Evans, conversa profunda e pés gelados
Conversaram com Dumbledore por quase duas horas e giraram tanto em torno da questão da marca que Severus imaginou que fossem encontrar uma solução maravilhosa e pouco irritante para a situação. Severus teria dado tudo para não ter que ficar grudado a James pelos próximos dias, porém, o consenso em que chegaram não o alegrou nenhum pouco.
Agora estavam parados em frente à uma porta, com as suas malas ao lado. Iriam mesmo dividir um quarto na ala dos professores ou era uma piada? Severus queria que fosse uma maldita piada.
–Se tivermos sorte, há duas camas.--O Sonserino cortou o silêncio que fazia questão de irritá-lo e revirou os olhos antes de adentrar o recinto pouco iluminado. E havia mesmo duas camas.
James analisou o espaço com uma expressão indecifrável.
–Não pensei que Dumbledore fosse dar essa ideia.--James falou assim que se pôs sentado em uma das camas, consequentemente a que Severus teria escolhido se tivesse sido um pouquinho mais rápido.--Jurei que ele fosse dar umas ideias estranhas e sem nexo, não um quarto na ala dos professores.
Potter parecia mais feliz do que deveria e isso irritou a Severus num nível que o surpreendeu. Dividir um quarto com James o faria ter que ter muita paciência.
–Por que está sorrindo feito um bobo, Potter?--Severus largou a mala ao lado da outra cama e foi verificar o recinto. Havia uma porta que dava ao banheiro... Um único banheiro para dividir com aquele ser. Uma janela, uma cômoda e, muito provavelmente, a segunda cama havia sido colocada aí porque Dumbledore previu que Severus iria ficar puto da vida se encontrasse uma cama de casal.
–Não estou sorrindo.--James tentou relaxar o rosto, mas não teve muito sucesso. Severus desejou que um meteoro caísse em cima da criatura.--São nove horas. Se quisermos assistir pelo menos uma das aulas da manhã, temos que nos apressar!
Severus daria tudo para Potter voltar ao normal, porque aquele não era o normal da criatura.
***
Severus não se orgulhava de dizer que estava fugindo do olhar de Lily. Não conversava com a garota desde o dia em que fizera besteira no quinto ano. Digamos que andar com as pessoas erradas e fingir estar bem renderam umas brigas traumatizantes e um conjunto de palavras bem ruins.
A verdade é que James tentava conquistar Lily Evans desde o terceiro ano e agora simplesmente havia parado e estava sendo um alfa-lúpus irritante além da conta para cima de Severus Snape, o cara que tanto odiava e gostava de ver sofrer. No mínimo, isso deveria ser confuso para a garota.
O problema é que fugir nunca havia dado certo para Severus e Lily o encurralou assim que o sonserino conseguiu se ver livre de James, que havia parado para conversar com um Sirius fadado à explosão após a aula de História da Magia.
–Então é verdade que você e Potter estão presos um ao outro?--A voz da garota envia uma lembrança extremamente melancólica para a mente de Severus, que sente a garganta dolorida ao olhar para o rosto da antiga melhor amiga.--Ouvi o boato do companheirismo, elo ou destinação. Tem muitos nomes para isso, pelo visto.
Lily não parecia irritada, tampouco deprimida ou preocupada, a garota parecia apenas querer conversar. Estava com um sorriso contido na face e abraçava três livros nos braços. Severus não tinha muita ideia do que deveria dizer.
–Bem... Meio que ele me encurralou.--Severus deu de ombros.
–Você está bem?--Lily deixou o sorriso vacilar, como se demonstrasse preocupação.--Imagino que esteja se sentindo assustado.
Severus sabia o que ela estava fazendo. O maior erro de Lily era ser gentil demais, sempre disposta a salvar as pessoas de seus casos diários. Mesmo depois de tanto tempo, ela ainda queria salvá-lo, de certa forma.
–Você realmente não precisa fazer isso, Lily.--Severus falou, sentindo o nome rasgar a sua garganta.--Eu e Potter estamos tentando nos resolver.
Lily vacilou e deu dois passos calmos para trás.
–Se precisar de alguém para conversar...--Ela tentou e, se Severus fosse alguém menos contido, teria a abraçado e desabafado por horas e horas, mas ele apenas acenou com a cabeça e a deixou encarando a parede.
Assim que chegou ao primeiro andar, James o alcançou correndo e de braços abertos, quase como se tivesse encontrado um parente desaparecido a décadas.
–Te procurei em cada canto!--Exclamou, rindo como se o momento fosse engraçado.--Pensei que tivesse fugido.
–Não faz nem vinte minutos que eu te vi pela última vez, Potter.--Queixou-se Severus, que ainda se sentia sensível pela conversa que tivera com Lily.
–É que eu consegui convencer Sirius a conversar com você e...
