capítulo 4: cortina de fumaça
• 10 horas até o baile de máscaras •
— Adoro a cor vermelha nas cortinas! Dá um ar de mistério e romance ao salão! — disse a diretora Brown, tocando o tecido macio e semi translúcido que se agitava por conta da brisa.
As pessoas se moviam pelo salão sob o olhar atento de Ava. As mesas decoradas nas cores da escola — vermelho, roxo, verde e azul — estavam sendo etiquetadas com as plaquinhas das casas. A diretora, com seus cabelos grisalhos presos em um coque e sua postura impecável debaixo do tecido rígido do terninho, estava ao lado dela, checando o andamento da decoração.
— Obrigada, mãe! — Ava respondeu, surpresa pela leveza do comentário de sua mãe — Foi, honestamente, diabólico conseguir fazer tudo a tempo! Nem acredito que já vai ser hoje a noite!
O espaço estava envolvido em uma nuvem que misturava o cheiro de fornadas de biscoitos de baunilha, o perfume doce de Ava e um sinfonia de passos apressados, conversas paralelas e uma melodia quase impossível de ser identificada debaixo de tudo isso.
— Estou orgulhosa, filha... A forma como você vem lidando com tudo... Qualquer outra pessoa da sua idade teria tido uma crise ansiosa, mas você é realmente uma líder nata! A casa Albuquerque está em boas mãos! — A diretora elogia, colocando uma mecha dos cabelos loiros da filha atrás da orelha dela.
— Ah, obrigada! — Ava exclamou, sorrindo, limpando uma lágrima silenciosa que escorria em sua bochecha. Mal sabia sua mãe que isso tudo era só uma fachada. — Eu… Vou checar a cozinha! Eles sempre erram a quantidade de biscoitos!
— Tudo bem, Chefona!
Ava se afastou de sua mãe. Enquanto andava em direção a coxinha, revisava mentalmente cada detalhe já acertado e, majoritariamente, tudo o que precisava ser revisto até as 20h desse mesmo dia.
Uma sensação quente de orgulho preenche seu peito enquanto ela observa a mesa no centro do espaçoso cômodo, os cadelabros posicionados de forma simétrica, os pratos de porcelana chinesa com as bordas douradas, os cálices e talheres reluzentes aos seus lados. A garota realmente sabia como dar uma festa.
Do outro lado do campus, no enorme quarto mergulhado na luz dourada do sol das 10, Pablo, de cabelos presos e já vestindo seu uniforme, estava deitado na cama apenas com os pés no chão, evitando pisar no colchão com o sapato brilhante e lustrado, o telefone contra sua orelha e próximo a sua boca.
— Pai... Olha, eu enchi a sua caixa de mensagens… Estou começando a me sentir ridículo! Mas... Estou com saudades. Desde que o senhor foi embora eu não consigo parar de... — seu rosto se contrai numa careta enquanto ele busca uma forma de colocar seu sentimento em palavras, é claro, pensando em não parecer um adolescente descontrolado e carente. — Só... Penso no que poderíamos ter feito de diferente... Sinto sua falta, pai... Eu... Nem sei o que dizer pro senhor, na verdade... Só me liga, por favor? — Pablo implora, a voz embargada. Mesmo sentindo que seria inútil, enviou a mensagem.
— Pablo? — a voz doce soou pelo quarto e Pablo voltou sua atenção para o garoto parado perto à porta.
— Ah, oi, Billy! — cumprimentou, se levantando e sentando na cama, enquanto coçava a nuca, sentindo o toque áspero de seu cabelo recém cortado. — Estava me bisbilhotando?
— Não... — Billy responde, andando até a cama, mas aí cora, não sustentando a mentira. — Quer dizer, acho que talvez tenha ouvido um pouco mais do que deveria... Mas, não foi minha intenção… Quer dizer, eu nunca iria… Não quis…
Pablo ri, revirando os olhos, e joga a almofada em direção ao garoto.
— Meu Deus, cara, você precisa relaxar!
— De qualquer forma… Quer conversar? — O loiro se senta ao lado de Pablo, os olhos verdes e amigáveis o observando, cheios de expectativa.
