7 • | i would take the pain away
O sol ainda está começando a nascer quando Liam dirige de volta para a mansão dos Tomlinson. Meus olhos estão pesados, ardendo por toda a luz e minha cabeça permanece apoiada no vidro o caminho todo, Louis dorme, pra variar, no meu peito, resmungando coisas como sermos Tom e Jerry e que ele quer muito comer ervilhas no desjejum. Não lhe dou muita atenção e nós adormecemos.
Consigo registrar pouquíssimas coisas e nenhumas delas me diz como eu acabei de pijamas na minha cama, confortavelmente enrolado nos edredons fofinhos onde eu pretendia ficar até a virada do século, no entanto quando meu estômago começa a roncar eu me arrasto para a cozinha com o plano de roubar algo pra comer e correr de volta para a cama, mas antes que eu atravesse a porta escuto o que não deveria, ou talvez fosse justamente o contrário.
— Eu percebi, Lottie. — Clare dizia, batendo alguma massa em uma tigela.
— Não, é? Ele até mesmo quis viajar. Já fazem anos desde que Louis saiu de Londres. Estes dias quando eu cheguei eles estavam sentados no jardim. Eu realmente gosto desse menino, o Harry é uma boa pessoa e tem feito bem ao Louis. — Sinto minha garganta fechar e me escoro na parede para não desmoronar. Merda, eu não preciso ouvir isso agora — Acho que ele é o amigo que meu irmão tanto precisava.
— Eu fico tão feliz por isso! Imagine a senhora.
Charlotte sorri tão largo e verdadeiro, que eu não consigo evitar de derramar algumas lágrimas pela alegria que transparece em seu rosto, tão cheio de esperanças, porque acredita que seu irmão possa estar melhorando. Confiando que eu estou fazendo bem para ele.
Suas palavras gritadas pra mim no sonho ecoam:
Assassino!
— Eu disse ao Tommy que poderíamos marcar a data do casamento. Acredito que posso confiar Louis ao Harry. Serão muitas responsabilidades, mas eu acredito que com o passar do tempo...
Tudo começa a girar diante dos meus olhos, a chuva de culpados caindo sobre mim, Lottie abrindo o próprio peito e o corpo morto e frio de Louis posto à mesa. Minhas mãos estão sujas de sangue, eu olho para elas e vejo o seu sangue vermelho as manchando. As memórias de todos os momentos que partilhamos pairando como uma assombração, um fantasma do meu crime.
Eu não posso fazer isso, não posso.
A morte de alguém é uma cruz grande demais para se carregar, principalmente se este alguém for Louis Tomlinson.
Procuro o remédio nos bolsos, não o encontrando, volto para o meu quarto e ele não está em lugar nenhum, e enfim uma lembrança útil da manhã me faz recordar que Louis havia vestido o meu paletó e ido para o seu quarto. O remédio está com ele, invado seu dormitório e ele ainda está se espreguiçando. Vasculho os bolsos do blazer abandonado na poltrona e encontro o vidrinho intocado.
— Hum, já está na hora do meu remédio. — Ele diz com a voz rouca sonolenta, sentando-se na cama com os cabelos para o alto — Vamos lá, Harold.
— Louis.
— Eu prefiro, Sr. Tomlinson, mas como é a última vez eu posso relevar. — Ele boceja, esfregando os olhos e abrindo um sorriso calmo — Não se preocupe, falei com o meu advogado há dois dias e ele já está organizando toda a papelada do testamento. Daqui a pouco eu estarei morto e você será rico.
— Eu não quero o seu dinheiro! — Declaro decidido e o sorriso em seu rosto vacila levemente.
— Claro que quer. — Nego novamente — Vai querer fazer isso de graça? Okay, então. — Louis se estica para pegar um copo e o estende para mim — Coloque o remédio.
Olho para o copo e aperto com mais força o remédio.
— Vamos, Harry, não é hora de hesitar. Daqui a pouco a Lottie estará aqui. É a última dose, você já fez tanto, não fraqueje agora. — Suas palavras são bem pensadas e ele sabe como me manipular — Já falamos sobre isso, você sabe que é o que eu quero.
— Mas nem sempre o que se quer é o que se precisa.
— Era só o que me faltava, você bancando o poeta. — Ele bufa, correndo os dedos pelos cabelos desordenados.
— V—você...você está sendo covarde, Louis. Fugir não é a saída, você pode achar que assim vai se livrar do problema, mas só vai piorar. — A esta altura não só o meu corpo como a minha voz tremem sem parar. Eu não sou bom nisso, em enfrentar as pessoas, sempre fui um filhinho de papai mimado, não tinha problemas como este. E Louis, definitivamente, me assusta.
— Oh, não, por favor não compare o meu caso ao seu. Não seja estúpido!
— Você mesmo disse que estávamos em uma situação similar e você tem razão, nós estamos e eu quero te ajudar.
— Então me dê a droga do remédio. — Torna a pedir, soando mais como uma ordem e seu maxilar trincado não deixa dúvidas de que sua paciência está evaporando pouco a pouco.
— Precisa conversar com a Charlotte, dizer como se sente, dividir o problema vai ajudar.
