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Capítulo 7

A mente humana é verdadeiramente fascinante, com suas numerosas funções cognitivas em ação. O pensamento lógico, a imaginação abstrata e a memória são apenas alguns exemplos de sua capacidade. Contudo, é de surpreender como seres aparentemente tão inteligentes podem, ao mesmo tempo, agir de maneira tola. Como é possível não enxergar que estão sendo manipulados por cordões invisíveis? São como marionetes, controladas por outros seres humanos igualmente ingênuos, que se enredaram nesses cordões e passaram essa influência adiante para suas próprias descendências.

As capacidades do encéfalo são extensas, mas duas se destacam pela sua imensa complexidade e impacto. Indivíduos dotados de habilidades intelectuais também podem ser autodestrutivos e representar perigos tanto para os outros quanto para si mesmos. Sentimentos como raiva, ódio, falta de controle, crises, medo e traumas podem exercer grande impacto sobre a nossa espécie. Os mecanismos que temos para mitigar esses impactos emocionais são a repressão e distorção de memórias.

A repressão de memórias traumáticas ocorre de diferentes maneiras, uma delas sendo a supressão, na qual o cérebro impede o acesso consciente a essas memórias. Isso significa que a pessoa pode não se lembrar do evento traumático ou apenas ter fragmentos de memórias que não são completamente claros.

O outro mecanismo é a distorção de memórias. Nesse caso, o cérebro modifica como a memória é armazenada, tornando-a menos intensa ou até imprecisa. Às vezes, as memórias traumáticas podem ser substituídas por falsas memórias, onde o cérebro preenche as lacunas com informações imprecisas ou inventadas.

No entanto, é importante destacar que esses mecanismos não são totalmente eficientes. As memórias reprimidas podem surgir subitamente em situações de gatilho, levando a flashbacks, memórias auditivas intensas e pesadelos. Ou então, o cérebro pode tentar proteger a pessoa por meio de confusões mentais, misturando ou implantando memórias inventadas.

No entanto, existe outra possibilidade: a irracionalidade, a necessidade de sentir-se importante e ter algo além em nossa história, a dificuldade em aceitar que somos apenas insignificantes em meio ao universo.

E se essa ânsia por ser tão importante ou ter algo poderoso em nossas vidas nos levasse a ver coisas que não existem ou a imaginar além do real? Acreditamos que somos pessoas importantes, que guardamos grandes segredos, que nossa vida é uma conquista, mas a crua verdade é que temos uma necessidade de nos tornar maiores do que realmente somos.

Pensamos tanto em ser algo que chega a convencermos a nós mesmos, e nossos cérebros acabam nos enganando. "Uma mentira repetida tantas vezes, acaba por se tornar verdade."

A irracionalidade é o pior inimigo de uma pessoa...


Sons distantes foram captados pelas sensíveis cócleas adormecidas de Zadie. Ela não se importou muito e se mexeu, recolocando-se confortavelmente em sua cama. No entanto, sua paz foi interrompida logo em seguida, quando os sons pareceram cada vez mais próximos dela.

Os olhos de Zadie se abriram, enquanto ela encarava o teto. Sentou-se na cama, ouvindo sons desconhecidos vindos do corredor logo após a sua porta. Seus pés deixaram a cama quente, tocando o chão gelado, e ela caminhou lentamente em direção à porta, colando seu ouvido nela, tentando identificar o som captado por eles. Suas sobrancelhas se franziram quando percebeu que o som estava se afastando. No entanto, a curiosidade dela falou mais alto. Ela tocou no painel e a porta se abriu, revelando um corredor que já não exibia as usuais luzes brancas, mas sim um tom vermelho. A confusão em seu rosto era evidente. Olhou para a parede de vidro atrás de si, ainda vendo a escuridão lá fora.

Decidiu investigar os sons por conta própria. O corredor estava mais frio do que o habitual. A porta se fechou silenciosamente atrás dela. Os sons distantes voltaram a ecoar em seus ouvidos. A humana decidiu segui-los pelo corredor, que parecia infinitamente longo. A luz vermelha envolvia seu corpo a cada passo em direção aos sons desconhecidos. Com o frio cada vez mais intenso, seus lábios se tornaram levemente vermelhos e seus braços buscaram se aquecer, abraçando-se. Um cheiro estranho chegou ao seu nariz, causando uma arrepiante sensação na coluna.

— Cheira a...

Ela não sabia exatamente o que era, mas já havia sentido aquele cheiro antes, assim como aquele frio. Seu nariz estava seco, a pele arrepiada e os lábios levemente trêmulos. No entanto, ela não se importava; queria seguir aquele corredor interminável. Uma porta fechada se aproximava à medida que ela avançava. Antes de poder tocá-la, algo a impediu. O som que ela perseguia agora vinha de trás, vindo do chão. Correntes. Correntes negras prendiam seu tornozelo, impedindo-a de alcançar a porta que emitia aquele reconhecível cheiro. No entanto, ela não sabia de onde conhecia aquele cheiro.

— Correntes? Isso não estava aqui antes. — Olhou ao redor. — Isso não pode ser real.

Ela foi despertada de seu devaneio ao sentir um puxão em suas pernas. As correntes suavemente a arrastaram para longe da porta. Ela se abaixou, tentando em vão soltá-las de seus tornozelos. As correntes pareciam se desvanecer ao seu toque, mas permaneciam firmemente presas. Uma vez mais, ela foi puxada pelos grilhões.

— É melhor seguir o seu rastro do que ser arrastada.

Zadie avançou com uma coragem trepidante na direção de onde as correntes negras serpenteavam sinistramente pelo piso. O rangido e arrastar das correntes ecoavam em seu ouvido, crescendo em volume conforme ela se aproximava do refeitório. O barulho metálico dos ferros batendo no chão a enervava, fazendo seu corpo formigar com uma antecipação sombria. O corredor e o refeitório estavam mergulhados em uma luz vermelho-sangue, envolvendo o ambiente sombrio e estranho.

