2. DANGEROUS
Eu sou o tipo de cara que eles dizem que é fodidamente hediondo
Porque eu sou o tipo de cara que você sabe que é fodidamente perigoso
— Agora, o que eu tenho que fazer? — eu exibi um sorriso pelo 'entusiasmo' dela, mesmo sabendo que ela não podia me ver.
— Vou te enviar alguns aplicativos que você vai precisar. Por hoje vamos deixar a sua rede mais segura. — Eu me virei para o teclado do computador ao meu lado, enviando alguns arquivos para ela. — Amanhã você pode começar com a parte social.
— Social? — ela me olhou curiosa e parecendo um pouco cética.
— É, preciso da ajuda de alguém com alguma habilidade social. — eu voltei minha atenção para a tela não muito longe de mim. — Digamos que meu alvo mais recente é cuidadoso. Os dados que preciso provavelmente estão em um aparelho conectado a uma rede mais discreta e desconhecida, diferente da que ele tem em casa.
— E onde eu entro aí? — eu a vi passear pela casa, o cenário ao fundo mudando de flores para um armário.
— Bem, ele tem uma esposa que tem um grupo para conversar com as outras esposas do círculo de amigos deles. — Eu voltei meus olhos para ela bem a tempo de vê-la revirar os olhos azuis-esverdeados. — Vou colocar você nesse grupo. Você pode inventar uma historinha de como foi parar ali, só precisa ficar nele. Tenho certeza de que elas têm algumas informações que podem ser mais importantes para mim do que imaginam.
— Espera, elas vão saber quem eu sou? — ela parecia assustada com a simples ideia de alguém saber sua identidade.
— Não. A menos que você queira, é claro. Pode arrumar um nome de guerra, como o meu, criar todo um perfil falso e conversar com elas. — Eu tinha meus olhos fixos a tela, atento aos dados.
— Como você está fazendo agora. — Eu desviei meus olhos, a encarando e deixando uma risada escapar.
— Isso, exatamente como estou fazendo agora. — Eu sorri, mantendo meus olhos nela por um momento a mais. — Aproveitando, acho que não me apresentei devidamente. Pode me chamar de Kid por enquanto.
Desde que comecei a trabalhar para o Kenway, o irritante do Cormac me chamava de Garoto para me irritar. No fim, fiquei tão acostumado a isso que tomei como meu nome de guerra e assinatura para os ataques. Um anonimato nem tão anônimo assim.
— Merindah. — Ela exibiu um pequeno sorriso e eu me lembrei de como um simples nome pode transformar toda uma conversa. Agora eu provavelmente tinha deixado de ser a sombra estranha de quem ela desconfiava e tinha virado o hacker que ia ajudá-la a se vingar de um babaca.
— Perfeito. Tem mais uma coisa que eu preciso e quero te pedir, Merindah. — Ela riu da entonação dramática que dei a seu nome antes de concordar com um aceno, deixando que eu continuasse. — Quero que me dê permissão para acessar remotamente os aparelhos ligados à sua rede, no caso seu celular e seu notebook. Vai ser mais fácil para deixá-los seguros e praticamente irrastreáveis para que você possa me ajudar.
— Pensei que já tivesse feito isso? — ela exibiu um sorriso de canto, me fazendo rir.
— Bem, sim. Mas estou pedindo permissão para continuar e ter um acesso ainda maior. — Eu apoiei meu rosto a uma de minhas mãos, encarando a câmera.
— Tudo bem. Só não atrapalhe as minhas compras. — Ela deu ombros enquanto eu acenava concordando. — E agora?
— Bem, agora, você aguarda enquanto preparo as coisas para você. Eu entro em contato amanhã... de forma menos invasiva. — Ela riu e concordou com um aceno enquanto eu me despedia dela e encerava a chamada.
— Assassinato? — eu voltei meu rosto para trás, encarando Killer que arrumava a iluminação do QG.
— Ela provavelmente estava apenas sendo dramática... — eu parei, pensando por alguns instantes. — Ou tem mais coisa aí, algo além de um revenge porn.
Ele me encarou por um momento, me vendo acessar os poucos dados que haviam no notebook e no celular dela antes de se afastar, voltando ao trabalho. Eu suspirei, encarando a tela por um momento. Merindah era a minha última tentativa antes de chegar a uma medida drástica, e eu realmente tinha esperança de que ela conseguisse.
Eu estava parcialmente entediada. Eu não saía de casa, então meu único contato com o mundo exterior era por meio da internet. Porém, na noite anterior, Kid me pediu para deixar o notebook e o celular 'descansando' enquanto ele fazia seja-lá-o que fosse para deixá-los seguros.
Enquanto isso, eu tentava enganar o meu tédio assistindo um filme qualquer na televisão.
— Que tédio... — eu me levantei, indo até à cozinha e começando a preparar um chá de camomila.
— Desculpe, estou quase acabando. — Eu dei um pulo ao ouvir a 'conhecida' voz distorcida.
— Seu desgraçado! Você disse que não ia mais fazer isso! — eu deixei as coisas de lado, indo até o celular e o pegando, encarando a sombra que ria.