— Eu... Não! Na verdade, não! Você, com certeza, não veio até aqui pra me ouvir falar dos meus problemas! Então... o que aconteceu?
— Não sei se lembra da manifestação pacífica que uns alunos querem fazer... Sei que é meio besta e hipócrita, até porque eu tô louco pra ir logo para esse baile e estrear minhas roupas novas! — Billy exclamou, animado, se perdendo no meio das palavras. Ele tinha um brilho nos olhos. — Mas, sei lá, esse protesto parece ser algo bom.
— É, é meio besta.
— Completamente besta! Vamos? — Billy estende sua mão e Pablo a toma sendo levantado com facilidade pelo adorável brutamontes.
— Não vai me meter em encrenca, né? — perguntou, enquanto cruzavam a porta.
— Não! Aparentemente, a liberdade de expressão ainda é bem aceita no campus! — explicou, sorrindo, o que fez Pablo rir, involuntariamente.
— Do jeito que as coisas vão, é melhor usarmos, não sabemos quando eles vão nos proibir de reclamar daquelas gororobas que servem no refeitório! — Pablo brinca e Billy solta uma risada alta e nasal. — Sabe, pra um colégio tão caro, eu esperava ao menos uma pizza com topo diferente de… Abacaxis.
Enquanto sorria, Pablo ponderou que não sabia exatamente o que tornava Billy tão amável, talvez o fato dele rir de seus comentários altamente sem graças ou a forma animada como ele fala sobre as coisas mais triviais, mas era definitivamente alguém cuja amizade poderia ser aproveitada. Não que Pablo entendesse muito sobre amizade.
— Espero que consigamos algo com isso, minha mãe sempre diz que perseverança é a receita para o sucesso. — o garoto diz, ajeitando seu rabo de cavalo, enquanto eles descem a escada longa da casa Albuquerque.
— Bom, talvez até pepperoni na pizza.
Pablo ri, mexendo a cabeça negativamente. Eles já estão do lado de fora. Pablo se arrepende amargamente por estar vestindo o uniforme quando sente a primeira gota de suor escorrer por sua testa.
— Mas, falando na sua mãe, ela vem para o baile? — Billy pergunta.
— Hum... Eu a avisei, mas não sei ao certo. — respondeu, o tom de voz desinteressado — Não esperei a resposta, só disse... Talvez ela venha, talvez não. Provavelmente não, ocupada demais defendendo um assassino ou estuprador milionário, eu acho — zombou, fazendo o outro rir. Num piscar de olhos, Pablo observou o rosto de Billy se tornar pensativo. Aos poucos, o sorriso cessou, dando lugar a uma testa franzida, olhos fitando o chão e um resto de rubor natural.
— Acho que… — ele suspira — Você não deveria subestimar essa relação, sabe? Não conheço sua mãe, mas sei como é viver sem uma... Não sei… Eu faria de tudo para ter a minha aqui.
— Oh... Merda, desculpa, Billy! Não sabia que... Quer dizer, você sabe! — explicou, olhando pra ele, mas o garoto continuou de cabeça baixa.
— Está tudo bem! Tipo, agora moro com os meu avós maternos, eles me dão tudo do bom e do melhor. Coisas que não tenho certeza se meus pais poderiam me dar. Mas, ainda sinto a falta deles. Acho que eles iam adorar me ver aqui nessa escola. Meus pais morreram de um jeito meio... Cortante e repentino.
— Não são todas as mortes assim? — perguntou, enquanto viravam por uma esquina.
— Bom, não quando uma pessoa está definhando por conta de uma doença, acho que assim você consegue se acostumar com a ideia até que a tal pessoa morra. Com eles não foi assim e, às vezes, ainda sou assombrado… Pensando em tudo que eles provavelmente sentiram e passaram em segredo, sem que deixassem ninguém saber.
Pablo franze o cenho, confuso. Ele limpa a garganta, sentindo as palavras penderem entre seus dentes e sua língua.
— Seria... Indelicado... Se perguntasse como eles morreram?
Billy cruza os braços.
— Desculpa! Você não precisa...
