele é um cara de sorte... Como você pretende recepcioná-lo?
- Como uma boa secretária...
- E o que essa secretária tão exemplar vai estar vestindo?
- Umas roupas improvisadas que encontrei no meu armário! kkkk Não tenho quase nada decente pra usar no trabalho.
Agora, é a minha imaginação que voa longe.
- Vai se vestir com cuidado pra ele, então? Cada peça vai ser pensando nele?
- Nem todas, né?
- As outras você vai escolher pensando em quem?
- Pode ser em vc, gato... Se quiser me encontrar amanhã depois do trabalho...
Ela vai direto ao ponto.
Também não quero mais perder tempo.
- Claro que eu quero.
✨ Se eles não querem perder mais tempo, imagina a gente, né? Semana que vem temos o tão esperado encontro dos dois... Será que ela vai descobrir a grande confusão que fez? Está gostando da história? Não esquece de deixar uma estrelinha e o seu comentário! ✨
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