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Vazio

— Eu entendi direito? — Caíque me encara. — Marina está sem memória?

Concordo com a cabeça.

— Nathan está arrasado.
— Mas que merda! — Ele passa a mão pelo rosto. 
— Nós já devíamos estar preparados para isso. Mas é tão difícil.
— Vamos voltar para São Paulo. — Caíque avisa após refletir por alguns segundos.
— Mas e se ainda não for seguro?
— Foda-se minha segurança! Olha tudo o que a Marina está passando por tentar proteger minha família! Eu vou ficar me escondendo até quando? Até Otávio resolver mudar seu alvo? Quem vai ser a próxima vítima? Você? Minha mãe? — Suspira. — Eu não posso deixar isso acontecer, Helena. Eu não vou deixar mais ninguém se machucar.

Cerro meus lábios e o abraço.

— Vou arrumar nossas malas.
— Eu te ajudo.

— Vocês já tem mesmo que ir, filho?
— Já, Aci. — Caíque segura suas mãos com carinho. — Ficamos mais tempo do que devíamos. Mas depois que resolvermos alguns problemas, prometo que voltamos.
— Não vai demorar três anos, como da última vez, vai?
— Não, não vai. Eu prometo!

Os dois se abraçam.

— Helena, querida. Foi um imenso prazer te conhecer. — Aci se vira para mim.
— O prazer foi todo meu, Aci. — Abraço-a.
— Continue cuidando do meu menino, está bem?
— Pode deixar.
— Senhor, quando quiser. — Hélio avisa.
— Chegou a hora. Vamos? — Caíque estende a mão para mim.
— Vamos.
— Tchau, Aci.
— Nos vemos em breve. — Sorrio.
— Tchau, crianças. Que Deus os acompanhe. — Ela acena.

Embarcamos, rumo à São Paulo.

— Ele tarda, mas não falha. — Caíque analisa a tela de seu celular, antes de atendê-lo.

Fala, Chang.
— Que história é essa de que vocês estão voltando para São Paulo?
Como é que você sabe? Ah, deixa para . Estamos voltando, sim.
O que foi que eu disse, Gama? Não volte até eu mandar!
Você não manda em mim! — Caíque vocifera. — Eu agradeço por tudo o que você tem feito para manter a mim e minha família à salvo, mas eu não vou mais ficar me escondendo como um garotinho assustado! Eu não quero ser seu protegido Chang, quero ser seu aliado!
Você é mais corajoso do que eu pensava. Eu, no seu lugar, nunca tomaria essa decisão.
E então, aceita minha proposta?

Leonardo suspira.

Bem vindo ao clube, Gama. Me avise quando chegar.
Valeu. Ei, Chang...
— Sim?
— Você está sabendo...
— Que a Marina despertou do coma? Estou.
— E que ela está sem memória?

Silêncio.

Como é? — Leonardo recupera a fala. — Sem memória? Ninguém me falou nada sobre isso. Disseram que ela está lúcida e gozando de todas suas capacidades.
Disseram o mesmo para o Nathan. Mas então ele foi vê-la. E ela simplesmente não o reconhece, não faz ideia de quem ele é.
Isso não pode estar acontecendo.
Infelizmente, está.
Eu estava enganado, Gama. Que bom que vocês estão voltando. Até breve.
Até.

— Ele não sabia?
— Não. — Caíque cerra os lábios. — Pela primeira vez, teve um tom de surpresa em sua voz.
— E que péssima surpresa.
— Pois é. Mas vai dar tudo certo. Marina vai recuperar sua memória, vamos botar Otávio atrás das grades e ter nossas vidas de volta, eu prometo. — Caíque beija minha testa.

— Bem vindos de volta! — Lúcia nos recepciona.
— Obrigada, Lúcia. — Abraço-a.
— Como foi a viagem?
— Foi ótima, Paraty é maravilhosa. — Sorrio. — O branquelo tomou até um bronze, olha só.
— Vai começar o bullying, é? — Caíque posta as mãos na cintura.