— Sabe o que vai ajudar? O remédio! Me dá ele, Harry. — Desta vez ele rosna se levantando e agarrando os pilares da cama para poder me alcançar.
— Eu não posso fazer isso, Louis. Não posso te ajudar a morrer, é errado e definitivamente não é a escolha certa. — Murmuro com a voz cada vez mais vacilante e sofrendo por Charlotte, em suas palavras Louis estava feliz, mas se ela o visse agora, ele parece possuído com os olhos opacos encarando a escuridão e o rosto convertido em um carranca de puro ódio e desgosto.
— Nunca peça a um menino pra fazer o trabalho de um homem. — Tomlinson resmunga tentando agarrar meu braço e eu recuo. Ele tenta novamente e num átimo eu o empurro de volta na cama. Isso o deixa louco — Oh, Harry.
Oh, Harry, você vai morrer!
— Você não passa de uma putinha, uma vadia qualquer com medo de tudo e de todos. Você é tão medroso, irritante, inconveniente e desprezível que não me surpreenderia que até a coisa dentro de você te odeie. — Ele começa enfiando o dedo na ferida, sem se importar, ele é impiedoso e cruel quando quer — Você me chama de covarde, mas o covarde aqui é você. Mesmo que consiga milagrosamente esconder a gravidez, essa criança vai nascer e eles vão descobrir que ela veio de você, que ela é uma aberração e vão queima—la numa fogueira, como faziam com as bruxas. — Um sorriso sádico rasga de seu rosto de ponta a ponta — Enquanto a você, viado, eles vão te colocar numa cela cheia de homens grandes e maus que vão te transformar na vadia deles até que você tome vergonha na cara e corte a garganta.
Louis diz aquelas palavras com tanta frieza que é difícil acreditar que saíram da boca de um outro ser humano que já foi pai e sofreu tanto. Em parte eu queria chorar e acreditar que ele estava certo, outra queria enfiar aquele veneno goela abaixo e assisti-lo morrer, mas havia outra e foi essa que eu resolvi escutar.
— Não importa o que você diga, eu não vou te matar.
— Pois então, eu faço, me dê. — Ele torna a ficar de pé.
— Não. Eu não vou deixar que faça isso.
— Harry, não dificulte as coisas, por favor. — Permaneço firme, apesar de ser gravemente abalado pelo golpe que se segue. Louis fecha o punho e o leva de encontro ao meu rosto, cambaleio e o sangue escorre pela minha boca, não tenho tempo de me recuperar e outro golpe se segue. E é quando eu sinto o gosto metálico na língua e a dormência no lado direito do rosto que eu acredito que o odeio, odeio o bastante para matá-lo.
Mas eu não vou ser um assassino e por isso o empurro mais uma vez, correndo para fora e indo em direção às escadas. Louis me persegue, se arriscando a descer alguns degraus, mas tropeçando na maioria.
— Volte aqui, seu maldito. Harry! — Vocifera com o rosto vermelho e suado — Harry! — Continua a gritar, completamente alucinado.
— Não. Eu não posso deixar que faça isso, por favor me entenda. — Suplico, correndo escada a baixo e Louis urra agarrando o vaso que enfeita uma mesinha próxima a janela e o lança do topo da escada, abaixo a tempo de desviar.
Sarah entra na sala e por pouco não é atingida. Louis começa a tacar tudo o que considera perigoso o suficiente até mesmo a mesa e quando ele a joga pela escada causando um estardalhaço com a madeira se partindo e pedaços seus voando. Liam entra feito um tornado por aquela porta, o rosto furioso ao ver a destruição que Tomlinson causou e Sarah e eu como as vítimas encolhidos em cantos aleatórios.
— Coronel, já chega. — Liam começa, subindo os degraus de dois em dois e me olhando demoradamente, preocupado, os olhos dobrando de tamanho ao ver o sangue — Você o machucou. Ele é só um menino.
É difícil associar a mesma pessoa de ontem, rindo e brincando comigo no Moulin Rouge e dormindo no meu peito pela manhã a esse homem transtornado que luta para conseguir rachar meu crânio com o que achar pelo caminho.
— Não. Ele é um demônio e eu preciso destruí-lo. — Louis berra se preparando para jogar mais alguma coisa, mas Liam o alcança agarrando seus braços e diante dos meus olhos, eles começam a brigar. Liam também havia sido um soldado e a cegueira de Louis não conta como desvantagem e é terrível de se ver, eles são tão bons amigos e não consigo parar de pensar que a culpa é minha. Estou quase me fundindo com o tapete das escadas, as lágrimas caindo pelo meu rosto ainda descrente de onde eu fui me meter e tudo simplesmente parece demais. Liam conseguiu derrubar Louis e ele bufa com o rosto pressionado ao chão, ele olha pra mim e antes que eu desmaie posso dizer, com certeza, que ele me viu.
Xx
O relógio marca 17h00, já fazem horas desde que tudo aconteceu.
Há alguns minutos eu não escuto os gritos de Louis. Ele gritou demais, até ficar rouco e continuou, até que simplesmente parou. Eu não sei o que houve, me trouxeram para o meu quarto, quando eu acordei Sarah estava fazendo carinho no meu cabelo e olhando para o horizonte, eu não sei se ela ainda me odeia, pois quando eu disse estar bem ela também partiu e me deixou sozinho. Clare trouxe meu almoço, mas não tive fome.