Ao cruzar a entrada do refeitório, as criaturas que se perfilavam às mesas voltaram seus rostos grotescos em sua direção, seus semblantes deformados parecendo terem sido costurados e remendados inúmeras vezes em um horrível quebra-cabeça. Suas feições ausentes de rosto transformavam cada ser em uma figura de pesadelo. Mesas ocupadas por esses seres abomináveis se espalhavam pela sala. No chão, um emaranhado de correntes enrolava-se em torno dos calcanhares deles, assim como aprisionava Zadie.

Movendo-se entre as mesas com uma cautela macabra, Zadie contemplava o chão e as correntes que se desdobravam como uma teia. As criaturas a observavam, seus olhos vazios cravados em seu ser. Duas mesas em particular atraíram a atenção dela e de forma arrepiante. Em uma delas, várias crianças humanas, sem rosto, fitavam-na, suas características humanas subjugadas por uma ausência glacial de identidade. Na outra mesa, encontravam-se seus pais, Caelius e Frey. Eles não se viraram para encará-la. Porém, um detalhe chocante assombrou Zadie: as correntes que aprisionavam seus pais não se fixavam aos seus calcanhares como nos demais seres, mas sim envolviam cruamente seus pescoços, como coleiras mórbidas.

Ela tentou se aproximar da mesa, mas um estrondoso baque ecoou, acompanhado por uma batida sincronizada nas mesas ao redor. Ela virou o rosto, atônita, observando as mãos de todos levantadas e o dedo indicador balançando de um lado para o outro. Era um aviso claro de que ela não deveria se aproximar. Engolindo em seco, ela virou-se lentamente, encarando a visão à sua frente. Enquanto passava entre as mesas das crianças humanas e a mesa de seus conhecidos, as múltiplas correntes entrelaçadas deram lugar a uma única corrente, porém mais espessa e sinistra do que as outras. Ela continuou a seguir aquela corrente, mantendo os olhos fixos no chão.

Uma figura humana frágil permanecia ajoelhada no chão, sujeita a uma corrente grossa presa em sua cintura, a qual se ramificava em correntes menores, amarradas aos seus pulsos e calcanhares.

Ela sentia um pavor imenso e não queria se aproximar, evitando ao máximo olhar para o que tinha à sua frente. Tentou fechar os olhos, mas seu corpo desobedecia, obrigando-a a caminhar inexoravelmente em direção àquela criança prostrada e acorrentada.

Conforme Zadie se aproximava, notou que aquela criança era extremamente jovem e sem um único fio de cabelo em sua cabeça. Ao ficar próxima o bastante para tocá-la, o desespero se intensificou, seu corpo todo arrepiou-se. A humana então percebeu os pequenos pontos negros que cercavam o crânio da criança, um sombrio contorno contra sua pele.

A criança trajava uma camisola suja, aberta atrás e amarrada apenas por um laço malfeito. Enquanto Zadie observava com horror os pontos espalhados por suas costas, seu braço direito subiu involuntariamente, quase como se fosse puxado por uma força impossível de controlar. A cada centímetro mais próximo que seu dedo estava de tocar o ombro daquela criança, uma sensação de terror insuportável crescida dentro dela, prestes a explodir.

Quando, por fim, os dedos trêmulos de Zadie tocaram o ombro da criança, uma onda de arrepios arrebatadores percorreu todo o seu corpo. A criança virou lentamente a cabeça, revelando um olhar vazio e sombrio, suas íris negras pareciam sem vida. Seu rostinho estava manchado de sangue seco, e lágrimas rolavam incessantemente por suas bochechas. A boca da criança estava amordaçada por um objeto desconhecido, silenciando seu sofrimento e angústia.

A humana, impulsionada por uma força incontrolável, estendeu a mão em direção à mordaça, mas, naquele exato momento, foi abruptamente puxada pelas correntes e caiu de costas no chão. Era arrastada sem controle, sua agonia ampliada a cada centímetro percorrido. O chão parecia consumi-la lentamente, enquanto seus gritos ficavam abafados em sua garganta. Seus olhos contemplavam em agonia os lampejos do abismo, que passavam rapidamente diante deles, em uma visão aterradora e quase insuportável.

A humana "pulou" da cama, parando ao lado dela, respirando profundamente e sentindo-se tonta com o rápido despertar. Sua mão estava sobre o peito, tentando em vão acalmar seu coração.

— Que merda foi essa? Eu pensei que tinha parado. Eu pensei...

Ela se abaixou, sentando-se no chão e abraçou a si mesma. Seus dedos puxavam seus cabelos pela raiz. Sentia-se esgotada e cansada. Jurava que podia ouvir seu coração batendo. Tentou acalmar-se e respirar fundo. Não entendia seus sonhos, pois desde que saiu da Terra, eles sempre foram os mesmos. Coisas estranhas aconteciam com ela. Desejava ter paz e pensou que, depois de um mês sem esses sonhos, estaria livre. Porém, estava enganada. Isso a deixava esgotada de uma forma inexplicável.

"Eu sou louca? Tenho algum problema?" pensava consigo.

Pouco a pouco, sua respiração foi se normalizando. Ela não queria ficar ali. Ela arrancou seu vestido e vestiu sua roupa de treino, tendo cuidado para não acabar tirando o bracelete que ganhou de presente, enquanto prendia seu cabelo em um rabo de cavalo relaxado. Ela saiu do quarto e olhou para o teto do corredor, que se iluminava com uma luz branca.

"Foi só um sonho. Mais um dos estranhos...", concluiu ela.

Seguiu pelos corredores até a sala de treinamento das tropas, parando em frente à porta fechada.

— Talvez atirar algumas flechas me ajude em algo...

Zadie adentrou a sala, completamente deserta àquela hora da madrugada. Ela caminhou até o estande de armas, pegando seu arco e flechas negras, seu companheiro fiel nas noites solitárias. Ao segurar o arco em suas mãos, seus olhos se encheram de ardor.

— Eu estou exausta...

O desejo de liberdade que a consumia não era apenas sobre escapar das muralhas, mas também dessa angústia persistente que a assombrava. Era mais do que um mero anseio, tornara-se uma obsessão. Zadie queria se libertar de si mesma.

