5 • | under pressure
Olho ao redor e todos estão aqui. Meus amigos da escola, antigos vizinhos, todos os garotos com quem já estive e eles me olham como se eu tivesse a praga, olhos atravessados e bocas tortas em escárnio. Enojados comigo. Mais a frente estão meus pais, eles não choram, não parecem tristes. Estão com ódio de mim. Eles me odeiam agora, eu não sou mais o anjinho deles. Gemma não se importa, ela não vê nada além do próprio umbigo e acena para algum oficial que está no canto do tribunal.
Da onde estou eu posso vê-lo, Zayn com seu rosto esculpido pelos deuses e os cabelos com seu brilho negro me cegando por um momento, até que eu reconheça Perrie Edwards ao seu lado com a grande pedra de diamante reluzindo em seus dedos esguios. Estão noivos. Eles vão se casar. Eles se amam.
Não muito longe deles está a rica Charlotte Tomlinson, roupas finas e um penteado bem elaborado, mas ela não sorri como da última vez que a vi. Ela chora. O rímel mancha suas bochechas e seus dedos sangram, seu peito está aberto e o coração pulsa por debaixo das costelas rompidas. Levo a mão à boca. É um sonho! É um sonho!
— Senhoras e senhores, estamos aqui hoje para determinar se Harry Edward Styles é culpado das acusações de homossexualidade, levar adiante uma gravidez masculina e assassinar friamente Louis William Tomlinson.
Assassinar Louis?
— Assassino! — Charlotte grita — Você matou meu irmão! O matou para ficar com sua fortuna.
— Eu não-eu não fiz isso!
— Tem certeza? — O juiz indaga e o corpo de Louis está sendo posto à mesa. Sua pele fria, dura e arroxeada, o mesmo frasquinho entre seus dedos, vazio. Ele está morto.
Eu o matei!
— E sobre o crime de homossexualismo e manter a gravidez mesmo estando sujeito a condenação por crimes sexuais?!
Abro a boca para negar, mas sinto meu corpo pesar. Porque eu tenho uma barriga de verdade, impossível de esconder.
— Acho que a resposta é bem clara, não? Senhores, deixo a vocês a decisão!
E uma chuva de "culpado" cai sobre mim, todos aqueles que me conhecem me condenam.
— Culpado! — O juiz decreta — Levem-no para a forca.
— Não. — Grito, mas há guardas por toda parte me segurando e me arrastando para a corda que surge no centro da sala — Mamãe! Papai! — Eles não se importam, ninguém se importa.
Eles me lançam contra a mesa e eu me agarro ao corpo sem vida de Louis.
— Por favor, você precisa me ajudar. Por favor, Louis, acorde! Acorde.
— Eu estou acordado, você é quem precisa acordar. — Salto dos travesseiros, jogando os cobertores no chão e passando as mãos pelo meu rosto e cabelos pegajosos. Minha respiração está frenética e meu coração luta para sair do peito.
Levo algum tempo até me ambientar novamente. Encontrar o conforto das paredes róseas do meu quarto, as portas do closet e as cortinas da sacada sendo balançadas pela brisa cálida do amanhecer. Tudo está bem, não estou em um tribunal, ainda me encontro a salvo em Londres.
— Harold, precisamos discutir sobre essas suas longas pausas dramáticas. Eu não posso te ver, não sei se está tendo um infarto ou só me ignorando, por favor colabore. — A voz de Tomlinson torna a romper o silêncio e o encontro ao meu lado, os joelhos pressionados a borda da cama, ele usa roupas de flanela que imagino ser seu pijama, em suas mãos carrega um copo de licor — acho que deveria acrescentar alcoólatra a longa lista de qualidades dele — , mas acabo por prestar mais atenção a faixa azul em seu cabelo, puxando os longos fios para trás, deixando todo o seu rosto exposto que é banhado pela luz amarelada que ressalta o bronzeado quase extinto de sua pele, tão repleta de traços perfeitos e harmoniosos como seu pequeno nariz atrevidamente empinando, o queixo projetado, as maçãs do rosto marcadas, os lábios finos e de aspecto tão suave, o maxilar másculo com aquela rústica barba que deveria deixar um impiedoso rastro avermelhado na pele delicada e por fim aqueles olhos, de um azul glacial capaz de fazer com que qualquer um se curvasse perante a sua vontade. Imagino como era olhar para eles e vê-los olhar de volta para você, Louis Tomlinson deve ter tido um olhar fatal há uma década atrás.
— Vamos brincar de deixar o ceguinho no vácuo, é super divertido. — Ele cantarolou com a voz afetada e agarrou o único lençol que ainda cobria meu corpo, o lançando longe.
