capítulo 3: cuidado onde pisa!
— No que vocês estavam pensando? — a voz da diretora Brown ecoou por toda a sala. Ava se encolheu em seu assento.
— É uma tradição, m... Diretora Brown! Nós sempre fizemos essas brincadeiras no início do ano letivo! — Ava argumentou. — Isso foi um assassinato! Um assassinato covarde! A culpa foi do assassino, só dele!
— De certa forma, Ava, nós facilitamos a atuação do assassino!
— Pelo menos, seu irmão sabe reconhecer os próprios erros!
— Ah, é claro — resmunga, sarcástica — Sei reconhecer meus erros! Tudo isso foi culpa da casa Albuquerque, né? Então, vou lidar com esse escândalo! De um jeito ou de outro e... Sozinha! — afirmou, séria, depois se levantou e saiu da diretoria.
A diretora Brown ficou parada ali, embasbacada, enquanto Abby apenas revirou os olhos, acostumado com a tempestuosidade de sua irmã.
Uma semana havia se passado. Os alunos estavam preocupados. As aulas começaram como se nada tivesse acontecido. O assassinato de Eric se tornou a coisa mais comentada dos noticiários. Nenhuma câmera ou registro denunciava a identidade do algoz. A casa Albuquerque caiu em desgraça e puxou o Preparatório inteiro junto com ela.
No enorme e espaçoso pátio, o sol reluzia nas mechas loiras e o barulho dos saltos era quase tão constante e voraz quanto os sussurros acusatórios em direção a garota, nenhuma peça de roupa escolhida naquela manhã esconderia sua frustração. Nem mesmo as botas novas da Prada, compradas para serem estreadas em uma festa, não numa crise de identidade. As passadas eram largas, os braços cruzados cima de seus seios, segurando seu livro sobre história da arte, com a edição do dia do Washington Post debaixo e a edição de agosto da Harper's Bazaar quase pulando de sua bolsa, enquanto ela andava em direção ao pavilhão onde ocorriam as aulas de exatas. A garota segurava as lágrimas, disposta a fingir que o mundo não estava desmoronando sobre sua cabeça com cabelos perfeitamente hidratados.
— Ava! — ela escutou alguém chamá-la, bem atrás, junto com os passos corridos sobre o chão de concreto.
A loira ignorou, não era a primeira nem a última pessoa atrás de relembrá-la da desgraça que recaiu sobre o telhado da casa Albuquerque uma semana atrás, literalmente. Ava havia dito um dia depois do assassinato que lidaria com a repercussão sozinha, mas até agora tudo o que fez foi ignorar.
— Ava! Você não pode me ignorar pra sempre! — ela reconheceu a voz, era Pablo, mas isso não significava que ela iria ouvi-lo. O garoto apressou seus passos, alcançando-a, mesmo com as pernas da loira sendo o dobro das dele.
— É aí que você se engana, Pablo! Aliás, tô atrasada! Tenho um quadro para pintar e uma professora baranga para bajular!
— Você tem uma folga de uns sete minutos! — Ava parou, deixando que o garoto se posicionasse em sua frente. Os olhos dela, intensamente azuis sob o sol frio daquela manhã de outono, o fitando com curiosidade e desdém.
— Garoto, é muito estranho que você saiba disso.
— De qualquer forma... Eu quero saber qual seu plano pra limpar a barra com a imprensa. Soube que querem interditar o campus e você disse lá na casa que daria um jeito nisso...
— Por que isso te interessa? Você estaria se livrando, pelo que sei... — retruca com um sorriso irônico.
Pablo pisca, brevemente, corando.
— Foi um assassinato, Ava... Eu... Não consigo esquecer o barulho que a boca dele fez quando o sangue... Tipo, ainda estão tentando tirar a mancha de sangue daquela merda de placa. — sua voz se torna frágil, pendendo no ar. O garoto fecha os olhos com força, mexendo a cabeça. — Eu não me importo com essa escola... Mas, eu tô preso aqui e, sabe, eu não quero morrer.
— Olha, eu estou tentando, ok? Eles não vão interditar nada! — responde, com um tom mais amigável e calmo, ajeitando a bolsa embaixo de seu braço. — Além disso, o garoto já foi enterrado! Eles já estão procurando o assassino... Não há por que!
— Espera, você não soube?
— O que? O que é agora?
— Bom, o caixão tava vazio no enterro... O corpo, tipo, desapareceu.
— Como assim? Caixão vazio...?
— O corpo está por ai... Pelo campus... Aparentemente — Pablo disse, a voz se tornando mais baixa, como se aquilo fosse bobo demais pra ser dito em voz alta.