Seguro o riso, levantando as mãos.

— Alguma novidade por aqui, Lúcia?
— Ah, há sim. Seus pais saíram de viagem.
— Quando?
— Há pouco mais de uma hora.
— À negócios?
— Provavelmente. Eles não me disseram.
— Estranho.
— Coisa do Chang? — Olho-o.
— Será? Ele não comentou nada.
— Coisa de quem? — Lúcia pergunta, sem entender.
— Do Leonardo. Ele é... — Começo.
— Um acionista. — Caíque me interrompe, desconversando. — Meu pai deve ter algum assunto para resolver com ele.
— Ah, sim. Claro. — Lúcia sorri. — Bom, vou lá em cima desfazer suas malas. Se precisarem de algo, é só me chamar.
— Obrigado, Lúcia.
— É muito bom tê-los de volta.
— É bom estar de volta.

Lúcia sorri e se vai.

— Vou ligar para minha mãe. Essa viagem repentina está muito estranha. Ela raramente acompanha meu pai nas viagens de negócios. — Caíque pega seu celular.

Eu aguardo por notícias em silêncio.

— Celular desligado. Dos dois. — Ele avisa, após algumas tentativas. — Meu pai nunca desliga o celular.
— Talvez tenham ficado sem sinal. Não vamos pensar no pior, ok? — Acaricio seu rosto.

Cerca de uma hora mais tarde, a campainha toca.

— Eu não pedi para você me avisar assim que chegasse? — Leonardo encara Caíque, apoiado no batente da porta.
— Como se você precisasse de aviso. — Caique lhe dá passagem.
— Helena, como tem passado? — Leonardo me cumprimenta com um aceno de cabeça.
— Bem, obrigada. E você?
— Cheio de problemas para resolver. — Ele enfia as mãos nos bolsos, com um pequeno sorriso.
— Chang, para onde você mandou meus pais?
— Eu?
— Não foi você quem os fez viajar agora a pouco?
— Não. Eles viajaram para onde?
— Eu não faço ideia. Pensei que você soubesse.
— Eu estava atrás de uma pista do acidente da Marina. Você conseguiu falar com eles?
— Não. O celular dos dois só dá desligado.
— Isso não é bom. — Leonardo analisa os sapatos.
— Claro que não é bom! Eles podem estar correndo perigo! E se foi Otávio quem planejou isso?
— Acho improvável. Otávio não pode fazer nada contra seu pai. Pelo menos, não por enquanto. — Leonardo afirma.
— Como você tem tanta certeza disso?
— Otávio e seu pai tiveram uma discussão há alguns dias atrás na empresa e alguns funcionários a presenciaram. Portanto, qualquer coisa que aconteça a seu pai, automaticamente o torna o principal suspeito. Ele não se prejudicaria assim.
— O que está acontecendo, então? — Pergunto.
— Uma inocente viagem de negócios, talvez? — Ele encolhe os ombros. — Ou então...
— Então?
— Uma forma de afastar seu pai da empresa.
— Para quê?
— Infinitas possibilidades. — Suspira. — Vou investigar. Se conseguir falar com seus pais, me avise imediatamente.
— Ok.
— E visitem a Marina. Quero saber tudo o que diz respeito à sua saúde.
— Pode deixar. — Seguro meus braços. 
— Ah, e não deixem aquele Nathan ficar tagarelando na cabeça dela. — Leonardo gesticula, caminhando até a porta. — Até hoje não sei o que foi que a Marina viu naquele magricela. — Resmunga. — Bom, qualquer notícia, eu te aviso, Gama.
— Eu aguardo.

Os dois trocam um aperto de mão e logo Leonardo se vai.

— Ele não consegue disfarçar o ciúmes, não é? — Sorrio.
— Nem um pouco.