— Hey, eu estou nu! — Escandalizado, pego o lençol de volta, amarrando em minha cintura.
— Oh, desculpe. Eu não vi. Prometo não olhar. — Louis coloca a mão em frente aos olhos, zombando, só pra variar, das minhas habilidades em ser idiota.
— Desculpe, eu me esqueci.
Saio da cama, à procura de uma calça. Enquanto a subo por meus quadris não posso evitar de deixar que meus olhos caiam no reflexo da minha barriga, mais precisamente no que há lá dentro. Segundo os meus cálculos eu devo ter em torno de seis semanas. Um mês e meio. Não há nenhuma mudança visível, mas eu sinto que estou diferente. Ainda não me permiti pensar no que fazer, se terei ou não essa criança, melhor deixar isso pra mais tarde.
— Então, Sr. Tomlinson, o que quer de mim tão cedo? — Indago, indo até o banheiro, lavando o rosto e escovando os dentes. Escuto os tropeços de Louis se aproximando.
— Está na hora do meu remédio.
— Remédio? — Cuspo a espuma, olhando de soslaio para seu corpo na porta. Enxaguo a boca — Está falando daquele remédio?
— Isso, duas doses hoje, de manhã e à noite. O mesmo amanhã e no domingo de manhã será a última.
— Você realmente quer levar isso adiante? — O observo balançar a cabeça, sem hesitação — O que houve ontem foi um grande erro, jamais deveria ter lhe dado aquele remédio. Por isso irei informar a sua irmã sobre suas intenções e voltarei para a minha cidade.
— Harry, por favor, venha até aqui. — Louis estende a mão e eu o encaro, estranhando. Com certo receio me aproximo, não toco sua mão, mas me sento na ponta da cama em frente a onde ele está em pé.
— Estou sentado na sua frente.
— Bem, eu sei que tenho sido um pouco hostil com você. — Louis umedece os lábios com a ponta da língua ao esfregar as mãos juntas e pela primeira vez eu diria que ele está nervoso, não de um jeito explosivo, está mais para o estilo dos humanos racionais mesmo — Acredito que você seja um bom garoto e eu não quero te trazer problemas, mas você por um acaso notou que... Que mesmo mal nos conhecendo partilhamos nossos maiores segredos?
— O que quer dizer com isso?
— Você não contou a ninguém sobre a gravidez, suspeito eu. — Sussurra e eu resmungo um sim — E eu não partilhei com mais ninguém o meu desejo em colocar um ponto final na minha existência. Já se perguntou o porquê disso, criança? Provavelmente não, mas eu lhe darei a resposta, que é simples. Nós fizemos isso por saber que aqueles ao nosso redor, as pessoas amadas, não nos compreenderiam, nem apoiariam.
— É claro que ninguém apoiaria, o que você quer fazer é suicídio! — Digo, elevando um pouco minha voz. Aliviado pelo quarto dos outros serem em outros andares.
— E se deitar com outros homens e estar esperando uma criança quando há leis, condenações e uma longa lista de executados que deixa claro o quão proibido é não lhe torna um suicida também, Harry? — O tom de voz cortante de Tomlinson me deixa sem palavras, eu não tinha visto por esse ponto ainda — Nós podemos ter nascido em épocas diferentes, ter tido experiências paralelas, mas de alguma forma nos encontramos na mesma encruzilhada, ambicionando pelo que nos é negado, proibido. Você quer ter o direito de amar quem e como quiser. E eu, apenas desejo paz. Diga-me, sinceramente, se eu fosse algum juiz da suprema corte e lhe dissesse que eu não o condenaria, mas que você não poderia nunca mais tocar em um garoto, que deveria se casar com uma mulher, ter filhos e ser um homem-modelo, você faria isso?
Pondero por um momento, me imaginando levando a vida que meus pais queriam e que Zayn insistia ser a única realidade aceitável. Aquela cheia de fingimentos. Eu não poderia viver desse jeito, me escondendo, prendendo o meu verdadeiro eu dentro de um armário, enquanto me tornava um boneco de plástico sem vontade apenas porque era isso que queriam de mim.
— Não, eu preferiria a morte a deixar que me proibissem ser quem sou. — Respondo firmemente, olhando para ele — Não é certo se anular apenas para agradar os outros.
Louis assente, um pequeno sorriso se curvando em seus lábios.