"Por que eu preciso tanto de respostas? O que caralhos eu realmente queria?"

Seus joelhos começaram a tremer ligeiramente, e ela se sentou no chão, colocando o arco ao seu lado.

— Tudo o que eu fiz em busca de perguntas idiotas...

O ódio que fervilhava em seu peito perfurava seu coração com implacável intensidade. Seu peito ardia intensamente.

— Todos viviam em paz na terra, mesmo com fome e trabalhando demais. Não se importavam. Só eu. — Suas mãos pressionavam sua testa. — Deve haver algo errado comigo. Tem que ter.

As vozes persistentes em sua cabeça continuavam a falar incessantemente. Ela não conseguia se lembrar se tinha esse problema ou qualquer outro, quando era criança, antes de ser "adotada".

"Eu tinha? Por que não consigo me lembrar disso?"

Sentia-se como se estivesse presa em um sufocante redemoinho de angústia, onde cada respiração parecia mais difícil do que a anterior. Seu peito apertava, como se uma força invisível pressionasse contra ele, restringindo o ar de entrar nos seus pulmões. A sensação de pânico invadia a sua mente, enquanto as vozes ininterruptas pareciam ecoar ainda mais alto dentro da sua cabeça.

As vozes nunca se calavam...

— Pare. — Sussurrou, tapando os ouvidos. — Calem a boca. — Gritou tão alto que suas cordas vocais doeram.

Suas costas caíram pesadamente no chão, enquanto o nariz ardia e a garganta ressecada se fazia presente. Seus olhos se fecharam, mergulhando na escuridão.

— Por favor, deixem-me em paz. — Um sussurro trêmulo escapou de seus lábios desesperados.

"Está tudo bem em não ser normal", Melie sempre lhe afirmava, mas ela não queria que essa frase ficasse cravada em sua memória. Seus problemas transcendiam apenas o rótulo de "estranha". Em momentos inoportunos, pensamentos, ações e emoções que não lhe pertenciam invadiam seu ser, se apossando sem permissão, sem qualquer consideração. Ela sabia que aquilo não era verdadeiramente dela; ela não agiria assim, certo? Mas a incerteza persistia.

Enquanto a angústia permeava seu ser, ela ansiava por uma sensação de normalidade, ou melhor, por uma sensação de estar verdadeiramente viva. A ideia de ser libertada de tudo o que a atormentava era um sonho tão simples, mas que parecia tão distante. Em meio ao peso de suas preocupações, a humana adormeceu.

Uma mão gentil tocou seu ombro.

— Zadie, acorda!

Seus olhos se abriram lentamente, encarando o rosto conhecido de Mira.

— Por que você está dormindo aqui? Você está bem? Relataram barulhos estranhos vindo daqui mais cedo.

Zadie se sentou e esfregou os olhos, em seguida encarou Mira com um leve sorriso.

— Eu estou bem, não foi nada.

Mira simplesmente balançou a cabeça em concordância.

— Vamos comer juntas?

Zadie concordou e se levantou, limpando a parte de trás de sua roupa e colocando seu arco de volta no lugar onde o pegou. Ambas saíram da sala de treinos.

Ela não se sentia à vontade para encarar todas as espécies no refeitório, mas faria um esforço. Desde que venceu Tars há dois dias, ela se sentia estranha, como se algo estivesse errado com ela. Talvez estivesse paranóica. Mas após esse sonho, ela tinha certeza de que algo estava errado.

"Engula isso", repreendeu-se mentalmente.

Talvez fosse mesmo o estresse. Agora tudo estava claro, nada mais parecia um sonho. Nada mudaria. Ela não queria mais voltar para a terra de onde veio, não desejava mais isso. Não para o lugar que oprime tanto a sua espécie.

"Algumas saudades devem permanecer como saudades", ela pensou em relação à sua família. Ela os amava, mas não queria retomar sua antiga vida. Seria hipócrita se dissesse que queria.

"Mas você é hipócrita", uma voz sussurrou no âmago de sua mente.

Zadie respirou fundo, massageando suas têmporas com as duas mãos.

"Eu já te mandei ficar em silêncio", repetiu sua ordem mais uma vez.

— Você está realmente bem, Zadie?

Mira a questionou quando estavam em frente à entrada do refeitório. A humana concordou, sorrindo de maneira sem graça. Ambas adentraram o refeitório, e os olhares de diversas espécies se voltaram para elas, principalmente para a humana. Zadie se sentiu pequena e desconfortável sob aqueles olhares. No entanto, percebeu que não a encaravam mais como inimiga, mas sim como parte do grupo, mesmo que ela não se sentisse assim.

— É ela!

— Foi essa humana que derrubou o Tars?

— Agora entendo por que o Caelius a tomou para si.

Um burburinho se espalhou pelo ambiente, que antes parecia rejeitá-la, mas agora ela se sentia quase "bem-vinda".

— O que está acontecendo aqui, Mira? — Zadie perguntou enquanto Mira se servia de comida ao seu lado.

— Bem, você provou não ser uma fêmea de troca.

A confusão só aumentava no semblante de Zadie.

— Essas fêmeas aqui são odiadas desde a última companheira de Mor. Fêmeas trocas são aquelas que trocam seu corpo e fertilidade por segurança, comida e luxos — explicou Mira, com um tom de desconforto.

As sobrancelhas de Zadie se franziram.

— E por que pensaram que eu era uma delas?

Mira deu de ombros.

— Bom, o ódio em relação a você começou depois de Caelius matar Zir. Como você era tão importante para ele a ponto de ele fazer o que fez por você, muitos acreditaram nisso. E como você não tinha nenhuma tarefa aqui, todos supuseram que você era uma fêmea troca. Alguns até pensaram que você foi dada a Caelius como parte de um acordo com Tur, em troca da saída dele do planeta.

Ambas caminharam até uma mesa vazia, com suas bandejas repletas de comida. Ao sentarem-se, três fêmeas da mesma espécie de Mira juntaram-se à mesa.

— Olá, Zadie.