Eu não sinto nada.
Estou sentado em posição de lótus há horas, minhas costas doem e meu lábio inferior ainda dói e sangra um pouco, tenho um hematoma grande e avermelhado na bochecha e sinto com a língua um ou outro dente mole. É tudo o que pedi a Deus.
Do lado de fora começa uma garoa fraca, a água batendo contra a janela do meu quarto. Eu gosto da chuva, mas não me movo para ir até lá e olhar. Estou apenas à espera do momento em que Charlotte entrará por aquela porta e me colocará para fora, ou quem sabe a polícia. De acordo com o que diziam, eles me levariam de volta a Holmes Chapel, eu iria para um hospital onde eles realizariam o aborto, em poucos dias eu seria levado ao tribunal e não seria necessário testemunhas para me condenarem por crimes sexuais, meus pais não dariam uma libra para me ajudar e eu seria encaminhado a prisão e lá aconteceria exatamente o que Louis disse. Eles devorariam meu corpo e minha alma até não restar mais nada.
Se eu não fosse um covarde...
Pego o remédio de Louis de dentro do bolso. A poção da misericórdia. Abro a tampa fitando o líquido perolado com um cheiro doce, parece leite, eu poderia tomá-lo de uma vez e o efeito poderia ser instantâneo. A visão de uma vida na cadeia me leva a aproximar o remédio da boca e estou tentado a bebê-lo quando meus dedos se agarram com força na minha barriga, tentando proteger o que há ali.
— Eu tenho que fazer isso. — Suspiro, abaixando a cabeça — Eu não quero, mas preciso fazer. O quê é uma pena, eu só tenho dezesseis anos, pensei que teria mais tempo, que veria o mundo, me apaixonaria, teria filhos. — Desta vez eu estou falando diretamente com a minha barriga, não, com o meu bebê — Você não me conhece ainda, mas eu sou idiota. Sempre fui, um lerdo, burro e dependente. Eu não sei me virar sozinho, você não iria me querer como pai. Eu não sou uma boa pessoa, quase matei uma pessoa hoje, por dinheiro, ninguém que coloca dinheiro acima da vida de alguém é bom. — Infiltro meus dedos por debaixo da camisa, apertando a pele morna — Mas eu quero que saiba que a culpa não é sua, jamais. A culpa é minha, é toda minha, se eu tivesse sido mais inteligente poderia ter esperado até que o nosso mundo fosse diferente e que eu pudesse te ter sem precisar me esconder ou temer uma pena de morte. Porque apesar das circunstâncias, apesar de eu saber da sua existência apenas há duas semanas e estar prestes a te matar, eu te amo. V-você é a única parte boa em mim, a única que importa e Deus sabe que eu daria qualquer coisa para que você pudesse viver e crescer. Eu te quero tanto, mas eu não consigo sozinho, você me entende? Sozinho eu não sei como....— Soluço, e novamente estou me debulhando em lágrimas, abraçando meu corpo que treme inteiro com os espasmos do meu choro. Eu sinto que estou despejando toda a minha dor, toda a minha angústia — Perdão, me perdoa, por favor.
A porta se abre e Charlotte Tomlinson me encara com o rosto abatido e os olhos inchados. Eu espero que ela grite, que me bata, que faça qualquer coisa menos me abraçar como se eu fosse uma criança desamparada, no entanto ela o faz, com tanto fervor que eu me agarro a ela como se fosse minha âncora.
— Desculpa, eu te traí. O ajudei a tentar se matar, me desculpa, por favor. Eu menti pra você. Eu não sou maior de idade, tenho dezesseis anos e fugi de casa porque estou esperando um bebê e eu não-não sei o que fazer. — Balbucio esperando que ela entenda — Eu queria acabar com isso, queria. — Mostro o vidro de remédio entre meus dedos e Charlotte o arranca de mim lançando contra a parede e ele se espatifa.
— Está tudo bem. — Ela não parece surpresa. Ela sabe. Louis contou, ele contará para mais quantas pessoas quiser.
— Ele vai dizer a polícia, Louis vai me entregar e vão matar o meu neném, vão matar ele. — Desta vez eu abraço Lottie. Ela sussurra palavras de conforto que não são ouvidas — Eu amo tanto ele, não podem machucar o meu bebezinho, ele é tão pequenino.
— Não vão, querido. Não vão. — Sussurra contra os meus cabelos.
— Mas e se... Deus, dói tanto. — Engasgo, sentindo meu peito latejando e minha visão voltando a escurecer.
— Eu sei, eu sei.
E eu só consigo enxergar a escuridão.
Xx
Quando eu acordo todos na casa já sabem o meu segredo. Isso porque Louis gritou para quem quisesse ouvir, mesmo com as portas de seu quarto trancadas eu podia ouvi-lo. Todos podiam. O desespero me fez jogar tudo numa mala e tentar fugir, mas antes que eu pudesse colocar os pés pra fora desmaiei na porta de entrada, por sorte na hora em que Liam entrava, cai em seus braços. Consequentemente a doutora Rexha foi chamada e ela se juntou ao clubinho dos que sabem o segredo do Harry. Segundo ela, eu tinha tido emoções fortes demais em um curto período de tempo e que isso estava fazendo mal para o bebê, ao que parece os desmaios eram uma autodefesa do meu corpo para evitar lidar com o estresse. Ela também falou algo sobre pressão sanguínea mais alta que o normal e recomendou, melhor dizendo, proibiu que eu saísse da cama pelo resto do dia.