— São sábias palavras. — Ele suspira com ar melancólico — Houve o tempo em que eu era aquilo que eles queriam. O aluno perfeito, com as melhores notas, um exímio atleta, ajudava minha mãe, cuidava das minhas irmãs mais novas e trabalhava com meu pai na sua farmácia. Precisava ouvir o que diziam sobre mim, teciam elogios o tempo inteiro e em 1940 quando a guerra estourou em proporções mundiais eu tomei mais uma atitude admirável, fingi ser maior de idade para poder me alistar. Na minha primeira semana eu fui enviado em um comboio para a cidade de Dunquerque e nós acabamos ficando encurralados, o bombardeio era incessante. Dia e noite lançavam bombas em nossas cabeças, guerreavam na praia com as tropas inimigas, quando conseguimos embarcar em um navio ele era afundado, eram mais de 400 mil homens e com a escassez de água e comida iam padecendo aos poucos. Eu me lembro de dormir dentro de um barco à beira mar, o cheiro de morte e putrefação me sufocando, a areia manchada de sangue e as ondas traziam os corpos de volta. Foram os mais longos dias da minha vida, no último dia um rapaz franzino enlouquecera e partiu pra cima de mim com um punhal, ele rasgou minha coxa e eu quebrei seu pescoço.— Louis faz uma pausa e fecha os olhos demoradamente — Eu nunca tinha matado antes e eu me senti péssimo, ele parecia ainda mais jovem do que eu. Então quando os barcos dos civis começaram a chegar eu me recusei a subir neles. Deitei na areia e esperei que uma bomba caísse em mim, mas ao invés disso alguém agarrou meus calcanhares e começou a me puxar. Era ela, Lydia. Eu consigo ver, como se ela estivesse bem aqui, na minha frente, a pele negra eriçada pelo vento frio, os cachos marrons caindo no seu rosto e a sua determinação em não deixar que eu me entregasse. Aquela garota roubou o barco do pai durante a noite e velejou até lá, decidida a salvar o máximo de pessoas que pudesse. Lydia ia e vinha, até que não restasse mais ninguém para ser salvo e eu sabia que era ela, a mulher da minha vida. — Enquanto falava dela Louis não deixava que o sorriso apaixonado saísse de seu rosto e embora eu não fosse muito inclinado a gostar de mulheres nesse quesito eu não vejo como evitar se apaixonar por alguém assim. Lydia parecia uma grande mulher — Eu a pedi em casamento no início do outono e no dia seguinte estávamos nos casando, nossa lua de mel durou menos de três horas e eu tive que entrar em um trem tendo de voltar para a batalha. Mesmo com o mundo vindo abaixo nós nos encontrávamos por várias vezes, ela servia como enfermeira, trabalhava como telefonista repassando informações do governo para o exército, e tinha o melhor frango assado da Europa. Eu me lembro de certa vez estar voltando pra casa, na minha licença e encontrar uns trinta homens alojados no nosso jardim, eles vestiam minhas roupas e tinham curativos por todo o corpo e afundavam os rostos na tigela de comida e quando eu entrei encontrei ela cantando para um homem deitado em nossa cama, ele estava morrendo, mas sorria pra ela e quando ele morreu, ela chorou e o enterramos no nosso quintal, Lydia desenhou um coração na cruz por não saber seu nome e poucos dias depois ela dava a luz aos nossos filhos. Abigail e William. Eles morreram três dias antes de completar dois anos. No fim, Lydia não foi tratada com a gentileza e amor que ela tratava os outros, eles... — Um soluço alto escapa do fundo de sua garganta e Louis esconde o rosto atrás de suas mãos. Tomando coragem para completar — , arrancaram sua pele. Aqueles racistas malditos! Essa foi a última coisa que eu vi, meus bebês mutilados e a minha doce esposa sem pele, essas imagens são como um filme de terror que se repete o tempo todo diante dos meus olhos. Eu não consigo parar de ver. E quando eu acordei, enlouquecido pelo que fizeram a eles e eu soube que tinham capturado meus pais e irmãs e que todos estavam mortos, deixando apenas a Fizzy que teria de viver o resto da vida num manicômio, eu sabia que não havia mais lugar para mim, eu não podia continuar nesse mundo que tanto mal me fez, mas quando eu disse isso a eles, sabe o que me responderam, Harry?
— Não. — Murmuro, me sentindo enfraquecido por sua história.
— Isso acontece, você precisa superar, Sr. Tomlinson. Agora, como você supera uma coisa dessas? Não há como! — Louis estende sua mão em minha direção e hesitante eu a seguro — Sr. Styles, eu não o conheço e não tenho direito algum de lhe pedir isso, mas eu não quero que seja um assassino, eu quero que se o que lhe contei tiver o feito se apiedar da minha pobre alma, por favor, ajude este moribundo a encontrar descanso. Acredito que minha família me espera em algum lugar e eu quero mais do que tudo poder encontrá-los, e pra isso eu preciso de ajuda, da sua ajuda.
— Mas e a Srta. Charlotte?