–Espera um pouco.--Severus arqueou as sobrancelhas, sentindo a pele pinicar embaixo dos olhos e seu coração ficar pesado.--Você quer eu converse com Black?
Aquele era o fim da picada.
Severus odiava chorar, mas, ironicamente, como uma criancinha pidona, Severus bateu o pé e soou com a voz embargada:
–Eu me nego a conversar com o Black!
As lágrimas vieram com uma facilidade que o assustou e os olhares das pessoas ao redor fizeram Severus duvidar da sua sanidade.
Correu até a ala dos professores sem se importar se Potter e seus olhos arregalados estavam o seguindo. Assim que adentrou o espaço que agora dividiria com James pelos próximos dias, não teve nem tempo de se largar na cama antes de sentir os braços fortes ao redor de seu corpo.
–Desculpa, desculpa, desculpa.--Potter murmurou com um desespero quase desnecessário.--Eu deveria ter pensado melhor.
–Porcaria!--Severus o empurrou para longe. Soluçava e sentia as lágrimas descerem de forma rápida. Nunca havia chorado assim antes.--Você poderia agir como você mesmo, por favor?! Você é a desgraça do James Potter, não a porcaria de um alfa apaixonado! Não creio que estou preso a vida inteira com o cara que só sabia ferrar com a minha vida!
Qualquer pessoa teria perdido a cabeça se estivesse em uma situação parecida com a sua e, Severus, embora não tivesse visto os sinais que o fariam surtar daquela maneira, sabia que não adiantaria de nada tentar se acalmar quando podia simplesmente surtar e deixar que as coisas se resolvessem quando estivesse mais calmo.
–Eu só queria que tudo isso fosse um pesadelo!--Gritou.--Que você não tivesse tido a brilhante ideia de não me contar quando descobriu. Podíamos ter evitado essa merda toda!
Severus largou-se sentado no chão e abraçou as pernas com a cabeça entre os joelhos. Mal ouviu James se sentar ao seu lado.
–No fundo eu sei que eu deveria estar agindo parecido com você.--James ficou tão próximo, que Severus sentiu a sua respiração.--Mas, Severus, nós não conseguiríamos evitar que eu te marcasse, mesmo se eu tivesse contado quando descobri no ano passado. Como companheiros, seria impossível. E agora que eu te marquei, não vejo motivo para tratá-lo de maneira não carinhosa... Não quero que você se sinta magoado por eu agir de forma indiferente, quando o meu lado alfa quer te fazer sentir bem.
–Você age como se nada tivesse acontecido!--Severus gritou.--Você age como se o quinto ano tivesse acontecido a muito mais de dois anos!
–Eu não esqueci de nada!--James acabou utilizando a voz de comando, o que não tornou a situação mais fácil. Severus soube que ele não havia feito de propósito assim que seus olhos se arregalaram, mas de nada ajudou.--Eu detesto lembrar daquela situação... Sei que errei e...
–Você não apenas errou, Potter.--A voz de Severus soou tão grossa e dura, que fez James se encolher.
–Permita que eu conserte as coisas...
–Como se você pudesse sumir com todas as lembranças.
Não querendo mais conversar, tampouco ver a James, Severus se levantou e andou até o banheiro, onde se trancou.
***
A noite parecia mais gelada do que o normal e Severus tremia de baixo das cobertas como se estivesse em uma geleira. Não entendia o motivo, mas sentia que o corpo de Potter estava quente e, no seu íntimo, desejava correr até o corpo dele e lá ficar. Se era a marca o enlouquecendo? Provavelmente.
–Eu não consigo dormir com você tremendo.--A voz de Potter é alta e faz o corpo de Severus quase implorar.--Eu acho que por estarmos no mesmo ambiente, a marca quer nos grudar...
–Como você sabe dessas coisas?!--Severus se sentou na cama e tremeu ainda mais quando olhou para Potter e o viu sentado na beirada da cama dele.
–Eu sinto... É meio óbvio.
Severus quis afastar Potter quando a criatura se levantou e andou até ele, mas não teve forças. Permitiu que James se sentasse em sua cama e o abraçasse de lado. Quase riu quando sentiu calor.
–Está melhor?--Potter perguntou, dando tapinhas leves em seu ombro.--Sabe, deveríamos conversar e nos conhecermos. Eu quase não sei nada sobre você.
–É... Quase não me conhece e fez todo aquele inferno na minha vida.--Severus alfinetou e sentiu James murchar, mas não se importou nenhum pouco.
–Eu prometo que irei consertar as coisas para nós.--A voz de Potter soou carregada do que parecia uma mistura de sentimentos estranhamente reconfortantes.--Eu prometo que serei o completo oposto do que eu sempre fui.