Quando Charlotte chegou, foi direto para o meu quarto, me dar uma bronca por ter tentado sair depois de dois desmaios seguidos. Era um fato que eu não poderia trabalhar naquela casa cuidando de Louis e ela meio que não sabia o que fazer comigo.
Por falar em Louis, ele estava alucinado. No nível mais elevado da palavra. Liam só conseguiu controlá-lo quando o deixou desacordado por meio de um mata-leão, mas assim que ele acordou derrubou Liam e arrombou minha porta. Eu nunca senti tanto medo na vida quanto no momento em que aquele homem enlouquecido apareceu na porta, rosnando e espumando feito um cão raivoso. Por sorte, antes que ele pudesse fazer qualquer coisa contra mim, Payne reagiu e foi preciso prender Louis a sua própria cama. Faixas grossas de couro prendiam seus pulsos e tornozelos nas pilastras da cama. Bebe o medicava com calmantes, porém não o podia manter dopado por tempo integral e nesse tempo lúcido ele aproveitava para usar todo o seu vocabulário de palavrões.
Assim como a minha gravidez, o plano suicida de Louis também foi revelado e como era de se esperar, Charlotte pretendia evita—lo à todo custo. Ela mandou que removessem, os espelhos, alfinetes, tesouras, e quaisquer coisas que ela considerasse uma forma do irmão pôr fim a vida, de seu quarto. Os remédios foram todos realocados para um lugar que não era do meu conhecimento e desta forma ele também não poderia tentar provocar um envenenamento ou overdose, sendo assim, Louis Tomlinson estava preso na própria pele, contra a sua vontade.
Com isso, sua situação só piorava e ele passou a descontar toda a sua fúria na irmã. Todas as vezes, sem exceção, que Charlotte se arriscava a ir ao quarto do irmão, tudo o que se ouvia era o silêncio e se havia algo pior do que os gritos de Louis, era a sua indiferença, seu desprezo, quando ele se propunha a falar com ela era em torno de uma ou duas palavras que eram mais do que o suficiente para fazê-la chorar. Charlotte estava sempre chorando, até o dia em que ela desmaiou devido ao desespero depois da visita a Louis.
Pela primeira vez em minha estadia na casa dos Tomlinson, eu conheci Tommy Napolitano, o noivo de Charlotte. Era um rapaz bonito e simpático, com um sorriso brilhante e dono do grande teatro Gaaldine em Manchester. Sua noiva ficou acamada depois disso e ele decidiu ficar ao seu lado, morando conosco por alguns dias.
Agora que Louis era um ser humano descontrolado amarrado a uma cama e Charlotte vivia trancafiada em seu quarto com a saúde fragilizada eu me sentia um tanto perdido, ela não havia me culpado de ter ajudado seu irmão. Pelo contrário, compreendia perfeitamente que eu acreditava estar fazendo o bem para ele, e por algum milagre ela não me desprezava pela minha condição. Acredito que alguém que perdeu tanto durante a guerra não se prenderia a preconceitos tão irracionais e isso fora um grande alívio. Ainda assim, eu sabia que não poderia continuar nesta casa, não poderia cuidar de Louis, ele me odeia com todas as suas forças.
Mas também não posso voltar para casa. Então, confuso e completamente desnorteado eu resolvi ficar por aqui, por enquanto. Comecei a frequentar o colégio no qual havia me matriculado, e me dedicava às aulas, fiz alguns colegas e rapidamente conquistei os professores que não me empanturram de trabalhos para repor os dias em que estive ausente — dei a desculpa mais velha do mundo de que estava adoentado e todos caíram facilmente — o uniforme era escuro, bem semelhante ao meu antigo colégio e como não haviam vestígios visíveis da gravidez, eu era como qualquer um ali, um garoto normal.
Continuei jantando na sala de jantar, no mesmo lugar que ocupava, à esquerda de Louis. Mesmo que ele não estivesse mais presente. Clare se esforçava todos os dias para fazer um prato melhor e mais elaborado do que o anterior, ela não disse uma palavra, mas ela sabia, todos sabiam. Sarah havia parado de me olhar torto, ela apenas ignorava a minha existência. Liam continuava o mesmo, gentil e atencioso, sempre me perguntando como eu estava ou se precisava de algo. Ele me levava até o colégio todas as manhãs, não dava partida enquanto eu não entrasse, quando o último sinal tocava lá estava ele, me esperando, no caminho de volta ele perguntava como havia sido o meu dia e o que estavam ensinando. De certa forma ele agia como um pai e era bom, eu sentia muita falta do meu pai, embora soubesse que no momento em que ele descobrisse sobre a gravidez eu o perderia para sempre.