— Ela ficará bem, ela tem o Tommy. — Ele responde, acariciando as dobras dos meus dedos com o polegar. O couro de sua luva raspando em minha pele — Eu serei covarde e um grande filho da mãe por estar fazendo isso secretamente, mas eu quero fazer uma última coisa boa. Quero garantir que você e o seu bebê fiquem bem, que nada lhes falte e que a lei não os atinja.
— E como faria isso, Sr. Tomlinson?
— Dinheiro, Harry. O dinheiro lhe dá poderes infinitos e eu quero que ele seja seu. Me ajuda e eu o ajudarei.
O silêncio se faz presente, pairando à espera que um veredito seja dado e pela primeira vez na minha vida ele precisa vir de mim. Então me vejo num impasse, entre o que é moralmente correto e o que ele deseja. Eu não tenho moral para julgá-lo, Lottie agiria movida pela emoção e o impediria de fazer qualquer coisa. Entendo que ele pede isso a mim pela falta de laços emocionais e embora me doa, a oferta de ficar com sua fortuna é extremamente tentadora e conveniente. Com isso, eu tomo minha decisão
— Espere aqui, irei pegar o seu remédio. — Digo e Louis se curva, deixando um beijo em minha mão, agradecido, antes de me deixar rumar até a sala de estar.
Xx
No caminho de volta esbarro com Sarah, com a sua habitual arrogância ela me mediu de cima a baixo antes de colocar as mãos nos quadris e estufar o peito como se fosse me intimidar de alguma forma. Ela deve ser uns vinte centímetros mais baixa do que eu. Não que isso me impeça de me sentir intimidado.
— Sr. Styles, possui algum problema de memória? — Sarah me pergunta com a voz destilando veneno e ironia.
— Não que eu tenha conhecimento.
— Sendo assim porque deixaria o Sr. Tomlinson sozinho, quando lhe foi instruído que não o fizesse?
Porque eu fui pegar o veneno dele, Sra. Enxerida.
— Me ausentei por um, no máximo dois minutos, creio que não tenha problema. — Digo, tentando passar pela fresta da porta que não é coberta por seu corpo, mas é claro que ela põe o braço no meio, me atrapalhando.
— Acho que está enganado. Quando cheguei o senhor já estava ausente, então tive tempo de arrumar seus aposentos, trocar o curativo na testa do patrão, que a propósito não acreditei nem um pouco naquela história furada que contou no jantar sobre um livro tê—lo atingido, em seguida preparei seu banho e o ajudei a entrar. Por fim, passei mais um longo tempo andando de um lado para o outro até que o senhor resolvesse dar as caras.
Certo, talvez eu tivesse me demorado mais do que o necessário. Primeiro por não estar conseguindo encontrar o remédio, alguém fez uma mudança radical e o trocou de lugar, depois aproveitei para comer algumas das torradas maravilhosas que Clare preparara e acabei me distraindo em frente ao espelho do corredor. Foi só isso. Quinze, vinte minutos no máximo.
— Estava fazendo um trabalho de grande importância para o patrão.
— Oh, é mesmo? — Sarah cruza os braços diante do corpo, uma sobrancelha arqueada e um sorriso debochado nos lábios — Pois saiba que o trabalho de grande importância aqui, garoto, é cuidar do Sr. Tomlinson. Se ele precisar de algo peça a qualquer um de nós, mas o seu dever é sempre estar ao lado dele.
Aperto o vidrinho de remédio dentro do bolso, sinto minha testa suar e meu rosto esquentar ao que Sarah mantém um olhar firme e inquisitivo sobre mim, como se ela pudesse ver através de mim. Saber o que estou planejando.
— Desculpe, eu realmente não deveria ter o deixado. Irei para junto dele agora mesmo. — Digo, rapidamente entrando em meu quarto, porém sua mão segura meu braço. Prendo o remédio com mais força entre meus dedos — Algum problema?
Sarah se aproxima, levantando o rosto para poder me encarar diretamente.
— Você esconde algo, garoto, e eu vou descobrir.
Sinto meu sangue congelar nas veias, mas me esforço para agir com naturalidade. Dou um sorriso de canto, fazendo com que uma covinha desponte em minha bochecha esquerda.
— Fique à vontade. — Sarah continua a me olhar, num misto de insatisfação e raiva ela me solta.
— Não fique andando pela casa sem camisa. Isto não é um bordel. — Dito isto, ela se afasta e eu suspiro aliviada batendo a porta do quarto e passando o trinco. Ouço o som da água vindo do banheiro e sigo até lá. Encontro o Sr. Tomlinson se banhando em minha banheira, sua cabeça está jogada para trás, acomodada em um pequeno travesseiro, os cabelos úmidos puxados para trás e os olhos fechados. Seus braços repousam ao longo das laterais da porcelana e seu peito se move vagarosamente conforme sua respiração.
