Capítulo 1 - Melhor amigo morto
"Se você quiser o amor, você vai ter que passar pela dor." - If you want love / NF
— Como está se sentindo hoje, Luan?
Como eu deveria está me sentindo? Minha namorada acabou de terminar comigo por telefone. Meus olhos ainda estão inchados do tanto que chorei para finalmente levantar da cama e vir para a maldita terapia que não me serve de nada.
— Estou bem. — Sorrio.
É mentira, claro. Mas Edna não é tão boba para se deixar ser levada por uma mentira tão mal contada e tão universal quanto essa.
— Tem certeza?
Eu odeio quando me perguntam se eu tenho certeza.
— Segundo Freud eu não posso ter certeza de nada porque a sabedoria começa com a dúvida.
Edna ri, mas é um riso amargo do tipo que deve ser incômodo para ela.
— Andou decorando frases de psicanálise, Luan?
Suspirei.
— Desde que perdi meu emprego, não tenho nada mais pra fazer.
Edna volta ao seu tom sério e compreensivo. Eu quero muito ir embora. Estou cansado. Desanimado. Eu não tenho mais emprego, não tenho mais namorada e minha mãe está se matando de trabalhar para pagar as malditas consultas. A sociedade é muito injusta. Sinto o nó se formar em minha garganta quando os pensamentos sobre a minha vida fracassada rondam a minha cabeça. Fecho meus olhos com força para reprimir o choro.
— Edna, eu preciso ir no banheiro. Posso ir?
Edna me olha com preocupação, mas concorda. Ainda faltam 20 minutos de terapia, mas eu preciso sair logo daqui.
Saio da sala e vou logo em direção ao banheiro. Tranco a porta atrás de mim quando entro e me encosto na parede. As lágrimas vem sem esforço e em questão de segundos soluços baixos sobem por minha garganta.
— Até quando vai ficar se iludindo, mano?
Levanto minha cabeça e me esforço para ignorar a presença de Heitor no banheiro. Não é real, digo para mim mesmo. Eu sei que não é. Sei que ele não está aqui de verdade, mas não consigo mais fazê-lo calar a boca. Ele está sempre na minha cabeça. Sua voz fica cada vez mais alta e acusadora.
— Até quando vai continuar nessa merda, Luan? Nem namorada você tem mais. — A voz do meu melhor amigo ecoa em minha mente junto com uma gargalhada. Não é ele, sussurro na esperança de que meu coração pare de denunciar meu medo.
Heitor não é assim.
— Acabe logo com isso e junte-se a mim no inferno.
— Não! — grito alto. — Não, não, não, não! Vai se ferrar, seu babaca. Você nem existe mais!
A risada do ser demoníaco ecoa por todo o banheiro dessa vez e logo posso vê-lo materializar-se em minha frente. Aproxima seu rosto sujo de terra e sangue do meu e sussurra, alto demais:
— Eu existo na sua cabeça. Eu não vou embora nunca.
Não é real, repito.
Mas por que eu sinto o seu hálito podre e frio em minha pele?
Eu estou ficando louco? Não consigo nem mesmo levantar do chão. Kell tem razão em terminar comigo. Eu sou um merda depressivo, sem emprego, amigos ou algo assim. Eu não tenho nada para lhe oferecer. Lágrimas escorrem por meu rosto.
Eu não percebo quanto tempo se passa, mas quando vejo já estou sendo levado pelos enfermeiros da clínica onde eu estava. Não sei para onde estão me levando e também não tenho interesse em saber. Eu só quero ficar longe de Heitor. Quero ficar longe dessa voz. A voz do meu melhor amigo morto.
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