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Poema 70. Quarentena

Que dia é hoje?

Já não sei mais...

Ando perdido ao contar as horas,

Algo inusitado,

Como um sonho de criança roubado,

Que queria um futuro melhor,

Sem tantas demoras.

Mas ficar isolado?

Lá fora o clima é sinistro,

Está cheio de vírus,

Mãos e pés contaminados,

Preciso me lavar e tirar os calçados,

Todos usam máscaras,

Os pratos estão vazios.

Como a vítima caçada de forma sombria,

Minh'alma medrosa e fria,

Sinto o vento do inverno,

A ameaça escondida como um segredo.

Agora sei como se sente o pássaro trancado.

Coitado... Cheio de medo!

Como ele poderia cantar?

Se a felicidade foi embora,

Como eu poderia sorrir?

Se ninguém mais comemora,

Não tenho para onde ir.

Lembro que o vírus está lá fora.

Que dia é hoje?

Já não sei mais,

Até no fim de semana não há paz,

E a esperança do vivo não é dizer: aqui jaz,

Quer muitos anos de vida como se canta no aniversário,

Que saudade das festas de outrora!

E o que faz a humanidade?

Por não sair de casa para ir embora,

Foge para o virtual,

Talvez tentando sair da realidade.

E apesar de tantos caírem,

O líder vai atrás de poder,

Certo de que amanhã será melhor,

Perdido no dilema do "ser ou não ser",

Descobre o furtivo lhe mostrando o espelho,

As mãos cruzadas no peito,

Ali deitado no leito,

Sem ver que no final não há mais nada,

E que o melhor da vida é a jornada.

Ele não aprende a lição,

No mundo que parece moderno,

Que está cheio de tédio,

Quem pode afirmar que é são?

O homem entrou numa caverna escura,

Precisa sair dela, não sabe quando tempo dura,

Um alguém lá no breu,

No meio da jornada,

Olha acima do muro,

Ao tentar ver a saída,

E não consegue enxergar mais nada.

Descobre o inferno...

Será que o céu existe?

A quarentena torna difícil ficar longe,

Quando a gente quer perto,

A tecnologia ajuda,

Mas quem pode prolongar a vida?

Quando só o sentimento cura o pranto.

Uma pausa... Escute!

Agora é tarde,

Está quieto lá fora,

Acho que chegou uma visita inesperada,

Não ouço mais o vento,

Sinto uma dor inusitada,

Não consigo respirar,

O peito dói, a tosse é seca,

A alma cansada,

A morte dos que amo me corrói,

E o sol se pôs,

Está quieto aqui dentro,

Não consigo ouvir minha voz...

Que dia é hoje?

Já não sei mais,

A noite caiu.

FIM

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