As três falaram ao mesmo tempo, como um coro. Mira as repreendeu com uma expressão divertida.

— Já disse para não falarem juntas, soa estranho.

Elas riram em resposta.

— Eu sou Aik.

— Sou Kiy. E esta é Tiy; ela não fala muito.

— Olá a todas. — Zadie sorriu calorosamente para todas.

Para Zadie, pequenas conversas com novas pessoas eram simultaneamente simples e importantes, especialmente porque as pessoas raramente se aproximavam dela. Sua fama peculiar no distrito alimentar afastava as pessoas e a possibilidade de fazer novas amizades. Se lhe perguntassem quantos amigos ela tinha na Terra, ela levantaria um dedo que seria ocupado apenas por Melie.

— Eu sabia que você não era apenas uma troca. Estou muito feliz por conhecer uma espécie estranha para mim. — disse Aik.

— É ainda mais incrível que você seja vinculada a um Nakkyriano. Que honra. Acho que todas as fêmeas disponíveis invejam você.

A humana mordeu os lábios antes de falar.

— Bem, eu e Caelius somos... somos amigos?

Ela não sabia exatamente qual rótulo aplicar a eles. Segurou seu copo transparente e deu um gole na bebida doce que estava ali.

— Pode nos contar. — Tiy sussurrou, embora todos ouvissem.

— Como é acasalar com um Nakkyriano? — Kiy perguntou.

Assim que ouviu a pergunta, seus olhos arregalaram e ela se engasgou, afastando o copo dos lábios e tossindo.

— Eu e ele... não fizemos nada.

As fêmeas rosas a encararam com surpresa.

— Eu pensei que Caelius já tivesse te marcado.

O corpo da humana estremeceu ao pensar que Caelius poderia querer algo a mais com ela. Ela guardava lembranças terríveis de seu primeiro e único relacionamento, que a deixou completamente destruída. Foi a primeira vez que permitiu que alguém se aproximasse além de sua família e dissesse "eu te amo". Essa escolha se provou a pior de sua vida.

Mas Zadie sabia que Caelius não era humano. Ela não repudiava seus toques. Os momentos que passou com ele foram incríveis. No entanto, isso não era motivo suficiente para viver eternamente com alguém. Talvez, com mais tempo e paciência, as coisas pudessem funcionar entre eles. Ela não se sentia pressionada a andar rapidamente.

"Eu não repudio a ideia, só acho que é muito cedo para isso acontecer", concluiu para si mesma.

—Qual é a história do seu planeta, Zadie? — Perguntou Mira, tentando mudar o foco da conversa, pois percebeu que a humana se retraiu ao abordar o assunto.

Zadie abriu e fechou a boca algumas vezes antes de responder.

— Eu não sei muito. Mas quase fomos extintos devido à exploração excessiva de recursos naturais. Nossos criadores "reverteram" a situação, e agora sobrevivemos em cidades-estados, sem contato com o mundo exterior, apenas recebendo notícias através dos Lázaros, que são androides, sobre a recuperação da Terra.

As fêmeas lançaram um olhar interrogativo para Zadie.

— Só isso? — Questionou Aik.

— Isso é realmente tudo? O que aconteceu antes disso? Como era o passado da sua raça? Afinal, todas as espécies possuem uma história mais longa — Falou Mira, buscando mais informações.

Zadie compreendia as perguntas, mas sua própria ignorância a frustrava. Tudo que sabia se limitava ao século XXI e a informações extremamente superficiais, como a quase destruição da Terra devido à exploração insustentável. Não havia mais nada. Se eles tinham um passado, ele havia sido apagado. A humana se questionava se isso era bom ou ruim. O que eles haviam feito de tão terrível para terem sua história encoberta dessa forma?

— Infelizmente, não temos conhecimento além disso. Não temos tempo para buscar mais informações. Precisamos trabalhar incessantemente para nos sustentar e pagar pelo que nos é dado. — Disse ela, erguendo o braço e exibindo o bracelete concepcional.

Kiy se levantou de sua cadeira e aproximou-se, curioso com o acessório.

— O que é isso? Tem um cheiro estranho.

— Este é meu bracelete concepcional, nele está inserido um hormônio chamado acetato de leuprorrelina que impede meu ciclo menstrual. Também contém um hormônio para prevenir a concepção. No entanto, o anticoncepcional só é acionado quando o dispositivo detecta uma relação sexual.

Mira puxou o braço onde o dispositivo estava e tentou removê-lo puxando.

— Ele só pode ser retirado quando um dos hormônios acaba, então precisamos ir para a capital para preenchê-los novamente. O uso do dispositivo é obrigatório nos distritos, exceto na capital. E ainda precisamos pagar por ele.

Tiy inclinou a cabeça para o lado.

— O que é esse ciclo que você mencionou?

Zadie olhou para elas com uma expressão confusa desta vez.

— Vocês não sabem o que é?

As fêmeas negaram.

— Tipo, vocês não passam uma semana sangrando se não engravidarem no mês?

Novamente, elas negaram.

— Desculpem, foi uma pergunta boba.

Mira sorriu animadamente para a humana.

— Tudo bem. Parece que somos muito diferentes do que pensávamos.

Zadie suspirou.

— Eu pensei que vocês iam me bombardear com perguntas. — Um suspiro de alívio. — Se o fizessem, eu temia não saber responder.

Kiy empurrou Mira para o lado e sentou-se ao lado da humana.

— Bem, seu passado não importa para nós. Você tem sorte em ter escapado dos mercadores ilegais, eles não são gentis com suas "mercadorias" e nem os compradores.

Aik sussurrou, silenciando Kiy.

— Você não teria um destino feliz nas mãos deles. Seria levada para os flutuantes espalhados pelas galáxias e seria compartilhada por vários machos. E quando tivesse sido usada por todos, acabaria nas mãos de um colecionador de fêmeas.

A humana notou a mudança de expressão na fêmea à sua frente.

— Tivemos uma fêmea que não tinha mais valor comercial e que foi deixada para morrer aqui. Rao a salvou enquanto estava na ala de saúde, mas ela se suicidou. — Aik concluiu.