Severus engoliu em seco quando sentiu cada pelo de seu corpo arrepiar com a lufada de ar que caíra sobre a sua marca quando Potter falou. James deitou a cabeça em seu cabelo e puxou o ar, o apertando com tanta força que quase arrancou o ar dos pulmões de Snape.
Caramba... Aquilo era estranhamente bom.
Sentiu que poderia cair quando um beijinho estranhamente carinhoso foi depositado em sua testa. Como era possível que estivesse gostando daquilo?
–A minha cor favorita é dourado e eu quero ser Auror.--James falou de maneira tão vaga, que Severus quase não entendeu.--E você?
Ele engoliu em seco e quase não foi capaz de falar ao sentir Potter se colocar atrás de seu corpo e, dessa vez, o abraçar pela cintura.
–Min..Minha cor favorita é verde sálvia e eu não sei o que eu quero fazer.--Respondeu rápido, mal pensando na resposta.
James pareceu soltar uma espécie de risinho.
–Você poderia abrir uma loja ou trabalhar na área da Medibruxa. Na área dos experimentos, sabe? Você é ótimo em poções.
Severus havia pensado na ideia de se tornar Medibruxo, mas a muito tempo atrás, quando ainda não havia cogitado se unir a você sabe quem.
–Por que você quer ser Auror?--A pergunta veio com facilidade a Severus.
Logo ele, que estava pensando seriamente em correr até o Lorde das Trevas, agora se via preso a um alfa que queria ser Auror.
–Estamos no meio da Primeira Guerra Bruxa. O ministério precisa de Aurores para conter você sabe quem.--James deu de ombros.--Meu pai gosta da ideia.
Severus sentiu vontade de se enfiar no meio de um buraco bem fundo. Potter, além de rico, tinha uma família funcional que o apoiava.
–Como você se sente em relação a ser eu o seu companheiro e não a Lily?--Severus decidiu sair do buraco, talvez por que estivesse curioso sobre aquele ponto em questão.
Lily era uma ignota.
Potter ficou em silêncio, como se não soubesse o que falar ou não estivesse preparado para responder. A verdade é que Severus não havia pensado direito antes de perguntar.
–Quando eu acordei de manhã e vi você deitado ao meu lado, entrei em um uma espécie de pânico antes de permitir que as lembranças da noite anterior viessem à minha mente.--James pareceu divagar, olhando para um canto em específico no quarto.--Eu me senti um pouco irritado, eu confesso, mas foi questão de poucos segundos. Eu aceitei antes de te puxar para perto. Agora está tudo bem.
–Mas...–Severus não achou que fosse o suficiente.--Você gostava muito dela!
–Eu não gostava de Lily, apenas achava que era ela.
–Não faz sentido!--Severus virou o rosto para fitar James, ficando estranhamente próximo ao rosto dele.
–Nada disso faz sentido para o nosso lado humano, mas para o meu lado alfa lúpus faz muito sentido.--James soou perfeitamente certo do que dizia.
–Todas aquelas brincadeiras de mau gosto eram coisas do seu lado alfa ou do seu lado humano?--Severus bufou.--Porque eu preciso saber.
James não pareceu saber como responder aquela pergunta de mau caráter, mas não tentou contornar a questão.
–Dos dois, talvez. Não sei, meio que...
–Vocês são a mesma coisa, assim como eu.--Severus o interrompeu.--Não dá para sair separando o alfa da pessoa ou o ômega da pessoa, Potter. Principalmente quando envolve o caráter.
Severus voltou a se virar para frente, mas não escapou dos braços que ainda permaneciam ao seu redor. Se fosse menos controlado, já teria deitado a cabeça contra o peito de Potter.
–Tudo bem, não dá para encontrar lógica.--A voz de James pareceu um pouco mais quente do que o normal.--Precisamos dormir.
James retirou os braços ao redor do corpo de Severus, que se controlou para não gemer em frustração. Ficou levemente confuso quando Potter puxou as cobertas e se deitou na pequena cama de solteiro que Severus havia adotado naquela manhã.
–O que pensa que está fazendo?--Snape arqueou uma sobrancelha, confuso.--Volta para a sua cama!
–Você vai voltar a tremer se eu voltar para a minha cama, Snape. Eu prometo que não vou fazer nada que o aborreça.
O problema é que Potter já estava fazendo algo que o aborrecia.
Severus revirou os olhos antes de se deitar debaixo das cobertas, o mais afastado possível da criatura. Potter, porém, não o abraçou, tampouco o tocou e isso o aborreceu bem mais do que se James tivesse o tocado.
Inconscientemente, Severus se aproximou por conta própria de James, até que estivesse com seus pés gelados grudados às pernas quentes dele.
Pensou escutar um riso, mas fingiu não tê-lo ouvido.
–Quer alguma coisa, Snape?--James perguntou, risonho.
Severus se negou a respondê-lo.
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