Sinto minha respiração falhar brevemente com a constatação de que ele está nu, a poucos centímetros de mim. Eu nunca fui santo, aos quatorze anos deixei de ser virgem, mas bem antes disso eu já tinha espiado meu vizinho ou me tocado e deixado que me tocassem, porém sempre estive com garotos da minha idade. Zayn havia sido o mais velho e ele só tinha dezoito.
Louis era um veterano de guerra, lutou em árduas batalhas, empunhou armas de fogo, tirou vidas e havia perdido pessoas queridas. O mundo lhe tirou muito, mas ele ainda tinha tanto, ele era um homem, um homem de verdade. Nem Luke ou Zayn chegariam aos seus pés, tenho certeza de que Louis acabaria com ambos num piscar de olhos. E mesmo que ele não possa ver e precise de ajuda para tantas coisas, da onde estou a observá-lo, ele exala poder, força e confiança.
Ele não tem medo, porque não tem mais nada a perder e por algum motivo isso me instiga, desperta a minha curiosidade. Eu gostaria de ser como ele.
Gostaria de poder vê-lo.
Meu pé esquerdo age contra a minha vontade, dando um passo em sua direção e eu praguejo comigo mesmo, alto o bastante para que Louis abra os olhos e sorria.
— Veja só se não é a minha girafinha preferida, onde se enfiou, miserável? — Resmungou sendo um doce de pessoa.
— Tive alguns inconvenientes, mas eu achei. — Digo, pegando o remédio e despejando no copo abandonado de liquor sob a pia. Não tenho certeza do que estou fazendo ainda, mas se ele quer, acredito que o certo seria ajudá-lo.
— Ótimo, traga até aqui!
— Até aí? — Sinto minhas bochechas corarem com a possibilidade de vê-lo tão intimamente.
— Sim, Harry. Espero que não esteja corando como uma virgem, porque nós dois sabemos que você não é e eu não seria o primeiro homem nu que veria. — Louis não perde a oportunidade de troçar de mim, rindo consigo mesmo e batendo os dedos na borda da banheira — Ande logo com isso.
Com passos meticulosamente calculados eu caminho até ele, entregando o copo em sua mão e o observando levar até a boca. Louis bebe a sua poção venenosa como se fosse água, sem hesitação, remorso ou arrependimentos. Sem medo.
— Quem te vendeu isso? Não pensei que vendessem veneno em farmácias.
— Não é veneno, Harry. — Louis me corrige — É o que os franceses chamavam de Potion de Miséricorde, ela se tornou popular nos postos médicos durante a guerra, muitos dos soldados que chegavam já estavam em estado irreversível, então, num ato de misericórdia eles lhe davam este remédio até que eles pudessem alcançar a paz.
— Está mesmo me dizendo que envenenar pessoas que iam até lá em busca de ajuda é um ato de misericórdia?
— Você nunca esteve na guerra, Harry! — Tomlinson bufa, passando o mindinho pela sobrancelha, desinteressado como se eu fosse uma mosca zumbindo em seu ouvido.
— Não, mas isso é covardia. — Digo, determinado e Louis vira o rosto em minha direção e pela primeira vez, desde que cheguei até esta casa ele parece estar olhando diretamente para mim.
Embora nada possa ser lido em seus olhos, as linhas em sua testa, o maxilar cerrado e os dentes apertados evidenciam que está furioso.
— Covardia é correr para longe de casa com medo que a mamãe e o papai descubram que você não é tão santinho quanto eles pensam. Covardia é ir para uma guerra e deixar sua família à mercê dos nazistas. Agora, estar disposto a sacrificar seus princípios e os mandamentos divinos para poupar moribundos de uma execução ainda pior, porque eu imagino que você nem saiba o que os inimigos fazem aos doentes, não é? — Nego, mesmo sabendo que Louis não pode me ver, mas ele parece saber bem qual é a minha resposta — Eles gostam de atear fogo neles, como estão acamados não há escapatória. Já imaginou a dor que deve ser, sua carne sendo derretida e caindo feito cera, seus ossos virando cinzas e tudo isso, diante dos seus olhos, você sentindo absolutamente tudo sem forças para lutar? Então, eu acredito que dar um remédio que irá matá-los é definitivamente um ato de misericórdia.
— Talvez. — Murmuro, sem querer dar o braço a torcer e crente de que as histórias de Louis sobre a guerra dariam um belo livro de terror.
— Você é só um bebezão que não sabe de nada.
Suspiro, ele tem razão.
— Vou deixar que tome seu banho em paz. — Me viro, pronto para partir quando a voz de Louis surge nas minhas costas.