Zadie sentiu uma sensação ruim no estômago, junto com a opressão na garganta.

— Tinha outra humana naquela nave comigo. — Sussurrou, mas todas ouviram.

Mira acariciou suas costas.

— Não podemos salvar a todos. Não é culpa sua.

— Exato, Zadie. – As três disseram juntas em coro.

A humana não havia parado para pensar na outra humana que estava com ela na nave. Abaixou sua cabeça, encarando suas mãos que brincavam nervosamente uma com a outra. Sentia um peso no peito ao imaginar o destino que essa outra humana ia enfrentar.

"O que teria acontecido com ela? Eu sei que não poderia ter feito nada para ajudar, mas ouvir isso me enche de remorso", sussurrou para si mesma, os pensamentos tumultuados em sua mente.

O silêncio repentino que se instalou no refeitório, antes tão cheio de vozes e risadas, chamou sua atenção. Ergueu os olhos, buscando o que poderia ter causado aquela mudança drástica de ambiente. Os rostos de Mira, Kiy, Aik e Tiy mostravam expressões fechadas e enojadas, deixando-a intrigada. Procurou em volta, tentando entender a causa desse incômodo coletivo.

Foi então que seus olhos se fixaram em uma figura solitária: uma mulher Kiyar, cuja pele parecia desbotada em comparação com as outras espécies presentes. Seu braço direito faltava uma mão, coberto por um tecido negro cuidadosamente envolto. Da mesma forma, sua cabeça estava coberta por um véu negro, complementando a faixa que envolvia sua mão.

"Por que ela não tem os rabos na cabeça como Mira e as outras aqui?" A humana questionava a si mesma.

A diferença da fêmea era a sua barriga, que se esticava carregando uma vida. Ela servia a sua comida enquanto todos a encaravam, incluindo Zadie, mas não com a mesma expressão que os outros. Enquanto a expressão de Zadie era de curiosidade e dúvida, a de todos ao redor era de nojo e ódio. Assim que a fêmea se sentou em uma mesa vazia, as pessoas que estavam ao redor se levantaram e foram embora.

Zadie cutucou Mira.

— Por que estão fazendo isso com ela?

Ela sabia o quão horrível era essa sensação. Ser odiada, ignorada e tratada como um erro.

— Ela é a antiga companheira de Mor. Pensávamos que ela estava morta.

Kiy virou para olhar Zadie nos olhos.

— Ela é uma fêmea de troca. Quase acabou com o nosso plano de nos libertarmos do Mor.

Aik se virou para explicar a Zadie, em vez de Kiy.

— Se um imperador tem um filhote gerado em uma rebelião, o imperador perde seu posto, que é passado para a fêmea que gera a criança. Ela governa até a maturidade da criança. A rebelião é obrigada a parar nessas circunstâncias. Ela teve um filhote de Mor, mas fugiu assim que descobriu. Mor passou anos procurando por ela, pois sabia que uma rebelião estava surgindo aos poucos nas minas. Ele precisava deles para conter o caos que ele causou. No entanto, quando Mor a encontrou, ela já havia desaparecido com o filhote.

Zadie levantou a mão pedindo uma pausa.

— Mas se ele precisa de um filho, ele poderia pegar qualquer fêmea e tê-lo. Rao me disse que ele forçava várias mulheres. Ele até poderia comprá-las, não?

Mira negou.

— Não somos Nakkyrianos, Zadie. Nosso povo é dividido em três raças: nós somos Kiyar, os Kree são a raça de Rao, e o Zangorr é a raça de Zir. Somente somos compatíveis entre nós mesmos. — Mira respirou fundo. — Todas as fêmeas que Mor violou tiraram suas próprias vidas para não prejudicar a rebelião. Era isso que ela deveria ter feito, era sua obrigação. Se ele tivesse colocado as mãos naquele filhote, estaríamos em uma situação ainda pior do que estamos hoje.

A humana balançou a cabeça.

— Mas ele não pegou a criança. Esse ódio não é demais? Quero dizer, ela está grávida, não deveria passar por isso.

Aik balançou a cabeça, negando.

— Zadie, não esperamos que você entenda nossos costumes. Você ainda não compreende completamente como foi para nossos anciãos durante a época de Mor. O ódio por ela não é recente. Olhe para a cor dela, isso mostra o quão antiga ela é. São duzentos anos de ódio por ela, e isso não vai cessar. Sabe o que ela fez com a criança? Ela a trocou por passagem para um planeta próximo ao nosso, com mercadores ilegais. A morte seria o melhor presente que ela poderia ter dado ao filhote.

Tiy sussurrou para todas ouvirem.

— Os anciãos falam que ela é amaldiçoada por isso ainda não morreu. A expectativa de vida dos Kiyar é de cento e vinte ciclos de luas. Ela tem cerca de duzentos ciclos e ainda está gerando outro bastardo.

Aik puxou a mão de Zadie, aproximando seus corpos.

— Como eu disse, não esperamos que você entenda. Mas saiba que se ela tivesse honra, teria feito o mesmo que todas as fêmeas fizeram.

Zadie engoliu em seco.

— E se a criança de Mor foi concebida sem consentimento?

Aik estreitou os olhos.

— Não importa como aconteceu. Ela não tem honra.

A humana, não entendia por que essa afirmação lhe doeu tanto. Não era natural sentir a dor dos outros, ou era? Ela se soltou de Aik, empurrando-o. Seu peito subia e descia agressivamente.

"Isso está errado. Elas não deveriam tratá-la assim", pensava Zadie, com a mente confusa.

A garota fechou os olhos, balançando a cabeça negativamente antes de abri-los novamente.

— Vou me retirar por hoje. Não me sinto bem.

Sem dar importância em ouvir mais palavras das Kiyar, Zadie deixou a mesa apressadamente. Ao passar pela fêmea excluída, ela se deteve ao seu lado, olhando diretamente em seus olhos. Seu coração se apertou ainda mais ao notar o sorriso quase desvanecido no rosto desbotado. Zadie saiu às pressas sem retribuir o sorriso, sentindo uma profunda tristeza dentro de si. Seu peito pesava.

