Juan observou Lucynda subir. Soltou um suspiro desolado. Vira quando Fernando saíra atrás dela e observou Margareth com atenção. Ela parecia estar fazendo força para agir naturalmente, mas era óbvio seu esforço.

Calmamente ele se sentou em uma das cadeiras, ainda disposto a falar sobre a decoração. Contudo, Margareth o fitou atentamente.

- O suspiro anterior... foi por causa de Lucynda, não?

- Perdão? - estava surpreso.

- A ama, não é verdade?

- A amei. Mas Lucynda não é o tipo de pessoa pelo qual devemos nos apaixonar. Feri-la pode custar caro demais.

Margareth deu um sorriso suave. As mesmas palavras que Fernando dissera, a mesma atitude. Se sentando ao lado dele, ela falou novamente:

- Fernando e eu sabemos do plano.

- Plano? Que plano?

- Do plano de vingança de Lucynda. Que ela quer estragar nosso casamento... eu sei. E sei que você tentou impedir, mas ela o chantageou. De qualquer maneira, estou grata por ter tentado intervir.

Juan deu de ombros, em silêncio.

- Contará a ela que sabemos?

- Não, claro que não. Lucynda não tem o direito de mover céus e terras para destruir a vida de duas pessoas apenas porque foi magoada. Não posso fazer nada, nem ajudá-los, mas... tampouco irei ajudá-la. Você é uma boa pessoa, Margareth... te conheci bem nesses dois meses. É óbvio que agiu daquele jeito porque amava Fernando e tudo o mais... Embora, claro, houvesse uma certa luta feminina.

- Luta feminina?

- Lucynda sempre a superou, não? A mais ousada, a mais sexy, a que ia se casar... embora agisse por amor, você também agiu por motivos menos nobres.

- Sim. Admito isso. Agi mal agora lhe oferecendo o vestido que eu usaria no casamento dela... mas ela quer se vingar de mim. Achei que poderia magoá-la.

- Você tem o direito de fazer isso. Lucynda sem dúvida saiu abalada.

- Você acha? Achei que fosse encenação.

- Acho que não. Acho que Lucynda está lidando com mais do que pode suportar.

- O que quer dizer com isso?

- Nada demais. Aliás, esqueça o que eu disse - ele parecia nervoso.

- Juan...

- Srta. Lisbel, entenda bem minha posição: sou apenas funcionário deste hotel e minha função é prestar auxílio no preparo do seu casamento. Não me meterei em assuntos pessoais nem nada. Como gostaria que a orquestra fosse arranjada no palco?

Ela viu que seria inútil tentar obter alguma informação dele. Conformada, Margareth começou a dissertar sobre como gostaria da banda e como gostaria que Thierry preparasse as bebidas. Mas sua mente estava longe dali. Incrivelmente longe. Algo que Juan lhe falara estava ecoando em sua mente, repetindo infernalmente o que ela não queria saber: estaria Lucynda ainda apaixonada por Fernando Hernandéz? E se a resposta fosse sim... como tudo terminaria?

........

Lucynda alcançou a cobertura do hotel. Rapidamente se dirigiu para a sacada e deixou a brisa suave bater em seu rosto. Havia alguns hóspedes na cobertura, mas estavam apenas observando a vista e conversando, sem lhe prestar nenhuma atenção.

Observou a vista e limpou as lágrimas que finalmente tinham caído. Pensava em seu casamento, nos planos que fizera, em tudo... em especial, no noivo. Perguntou mais uma vez o que fizera de errado.

Estava entretida com a vista e os pensamentos que nem notou Fernando se aproximar. Quando ele se escorou na sacada, ao lado dela, ela não se moveu.

- As lembranças te atormentam?

- Sim. Mas... nada com que deva se preocupar. Não deveria estar com sua noiva?

- Ela está bem. Não é ela que está chorando.

Lucy deu uma risada.

- Fale a verdade, Fernando. Está com medo que eu tenha subido aqui para tramar algo odioso contra o casamento de vocês, não é verdade?

Fernando a observou atentamente. Não, aquilo não passara pela sua cabeça. Aliás, estava muito desconfiado do que Douglas havia falado. Douglas era o ex de Lucynda, tal qual Juan. Seria típico de ambos se unirem para acabar com a imagem de Lucynda perante seus olhos e os de Margareth. Lucynda poderia ter arruinado o casamento de quinhentas maneiras diferentes, e tudo que fizera fora ajudar para que ele fosse realizado. Se Douglas havia falado a verdade, era claro que Lucynda havia se arrependido.

E se ela não houvesse... bem, estava precavido. Mas não iria ofender Lucynda gratuitamente. Não quando ela parecia estar abalada, tanto quanto ele.

Ele também fora tomado pelas lembranças. Também pensara no que havia quase acontecido entre eles. Ele a amara. E, do nada, o amor havia terminado. Não era culpa de ninguém. E agora, encarando-a, ele se perguntou como pudera deixá-la e magoá-la.

Não havia respostas.

Ele apenas sabia que não iria magoá-la novamente, mesmo que a intenção dela fosse de fato se vingar.

Respirando fundo, ele se aproximou dela e a tocou no rosto.

- Não, claro que não. Sei que está sofrendo... afinal... são lembranças. Quase nos casamos com Margareth usando aquele vestido.

- Você... sente saudades, Fernando? De nós dois?

- Sinceramente? Sinto. Muita. Tivemos algo que muitos casais nunca tiveram. Nunca lhe disse isso, mas você ocupa um lugar no meu coração, um que sempre será seu. Um lugar que Margareth nunca ocupará. Você foi meu primeiro grande amor... eu a amei. E esse amor terminou, e eu não sei a razão. Mas tenho apenas boas lembranças de nós dois. Lamento se sempre a critiquei e lhe disse que a culpa de tudo era do seu temperamento vingativo... não foi você. Não fui eu. Simplesmente... aconteceu.