— Precisarei de ajuda. — Giro nos calcanhares com a sobrancelha quase alcançando meu couro cabeludo. O quê? — Graças a minha queda de ontem não estou conseguindo dobrar o corpo, ou seja, precisarei de ajuda para lavar a parte inferior do meu corpo.
Parte inferior? Mas é na parte inferior que está o....
— Girafinha, morreu de novo? É sério, Harry, você me irrita. — Louis molha uma das mãos e a passa pelo cabelo, meus olhos seguem o rastro molhado que se faz quando algumas gotículas de água caem por seu queixo, deslizando pelo pescoço, peito e se perdendo no abdômen.
— D—desculpe, senhor.
Me arrasto até estar me ajoelhando a borda de sua banheira. Contemplando a pele bronzeada que se estica por seus ossos e músculos, ele tem uma série de figuras gravadas em sua pele com tinta. Muitos dos quais eu não entendo bem o significado, mas ficam bem nele. Como a frase pouco abaixo das clavículas, o número no peito e o outro número em sua mão esquerda, juntamente com o par de alianças. A dele e a dela.
Louis torna a jogar a cabeça para trás e apoia o copo no beiral da banheira. Pego a esponja que repousa em seu estômago e meus olhos examinam seu abdômen liso com músculos salientes, como em seus braços fortes e as coxas grossas que mostram o resultado de seus treinos no meio da tarde que tendem a ser realizados com Liam — sei disso pelo meu costume de ficar babando em Payne sem camisa fazendo uma série de abdominais até que sua pele esteja coberta de suor e eu me segurando para não ir até lá e me oferecer para secá-lo com a língua. Sarah provavelmente gostaria menos ainda de mim — Evito propositalmente olhar para você-sabe-onde quando começo a ensaboar seus pés, subindo pelos tornozelos que ostentam algumas pequenas cicatrizes e queimaduras, sigo cuidadosamente até estar esfregando suas coxas e me deparando com o corte horizontal em sua pele, uma cicatriz grossa, mais escura que a pele, ao seu redor estão uma série de pontinhos que eu imagino terem sido provocadas pelas injeções de Bleta.
Enquanto a ensaboo não consigo ignorar que daqui algum tempo aquela perna não estará mais presa ao seu corpo, a cada dia ele a perde mais um pouco até chegar o momento em que ela terá de ser arrancada fora. Olho para o seu rosto relaxado e me pergunto como ele conseguirá viver sem os olhos e a perna. Bem, não viverá, em dois dias Louis Tomlinson estará morto e seus problemas de saúde não importarão mais.
É estranho saber que em breve tudo isso não mais existirá.
Ninguém mais terá o prazer de ouvir sua voz, sentir o calor de sua pele ou o aperto de seus braços. O toque de seus dedos se perderá, o sabor de seu corpo se perderá, seu beijo, sua paixão, seu prazer, tudo isso se perderá. Ele será levado como poeira ao vento.
Os lábios de Louis se rompem em um pequeno gemido e eu não entendo o porquê de tal até que flagro meu próprio punho, fechado em seu comprimento. Envolto pela esponja, é claro. Ele é tão grande e grosso que meus dedos não o envolvem por completo, eu não sei ao certo o que pretendo quando eu movo o punho para baixo pressionando seus testículos. Outro som escapa de seus lábios e eu gosto disso. Gosto de poder ouvi-lo, pela última vez.
E ele é ainda mais bonito com a boca entreaberta soltando pequenos suspiros, os olhos se apertando com força, assim como seus dedos cravados na porcelana e seu quadril levantando-se levemente. Volto a mover a mão, encontrando um ritmo no qual posso encontrar seus quadris, e deixando que ele foda minha mão como bem entender. Mordo os lábios apertando minhas coxas uma na outra e sentindo meu membro endurecendo.
Observo sua glande aparecendo e desaparecendo, o pré-gozo se misturando com a espuma e minha luxúria fala mais alto ao que pressiono meu polegar, diretamente contra a fenda e apertando. O contato direto de nossas peles parece servir como estopim para o Sr. Tomlinson que solta seu copo, o som do vidro se partindo ecoa pelo cômodo e eu salto para trás, tirando minhas mãos dele.
— Seu garoto maldito. — Ele rosna com uma voz demoníaca e eu engatinho até que minhas costas batam contra a pia. Louis demonstra conhecer bem o lugar ao puxar um roupão, se colocar de pé e vesti-lo, saindo da banheira com maestria e tateando a parede até alcançar a pia e consequentemente a mim. Louis não pode se ajoelhar por isso procura uma forma de me segurar e para a minha infelicidade seus dedos se prendem em meus cabelos e Louis os agarra com tanta força que me força a levantar, estou tentando afastar sua mão do aperto violento quando seu corpo prende o meu contra a pia e me vejo sem saída.