— Isso não está correto. — Sussurrou para si mesmo enquanto percorria o corredor de seu quarto.

Ela andava rapidamente, olhando para o chão, o que a impedia de ver quem estava à sua frente, enquanto fugia pelo corredor.

"Ela tem um ponto de vista. Tem suas razões. Já ouviram o que ela tinha a dizer?" Seus pensamentos trabalhavam incessantemente em sua mente.

Parou no meio do corredor para respirar profundamente. Ninguém merece passar por isso, não importa o que tenha acontecido no passado. Fechou os olhos e buscou encontrar um momento de calma, mesmo com todos os pensamentos turbilhonando em sua mente. Inspirou profundamente, sentindo seus pulmões se expandirem lentamente.

"Preciso encontrar um lugar de paz. Ainda não o encontrei aqui."

Zadie ouviu passos se aproximando e abriu os olhos, procurando quem os produzia. Seus olhos encontraram o Nakkyriano parado no corredor, muito próximo a ela, porém mantendo uma distância respeitosa. Ele usava um cinto que realçava sua imponente estrutura muscular no peito e carregava uma parte de um arco e flecha em suas costas, juntamente com adagas fixadas nas laterais de seus braços superiores.

— Zadie, andei procurando por você. Gostaria de caçar comigo? — Ele perguntou.

Aquilo parecia ser exatamente o que ela precisava. Um momento agradável para se manter em silêncio. Ela começou a perceber que sempre que ele estava por perto, o silêncio, tão raro em sua mente, predominava. Era estranho, mas reconfortante.

— Seria ótimo, Caelius. — Um leve sorriso surgiu no rosto da garota. — Vou buscar minhas armas.

No entanto, o gigante a interrompeu.

— Não será necessário. Já providenciei isso. Frey foi buscá-las.

Ela não pôde resistir e decidiu perguntar.

— Vocês entendem tudo o que dizem? Quero dizer, Frey consegue se comunicar com você?

Os braços inferiores de Caelius puxaram os cintos presos ao seu peito, testando sua resistência.

— Sim, Frey é meu Eyam. Ele vai além de ser apenas um animal de estimação. Há uma conexão entre nós. Temos um vínculo baseado em respeito e conexão; eu posso senti-lo e ele pode me sentir. Não precisamos de muitas palavras para nos entendermos.

— O que você quer dizer com "ambos se sentir"?

Caelius soltou uma risada suave, e Zadie se encantou com o som.

— Quero dizer que é uma experiência completa. Sentir a existência de outro ser é uma verdadeira honra. É como se nossas respirações se fundissem, nossos corações batessem como um só. É algo indescritível, que vai além das palavras. Você não precisará delas. Assim que nos vincularmos, compreenderá o verdadeiro significado.

Zadie sentiu o calor tomar suas bochechas e as palavras desaparecerem de sua boca. Ela lembrou da pergunta que lhe haviam feito antes. Seus pensamentos curiosos insistiam em ser invasivos.

"Agora, que penso nisso... Sinto vontade de saber se ele tem um... Não é algo que eu precise saber", balançou a cabeça de um lado para o outro.

— Vamos?

A humana saiu de seu próprio mundo pessoal e concordou em seguir Nakkyriano pelo corredor.

Ao saírem do complexo, Frey estava à frente, esperando por eles. Ele estava sentado em suas patas traseiras, segurando o arco e flecha da humana na boca. Quando ambos se aproximaram, ele abaixou a arma no chão, levantou-se e caminhou em direção à humana, esfregando o focinho em sua barriga. Ela sorriu e acariciou o animal.

"Você é tão fofo. Apesar de eu ainda ter tido uma péssima primeira impressão de você", pensou a humana.

Zadie gostava do animal, isso ela não poderia negar. Ela sentiu falta dele durante o mês em que treinou, pois ele não apareceu em seu quarto para deitar em sua cama, dormindo e até babando. Ela poderia dizer o mesmo sobre Caelius? Ela não o via ainda como um homem, talvez como um amigo? Duvidava que ele reconhecesse essa palavra. Ele já deixou claras suas intenções e foi sincero.

Tudo isso era confuso para ela. Ela aceitou conhecê-lo sem pensar muito nisso, a violência dele não a assustava, era um fato. Ela deveria sentir medo dele, afinal, qual seria a reação normal de um humano diante de uma criatura como ele? Um "monstro" gigante, robusto e veloz. Quem não teria medo?

Ele matou por ela, isso mostrava até onde ele iria. Isso deveria assustar Zadie ainda mais, mas ela não sentia medo. Seu corpo se arrepiava de uma maneira agradável.

— Podes caçar por conta própria hoje, Frey. — A voz grave de Caelius ecoou entre eles.

Frey rapidamente saiu do carinho da humana e foi até o guerreiro, repetindo a ação que teve com Zadie, correndo em direção à mata e desaparecendo. A humana pegou seu arco e flechas do chão, passando a corda pelo peito e o prendendo em si, juntamente com o flecheiro.

— Não é perigoso? Ouvi dizer que há escravos de Tur rondando por aqui.

O guerreiro negou.

— Eles não atravessaram a caverna que dá acesso à nossa cordilheira. Estavam antes dela, e eu já resolvi isso. Teremos algum tempo de paz antes de tudo explodir. Tomamos algo deles e logo reagirão.

Caelius começou a caminhar para dentro da mata, assim como Frey. Zadie o seguiu. Ele caminhava devagar para acompanhar os passos da humana. Ela tinha muitas perguntas, muito mais do que gostaria.

— Posso fazer uma pergunta?

O extraterrestre balançou a cabeça em concordância.

— Rao fala de você como se tê-lo ao lado da rebelião fosse um triunfo. Já ouvi você dizer que seu povo tem grande poder bélico e um enorme exército.

Caelius parou de andar, virando seu rosto para a humana.

— Pergunte, Zadie. Me faça suas perguntas e terei o prazer de respondê-las uma por uma.

Ela engoliu a saliva em sua boca. Ele sempre foi direto com ela e ela tentaria ser assim com ele também.