Ava soltou um longo suspiro. Levando suas duas mãos até as têmporas e depois as abaixando, como se nem isso fosse funcionar.
— Eu preciso ir! Preciso... Pensar! — anunciou, levando seus dedos até suas temporas e pressionando levemente. — Nos falamos depois. Talvez.
Pablo revirou os olhos, mas assentiu, franzindo os lábios e observou Ava marchar para o lado contrário ao prédio de artes, em direção à reserva florestal ao redor do campus.
A luz adentrava suavemente através das folhas dos enormes carvalhos-brancos que preenchiam aquele lado da reserva florestal. O chão estava úmido e coberto pelas plantas mortas que caiam das árvores, o ar estava contagiado pelo cheiro inexplicavelmente nostálgico de terra molhada. O silêncio era quase absoluto, se não fosse pelas aves cantando tranquilamente e pelos soluços da menina, encolhida, sentada sobre um tronco seco e cheio de musgo de um bordo-vermelho.
Ava conseguia acessar aquele pequeno paraíso através de uma pequena fissura nas grades de limite pra sair do campus. Só havia mostrado aquele lugar para uma pessoa. A garota se sentou num tronco. Suas coxas se movendo freneticamente, ela se segurava para não roer suas unhas perfeitamente feitas, os pensamentos correndo em sua mente como numa corrida de Atletismo.
Sua vida estava sendo destruída. Destruída de verdade! Não como quando ela sem querer pagou peitinho na festa clandestina no 1 ano ou quando os amigos de seu irmão contaram para a escola inteira que ela hermafrodita. Destruída tipo nunca-vai-conseguir-aquilo que quer. Destruída pra valer. Ela pensava em mais comparações quando toda adrenalina foi cessada, quando os gritos em sua mente pararam e o som dos pássaros e galhos e gotas de chuva se tornaram notáveis de novo. O barulho parecia de um galho quebrando.
A loira instintivamente se levantou, se virando com olhos acusadores e assustados.
— Quem tá ai? — a loira gritou, sem resposta.
Ava já começava a andar, buscando fugir. Quando ouviu a voz familiar e risonha.
— Sou eu! Relaxa! — O rapaz loiro sai de trás da arvore, ele tinha no rosto um sorriso cheio de cautela.
— Noah, você é idiota? — ela perguntou em tom hostil, depois de voltar a se sentar. Ava nem olhava pra ele.
— Te assustei, V? — ele perguntou, a voz rouca, um sorriso provocador no rosto enquanto se sentava no banco.
— Você me seguiu até aqui?
— Não precisei, sabia que te encontraria aqui... Tenho a sensação que precisa conversar... As pessoas estão sendo... — ele começa.
— Não com você — ela interrompe e se vira, decidida a ir embora.
— V, espera! — O atleta chega a ela sem qualquer dificuldade, a virando para ele. — Sinto sua falta... Não faz isso comigo.
A loira ri, incrédula com as palavras que acabou de ouvir.
— Fazer com você? Você é tão filho da puta. — ela abaixa os olhos, o sorriso debochado ainda anunciado entre seus lábios com batom rosa. A garota analisa a feição jovem do loiro, fita seus olhos verdes, observa as tão familiares marcas em seu rosto. — Você é quem queria que eu fosse seu segredo, Noah, e eu não nasci pra me esconder. Nem por você, nem por ninguém. Não tenho interesse em suas migalhas, então guarde para alguém que tenha tão pouco auto respeito quanto você! — Ava exclamou, sorrindo, como se dissesse a coisa mais engraçada do mundo. — Por que não vai gastar toda essa energia naquele campo de futebol com os brutamontes estranhamente homoeróticos da Schengen? Os que você tanto quer agradar! — sua voz agora é rasgada, a expressão de nojo, os olhos cravados no rosto de Noah.
— Eu...
— Sai. Só vai embora! — ordenou, já sem olhar pra ele, como estava alguns minutos atrás.
— Sinto muito por te magoar...
— Não, você não sente... A única coisa que você realmente consegue sentir é auto piedade. Tchau, Noah!
Ava voltou a se sentar no banco. Noah abaixou a cabeça, respirou fundo e saiu, sem olhar para trás. Enquanto a loira, depois de segurar por alguns minutos, finalmente chorou; chorou tanto que sentiu sua cabeça doer e seu rosto inteiro arder. Minutos depois, ela enxugou o rosto, se levantou, ajeitou a saia e voltou para o campus.
