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Bem vinda ao Inferno

Palmas para mim!

Sou a mais nova contratada da Exxon!

Confesso que não foi nada fácil. Foram duas longas e cansativas semanas de entrevistas e exames.
Caíque tinha razão, eles são extremamente exigentes e ser sua esposa não me livrou de enfrentar nenhuma das etapas. Para falar a verdade, até dificultou um pouco as coisas, ninguém parecia acreditar muito em meu potencial.
Mas eu provei que eles estavam enganados.

— Helena, está pronta?
— Estou quase, Caíque. Só falta por o... — Calço o sapato. — Aí, pronto.

Dou uma última ajeitada em minha roupa e saio do closet, me apoiando no batente da porta, numa tentativa totalmente frustrada de ser sensual.

— Uau! Uma contadora muito sexy.

Dou uma risada, desfazendo minha pose.

— Corrigindo: uma auxiliar contábil muito sexy.
— Por enquanto. Tenho certeza que você se sairá bem. Tão bem que será promovida rapidinho.
— Deus te ouça.
— Vamos, então?
— Vamos. — Respiro fundo, antes de pegar minha bolsa.

O grande e imponente letreiro prateado na fachada faz meu coração disparar. Entro caminhando em silêncio ao lado de Caíque e logo somos recepcionados.

— Caíque, como vai? — Jorge, o Diretor da Contabilidade, aperta com alegria sua mão. — Fico feliz que suas visitas à empresa tenham aumentado nos últimos tempos.
— Pois é. Tenho que me fazer presente, não é? Um dia herdarei isso aqui. — Caíque responde, indiferente.
— Helena, bela Helena... — Jorge se vira para mim. — Que prazer revê-la.

Trocamos dois beijos no rosto.

— O prazer é todo meu, Jorge.
— Confesso que fiquei muito feliz quando soube que você conseguiu a vaga. Ouvi dizer que andaram dificultando as coisas para você por aqui.
— Dificultando? Como assim? Quem fez isso?
— Esquece isso, Caíque. O importante é que eu consegui e estou aqui. — Sorrio.
— Além de bonita e educada, ainda é extremamente inteligente e sagaz. Tirou a sorte grande, rapaz. — Jorge dá dois tapinhas amigo no ombro de Caíque, sorrindo.
— É, realmente... Tenho muita sorte. — Caique fixa seus olhos nos meus, me fazendo ruborizar.
— Bom, pronta para começar, Helena? — Jorge sorri.
— Prontíssima.
— Ótimo! Porque temos muito trabalho pela frente. Caíque, nos vemos em breve.
— É claro.

Os dois trocam um aperto de mão.

Caíque beija minha têmpora e sussurra um "boa sorte", que eu agradeço com um pequeno sorriso. Em seguida, sigo Jorge até o elevador.

Jorge é apenas alguns centímetros mais alto que eu, rechonchudo e grisalho. Mas se movimenta com muita elegância e possui uma voz digna de locutor.

— Você será minha pupila, Helena. Eu lhe ensinarei o máximo que puder. — Jorge afirma, enquanto subimos. — Principalmente a lidar com as cobras que vivem aqui.

Encaro-o, levemente assustada.

Quando as portas do elevador se abrem, topamos com um homem bonito, de cabelos e olhos claros, trajando terno e gravata impecavelmente bem alinhados.

— Bom dia, Jorge. — Ele cumprimenta, cordial.
— Bom dia, Otávio.
— Então, essa é sua tão comentada assistente? — Otávio se dirige a mim, com olhar de superioridade.
— Sim, a própria. Helena, este é Otávio... — Jorge começa, porém é interrompido pelo mesmo.
— Vice-presidente da empresa. Encantado. — Ele sorri brevemente e beija minha mão.
— Igualmente, senhor Otávio.
— Jorge, depois passe em minha sala, por favor. Temos algumas pendências a acertar.
— Certamente. — Jorge responde e logo Otávio some de vista.

— Lembra das cobras que lhe falei, Helena? — Jorge baixa o tom de voz.

Consinto.

— Acabou de conhecer a pior delas.

— Mas... Por quê, Jorge?
— Otávio deseja a presidência a anos. — Ele me explica, já em sua sala.
— E por que o senhor Gama não o expulsa daqui a pontapés?
— Ele não pode.
— Por que não?
— É complicado. — Jorge analisa os nós de seus dedos. — Enfim menina, não se esqueça de meu alerta: fique longe de Otávio. Ele é totalmente sem escrúpulos quando se trata de seus interesses.
— Mas Jorge, o que ele poderia querer comigo?
— Não é óbvio? Ora Helena, elogiei sua inteligência mais cedo, não faça eu me arrepender. — Ele se ajeita em sua cadeira. — Você é esposa do herdeiro de um império, muito cobiçado por sinal.
— Acha que foi um erro eu ter vindo trabalhar aqui?
— Não, muito pelo contrário. Caíque precisa de você aqui. Você tem firmeza no olhar, Helena e eu gosto disso. Tenho certeza que colocará aquele moleque na linha.

Sorrio.

— Só peço que você tenha cautela e não confie em qualquer um. Quando se trata de dinheiro, todos têm a mesma religião.
— E por que eu devo confiar em você, então? — Franzo o cenho.
— Não deve. — Ele sorri.

Sorrio de volta.
Sei que posso.

