Entre o tic tac do relógio, o cheiro de mofo que assolava aquele lugar e o sussurros das pessoas que estavam ao redor, eu lia atentamente um livro de auto ajuda, o único que eu li e o único que leria em toda a minha vida.

Mas aquilo não foi o suficiente para evitar de que eu fizesse o que estava prestes a fazer e não me fez esquecer o que já havia acontecido.

Não irei lhes encher com todas as informações sobre minha vida, apenas quero que saibam o que aconteceu naquele dia.

Na minha frente uma mulher estava sentada lendo um romance. Ela estava atenta a cada frase e palavra que lia. A lágrima que escorria pelo seu rosto mostrava a sua emoção com alguma cena que acabara de ler.

Ela era a pessoa certa, só precisava de mais uma coisa que confirmasse aquilo.

Todos olharam para a mulher, ela colocou a mão na bolsa e puxou o celular que tocava um Funk.

Falou alguma coisa, colocou todos os papéis na bolsa e saiu da biblioteca, eu a acompanhei, passamos pelas ruas da Ribeira, um modesto bairro de Salvador, e eu acompanhava a mulher conversando no telefone.

— Te encontro lá! — ela falou alto o suficiente para que eu conseguisse ouvir.

Passamos por todo o Caminho de areia. Pizzarias, mercados, lotéricas e vários outros comércios, não estava tão cheio assim como eu pensara que estaria.

Entramos e saímos de ruas que nem eu sabia que existiam, vários bares e diversos lugares que eu estava descobrindo naquele exato momento.

Me senti um pouco incompetente, já que me considerava um conhecedor de toda a cidade de Salvador. Pensava que sabia tudo que havia na cidade, mas percebi que não era bem assim.

Chegamos na Rua direta do Uruguai. Aquele sol forte estava me deixando com dor de cabeça. Eu tinha a impressão de que a rua à minha frente se mexia.

Descemos aquela rua, no meio do caminho percebi que a mulher a minha frente estava cansada, pensei que ela fosse parar para comprar água, mas pelo visto ela estava ansiosa para se encontrar com a pessoa que conversou ao telefone.

Caminhamos mais um pouco e chegamos no Outlet Center, logo à frente de uma empresa têxtil.

Ela parou na praça de alimentação do shopping e ficou olhando para todos os lados.

Tirei minha mochila das costas e coloquei sobre uma mesa do anexo do shopping, olhei a mulher abordar um homem perto do Subway, os dois se beijaram e entraram numa loja ali perto.

Aquele era o sinal que eu precisava pra confirmar que aquela era a pessoa certa.

Olhei meu relógio e vi o horário:

13:30.

Decide esperar a mulher, sabia que ela não iria demorar muito, quando estávamos na biblioteca eu li um de seus papéis:

O exame será realizado às 16:00, na unidade da UFBA.

Ela não iria perder aquele exame, não depois de ler aquele romance, já que o exame era sobre literatura... E ler Machado de Assis foi, e é, a melhor coisa que ela poderia ter feito.

Esperei durante quarenta minutos, quando percebi que ela saiu da loja, mas estava indo em direção ao outro prédio.

Levantei, tirei uma caixa da mochila e coloquei meu capuz, todos que estavam na praça de alimentação me olharam como se fosse maluco, e sim, eu era um pouco maluco.

Olhei a mulher dar um último beijo no homem e se despedir dele. Ela agora partia em direção a Calçada, e eu fui atrás dela. Abordei a mulher, ela se virou assustada, mas quando eu tirei o capuz a sua expressão se "suavizou".

Entreguei a caixa a ela e sai andando. Olhei de relance para trás e percebi que a mulher já havia abrido e já estava com o urso de pelúcia em mãos, provavelmente já estava lendo a mensagem que o acompanhava:

Me perdoa?