— Louis, você está me machucando... — Choramingo e o sádico puxa com mais força meus cabelos, fazendo com que minha cabeça tombe para trás.
— Louis? Então pra você eu sou o Louis agora? Qual é o próximo, amor, benzinho, querido? — A cada palavra Louis acrescenta uma pitada de sarcasmo e desprezo na voz — Eu sou um Coronel! Enquanto você brincava de dar a sua bundinha cor de rosa para todos os seus coleguinhas da escola eu estava vivendo no inferno. — Agora ele parece estar rosnando, o aperto nunca cessando e seu rosto se aproxima da minha orelha. Posso sentir sua barba pinicando minha bochecha e eu me sinto um monstro por sentir uma fisgada na virilha com isso — Eu não sou um garotinho idiota como os que você está acostumado, eu não vou te comer só porque você é uma puta com tesão. — Tomado pelo impulso da raiva, empurro seu peito, mas Louis agarra meus pulsos e os prende atrás do meu corpo — Ainda não acabei, porra! — Luto para me afastar, porém maldosamente ele pressiona a coxa contra meu pênis duro e sensível que me faz gemer dolorido, minha cabeça cai para frente e repousando em seu ombro — Eu posso ser o ceguinho inofensivo pra você, idiota, mas se pensa que pode colocar essas mãos imundas em mim está muito enganado. Você não é o primeiro a tentar se aproveitar de mim.
Aproveitar? O quê? Não, não era isso!
— Eu não quis me aproveitar de você. — Murmuro contra o seu pescoço e tenho a impressão de ter visto sua pele se arrepiar.
— Oh, não? — Ouço sua voz irônica e então ele está me virando, deitando meu tronco na bancada da pia, mantendo meus braços presos, mas agora com uma única mão, enquanto a outra puxa minha calça para baixo me deixando completamente exposto.
— O que está fazendo? — Grito, me debatendo.
— Te educando, já que não fizeram isso na sua escola. — Louis responde com um ar zombeteiro, tudo o que meus olhos podem ver e a porta do banheiro, mais nada, eu me sinto no escuro quanto ao que ele pretende fazer, me sinto cego, totalmente a mercê, sem ter como me defender ou reagir. E é neste momento em que um tremor cobre minha epiderme, não é prazeroso, é assustador.
Seu indicador circula minha entrada, por vezes seguidas, se pressionando e deixando que a pontinha afunde. É horrível, eu não quero isso!
— Pare!
— Porque? Você está duro! Eu posso sentir isso. — Ele desliza a mão até agarrar meu pênis, provando seu ponto e o aperta — Isso é prova suficiente de que você me quer.
— Eu não te quero! — Grito angustiado, com seu dedo voltando a brincar com a minha entrada, afundando e voltando — Eu estar duro não significa nada.
— Exatamente, Harry. — De repente Tomlinson está soltando meus pulsos e puxando minha calça de volta. Ele me vira e toca meu rosto, sentindo minhas lágrimas — Você não toca alguém porque sentiu vontade, você não toca alguém porque acha que ela está com tesão por você...
— Mas você estava gemendo. — Tento inutilmente me defender.
— Eu já te disse que estou no escuro aqui, eu passo a maior parte do tempo imaginando e sonhando com coisas, quando aquilo começou eu estava me imaginando nos braços da minha esposa. Em nenhum momento eu pensei que aquilo era real até que você me acordou. — Droga, o que eu pensei que estava fazendo. Olho para a banheira cheia de água e me afogar parece uma ótima idéia — Qualquer coisa que você for fazer envolvendo outra pessoa, precisa ser de comum acordo. Ambos precisam estar cientes. Se uma delas estiver inconsciente, como era o meu caso, ou imobilizada, como era o seu caso, é abuso. Se aproveitar, tocar, beijar ou qualquer tipo de contato feito com alguém contra a sua vontade é abuso, Harry.
Meu Deus, ele tem razão! Ele tem toda a razão do mundo! Abaixo a cabeça, sentindo uma nova remessa de lágrimas chegando, em meio aos soluços eu lhe peço perdão até perder as contas.
— Tá, tá, chega disso! — Louis pede me dando um tapinha no ombro — Agora vá chamar Sarah e diga que preciso de ajuda para me vestir.
— Eu posso...
— Não, você não pode!
Xx
Sarah continua me olhando atravessado o resto da manhã. Ela não sabe o que levou o Sr. Tomlinson para me dispensar, mas deve alimentar suas suspeitas. Depois de horas sendo encarado e xingado vez ou outra eu vou para a biblioteca, aproveito que estou só para perambular, conhecer melhor os exemplares e ver se algum me agrada. Estou caminhando pelo segundo andar quando Liam entra acompanhando Louis.