Uma noite ou outra, Tommy se juntava a mim no jantar. Ele comia demais e falava sem parar. Em poucas conversas eu sabia absolutamente tudo sobre ele, onde nasceu, estudou, fatos sobre sua família, sua história com o teatro e como conheceu Charlotte. Tommy não havia ido para a guerra, por este motivo Tomlinson o achava um fracote, inútil e indigno de sua irmã. Parecia muito a cara de Louis dizer algo assim.
Mas o que mais me chamou atenção em sua história era o teatro. Eu havia estado em um certa vez e ainda me lembro da atmosfera quase que celestial, como se estivesse adentrando em um outro plano, onde o mundo real não existia e aquele poderia ser moldado como bem entendêssemos, eu sempre fui fascinado pelas artes cênicas. Charles Chaplin era o meu herói, me fantasiava de Carlitos em todo os halloween e sabia imitar até mesmo o seu andar icônico. Meus pais nem sequer sonhavam com isso, afinal, eles já tinham planos para mim. Eu seguiria os passos de meu pai e me tornaria um escrivão, teria uma profissão de verdade, não seria um vagabundo. Era assim que eles viam os artistas. Quando ainda era muito pequeno, lembro de Gemma falando que queria se tornar uma grande pintora e se mudar para Paris. Minha mãe não disse nada, ela esperou até que papai chegasse e bem, quando ele chegou minha irmã levou uma surra memorável que lhe deixou marcas até os dias de hoje, todos os seus desenhos e tintas foram jogados fora e desde que ela terminou o colegial, passava seus dias como voluntária na igreja, ajudava mamãe nos afazeres domésticos e esperava encontrar um bom pretendente que viria a ser seu marido um dia. Esta era toda a sua vida a partir de então.
Pelo menos ela teria uma vida. Eu, ambicioso e arrogante demais para aceitar o que me fora oferecido, estava numa encruzilhada, sem saber ou ter pra onde correr. Apenas deixava os dias se arrastarem.
— Harry, querido, vai querer mais alguma coisa? — A voz baixa de Clare me tirou do meu transe. Ergui os olhos em sua direção, encontrando um sorriso pequeno e maternal.
Desde que souberam da minha gravidez me tratavam como um bebê e não é como se eu não gostasse disso.
— Não, obrigado, eu acho que já comi demais. — Suspiro, olhando para os pratos vazios à minha frente. A entrada, o prato principal e sobremesa, acredito ter repetido mais de uma vez todos eles.
Nessa coisa de deixar fluir naturalmente haviam se passado três semanas, quase um mês inteiro em que Louis estava em um quarto e sua irmã no outro e eu como hóspede não-oficial em sua mansão. Meu bebê estava crescendo e ficando faminto, o que me deixava faminto e consequentemente mais gordinho do que eu gostaria, mas nada que chamasse atenção ou levantasse suspeitas.
— Isso é um bom sinal, significa que o... — A mulher se calou antes mesmo de começar, talvez pela forma que meus olhos se arregalaram em espanto. Não que eu quisesse fingir que nada estava acontecendo, era evidente que estava, mas eu ainda não havia feito isso. Conversado diretamente sobre a minha situação, eu ainda não acreditava que tinha falado com Charlotte sobre isso ou até mesmo conversado com a minha barriga. Era tudo muito estranho e eu não sei, mas falar sobre parecia deixar as coisas reais demais e eu ainda não me sentia pronto pra isso.
— E-eu acho que vou me deitar agora. Tenho aula pela manhã. — Digo, forçando um sorriso que sai mais como uma careta. Subo as escadas, bem lentamente, já que ando me cansando com uma facilidade absurda. Todas as luzes estão apagadas, com exceção da vela acessa no quarto de Louis, a luz alaranjada escapa por debaixo da porta e eu não resisto em entrar. Com sua irmã doente ninguém fica ao seu lado. Bebe passa grande parte dos dias com ele, porém quando anoitece ela tem de partir.
Entro cuidadosamente em seu quarto, Louis está esparramado pela cama, um monte de travesseiros ao seu redor, provavelmente para impedir que ele bata a cabeça na cabeceira. Seus braços estão atados em cada extremidade da cama, assim como seus calcanhares, ele está adormecido. Os olhos fechados, os cílios longos fazendo sombra em suas bochechas e a boca entreaberta. Algumas mechas de cabelo caem em seus olhos e ele parece tão relaxado. Sereno.
Ocupo a poltrona ao lado de sua cama e não faço som algum, nem tento me aproximar, apenas fico ali, zelando por seu sono até que eu mesmo esteja dormindo.
Quando eu desperto em alguma hora da manhã, Louis está solto. Desacordado, mas solto. Bleta está sentada ao seu lado na cama, acariciando seu pulso que ostenta algumas marcas devido às faixas.
— Essa cadeira não é muito confortável para se dormir. — Ela diz, ainda olhando para Louis — Deveria estar na sua cama.
— Eu não queria que ele ficasse sozinho. — Digo, me remexendo na poltrona e descobrindo que ela tem toda a razão, minhas costas doem como o inferno.
— Ele está dopado, nem sequer notou que você estava aqui.
— Tudo bem. Eu só queria ficar por perto.
— Não sei se essa é uma boa ideia, Harry. — Viro os olhos para Bebe, o que ela quer dizer com isso? — Como eu disse no dia em que te conheci, você é só uma criança, não é capaz de cuidar de Louis. E depois do que aconteceu, isso só se confirmou.