— Bom... Preciso ir até a sala de Otávio. — Jorge revira os olhos. — Você pode colocar esses documentos em ordem, por favor?
— É claro. 

Jorge sai porta afora, enquanto eu me encaminho até sua mesa, juntando vários papéis, em sua maioria, balanços e gráficos. Algumas folhas de sulfite contém anotações feitas à caneta e outras, textos impressos.

Começo a organizá-los, até que alguém bate à porta.

Deixo as folhas sobre a mesa e vou abri-la.

— Você? O que faz aqui, na sala de Jorge? — Laila, a "ex" de Caíque, me olha com desdém, com as mãos na cintura.
— Sou sua nova assistente.
— Caíque te botou para trabalhar aqui e nem ao menos lhe deu um cargo digno? — Laila gargalha. — Se não fosse trágico, seria cômico.
— Olha Laila, caso você já tenho debochado o suficiente, eu tenho muito trabalho a fazer, então...
— Querida. — Ela me interrompe. — Eu ainda nem comecei.

Com um sorriso maléfico nos lábios, ela entra e se senta elegantemente na cadeira de Jorge, ordenando:

— Traga-me um café.
— Você só pode estar brincando.
— Não estou, não. E se eu fosse você, faria o que eu mando. O senhor Gama não vai ficar nada contente se souber que você foi rude comigo logo em seu primeiro dia na empresa. Papai então, nem se fala. — Ela faz um bico, enquanto brinca com uma mecha de seu cabelo ruivo entre os dedos. — Os dois são muito próximos, sabe? E imagine só o que diriam os outros acionistas ao saber deste triste desentendimento.

Abro a boca para argumentar, mas desisto. É melhor ficar longe de confusão.

— Assim que eu gosto. Acredite Helena, é melhor assim.

Laila estampa um sorriso maldoso no rosto.

— É claro que é. — Sorrio sem humor e vou até a porta, buscar o café à contragosto.
— Ei, querida... — Ela me chama. — Macchiatto.

Fecho a porta, controlando a imensa vontade de voar no pescoço da cascavel ruiva e respiro fundo. Em seguida, saio à procura do tal Macchiatto, sem fazer ideia de onde o encontrarei.

Andando pelos corredores feito uma barata tonta, esbarro em alguém.

— Ai, me perdoe, eu...
— Por que você está com essa cara? — Caíque me observa.
— Ai, — passo a mão pela testa — é você.
— Tendo um dia difícil?
— Nada que eu não consiga resolver.
— É claro.

Ele me olha por alguns segundos com as mãos nos bolsos, depois sorri.

— O que foi?
— Você fica linda assim, sabia?

Caíque me toma em seus braços e me beija com urgência. Seu delicioso perfume me envolve completamente e posso sentir sua pele quente mesmo por cima da camisa. Quando nossas bocas se separam, luto para controlar minha respiração falha.

— O que deu em você? — Pergunto, após recuperar o fôlego.
— Nada. — Ele sorri , dando de ombros. — Nos vemos no almoço.

Caíque gira nos calcanhares e me deixa com uma interrogação no meio da testa.

O que foi isso?

Foco Helena, foco.

Sacudo minha cabeça e me esforço para lembrar o que estava fazendo.

— Ah, o Macchiatto da cascavel. 

Vou até a lanchonete da empresa e felizmente, consigo o café cheio de frescuras que Laila pediu.

 Quando volto à sala de Jorge, encontro todos os documentos e anotações que eu deveria ter colocado em ordem jogados pelos chão, na maioria amassados ou rasgados.

— Aquela vadia! — Rosno entre os dentes.

Deixo o café em cima da mesa e tento arrumar toda a bagunça antes que Jorge volte.

Tarde demais.

— Helena, céus! O que houve aqui?
— Jorge, eu não fiz isso. — Me levanto depressa. — Eu juro!
— Quem fez, então?
— Laila Albuquerque. — Me abaixo e volto a juntar os papéis. — Ela surgiu aqui do nada, me fazendo ameaças e despejando desaforos sobre mim.
— Ah, isso é típico dela. Laila é uma mimada, não dê ouvidos a nada do que ela diz. Ela só está com o ego ferido.
— Já é a segunda vez que ela me ataca sem motivo algum.
— Ela é apaixonada por Caíque desde criança, mas ele nunca correspondeu a esse amor. Só se divertiu, como um bom galanteador. — Jorge conta, enquanto me ajuda com a papelada espalhada. — Quando o casamento de vocês foi anunciado, ela deu um verdadeiro show. Não deve ter sido fácil ver o homem que sempre a rejeitou e disse que nunca iria se casar, realizando tal feito.
— Mas eu não tenho culpa.
— Certo. Explique isso à ela.

Suspiro.

— Acho que será um esforço desnecessário.
— Exato. Está pegando o espírito da coisa. — Jorge sorri, se levanta e olha o café, que repousa sobre a mesa.
— Ah, ela ordenou que eu fosse buscar esse café. — Aponto.
— Para ela?

Consinto com a cabeça.

Jorge pega o café e, em seguida, beberica-o.

Macchiatto, meu preferido. Mas Laila é alérgica a leite. Pelo visto, ela quer mesmo lhe causar problemas.
— Vem mais pela frente, não é?
— Bem vinda ao inferno, Helena.

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