— Sinto muito. — Ele parou, respirando por um momento. — Eu tentei falar com você, mas você não me respondeu. E é importante.
— É bom que seja ou vou te guardar numa gaveta. — Ele riu antes que uma notificação aparecesse no alto da tela. — Uma pergunta... Você quer que eu fique amiguinha dessas mulheres, mas eu não tenho nenhuma informação sobre elas... Você não pode me ajudar com isso?
Eu acho que ele ficou me encarando por um momento antes de se virar, encarando algo ao lado.
— Hm, posso te mandar os perfis do Instagram delas. Foi até fácil de encontrar. — Ele se voltou para mim e eu concordei com um aceno. Perfeito. — Bem, eu vou dar um tempo para você poder fazer a sua pesquisa antes de te jogar no meio delas. Quando tudo estiver pronto, você pode me mandar uma mensagem.
— Vou conseguir falar com você a qualquer hora? — ele concordou com um aceno e eu sorri. — Hm, meu hacker particular.
Ele riu, me fazendo sorrir. Eu devia achar isso estranho, estou ficando amiguinha de um hacker, era só o que faltava.
***
— Como as coisas estão indo? — Kid, ou melhor, a sombra dele estava me encarando esperando o relatório do dia.
Nossa pequena parceria havia começado oficialmente há três dias e nesse meio tempo eu vinha fazendo um relatório para ele todo final de tarde.
— Bem, eu acho... — eu estava encarando a tela do celular e o bloquinho de anotações ao meu lado. — Acho que tenho algo do seu interesse...
Ele arrumou sua postura, prestando um pouco mais de atenção. Não foi exatamente difícil conseguir a confiança delas depois de uma pequena stalkeada. Algumas gostavam de flores, uma tinha uma queda por cristais e pedras preciosas e todas tinham filhos. Foi fácil pegar afinidade depois de dizer que eu era uma praticante da medicina natural.
— A esposa do seu alvo, acha que ele está traindo ela. — Eu virei uma folha do meu bloquinho, conferindo a informação.
— É eu sei disso. Mas aquele imbecil não dá conta nem de uma mulher, quem dirá de duas. — Eu tenho quase certeza que ele deve estar com um enorme sorriso agora. — Isso não é relevante.
— Eu não terminei ainda, ó grande hacker onipresente. Posso continuar? — ele riu e eu tive que esperar alguns segundos antes que ele concordasse com um aceno e eu voltasse a falar. — Ótimo. Eu sei que o pau pequeno não tá traindo ela.
Eu parei, exibindo um pequeno sorriso enquanto Kid explodia em risadas, sua voz distorcida ecoando pelo meu pequeno e praticamente vazio apartamento. Levou alguns instantes antes que eu pudesse continuar.
— Mas, ele tem úlcera e vai num café todos os dias. — Kid ficou me olhando, como se esperasse que eu concluísse meu pensamento e isso me fez revirar os olhos. — Deusas! Ele não pode tomar café, seu lerdo. Se ele não pode tomar café, o que ele vai fazer todos os dias indo até uma loja que só vende café e tem wi-fi grátis para os usuários? Vamos, cinco dólares se acertar a resposta.
Eu ri quando ele me mostrou o dedo, aparentemente irritado.
— Como não pensei nisso antes? — ele havia virado sua cadeira e digitava em um teclado que fazia um barulho altíssimo.
— Tava ocupado demais me enchendo a paciência para descobrir. — Eu me recostei na cadeira, encarando com os olhos semicerrados a tela do notebook.
— Haha. — Ele se voltou para mim, me encarando por um instante a mais. — Bom trabalho e obrigado, Merindah.
— Por nada. — Ele acenou para mim e eu entendi como sendo o final da nossa conversa. — Tenha uma boa noite, Kid.
Ele desligou, acenando uma última vez e eu me vi encarando a tela vazia antes de me levantar e ir até à cozinha. Não acredito, tô mesmo virando amiguinha do hacker.
Okay, era divertido. Eu passava parte do dia conversando com o bando de peruas, que até que não eram tão ruins assim e, ao mesmo tempo, conversava com o Kid sobre as minhas descobertas e algumas vezes sobre as minhas plantas. É, ele descobriu que eu compro plantas raras e algumas vezes ilegais.
É obvio que ele não me contava nada sobre ele, mas ele parecia ser bem legal. Ouvia o que eu tinha para falar e nunca mais falou sobre as fotos. O que já me dizia muito sobre o tipo de pessoa que ele era. Algumas vezes ele me perguntou sobre o meu cabelo, sobre as plantas que eu tinha em casa e do porquê eu comprava tanto chá e doce. O que me fez deixá-lo na gaveta por meia hora por estar xeretando as minhas compras.
Eu tinha me esquecido de como era bom conversar realmente com uma pessoa, sem ser por letrinhas negras em uma tela. Mesmo ele sendo apenas uma sombra, ele era uma sombra reconfortante. Ótimo, estou enlouquecendo. Qual o próximo passo, me apaixonar por ele?
