Coração Partido
Passo a noite toda trocando mensagens com Nathan e constato que ele é incrivelmente interessante. Divertido, inteligente e muito bom de papo. Isso sem contar sua beleza. Qualquer mulher adoraria tê-lo ao seu lado, exceto talvez... Eu. Como já disse antes, deixei de acreditar no amor há algum tempo.
"Eu tinha dezessete anos quando o conheci. Rafael veio transferido de outra escola e logo que chegou, se tornou o mais popular, desejado e disputado à tapas por todas as meninas. Eu era a única que não o achava tão espetacular assim.
Enquanto eu era a nerd da sala, sempre na primeira carteira e com as melhores notas, ele era da turma do fundão, capitão do time de futebol e idealizador das bagunças. Completamente opostos, até um trabalho em dupla para a feira de profissões no final do ano.
Começamos a nos encontrar todos os dias depois do meu trabalho em sua casa. Foi então que comecei a conhecer um outro lado de Rafael: inteligente, engraçado, criativo e carinhoso. Nossa relação foi se intensificando ao passar dos dias e quando me dei conta, já estava completamente apaixonada por ele.
Um mês depois, no dia da feira, que foi um sucesso, diga-se de passagem, Rafael me beijou. Ele disse que estava apaixonado e que queria à mim. Dentre todas, eu fui sua escolhida.
Eu me sentia em um conto de fadas. Meu príncipe, nosso "felizes para sempre". Rafael sabia exatamente como fazer eu me sentir especial.
Vivi esse romance perfeito por dois anos, até que a verdade foi esfregada em minha cara da maneira mais nojenta possível. Até hoje eu me culpo, afinal fui tola, muito tola, incapaz de enxergar um palmo à frente de meu nariz.
Era meu 20° aniversário. Rafael me levou para jantar, comprou flores e fez declarações de amor por toda a noite. Ao me deixar em casa, com a justificativa de que teria uma reunião importante no trabalho logo pela manhã, falou olhando em meus olhos o quanto me amava e o quanto eu era importante para ele.
Fui deitar radiante, agradecendo por ter tanta sorte, até que uma ligação anônima tirou o sorriso de meu rosto. Segundo a voz feminina do outro lado da linha, Rafael acabara de entrar em um motel, acompanhado.
"Isso é impossível.", repetia, tentando me convencer.
Não aguentando viver com essa dúvida, me vesti, chamei um táxi e fui até o motel em que supostamente Rafael estava. Perdi a noção do tempo enquanto observava cada carro que saía daquele lugar. Estava convencida de que havia caído em um trote, até que o carro de Rafael finalmente saiu do motel.
Fui tomada pelo ódio, vergonha e dor. Parei em frente ao seu carro e o vi assustado me olhando, com uma mulher no carona. Ele desceu, dizendo que não era nada do que eu estava pensando. Típica desculpa canalha.
Rafael se ajoelhou, pediu perdão e chorou muito. Repetiu incansavelmente que aquilo nunca mais se repetiria. Segurando o choro que apertava meu peito, arranquei a aliança de meu dedo e pedi para ele nunca mais me procurar. Eu estava sentindo nojo dele, muito nojo. Não queria que ele se aproximasse, me sentia imunda.
Larguei-o ali, jogado ao chão, com a aliança que havia me dado ao seu lado.
Ignorei todas suas ligações e depois chorei a noite toda relendo suas mensagens.
Eu estava machucada, humilhada e decepcionada. Incapaz de perdoá-lo.
Os meses se passaram e Rafael continuou buscando meu perdão, enquanto eu o ignorava majestosamente. Quando olhava em seu rosto, só me lembrava daquela cena que me causou tanta dor.
Dizem por aí que ele ainda não me esqueceu. E não vou mentir e dizer que já fiz isso, afinal, estaria mentindo. Rafael foi meu primeiro e único amor. O problema é que, infelizmente, eu não consegui perdoá-lo até hoje.
Nós tínhamos planos. Eu o amava com toda minha alma e ele descartou nosso amor por uma noite de prazer.
Imperdoável."
Depois disso, jurei nunca mais me deixar levar pelo coração. Eu só me machucaria e já tinha perdas demais na vida, não queria mais nenhuma para a lista.
Fechei meu coração e comecei a agir somente com a razão, desde então.
— Bom dia, irmã.
Abro os olhos e me deparo com Alice sentada em minha cama, com um enorme sorriso estampado em seu rosto.
— Em que mundo eu estou? — Coço meu olho. Alice ergue uma sobrancelha. — Você, acordada às — olho o celular — oito da manhã sorrindo? É uma realidade paralela, só pode!
— Dormiu com o Bozo, foi? — Ela se levanta e vai até minha janela, abrindo-a.
Rio do seu tom e me sento.
— Fala: o que aconteceu de tão espetacular para você estar de pé e bom humor a essa hora da manhã?
— Nada. — Alice se volta para mim. —Só achei que devíamos aproveitar essa manhã bonita.
— E como seria o seu "aproveitar"?
— Ouvi falar que tem um parque lindo aqui pertinho. Podíamos, sei lá, caminhar.
— É sério?
— É, Helena. — Alice me olha, séria. — Vai, deixa de preguiça. Isso é pecado, sabia?
— Sabia. — Mostro a língua e me levanto. — Ok, eu vou. Mas você arruma minha cama.