— O que quero dizer é: se você é quem ele diz que é e tem o que diz ter, por que este confronto ainda não acabou?

Ele sorriu, revelando seus dentes pontiagudos.

— Está certa. Eu poderia fazer isso.

— Então por que...

Sua fala foi interrompida por ele.

— Porque não posso me dar ao luxo de perder meu irmão mais uma vez. — Ele continuou andando, com a humana seguindo-o de perto. — Eu permiti que ele saísse de Nakkyr antes de eu ascender ao trono. Seu desaparecimento atrasou meus planos.

— Espere. Trono? Você é um príncipe? — As sobrancelhas dela se franziram diante dessa revelação.

— Sim, eu e meu irmão somos herdeiros. Mas serei eu a ascender.

Caelius saltou facilmente por cima de um tronco à sua frente, enquanto Zadie se sentou, passando as pernas por cima antes de se levantar. O príncipe segurou o ombro dela, mantendo-a sentada, e se abaixou na sua frente.

— Como eu já disse, não tenho motivos para esconder a verdade de você ou não responder às suas perguntas. Meus familiares não sabem que estou neste planeta. Eu pedi permissão para ir a um planeta de caça, não para outra galáxia. É extremamente importante que nossa linhagem seja preservada até que possamos recuperar todas as pedras fundadoras e estabelecer a ordem no universo. Muitos planetas foram destruídos por causa da ilusão de controle. Não há outra espécie capaz de manipulá-las sem causar danos ou ter intenções errôneas. É triste. Tanta destruição por causa de um erro. Este planeta não é o primeiro e nem será o último a tentar possuí-las.

— Então, seus pais não estão cientes da morte de seu irmão?

Ele balançou a cabeça em negação.

— Não posso permitir que este planeta seja destruído, nem permitir que a pedra seja destruída. Não sei onde a energia de meu irmão está. Eu queria encontrar seu corpo, pois é o que mais desejo. Quero enterrá-lo onde ele queria e ver sua última luz. Apesar de saber que a morte não é o fim, perder alguém é triste, é uma tristeza profunda.

O guerreiro se ergueu, saindo do caminho da humana para que ela pudesse se libertar do tronco.

— Vamos, temos uma longa caminhada até o local de caça.

Ambos retomaram a marcha.

A humana sentiu que, aos seus olhos, ele estava se mostrando mais "humano". Ela não conseguia decifrá-lo, já que não podia ver suas expressões faciais. Mas isso a aproximava mais dele, pois ambos haviam perdido entes queridos. Ela sentiu uma urgência em compartilhar sua história com ele. Ele nunca perguntava sobre ela, talvez para evitar ser evasivo. Ela inspirou profundamente, reunindo coragem.

— Eu também perdi pessoas próximas. — Ele suspendeu o passo, mas ela continuou. — Meus pais. Provavelmente não é a mesma coisa, já que a perspectiva de morte para vocês é completamente diferente.

Caelius continuou seguindo-a lentamente. Ele não precisava perguntar como ela se sentia, pois o cheiro entregava. Ele percebia as nuances a cada vez que a encontrava. Sua tristeza, desconforto, raiva e medo tinham aromas distintos, e ele apreciava todos eles. Seu favorito era o aroma que ela exalava quando estava impressionada. Ambos seguiram caminhando em silêncio, cercados pela exuberante mata, enquanto a brisa acariciava suas peles.

Assim que pararam em frente a um paredão de rochas negras com uma fresta grande e irregular no meio, folhagens também negras se retorciam, presas às pedras, pareciam ter vida própria. Zadie se virou para encarar o Nakkyriano.

— Estamos no lugar certo?

Ele concordou.

— Os animais daqui estão na temporada de procriação e, além disso, eles sentem algo estranho no ambiente do planeta e se escondem. — Ele se aproximou da fresta. — Venha, não precisa ter medo. Não deixarei nada de ruim acontecer com você.

Zadie inspirou profundamente e juntou-se a ele, adentrando a fenda escura. Imediatamente, uma escuridão acolhedora os envolveu, e uma brisa gélida e úmida beijou suas peles, trazendo uma sensação de estar mergulhando em um rio. Era como se o próprio ambiente abraçasse seus corpos.

Nesse instante, a pele de Caelius começou a emitir um brilho suave. Como se ele fosse uma extensão da natureza, sua presença despertou uma resposta luminosa ao seu redor. Todo o ambiente ganhou uma nova vida, tornando-se iluminado e vibrante, como se estivessem imersos em um mundo paralelo. As plantas dentro da fenda não se limitavam a simples árvores; eram como as algas do fundo de um rio, grudadas no chão e no teto, com suas cores azuis e roxas dançando e oscilando graciosamente. Não era apenas a vegetação, mas toda a natureza ao redor parecia estar em movimento, pulsando em uma sinfonia de cores e vida. Era um espetáculo de tirar o fôlego, um lugar tão cheio de vida e cores que parecia existir em um mundo próprio.

— Por que elas se movem dessa forma? — indagou ela.

— Elas se movimentam a cada inspiração.

Ela estava completamente encantada com o cenário à sua volta. Os sentidos aguçados captavam cada detalhe. E lá estava o aroma que o príncipe amava, aquele que parecia intoxicá-lo: uma mistura única. Ele sentiu um impulso forte de tê-la completamente, mas sabia que não era o momento adequado. Afinal, ela não era da mesma espécie que ele. Seria preciso ter paciência e esperar o momento certo para conquistar sua fêmea.

— Vamos em frente, Zadie.

Ambos seguiram em direção a uma abertura lateral, de onde uma luz tênue penetrava. Assim que atravessaram, ela fora surpreendida pela majestosidade do cenário à sua frente. Um ambiente profundo e exuberante, repleto de vegetação de tons vibrantes. Árvores terrestres densas balançavam suavemente ao correr da brisa, criando um espetáculo visual deslumbrante. A humana levantou o rosto, procurando o céu que estava encoberto por rochas escuras, mas uma brecha no centro permitia que um raio de luz solar penetrasse, iluminando o ambiente. Ao lado da rocha, uma cachoeira cristalina despencava em queda livre para um abismo misterioso. Era um verdadeiro oásis submerso.