— Consegui falar com meu pai. — Caíque entra no quarto, cerca de uma hora depois. —Está tudo bem com eles.
— Ah, que bom. O que foi essa viagem repentina? — Ajeito a alça de meu vestido.
— Negócios. Ele não entrou em muitos detalhes.
— Pelo menos sabemos que está tudo bem com eles. Está aliviado?
— Demais! E aí, está pronta?
— Estou. — Saio do closet. — Vamos? — Vamos.

— Vocês mal chegaram e já vão sair? — Lúcia questiona, ao nos ver descendo a escada.
— Vamos visitar Marina, aquela nossa amiga. Ela despertou do coma.
— Jura, Helena? Que notícia boa! — Lúcia comemora. — Mande meus cumprimentos à ela, por favor.
— Mandarei, com certeza.
— Até logo, Lúcia.
— Até, Caíque. Vão com Deus.



— Nathan está aqui? — Caíque pergunta, já na recepção do hospital.

Concordo com a cabeça.

— Está nos esperando no terceiro corredor. — Leio a mensagem que ele acaba de enviar.

Seguimos em silêncio ao seu encontro.

— Oi Than. — Dou um abraço apertado nele, que funga.
— Oi.

Seus olhos estão vermelhos e inchados, entregando que ele chorou por muito tempo.

E aí, Nathan. — Caíque troca um aperto de mão com ele.
— Oi Caíque.
— E então, como ela está?
— Confusa e assustada. Não reconhece ninguém. — Nathan enfia as mãos nos bolsos.
— Melhor voltarmos outro dia, então.
— Não, entrem. Vai fazer bem à ela. É bom que ela se sinta querida, foi a própria médica quem disse.

Troco um olhar com Caíque e silenciosamente, concordamos em entrar.

Bato levemente na porta que está entreaberta e reconheço a voz de Catarina dizendo para entrarmos.

— Com licença. — Entro, seguida por Caíque. — Olá, dona Catarina. Oi, Ma.
— Olá Helena. — Catarina sorri, educadamente. — Caíque.
— Dona Catarina. — Ele sorri, cumprimentando-a com um aceno de cabeça. — Oi Marina.

Ela por sua vez, apenas nos olha com certa curiosidade.

— Se lembra deles, querida? São seus amigos. Vinham sempre te visitar, enquanto você estava desacordada. — Catarina acaricia-lhe a mão.

Marina apenas faz que "não" com a cabeça.

— Ma, nós ficamos tão felizes quando soubemos que você havia acordado. — Sorrio.
— É como se eu ainda estivesse em coma. Tudo o que tenho na cabeça é um branco sem fim. Eu não reconheço nem minha própria mãe. — Marina olha com tristeza para Catarina, que segura o choro.
— Isso é passageiro. Logo você vai se lembrar de todos. De tudo. — Me aproximo de sua cama.
— Isso é tudo o que eu mais quero. Eu tento, juro que tento me lembrar, mas quanto mais eu tento, mas me afundo nesse vazio. Isso é desesperador! — Vejo seus olhos marejarem.

Catarina se levanta, não contendo o choro. Caíque vai até ela, reconfortá-la.

— Você vai se lembrar. Ainda é tudo muito recente, você acabou de despertar de um coma de dois meses. A única coisa que você precisa saber agora é que todos nós aqui te amamos muito e estaremos ao seu lado, sempre. Você é muito querida, Ma. — Me sento na beirada de sua cama.

Marina sorri fraco.

— Posso? — Estendo os braços em sua direção.
— Pode. — Ela sussurra, aceitando meu abraço.
— É a primeira pessoa, depois de mim, que ela deixa se aproximar. — Catarina nos observa, emocionada.
— Helena é iluminada. — Ouço Caíque afirmar.

Sorrio em direção a eles, enquanto acaricio os cabelos de Marina. Ela me abraça como uma criança amedrontada.

— Vai ficar tudo bem. — Sussurro. — Eu prometo.

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