— Não acha que está ficando próximo demais dela? — Killer se aproximou, me encarando por um instante antes de se sentar ao meu lado e colocar uma xícara de chá nas minhas mãos. — Isso te faz bem, para de me olhar com essa cara.
— Odeio essa coisa. — Eu tomei um gole, fazendo uma careta. — E não, não acho que estou ficando próximo demais. Ela gosta de conversar, não faz mal conversar uma bobeira vez ou outra.
— Sei... — ele abriu minha gaveta, pegando meu estoque de café instantâneo e indo em direção a cozinha. — E se você tomasse menos disso, não precisaria do chá.
Eu mostrei o dedo a ele, voltando a atenção para minha mais nova e recente tarefa: hackear a rede do tal café.
— Para um pouco, está nisso há horas. — Aestus colocou uma xícara a minha frente e para a minha alegria não era chá. — O Killer mandou pra você. E tem mensagens, deve ser sua nova amiga.
Ele exibiu um sorriso se afastando e ignorando minha expressão mal-humorada. As mensagens eram mesmo de Merindah, ela me passava mais algumas informações que pareciam ser triviais num primeiro momento, mas que sem dúvidas eram importantes.
Eu pensei por dois segundo antes olhar ao redor e configurar as luzes, preparando a câmera e iniciando a chamada, esperando que Merindah a respondesse.
— Olha só quem veio me presentear com sua ilustre presença. — Eu sorri. Merindah era petulante, inteligente, meio mandona e fazia tudo com a segurança de que não iria falhar. E tenho certeza de que em um outro momento isso me irritaria profundamente, mas agora... era apenas um charme a mais que me divertia. — A que devo a honra?
— Vim te atualizar da situação. — Eu ajeitei minha postura, me aproximando um pouco mais da câmera. Ela sorriu, ajeitando seu corpo ao que eu julgava ser um sofá. Eu li as anotações que tinha e pedi que ela me informasse caso algo mais surgisse no grupo. — Estamos quase terminando...
— E depois disso, você será todinho meu... — eu ri do tom sacana que ela propositalmente colocou na frase.
— Todo seu, moça. — Ela sorriu, parecendo relaxar por um momento. Uma notificação no alto da tela me fez desviar os olhos, abrindo a mensagem e a lendo rapidamente. — Conversamos mais amanhã. Talvez eu suma por uns dois dias, mas não precisa se preocupar, vou estar cuidando de você.
— Bom mesmo. Vai que outro hacker doido resolve competir com você. — Eu ri e a vi dar um pequeno sorriso. — Tome cuidado, seja-lá onde você for.
— Se preocupando comigo, que fofo. — Eu sorri ao ver seu rosto ficar rosado. — Não se preocupe é apenas o meu chefe me pedindo ajuda com uma coisa.
— Tô preocupada é em você não cumprir sua parte do acordo. — Eu ri quando ela desviou os olhos antes de sorrir e voltar a me encarar. — Boa viagem, Kid.
— Obrigada. Até mais, Merindah. — Eu me despedi, encerando a chamada e me levantando. — O Kenway me pediu ajuda. Devo passar uns dois dias fora.
— Demorou até ele chamar o engenheiro robótico favorito dele de novo. — Aestus se aproximou com um sorriso, ignorando minha expressão mal-humorada. — Sabe o que é dessa vez?
Eu balancei a cabeça. Haytham não costumava me contar o que eu precisava consertar ou analisar até que eu chegasse. Raramente ele abria uma exceção para isso, mas esse não era um desses momentos.
— Vá se arrumar antes que o Cormac chegue. Não quero ele reclamando da bagunça de novo. — Killer passou por mim, indo até à mesa enquanto eu subia as escadas para o nosso 'dormitório'.
Demorou alguns minutos até que eu juntasse minhas coisas em uma mochila e descesse. Killer me entregou uma bolsa com o notebook e o que mais eu pudesse precisar antes que a campainha soasse e ele fosse espiar no monitor quem era.
— É o Cormac. Tente não morrer. — Ele riu quando eu lhe mostrei o dedo, indo em direção a porta.
— Até mais, tentem não botar fogo em tudo durante a minha ausência. — Eu acenei para os rapazes por um instante antes de fechar a porta e descer, encontrando Shay e mais dois seguranças a minha espera. — Qual o problema?
— Nada. Mas vou deixar alguém de babá dos rapazes. Parece que o pequeno trabalho que o Haytham te deu é um pouco mais ariscado do que imaginamos. — Shay apontou para as escadas com um aceno e um dos seguranças seguiu para lá. — Ainda assim, você estará livre de mim pelos próximos dias, por que eu tenho coisas mais importantes a fazer além de bancar sua babá.
— Que bom pra você. — Eu sorri, entrando no carro e vendo Shay se sentar ao lado do motorista com a mesma expressão emburrada de sempre.
Eu peguei o celular, espiando os rapazes pelas câmeras de segurança, vendo que o capanga deixado pelo Cormac se adaptou bem, se sentando em um cantinho e ficando quieto. A situação um tanto incomum me fez pensar em Merindah. Era uma boa ideia falar com ela e deixá-la a par da possível situação perigosa ou seria causar um pânico à toa?
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