A observo deslizar os dedos pelos cabelos dele, acariciando sua testa quase em reverência. Em seus olhos está estampado seus reais sentimentos e amizade não é um deles.
— Acredito que esse seja o erro de vocês. — Desta vez, ela é quem me encara, um vinco entre suas sobrancelhas — Agir como se ele precisasse de cuidados, Louis sabe se virar muito bem sozinho.
Ela prensa os lábios com força e acena em concordância, voltando a acariciar o rosto de Louis, delineando cada traço perfeito com a ponta dos dedos.
— Talvez você esteja certo, mas eu o vi em seu pior. Mergulhado em sangue, com todos os ossos quebrados, sem conseguir falar, se mexer... — Roça o indicador pelas pálpebras magras que tremulam —, ver. Eu sempre estive lá, me esforçando ao máximo para curá-lo, para devolver tudo a ele. Mas o que ele mais queria eu não podia dar. — Visão ou família? — Não cuidar do Louis vai contra a minha natureza. É inevitável.
Tento ignorar a lágrima que escorre por sua bochecha e me levanto rapidamente, indo até a porta.
— Preciso ir para o colégio. — Informo a vendo concordar — Louis, tem sorte de ter uma amiga como você!
— Sim. — Bebe murmura, com uma voz chorosa — Amiga.
Resolvo partir sabendo que nada daquilo é da minha conta. Depois disso, eu passo minhas noites no quarto de Louis, acordando sempre que Bebe chega. Vez ou outra consigo vir durante o dia, sem deixar que ele perceba observo seus olhos turvos encarando o céu pela janela, mesmo preso e irritado, Louis é o tipo de pessoa perfeita para você sentar e apenas admirar a pessoa que ele é, cheio de caras e bocas, resmungos, citações e até piadas. Sim, quando ninguém está vendo Louis Tomlinson conta piadas para si e até que são boas.
Tudo ia relativamente bem, até o dia em que eu, desastroso como sempre, derrubei um porta retratos e ele perguntou quem era. Eu tive de responder.
— Harry.
— O que diabos você ainda está fazendo na minha casa? — Esta era uma boa pergunta que eu ainda não tinha uma resposta.
Eu não sabia o que dizer ou fazer. Tinha medo de iniciar alguma conversa e ele me dizer mais coisas ruins como da outra vez, então o deixei sem resposta. Mas Louis sabia sempre quando eu estava por perto e ele, jamais, me dirigia a palavra.
Até que durante uma madrugada aleatória estava encolhido em sua poltrona, a cabeça caída para o lado quase completamente adormecido, ouvi a voz de Louis chamar meu nome.
— Sim? — Murmuro com a voz ainda mais lenta, me recusando a abrir os olhos.
— Preciso ir ao banheiro.
Abro apenas um olho e lá está ele, os punhos cerrados e os grandes olhos azuis olhando para cima. Desde que Bebe parou de seda-lo ele adquiriu o costume de acordar durante a madrugada. Saio do conforto do meu ninho para soltar as tiras e ajudá-lo a levantar. Charlotte também havia mandado que mudasse todos os móveis do quarto de lugar, para deixá-lo desnorteado e não tentasse qualquer coisa. Com a nova posição da cama, Louis não conseguia chegar ao banheiro sozinho, por isso ele se limitava a aceitar meu braço e deixar que eu o guiasse.
Esperei por ele do lado de fora. Observando a lua cheia brilhando do lado de fora. A lua me lembrava Zayn. Eu ainda precisava falar com ele.
Ouço o ruído da porta se abrindo e vou até Louis.
— Estou sem sono. Posso tomar um pouco de chá?
— Claro. — Respondo, mas logo me lembro de que Louis já havia esvaziado o bule que Clare havia trazido mais cedo — Eu vou pegar mais lá embaixo.
— Eu quero ir também. — Louis declara, mantendo—se agarrado a mim.
— Tenho ordens para não deixá-lo sair deste quarto.
— Eu sou o dono da casa, o único que dá ordens aqui sou eu. — Louis bufa, puxando meu braço, impaciente para sair. Permaneço parado — Deus, Harry! Eu já entendi, eu não tenho o direito de fazer o que quero com a minha vida, não tenho direito de nada. Okay, eu não sou burro, mas eu estou preso neste quarto há semanas, preciso andar, mesmo que seja um pouquinho, vamos, eu não tentarei nada e seja como for, eu sou cego e inofensivo.
— Sabe que isso é uma grande mentira. — Retruco, ele coça a barba, contrariado. Mesmo assim eu resolvo dar um voto de confiança — Mas acho que não é nada demais dar uma volta pela cozinha. — Louis abre um largo e radiante sorriso que me faz prender a respiração.
Com seu braço atado ao meu descemos os degraus e rumamos até a cozinha que a esta hora está vazia. A luz da lua invade todo o lugar, então não me incomodo em ligar a luz. Deixo Louis sentado na bancada e vou até o fogão encontrando o chá, apenas preciso esquentá-lo. Enquanto o deixo no fogo vou até o armário, pegando duas xícaras de porcelana. Sr. Tomlinson está em silêncio, batucando os dedos na ilha do balcão. Quando a chaleira apita me ocupo em encher as xícaras, mas antes que eu nos sirva escuto o som de algo se chocando com o chão e alguns talheres se esparramando pelo armário. As facas!