Antes que ela pudesse expressar sua admiração, o ser ao seu lado sussurrou em seu ouvido.

— Sem fazer barulhos, poderíamos assustar nossa presa.

Ela mordeu os lábios com vontade de rir.

"Ele sabia que eu iria fazer algum comentário", pensou, divertida, enquanto prosseguia com ele em busca da caça.

O guerreiro equipou-se com as adagas presas em seu corpo, buscando um pequeno animal doce para que ela pudesse provar, pois tinha certeza de que ela iria adorar. Ele desejava mimá-la. Observando ao redor, sentiu o aroma de um desses animais próximo a eles.

— Vou deixá-la aqui. Volto logo, certo?

Ela confirmou com um balançar de cabeça, enquanto o observava desaparecer entre as árvores.

— Seria estranho se eu dissesse que me sinto bem aqui? — Sussurrou para si mesma.

Ela olhava ao seu redor, seus olhos inquietos tentando absorver toda a paisagem. Tudo parecia tão belo, desde a combinação de cores até o solo irregular. O cheiro úmido e verde ao redor adocicava seu nariz. Os fios soltos do seu rabo de cavalo balançavam com a brisa úmida. Era estranha a sensação de se sentir acolhida e aceita. Sentia-se sonolenta, enquanto o som distante da água se transformava em música para seus ouvidos sensíveis. Suas mãos se juntaram, brincando com o bracelete que ganhou de Caelius.

"Isso não é errado", um pensamento sussurrou no fundo da sua mente sem autorização.

Ela sorriu, balançando a cabeça em descrença.

"Você está certo", pensou a humana.

Um barulho nas folhagens atraiu seu olhar. Ela observou as folhas mexendo, sendo puxadas por algo. Com cuidado e agilidade, ela retirou o arco das suas costas. Posicionou uma flecha e puxou a corda, sentindo-a tocar sua bochecha.

Movendo-se lentamente em direção ao local do movimento, ela afastou uma folha laranja que bloqueava sua visão do alvo. Então, seus olhos se fixaram em um animal de tamanho médio, com uma pelagem preta e branca. Possuía seis patas com cascos e um pescoço alongado, adornado por uma crina azulada. Sua cabeça era pequena, com dois chifres triangulares negros que exibiam várias aberturas. Em vez de olhos, três estruturas semelhantes a penas se projetavam, com suas pontas em tom azulado.

A humana respirou fundo, mirando no pescoço do animal, preparada para atirar. Contudo, antes de soltar a corda, uma mão familiar tocou a flecha negra apontada para o animal desconhecido, abaixando-a suavemente. Ela olhou para a mão, sem compreender sua ação. Estava convencida de que, naquele local de caça, poderia abater qualquer animal que surgisse.

— Não matamos fêmeas.

A garota abaixou suavemente seu arco, enquanto Caelius se aproximava do animal, que emitia um som suave com um leve rosnar. Ele avançou com cautela em direção à fêmea, estendendo a mão para tocar seu focinho com cuidado. O animal, aparentemente confiando em sua intenção pacífica, permitiu o contato. Enquanto isso, o braço livre de Caelius sinalizou à humana que largasse seu arco, convidando-a a se juntar a eles.

— Quer tocá-la? — indagou Caelius.

Com um gesto hesitante de concordância, a garota levantou lentamente a mão e se aproximou do animal. O Nakkyriano suportou sua mão com segurança, guiando-a para acariciar o topo da cabeça. Um sorriso iluminou o rosto de Zadie ao sentir a sensação engraçada do pelo frio e úmido do animal.

— Nesta temporada, só caçamos machos.

Enquanto pronunciava essas palavras, o animal à frente deles correu rapidamente, sendo seguido por um novo som vindo da mesma direção. Zadie observou Caelius puxar seu enorme arco e flechas das costas, mirando no ponto de origem do barulho e lançando uma flecha com precisão. Um ruído de algo caindo foi seguido por um mugido, ecoando pelos arredores. O gigante então se dirigiu à área onde atirou a flecha, e Zadie o seguiu de perto. Caelius se ajoelhou no chão, revelando o animal ainda vivo, semelhante àquele que ela mesma havia tentado abater. Com sua agada em uma das mãos, ele acariciava gentilmente o corpo do animal com as mãos desocupadas.

— Agradeço pelo seu sacrifício, irmão de espírito. — Expressou o guerreiro, com reverência, ao enfiar a adaga na barriga do animal. — Que sua passagem para junto de Eya seja em paz.

Com cautela, o guerreiro recolocou a adaga em sua bainha no braço e retirou a flecha, guardando-a de volta em seu próprio aljava. Era difícil encontrar palavras que pudessem transmitir a verdadeira essência de uma morte que não deveria ser contemplada com beleza, mas o respeito que ele nutria pela criatura permitiu que seu ato fosse repleto de admiração. Erguendo-se, ele cuidadosamente colocou o animal nos ombros.

Ambos retornaram ao local de onde haviam partido, e o guerreiro depositou gentilmente o animal no chão, enquanto Zadie se adiantava para pegar seu arco.

"Já caçamos, infelizmente temos que ir embora."

Um suspiro de tristeza escapou da humana, sendo audível mesmo para Caelius, que se encontrava a certa distância. Ele também não desejava partir, pois apreciava a atmosfera livre de corrupção daquele lugar. Além disso, valorizava imensamente a companhia da fêmea. Desde sua chegada, ele mantinha os olhos em um pequeno animal que almejava capturar, mas teve que abrir mão momentaneamente ao impedir a trajetória de sua flecha. No entanto, ele prometia a si mesmo que conseguiria capturá-lo e, assim, mimar sua fêmea, que tanto adorava com coisas doces.

— Gostaria de permanecer mais algum tempo aqui comigo? — indagou ele.

Ao ouvir suas palavras, ela virou a cabeça rapidamente, exibindo um sorriso.

— Sim, adoraria.

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