— Minha mãe caiu do 8° andar do prédio em que a gente morava, em Salem... Uma semana depois meu pai, que sofria de depressão severa... Ele... — o loiro não finaliza a frase. Pablo estende seu braço e alcança o antebraço de Billy.
— Tudo bem, eu entendo.
— É estranho... Sabe, pensar que nunca sabemos exatamente o que se passa na cabeça do outro.
— Quando meus pais se divorciaram, eu… Fiquei despedaçado… Se minha mãe não tivesse chegado a tempo, eu provavelmente… — Pablo se interrompe. — É idiota… Eu era um… Idiota.
— Ah, Pablo... Não…
— Eu estou bem! Medicado, mas estou bem.
Billy sorri e Pablo suspira aliviado por seu colega ter recebido seu otimismo característico de volta. Eles chegaram ao fim da rua calados, apenas deixando que seus desabafos flutuassem para longe, ou sei lá. As palavras de Billy ecoavam na mente de Pablo.
— Vem cá, quem está a frente dessa manifestação mesmo? — ele perguntou, por fim, enquanto eles se aproximavam do grupo concentrado em frente ao salão de bailes.
— Integrantes de outras casas. Aquele lider da casa Bittencourt, Edward, vai liderar! — Billy respondeu.
— Ah, não... — resmunga. Para a confusão de Billy.
— Uh...
— Nem pergunta! — Pablo corta.
• 08 horas até o baile •
— Os protestantes estão aqui, Ava! — Abby avisou, saindo de perto da janela. O garoto foi praticamente obrigado pela mãe a ajudar Ava, Jason e Brittany nos por menores do evento. Ele não dedurou as verdadeiras intenções de Ava, mas tremia e suava de preocupação enquanto arrumava os docinhos de pistache na mesa.
— Ótimo! — a garota responde, tirando a touca higiênica de sua cabeça e se levantando, ajeitando a saia em vermelho e azul do uniforme.
— Não vai fazer nenhuma besteira, vai? — Abby perguntou, apreensivo.
— Às vezes parece que você não me conhece — Ava disse, esnobe.
Abby revira os olhos.
— Conheço o suficiente para saber que você não é das melhores em lidar com a oposição, docinho — retrucou, sarcástico. Pensando no que o sorrisinho convencido de Ava poderia significar.
— Eu vou ignorar o que você disse, pois não quero cometer mais um assassinato neste campus. — Ava se vira para sair, mas volta a olhar para o irmão e acrescenta: — E não é oposição se estamos do mesmo lado! — Depois, anda em direção à saida do salão.
Ava caminhou para fora do salão observando o salão decorado e fazendo notas mentais. Uma longa fileira de mesas com guloseimas e quitutes estava sendo arrumada, as cortinas vermelhas com detalhes dourados se destacavam.
Cada detalhe estava controlado a perfeição. Apesar da jovem ter deixado metade dos funcionários da escola a beira de uma ataque, tudo saiu como ela queria.
— Não se preocupe! — Abby respondeu, alterando um pouco a voz para que ela pudesse ouvir — Se eu tiver que arrumar mais uma mesa de doces, eu me mato antes — sussurrou, com Ava fora de seu campo visão, enquanto ajeitava a touca em sua cabeça. Jason, do outro lado do salão, deu de ombros.
Ava saiu de dentro do salão e se dirigiu ao grupo de protestantes. Ela viu alguns rostos conhecidos como o de Billy, Edward e, argh, Pablo. Apesar do menino estar parecendo ridiculamente perdido. Ava posicionou as mãos na cintura e olhou confiante para a pequena multidão à sua frente.
— Olá, queridos… Manifestantes. — ela cumprimentou, sorrindo, olhando para eles do alto da escada curta em frente ao salão.
— Se você veio reclamar da manifestação a gente tem perm... — Uma menina morena que ela nunca viu antes começou, tirando um papel do moletom e desdobrando.
— Não, meu amor — interrompeu, com um gesto, enquanto descia os degraus — Na verdade, eu vim fazer uma proposta.
— Seja o que for, não temos interesse, bonitinha! — Edward provocou, tomando a frente, uma das sobrancelhas erguidas, em expressão de desafio.