— Louis! — Grito, contornando o balcão e o encontrando no chão, encolhido, mantendo uma grande e afiada faca de carne rente ao pescoço — Louis, cuidado.
— Oh, girafinha, eu serei cuidadoso. Você é quem deve tomar cuidado e não se aproximar demais, ninguém quer que você se machuque. — Cantarola, com um senso de humor ácido, pressionando cada vez mais a lâmina contra sua pele até que uma faixa de sangue escorra — Você me atrapalhou bastante da última vez, mas agora, você não vai ficar no meu caminho. Eu vou conseguir pôr fim a essa merda toda.
— Louis, por favor, não faça isso. — Choramingo, arrastando meus pés para cada vez mais perto dele, com medo de um movimento brusco.
— A escolha é minha e é isso que eu quero.
— Não pode fazer isso, não pode se matar na minha frente.
— Você pode ir embora. — Ele diz, com a mão firme agarrada ao cabo da faca. É assustador a forma como ele não treme ou hesita. Louis é tão seguro quanto ao que quer, ele nunca tem medo — As pessoas têm medo de serem responsabilizadas, você acha que a Charlotte tem medo que eu me mate porque me ama? Não, não mesmo! Ela só não quer levar a culpa, o que naturalmente aconteceria. Ela não quer ser vista como uma assassina, e eu entendo o lado dela, assim como entendo o seu. Você é só um garoto, Harry. Você não é capaz de lidar com isso, mas eu sim. Então saia e me deixe fazer o que é preciso.
Talvez uma pessoa sensata, o desarmaria e depois procuraria por ajuda. Os cochichos pela casa diziam que Louis seria internado em uma clínica, que ele estava depressivo e essa era a única saída. Mas ele já tinha outra em mente. Embora nenhuma das alternativas me parecessem boas de fato, não era minha função escolher. Então, eu fiquei em pé diante dele, sem mover um músculo.
— O que leva uma pessoa a um desespero tão grande em que ela não vê outra solução a não ser a morte? — Eu o pergunto, genuinamente, intrigado.
Os lábios de Louis se repuxam em um sorriso amargurado. Os olhos fundos e as linhas em sua pele não escondem a exaustão de seu corpo, seu espírito, sua alma.
— O medo.
— Mas você não tem medo.
— Tudo o que eu tenho é medo, Harry. Medo de viver mais um dia, medo do futuro e do que me aguarda e principalmente de que a melhor época da minha vida tenha ficado para trás. O medo é tão esmagador que ele te prende, numa pequena bolha de desespero e todos os dias em que você acorda respirando são dias de terror e pânico total. É preciso coragem para viver, para encarar o mundo real e isso eu perdi há muito tempo.
É preciso coragem para viver, para encarar o mundo real....
Num minuto estou em pé apertando meus dedos e pensando em uma forma eficiente de pará-lo e no outro estou me ajoelhando diante dele, meus dedos tocam seus joelhos e Louis salta, acreditando que estou tentando algo, mas eu não faço nada. Apenas olho, e é em seus olhos que encontro o reflexo de todo o meu desespero e medo.
Eu não tenho ninguém no mundo que me apoie ou me defenda, que cuide de mim. Nem eu mesmo. Mesmo assim, existe uma criança, que querendo ou não está a caminho e ela vai precisar de alguém que cuide dela, que mate e morra por ela se for preciso. Alguém disposto a tudo, sem medo, que não chore ou se encolha só com a ideia de ter que se virar.
Eu gostaria de ser esse alguém para o meu bebê, mas infelizmente, não sou.
— Se você se matar na minha frente eu nunca esquecerei. — Digo, com a voz surpreendentemente estável — E todos acharão que eu fui seu cúmplice.
— É uma possibilidade. Por isso você deveria ir embora.
— Pra onde eu iria? De volta pra casa? No dia em que eu decidi me deitar com um garoto, mesmo estando sujeito a lei, eu perdi minha casa. Perdi minha família e amigos. Eu tenho dezesseis anos e não sei fazer nada, acho que não tenho mais um emprego. — Louis e eu soltamos uma risada fraca — Uma casa, ou com quem contar, só um bebê que precisará de muitas coisas que eu não poderei dar. Sinceramente eu nem sei como conseguiria levar isso adiante sem que a polícia descobrisse. De uma maneira ou de outra essa criança vai morrer, ela está condenada, estamos condenados. Mas ainda existe algo que eu posso fazer. — Apesar de hesitante, encontro forças para segurar o pulso de Louis que se encontra mais maleável e deixa que eu o leve até mim, colocando a faca em minha garganta como ele fizera a pouco consigo mesmo — Posso escolher como vamos morrer.
A boca de Tomlinson se abre em espanto e ele tenta puxar a mão de volta, contudo firmo meu aperto em seu pulso, o puxando um pouco para frente e engasgando com a ardência do corte que é feito superficialmente em minha pele que é o suficiente para arrancar um pouco de sangue que goteja pela gola do meu pijama.