— Nossa casa está no meio de um escândalo! — Ava começou, quase gritando, fazendo os outros membros da chapaolharem pra ela.
Os quatro estavam na sala Albuquerque do prédio do Grêmio. As paredes eram feitas de madeira marrom. No centro da sala, uma enorme mesa redonda, em preto, com alguns computadores e laptops. Ao redor da mesa, algumas cadeiras de rodinha ao redor, neste dia ocupadas apenas por quatro deles.
— Me diga algo que não sei, irmã querida — Abby provoca, tirando o salgadinho da máquina posicionada no canto da sala, sua voz carregada de sarcasmo e desinteresse enquanto se sentava no outro extremo da mesa. Ava já estava posicionada, com suas mãos cruzadas em cima da mesa.
— Nossa iniciação se transformou num assassinato e depois num desaparecimento de cadáver... E ninguém me avisou disso! Nós fomos para a porra do jornal do estado! E, logo, estaremos num jornal pra todo o país! Não sei vocês... — ela começou com ironia, virando o laptop aberto em sua frente para que os outros vejam, estava irritada e ansiosa por trás do sorriso amarelo. — Queria aparecer no jornal porque descobri a cura para o câncer, ou algo assim, e não porque um estudante na minha responsabilidade morreu!
— O que podemos fazer? Para ajudar? — Brittany, vestida com seu uniforme de torcida em roxo e sentada do lado esquerdo de Ava, perguntou, apreensiva.
— Nós podemos tentar descobrir onde está o corpo, não é? Investigar... — Jason sugeriu. O garoto de pele escura coçou seus cabelos cortados em estilo militar, enquanto pensava.
— Você está literalmente sugerindo que a gente dê uma de Mistérios C.A.? Isso não é a porra do Scooby-Doo, Jay! — Abby zombou com um sorriso incrédulo no rosto. — Isso não é brincadeira! Tem um assassino solto no campus, não podemos ficar por aí nos arriscando... Investigando como se estivéssemos num filme.
Ava estava quieta enquanto eles discutiam, pensando. Sua mente freneticamente pensando numa forma de conciliar toda aquela baderna.
— Eu acho que vou falar a maior idiotice da minha vida... Mas, nos arriscar é exatamente o que temos que fazer!
— Hum... — Jason murmura.
— O baile de máscaras! Precisamos fazê-lo mais cedo — Ava afirmou, com a expressão passeando entre determinada e insegura.
— Qual o seu plano? Dançar até o assassino aparecer? Juntar todos no mesmo lugar para que ele possa nos matar mais facilmente? — Abby perguntou. — Preciso te lembrar do que aconteceu lá em Salem no último verão? Festas com um assassino a solta são má ideia!
— Bom, idiota, seriamos quatro contra um. Vamos atrair o assassino e fazê-lo se entregar. Os filmes slasher dos anos 80, e o caso da garota de Salem, me ensinaram que uma festa sempre atrai o assassino! Se ele for um assassino em série, então ele vai aparecer... Nós usamos algum novato de isca e o pegamos antes dele atacar de fato. Se pegarmos ele, ele vai nos dizer onde está o corpo do Eric! E, se ele não aparecer, vamos saber que foi coisa de uma vez só.
— Se esse novato morrer... Vai ser um escândalo ainda maior pra nós, vai piorar tudo, Ava, é só você pensar!
— Já tá tudo uma merda e prestes a ficar pior, Abby! Vamos ouvir sua irmã, ela parece segura sobre o plano — Brittany disse.
— Que plano? Matar todos nós?
— Eu jamais faria isso, Absolem. — Ava rebate, se jogando na cadeira de rodinhas.
— Estamos de acordo? — Jason questiona.
Os três afirmam com a cabeça, Abby sai da sala, fazendo bico e batendo pé. Os restantes observam a porta fechar e logo depois voltam suas atenções para a conversa.
— Só precisamos de algo impossível: a autorização da diretora! — Jason relembrou-os.
Mas, surpreendendo a todos, mesmo com Ava usando Jason como laranja de sua ideia maluca, a diretora Brown, após algumas negociações, percebeu que o baile de máscaras seria uma ótima oportunidade para fingir que nada de ruim havia acontecido no preparatório…
Assim, naquele mesmo dia, Ava reuniu seus colegas para a preparação e planejamento do tão antecipado e icônico Baile de Máscaras da Casa Albuquerque e, é claro, para planejar seu plano arriscado de usar uma isca viva, que por acaso adora se meter onde não é chamado, usa camisas de flanela mais do que gostaria e se chama Pablo.
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