— Folgada! — Alice resmunga enquanto eu caminho para o banheiro, rindo.
Depois de um café da manhã reforçado, vou com Alice para o "parque milagroso". Em dezoito anos de convivência, foi a primeira vez que a vi animada por caminhar às oito e meia da manhã em plena quarta-feira.
— Nossa! — Observo a natureza incrível do lugar.
— É mesmo lindo, né? — Alice sorri. — Vamos?
Corremos por pouco mais de meia hora debaixo das árvores floridas que colorem toda a pista.
— Ai, cansei. — Alice finalmente pára, apoiando as mãos nos joelhos, exausta.
— Parece que alguém arregou. — Ironizo, sorrindo em seguida.
— Insuportável. — Ela me mostra a língua.
— Ok. Vamos dar uma pausa, molenga.
Caminhamos em direção à lanchonete do parque, quando um rapaz loiro, alto e todo tatuado quase tromba comigo.
— Opa! — Dou-lhe passagem, depois de tentarmos passar sempre pelo mesmo lado.
— Desculpa, moça.
— Tudo bem. — Sorrio, com um aceno de cabeça.
Volto a andar, até que o mesmo rapaz me chama:
— Ei, moça!
Me viro em sua direção e o vejo sorrindo.
— Posso te fazer uma pergunta?
— Bom, acho que você já fez. — Respondo, em tom divertido.
— Ééé, tem razão. — Ele morde o lábio inferior.
— Tá bom, vai. Eu deixo você fazer uma segunda pergunta.
Ele ri.
— Obrigado. Qual é o seu nome?
— Helena. E o seu?
— Paulo. Por que eu nunca vi vocês aqui antes, Helena?
— Porque é a primeira vez que nós vimos aqui.
Ele abre a boca para fazer outra pergunta, mas eu o interrompo.
— Bom, já foram três perguntas. Até mais, Paulo. — Sorrio e puxo Alice comigo.
— Irmã. — Ela me abraça pela cintura. — Quando eu crescer, quero ser igual à você.
— Meu Deus, acho que vou morrer. — Me jogo no sofá, logo após chegarmos do parque.
— Parece que o jogo virou, não é mesmo? — Alice ri, jogando uma almofada em minha cabeça.
— Como foi a caminhada? — Dona Camélia pergunta, enquanto cozinha.
— Virou corrida. — Respondo com a cara afundada na almofada.
— Camélinha do céu, que cheiro bom é esse? — Alice vai até as panelas e levanta as tampas.
— Strogonoff.
— Você é a melhor do mundo, Cams! — Faço "jóias" para ela.
— Cams?
— Abreviação de Camélia. Estou exausta demais para falar teu nome inteiro.
— Você é uma comédia, menina. — Camélia ri.
— Vou levar isso como um elogio.
— Ei, vou tomar uma ducha. — Alice avisa.
— Ah, deixa eu ir primeiro? — Me sento no sofá.
— Não! — Ela corre e fecha a porta.
— Ela sempre faz isso. — Me jogo no sofá novamente.
À tarde, sentamos as três na sala e colocamos um filme para assistir. Em menos de quinze minutos, dona Camélia já se encontrava ferrada no sono.
— Irmã...
— Oi. — Respondo, ainda focada na TV.
— Por que você nunca mais namorou outra pessoa depois do Rafael?
Encaro-a, surpresa.
— Eu... Ah... Acho que não apareceu ninguém que valesse a pena.
— Não apareceu ou você nunca deixou alguém te provar que valia?
Suspiro.
— Você sabe, Li. — Baixo meus ombros. — Eu sofri muito.
— Eu sei. — Ela se senta sobre as pernas em minha frente, no tapete, e segura minhas mãos. — Mas você tem que se dar uma segunda chance. Não é porque uma rosa te espetou, que você deve odiar todas as outras.
— Meu Deus, Alice. Onde você viu isso? No Facebook?
— Isso não importa. — Ela ri, revirando os olhos. — Foca no ensinamento por trás da frase.
— Estou brincando, eu entendi. — Sorrio fraco. — E você está certa. O problema é que eu não consigo. Parece que tenho um bloqueio, sei lá.
— Você é tão linda, inteligente, batalhadora. — Alice coloca uma mecha de meu cabelo atrás da orelha. — Meu maior sonho é ver você feliz, Lena.
— Eu sou feliz. Tenho você e a Camélia.
— Eu sei. Mas o brilho nos olhos que você tinha, não existe mais.
Sinto meus olhos marejarem.
— Se dê uma chance. Você, mais do que ninguém, merece ser feliz. Desde tão jovem sendo a adulta da casa, carregando fardos que muitos não aguentariam.
— Você foi a melhor coisa que já aconteceu na minha vida, sabia? — Abraço-a, sentindo as lágrimas descerem por meu rosto.
— E você na minha. Eu sinto tanto orgulho de você, Lena. — Alice sussurra.
Seguimos assim por alguns minutos, até que Camélia se mexe no sofá.
— Camélinha é uma ótima companhia para ver filme. — Alice brinca, secando suas lágrimas.
Eu concordo, rindo e secando as minhas também.
— Pensa no que te falei, tá?
Consinto com a cabeça.
— Promete? — Ela estende o dedo mindinho para mim.
— Prometo! — Entrelaço-os.
— Nathan é uma boa opção. — Pisca. — Vou fazer pipoca.
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