— Você não quer morrer. — A voz de Louis saiu embargada de uma sofreguidão que eu nunca vi antes. Porque ele se importaria se eu vivo ou morro? Não é como se eu significasse algo para ele.
— Não quero. — Confesso, num sopro de voz, observando seu rosto sendo banhado pela luz pálida da lua e um pequeno sorriso desponta em meus lábios com a constatação de que ele será uma bela última visão — Mas...mas eu sou um viado, que eles colocarão numa cela cheia de homens grandes e maus que vão me transformar na vadia deles até que eu tome vergonha na cara e corte a garganta. Por isso decidi, que é melhor tomar vergonha na cara logo, antes que seja tarde demais.
Uma única lágrima escorre por seu olho direito e é como uma pequena rachadura numa grande e imponente muralha de pedra.
— Quem te disse isso é um idiota.
— É a verdade.
— Você não precisa morrer por isso, Harry. Pode ficar com o meu dinheiro, eu o dei a você. — Ele insiste.
— Eu não quero seu dinheiro, Sr. Tomlinson. Nada disso pode me proteger. Essa sim, é a minha única saída. — Puxo novamente seu pulso, aprofundando levemente o corte.
— Quer parar com isso?! — Grita, para a minha surpresa — Você é só uma criança como pode ter tanta falta de fé em si mesmo? Sua vida só está começando! Não se pode deixar levar pelas minhas palavras idiotas. É isso que eu sou, Harry. Um grande idiota e você deveria me mandar para o inferno e pegar o dinheiro. Porque diabos você não fica com o dinheiro?
— Não é óbvio? — Suas sobrancelhas se unem em incompreensão — Mesmo com tanto dinheiro aqui está você, tentando cortar o pescoço no chão da cozinha. O dinheiro não é garantia de nada, ele não cura, não salva e com certeza não vai apagar a lembrança de que eu deixei o senhor morrer apenas para ficar com ele. Você está certo quando diz que eu sou covarde, inconveniente, um viado e uma vadia, mas mesmo que não seja dos melhores eu tenho caráter. Charlotte confiou em mim, confiou que eu cuidaria de você, eu a trai uma vez e jamais repetirei meu erro, ou vivemos ou nós dois, melhor dizendo, nós três morremos.
Com isso, eu solto o pulso do Sr. Tomlinson que não se move. Ele abaixa a cabeça e um longo suspiro sai por entre seus lábios. Eu não sei o que ele fará, mas seja o que for, estou preparado. Pela primeira vez na vida, eu não tenho medo.
— Com quantos meses você está? — A atmosfera silenciosa e quase mórbida é quebrada por seu sussurro inaudível.
Engulo em seco antes de responder.
— Dois meses e uma semana.
— Dois meses e uma semana. — Tomlinson repete, como se isso o lembrasse de algo importante — Isso é bastante, é uma vida. Uma vida. — De repente, seus olhos se erguem, ostentando um brilho diferente e ele lança a faca para longe, o som do metal contra o piso ecoando por todo o cômodo.
— O que está...?
Sinto as mãos de Louis agarrando meus ombros e literalmente me chacoalhando de um lado para o outro.
— Como pôde arriscar o seu filho desse jeito, você é maluco ou o quê, Harold? Meu deus, você só pode ter merda na cabeça. — Ele resmunga com a voz se elevando cada vez mais, sem parar de me chacoalhar.
— Isso significa que você não vai se matar? — Pergunto com o coração transbordando de esperança e então ele se desmancha por completo, com os olhos de Louis se apertando daquele jeitinho meigo e arteiro e seus cabelos caem ainda mais por seu rosto quando ele assente.
— Alguém precisa ficar de olho em você, para garantir que essa criança tenha alguma chance. — Diz, tirando a franja da frente do olho — Acho que eu poderia dar um bom tio.
Antes que eu possa registrar estou me jogando em seus braços e o apertando em um abraço completamente indesejado por Louis.
— Socorro! Estou sendo asfixiado por esses cachos! Cortar o cabelo de vez em quando não mata, Styles. — Ele está falando quando eu me afasto, puxando alguns dos meus cachos, mas eu estou tão feliz que nem consigo me irritar — Alguma coisa me diz que você está me encarando e sorrindo feito o bobalhão que é.
— Obrigado!
— Pelo que?
— Por escolher viver.
— Eu posso mudar de ideia a qualquer hora, sou uma pessoa muito inconstante. — Louis ameaça, com um sorriso malicioso — É melhor me manter distraído.
— Eu farei. — Prometo, sentindo minhas bochechas doerem tamanho o meu sorriso permanente.
— Pegue o meu chá, serviçal.
— Sim, senhor. — Pego as duas xícaras e me sento ao seu lado, escorados no armário e encarando a janela, o céu, a lua e as estrelas que parecem brilhar espetacularmente mais forte nesta noite — Amigos? — Me arrisco a perguntar levantando minha xícara. Primeiro Louis resmunga, entorta o nariz e bufa até bater a xícara na minha em um brinde.
— Amigos, girafinha. — Deixo um soluço escapar, ao secar as lágrimas que escaparam dos meus olhos. Desta vez é um choro de alegria e alívio — Ai como eu odeio pessoas emocionais! Vamos, garoto, pare de chorar, tudo vai ficar bem.
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