— Harry! Olá, como vai? Quase não te vi hoje. — Liam saúda com seu sorriso doce, apertando os olhinhos e eu me derreto por completo.
— Estou bem e você? — Me apoio no corrimão dourado, sorrindo de volta para ele.
— Igualmente. O Sr. Tomlinson se fatigou do quarto e quis vir até a biblioteca, a Srta. Charlotte precisa que eu a leve até o centro, pode ficar com ele agora?
— Sim, é claro!
— Certo. — Liam ajuda Louis a se acomodar em sua poltrona e com um aceno, parte, nos deixando sozinhos. Hesito em ir até ele, embora a culpa tenha sido toda minha, ainda me sentia mal ao pensar no quão fácil ele me prendeu e me tocou daquela forma tão desagradável. Por isso continuo no segundo andar.
Apenas vinte minutos depois o Sr. Tomlinson se preocupa em me dirigir a palavra.
— Senhor? — Digo, após ouvir seu chamado.
— Onde você está?
— Aqui em cima, no segundo andar.
— Poderia me trazer um livro. O morro dos ventos uivantes de Emily Brontë. — Ele pede com a voz branda e eu me coloco a procurar, não é tão fácil de achar. O livro é velho, a capa preta já desbotada tem o nome quase todo apagado. As páginas amareladas com alguns pedaços se desfazendo. Não entendo porque pessoas tão ricas manteriam livros em um estado tão deplorável dentro daquela magnífica biblioteca, mesmo assim vou até Louis e entrego o livro esperando que ele começasse uma de suas leituras sem muito sentido.
— Não, eu quero que você o abra na página... 158, se não me engano está lá. — Franzo a testa, mas faço o que me pede. Quando encontro a página me deparo com o esqueleto do que fora uma flor um dia, o cabo fino carcomido pelo tempo e as pétalas murchas num tom de vermelho escuro. A seguro entre meus dedos e meus olhos caem no trecho grifado do livro: — Não posso viver sem a minha vida! Não posso viver sem a minha alma!
— Mesmo que eu viva mil vidas estas ainda permanecerão sendo as palavras mais verdadeiras que há. — Louis comenta, aparentando felicidade por eu ter lido o trecho — A rosa está aí, criança?
— Sim, senhor.
— Ótimo! Pegue o estojo na última prateleira da estante ao lado da lareira. — Pego o estojo e trago até ele e o abrindo.
Meu queixo cai ao me deparar com o que está lá dentro.
— Venha, Harry. Pegue a rosa e o fuzil e vamos brincar de tiro ao alvo lá fora. Está na hora de você pagar pelo seu pecado de hoje de manhã
Xx
Louis Tomlinson não blefa.
Quando ele disse aquilo na biblioteca eu rezei para que fosse uma brincadeira de mal gosto. Mas não era. Louis tinha criado uma pequena lista de últimas coisas para fazer e entre elas estava a de acertar um pequeno alvo a onze metros de distância. Seu alvo era a flor, que naturalmente precisaria ser sustentada por algo ou, no caso, alguém. Exatamente, como castigo pelo que eu fiz mais cedo, tive de segurar a rosa, enquanto Louis se posicionava empunhando um maldito fuzil de guerra.
Eu não tinha muita escolha. Ele me ameaçou com a história do bebê novamente. Ou eu morria, ou morria. Ao menos uma bala de uma AK—47 parecia menos indolor do que um aborto seguido de uma execução.
Com todos longe o bastante, nada ficava no seu caminho. Louis parou na distância que ele determinou ser a correta.
— Mais pra direita. — Gritei o auxiliando e ele me deu o dedo do meio.
Aproximei a rosa do meu nariz e ela ainda era perfumada. Quando Louis gritou para mim a afastei do rosto e a deixei no ângulo, fechei os olhos quando ouvi o disparo, mas os abri a tempo de vê-la sendo explodida em meus dedos, as pétalas voando para todo lado e o rastro da bala que se alojara em uma árvore. Ainda estava extasiado quando um novo disparo foi feito contra o cabo da rosa, a soltei no chão. Fora a um ou dois centímetros da minha mão.
— Você já tinha acertado, porque outro disparo? — Grito o observando abaixar o fuzil e rir se sentando na grama.
— Pra ficar de aviso!
— Aviso de que? — Bato o pé, marchando até ele. O carro de Charlotte adentrando aos portões.
— Que se você ousar me tocar novamente perde as mãos. Entendeu?
— Sim, senhor. — Concordo, parando em sua frente.
— Bom, agora faça as malas, vamos partir amanhã cedo.
— Pra onde?
— Paris, meu caro, a cidade do amor.
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