Lucynda sorriu suavemente.

- Aconteceu. E você partiu meu coração eternamente, Fernando.

- Eu sei. Mas você se recuperará. Tenho certeza.

- Talvez sim... talvez não.

- Como talvez não? Lucynda Peters, a mulher mais forte que eu conheço, não consegue se recuperar porque um idiota a abandonou no altar?

Deram uma risada. Parecia o dia em que haviam se conhecido, quando Lucynda e ele brigaram em altos brados sobre quem tinha prioridade de usar o banheiro da boate onde estavam. Sendo o banheiro masculino, Fernando achava que tinha maiores direitos. Estando o feminino interditado e Lucynda sendo uma mulher, ela achava que tinha mais direitos do que ele. O bate boca terminou com os dois sendo retirados da boate pelos seguranças. Sem festa e sem banheiro. No fim, depois de ambos pararem em um posto de gasolina, começaram a conversar e acabaram trocando telefones.

Eram o casal perfeito. O pedido de casamento fora perfeito, a festa seria perfeita, mas Margareth havia encantado Fernando que, no último momento, decidira sair em busca de sua felicidade e deixar Lucynda. Agora, se encarando sete meses depois, com tantas emoções conflitantes, os dois ainda podiam se lembrar do quanto se divertiam juntos.

- Não me superestime, Fernando. Não foi fácil, sabe... Te odiei por tanto tempo... Você não tem ideia. Quis te matar diversas vezes.

- Tem sua chance agora.

- Sim... mas não desejo mais te fazer nenhum mal. Sabe, eu te odiei muito, mas era porque ainda te amava. Só quando meu ódio passou é que comecei a ter relacionamentos, a fim de sufocar o amor que eu sentia por você.

- Conseguiu?

- Falhei miseravelmente - ela disse em voz baixa.

Ele a observou. Aquela declaração dita de forma espontânea, do nada, sem propósito o atingiu em cheio. Naquele momento, ele se esqueceu de uma suposta vingança, se esqueceu de Margareth, se esqueceu do noivado. A mão que ainda estava no rosto dela se dirigiu para a nuca. Um braço a rodeou pela cintura, puxando-a contra si. E, antes que ambos pudessem reacionar, o beijo aconteceu.

Alguns definiam beijo arrasador como aquele beijo que durava cinco minutos, cheio de movimento de línguas e muitas passadas de mão. Esse poderia ser chamado de beijo fogo, até apaixonado, mas não abrasador. O beijo abrasador é aquele que queima, ferve os lábios, nubla o sentidos, faz o corpo inteiro formigar. Para tanto, ele não precisa durar cinco minutos, nem mesmo um. E pode ser apenas um simples toque de lábios.

Cabe ao ser humano dar ao beijo o significado de arrasador. Bem, no caso de Lucynda e Fernando, os dois deram um... beijo arrasador. Que, ainda por cima, foi um beijo fogoso e o dito beijo apaixonado - não que a paixão exista no caso. Definição de beijo apaixonado ficará para a próxima. O que interessa é que o beijo foi arrasador.

Entre passadas de mãos, sucção de língua, movimentos, encostamento corporal e tudo que acontece num beijo arrasador e fogoso, os dois finalmente se deram conta do que estava acontecendo. Lucynda foi a primeira a se afastar. Colocou as mãos no rosto e curvou a cabeça.

- Oh, meu Deus...

As palavras dela foram o que acordaram Fernando. Ainda com o gosto do beijo, ele a encarou, um pouco nocauteado.

- Lucynda, eu...

- Eu sinto muito. Quero dizer, você... nem quero saber o que está pensando.

- Eu juro que não estou pensando nada.

- Está. Acha que eu fiz isso com o intuito de Margareth ver e...

- Não, não acho - a ideia lhe passou pela cabeça, mas a descartou. Se Lucynda quisesse que Margareth visse o beijo, teria-o beijado no hall ou perto do salão, não na cobertura.

- Sinto muito. Você é noivo... Isso não deveria ter acontecido.

- A culpa foi de ambos. Acho que tivemos uma recaída, coisa de momento... sinto muito.

Ele deu um passo na direção de Lucy, mas ela se afastou e virou as costas. Deixando uma lágrima cair, ela evitou encará-lo.

- É melhor você ir ver como está Margareth.

Fernando pensou em falar alguma coisa, mas Lucynda estava irredutível. Ele abaixou a cabeça.

- Certo. Lucy, eu...

- Nada do que falar vai melhorar a situação, Fernando. Vá ver Margareth. Eu... eu ficarei aqui.

Ele já estava quase saindo quando se lembrou de algo.

- Em relação ao vestido de madrinha... se não quiser usar, eu falarei com Margareth para que ela...

- Não se preocupe - ela disse com a voz fria. - Conseguirei usá-lo. Não se preocupe.

- Tem certeza?

- Absoluta.

Fernando pensou em mais alguma coisa para falar, mas desistiu. Com um aceno que Lucynda não viu, ele abriu a porta e saiu do terraço.

Lucynda soltou o ar devagar. Seus pensamentos eram um mistério até para si mesma. Calmamente se virou da sacada para a porta, por onde Fernando saíra uns minutos antes. Não ficou surpresa ao ver uma figura morena surgindo de um canto da cobertura e caminhando em sua direção. Alguns instantes depois, Milena se encontrava ao lado dela, um semblante neutro, embora estivesse preocupada.

- Impressão minha ou você está ferrada?

Lucynda apenas conseguiu sorrir, embora fosse o que menos tivesse vontade de fazer no momento.