— É uma boa ideia, Edward… Quero que vocês protestem no baile! — Ava exclamou, com um sorriso.
— Boa tentativa! Sabe muito bem que isso nos causaria problemas... Vários problemas. — Edward retrucou — Especialmente para nós bolsistas.
— Oh, Edward... Você é burro para um integrante da Bittencourt! Vocês farão uma “intervenção artística”… De certa forma! — gesticula, movendo sua mão para baixo, tentando fazer com que ele entenda — Já arranjei tudo.
— E o que você ganha com isso? — uma outra garota perguntou, essa Ava conhecia.
— Bom, Raven, eu posso não estar aqui... Sabe, debaixo do sol quente ao meio dia protestando para Deus sabe quem ou o que, mas eu me importo tanto quanto vocês com a dissolução do sistema de casas... Por isso, quero ajudar vocês e assim vou, talvez, plantar uma pulguinha na mente do conselho.
Edward refletiu. As pessoas cochichavam.
— Ai, meu Deus! Só fala logo se faz ou não! — Ava exclama.
— Será que eu poderia recusar a chance de provocar todo o conselho? — Edward brincou, dirigindo-se aos seus colegas. Então, com um sorriso provocador nos lábios, ele aperta a mão de Ava.
— Garanto que tomou a decisão certa — disse Ava, sorrindo.
— É, ainda odeio você mais que tudo! — Edward provocou.
— Bom, não é surpresa a essa altura. — a garota sussurrou, com uma expressão radiante no rosto e os olhos brilhantes.
• 04 horas até o baile •
— Ei! Esperem! — Pablo ouviu uma voz feminina. Billy se virou, vendo a garota andando rápido, ajeitando sua bolsa marrom no ombro. — Esperem!
— Ei, não é aquela garota que tava lá na manifestação? Hanna, Riley, Hailey, ou algo assim?
— É ela? — Pablo leva seus olhos para a menina.
— Oi! Sou a Hailey! — ela acena — Se importam se eu acompanhar vocês? — A garota asiática perguntou, se aproximando, as mãos posicionadas casualmente nos shorts jeans, Pablo havia estanhado a falta do uniforme, mas tentou desviar os olhos das coxas bronzeadas.
— Claro! Tudo bem — Billy respondeu, com Pablo levantando uma sobrancelha com curiosidade.
— Ansiosos para o baile? — perguntou, enquanto os garotos se viravam para a frente, voltando a andar.
— Não muito — Pablo admitiu, a voz monótona
— Eu estou um pouquinho — Billy responde — Tá, eu tô ansioso demais! Meus avós vão vir. — Completa, abrindo um sorriso.
— Ah... Sério? Você está feliz com isso? — Hailey perguntou, meio confusa.
— Não era pra ele estar?
— Bom, você, Billy atraiu seus avós pra um campo minado! Não sabemos se a morte do Erick foi caso isolado ou... Se foi algo pior. Meus pais querem vir mas deixei explícito que eles deveriam ficar exatamente onde estão. — Hailey explicou, olhando pro caminho á sua frente.
— E por qual motivo você ainda está aqui? — Billy perguntou.
— Sabe que eles me perguntaram a mesma coisa? Sou jornalista! Eu nunca perco uma boa história! — a garota sorriu e fez Billy e Pablo trocarem sorrisos desconfiados. — E, estou no último ano. Não tem assassino que me faça repetir no ano que vem.
Pablo ouve com atenção.
— Você é da Califórnia? Seu sotaque...
— Sou de Los Angeles, tipo… Eu nasci na Coreia, mas basicamente cresci em West Hollywood.
— Ah, eu também... Não nasci na Coreia, mas cresci em Los Angeles… — Pablo explica, sorrindo de orelha a orelha — O que está fazendo aqui? Quer dizer, por que sair daquele paraíso e...? Te obrigaram também?
— Ei! — Billy exaspera, ofendido.
— Sou uma Winchester... Meu pai é o principal investidor da casa — revela.
— Mas, você estava na manifestação... — Billy indaga.
— Pois é! — Hailey ri.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro