4 • | everything I do, I tell you all the time
— Styles! — Louis chama minha atenção pela terceira vez e eu me afasto, de novo — Enfia a porra da mão no meu prato mais uma vez e eu mordo ela.
Ignoro suas palavras e quando Louis sofre para tentar cortar seu filé eu me intrometo novamente, e descubro que ele não estava blefando e realmente finca os dentes na minha mão quando me aproximo de seu prato.
— Meu deus, Tomlinson, você é maluco ou o que? — Grito furioso, puxando minha mão que agora ostenta as marcas profundas de seus dentinhos afiados — Seu cachorro. — Digo só pra mim e é claro que ele escuta.
— O cachorro e a girafa, é divertido. Gostei disso, Styles. — Ele ri, quase cortando a manga solta de sua camisa ao invés do seu almoço, mas estou aborrecido e não quero mais ajudar — Ora, vamos fale comigo. — Continuo calado, esfregando minha mão tentando aliviar a dor — Harry, onde está a sua compaixão, eu sou cego!
— Usa a cegueira só quando conveniente?
— Naturalmente.
— Argh, vai se ferrar.
— Vai se ferrar! — Ele repete, imitando até mesmo a minha voz.
— Vai me imitar agora?
— Vai me imitar agora?
— Sr. Tomlinson, por favor.
— Sr. Tomlinson por favor.
— Porque você é tão irritante?
— Porque você é tão irritante?
— Infantil!
— Infantil!
Respiro profundamente, massageando as têmporas e olhando de canto de olho que ele está atento, esperando a próxima palavra.
— Certo.
— Certo.
— Harry é lindo.
— Harry é lindo.
— Louis é idiota.
— Opa, nada de dizer mentiras aqui, rapaz. — Balança o indicador de um lado para o outro, reforçando sua ideia.
— Então, concorda que eu sou lindo?
— Pode ser. De qualquer forma eu sou cego, meu julgamento não é confiável e nos poucos dias em que esteve aqui ninguém fez comentário algum sobre sua aparência, então acredito que você não é grandes coisas.
— Eu era o mais bonito de Holmes Chapel. — Me defendo, ofendido. Realmente ninguém pareceu muito impressionado pela minha beleza o quê é bem raro.
— Em Holmes Chapel só tem poeira e rato, a concorrência é bem leve. — Louis continua a me provocar, dando um longo gole em seu vinho.
Estamos caindo na rotina. Oito dias se passaram desde minha chegada a Londres, eu e Louis ainda estamos no período de adaptação. Lottie me instrui quanto as minhas obrigações que basicamente são:
Não deixar que o Louis se machuque.
Não deixar que o Louis se sinta sozinho.
Não deixar que o Louis chegue no armário de remédios.
Nem que fique sozinho durante o dia.
Não deixar que o Louis receba visitas de estranhos, nem fique em pé por muito tempo.
Semana passada ele zombou de mim dizendo que eu era sua nova babá e não é que ele tinha razão. Liam o levava de carro para a cidade, o ajudava a cavalgar, jogava xadrez com ele — ainda não entendo como fazem isso — batem papo e afins, às vezes ele consegue convencer Louis a deixá-lo carregar até o andar de cima. No dia seguinte ao episódio no quarto de Louis, Charlotte me contou que durante a guerra ele foi um dos soldados a ficar preso na ilha de Dunquerque e que durante o tempo em que esteve lá sofreu um ferimento na perna, na época não parecia nada, mas pela falta de cuidado ele contraiu alguma bactéria maligna que estava devorando os nervos e tecidos de sua perna. Nenhum médico havia conseguido localizá-la para realizar a remoção e a dor era insuportável, a cada semana mais e mais tecidos eram rompidos e sua locomoção ficava cada vez mais comprometida. Quando perguntei se havia alguma forma de pôr fim a dor ela disse que eles poderiam amputar a perna de Louis ou simplesmente esperar até que ela se tornasse um membro inútil e sem funcionalidade, embora Bebe tenha certeza de que ela irá para a outra perna.
Em pouco tempo Louis não seria apenas cego, mas também aleijado.
Acho que ele pensa bastante nisso e por isso tem seus momentos depressivos. Lottie me instrui a ficar ao seu lado nessas ocasiões, mesmo que ele se irrite com a minha presença e xingue até meus antepassados na esperança de que eu vá embora. Mas eu não vou. Eu preciso ficar.
Sendo assim, até hoje Louis e eu nunca estivemos completamente sozinhos. Até hoje.
— Boa tarde, meninos. — Lottie nos saúda, vestindo roupas elegantes denunciando que está de partida.
Lottie está noiva de um rapaz chamado Tommy há três anos, eles ainda não se casaram por causa de Louis. Ele se recusava a ir morar com os dois ou deixar que Tommy se mudasse para a sua casa, determinada a não abandoná-lo, ela deixava o casamento de lado pelo bem estar de Louis. Porém, acredito que desde que eu milagrosamente consegui um abraço de Louis — o qual ele não se lembra — ela acredita que eu sou a pessoa ideal para quem ela pode entregar a segurança do irmão e eu farei todo o possível para que ela acredite nisso, Louis é cego, Clare só tem olhos para seus pratos e Sarah e Liam são dois bobos apaixonados que se derretem toda vez que se vêem, Lottie é a única de quem eu não poderia esconder minha gravidez. Preciso que ela esteja fora dessa casa, ocupada demais com sua nova vida. Sem ela eu poderia usar roupas largas e ninguém notaria, sairia num belo dia e voltaria no outro, sem bebê, sem barriga e livre.
— Não sei o que tem de bom. — Louis larga os talheres e cruza os braços em cima da mesa — Você me larga o dia inteiro com esse moleque tapado.
— Louis William Tomlinson, seja gentil, por favor. — Lottie pede com sua fala controlada, ajeitando as luvas em suas mãos. Algo que pude perceber nesses dias é que ela tem uma ligação tão profunda com o irmão que de certa forma absorve suas dores. Louis tem queimaduras na mão direita e por isso está sempre usando uma luva de couro, Lottie vive com luvas mesmo que não haja nada de errado com suas mãos. Nos dias em que Louis está mancando, ela também começa a mancar e em alguns dias a vejo perambulando de olhos fechados, privando a si mesma da visão.
É doloroso ver a forma como ela se prende a ele.
— Não dê atenção, Srta. Tomlinson, está de saída?
— Bem, sim. Tommy gostaria que eu fosse até a costureira ver o vestido de noiva e que eu tomasse chá com ele em nossa casa.
Eles também tinham uma casa onde ninguém morava.
— Isso é bom, divirta-se!
— Não sei se deveria ir. Você acabou de chegar...
— Já estou aqui há uma semana, tudo estará sob controle. — Asseguro estranhando o quão silencioso Louis está.
— Ainda assim, hoje é a folga de Liam e Sarah e a Clare é tão distraída que...
— Charlotte. — Me levanto e vou até ela, colocando minha mão no peito — Tem minha palavra de que nada acontecerá ao seu irmão. Eu cuidarei dele.
Ela hesita por um instante e então suspira como se o peso do mundo tivesse sido tirado de seus ombros miúdos.
— Eu confiarei em você, Harry. Por tudo o que há de mais sagrado, não me decepcione. — Ela suplica, dando um leve carinho em minha bochecha e passando pelo irmão, depositando um beijo no alto de sua cabeça — Eu volto em breve, Lou.
— Tá, tá, mamãe. — Responde enfezado e ela sai rindo, tentando disfarçar a preocupação.
Olho em volta, o som quase imperceptível de uma ou outra panela na cozinha. Clare vai esquecer que existimos até o horário do jantar, então somos só nós dois, me viro para Louis arqueando uma sobrancelha a espera de um comentário sarcástico ou revirar de olhos e é quando me dou conta de que expressões corporais ou faciais não valem de nada pois ele não me vê. Às vezes isso é tão frustrante.
— Sr. Tomlinson, o que gostaria de fazer hoje?
— Matar o Harry é uma opção?
— Nope.
— Então nada. — Ele diz e eu acabo gostando de poder revirar os olhos sabendo que ele não pode me ver.
Xx
Não havia se passado nem uma hora desde que Lottie tinha colocado os pés pra fora de casa e eu já me sentia angustiado olhando no relógio no topo da sala desejando que as horas passassem mais depressa, o que não aconteceria apenas pela força do querer e com isso eu permanecia preso a Louis Tomlinson.
Era uma calorosa tarde de quinta-feira, eu podia ouvir de longe o som dos carros, das fábricas e todo o furor da cidade grande. Estava me coçando para ir até lá, conhecer o Big Ben e todas as maravilhas da qual Londres é tão mundialmente conhecida, sem falar que eu precisava ir a aula.
Oh meu Deus, as aulas!
Eu tinha tomado uma atitude imbecil, diga-se de passagem, de me matricular em uma escola não muito longe daqui para que pudesse terminar meus estudos. Mesmo estando aqui há uma semana não me lembrei de ir até o colégio, eles irão estranhar e ligarão para os meus pais querendo saber o motivo da minha ausência e então será o meu fim. Eles descobrirão que eu não estou em Eton, mas sim me escondendo em Londres para ter um bebê. Será o caos, eu preciso ir até lá e dar alguma desculpa.
Olho por cima do ombro e Louis continua a folhear um velho livro de páginas amarelas e capa de couro. Estamos em sua biblioteca que parece ter saído de algum conto fantasioso, com estantes que alcançam o teto, repletas de exemplares alfabeticamente catalogados e mesas de estudo, com poltronas e uma lareira ainda maior do que a da sala. Ela é construída no formato oval, não deixando que haja cantos e possui uma escadinha que leva ao segundo e até terceiro andar para que se possa alcançar os livros no topo da estante. Louis ameaçou me dar um soco quando eu não o deixei subir. Seria um ótimo primeiro dia de trabalho oficial, deixá-lo despencar escada a baixo.
Mas ele não foi tão colaborativo quando eu me ofereci para ler o livro pra ele. Ele atirou um candelabro, por sorte sem velas, em mim e praguejou pela meia hora seguinte. Louis se recusava a aprender o braille e não usava uma bengala, por mais que gostasse de fazer piadinhas sobre sua cegueira ele ainda tinha sérias dificuldades para aceitar suas próprias limitações.
Fechei o meu exemplar de O Retrato de Dorian Gray, não que eu tivesse escolhido lê-lo, Louis tinha tacado ele em mim e era um dos poucos livros que eu me permiti ler na escola. Suspirei alto o bastante para que ele pudesse me ouvir de suas acomodações próximo a lareira apagada, mas Louis fazia seu joguinho preferido de ignorar a minha existência.
— Ficou surdo também? — Pergunto, tentando quebrar o gelo e me preparando para alguma grosseira que surpreendente não vem.
Ele não diz nada. Silêncio total.
Vou até ele, o olhando com cuidado. Estranhamente ele parece não notar minha presença e continua com seus olhos opacos perdidos em sua própria escuridão. Ajoelho diante dele e faço uma burrice do tipo balançar a mão em frente ao seu rosto. Não há resposta da pupila, que surpresa, senhoras e senhores. Dou um tapa na testa por isso e toco uma de suas mãos que repousa sobre o livro.
— Sr. Tomlinson. — Chamo com a voz baixa — Sr. Tomlinson, pode me ouvir?
— Ela... Ela estava chorando. — Diz, a voz trêmula e uma lágrima desliza por sua bochecha. Confuso, eu a seco e Louis agarra minha mão, a mantendo em seu rosto.
— Porque ela estava chorando?
Olho ao redor, sem frascos ou qualquer resquício de remédio. Ele não poderia ter nenhum escondido na biblioteca, eu teria percebido, mesmo assim ele parece estar delirando.
— Porque as crianças estavam quietas demais. — Louis diz, o aperto em minha mão aumentando — Eu me lembro de ter ido até elas, pareciam tão serenas, os rostinhos angelicais, adormecidas no sono sagrado. Seria belo, se não fossem seus crânios abertos.
Minha garganta fica seca e eu prenso os lábios firmemente uns nos outros para não imaginar crianças inocentes com crânios abertos. O que se torna ainda mais difícil quando Louis prossegue.
— Eles faziam aquilo com crianças judias que encontravam fora dos campos. Abriam suas cabeças, arrancavam seus cérebros e davam aos cães. — A bile sobe a minha garganta com o pensamento perturbador.
— Louis, por favor... — Tento puxar minha mão.
— Coronel Tomlinson, Coronel Tomlinson, venha ver o que fizéssemos as suas crianças! Era o que eles gritavam quando eu cheguei na porta. Lydia tinha os dedos em carne viva tentando cavar um túmulo para esconder seus cadáveres e impedir que eles continuassem a desmembrar nossos filhos.
— Sr. Tomlinson, você está delirando. Precisa voltar a si. — Balbucio e eu não sei se é devido a gravidez ou sou eu mesmo, mas ouvir um episódio macabro sobre a guerra está me nauseando de uma forma que eu tenho a impressão de ser capaz de vomitar meu coração — Eu não ouvir isso...
— O que quer ouvir então, criança? O som dos passarinhos cantando pela manhã na sua janela, a risada doce de uma criança, a voz melodiosa de uma cantora ou os estalidos de um beijo apaixonado? Eu ouvi tudo isso, mas nada se compara a gritos desesperados de uma mãe que perde seus filhos e implora para que você faça algo, para que os salve.
As unhas de Louis se cravando em minha mão, somada a sua expressão vivaz como se ele estivesse revivendo o momento me fazem cair de joelhos por entre suas pernas, apenas partilhando de sua dor.
— V-você não conseguiu salvá-los?! — Mantenho o rosto erguido para poder olhar para ele. O maxilar trincado relaxa quando seus lábios se partem em um suspiro choroso e sua cabeça tomba para frente, a testa se apoiando na minha.
— Abby e Will. Eram tudo pra mim e naquele dia eles morreram nas mãos dos nazistas imundos. — Sinto sua respiração indo de encontro a minha e deixo que uma de minhas mãos repouse em sua coxa — Lydia, minha esposa amada, o amor da minha vida, a luz dos meus dias, eu vi seus olhos se apagarem antes que a faca viesse de encontro ao seu pescoço, foi quando eles formaram uma fila para estuprá—la. — Engasgo, encolhendo meu corpo ainda mais entre suas pernas — Eles me fizeram ver tudo. Cada segundo em que destruíam minha família, me lembro de a todo momento estar gritando para que eles acabassem com aquilo que me matassem de uma vez. Eles não me mataram, porque daí tudo perderia o sentido e eles tinham planos para mim. Havia um soldado, ele era gigantesco, Gordon era seu nome. Ele quebrou todos os ossos do meu corpo e bateu minha cabeça contra o mesmo chão de pedra que ele tinha violentado minha esposa minutos atrás, ele fez isso até que eu desmaiasse. Então, quando eu acordei, tudo o que eu conseguia fazer era mover essa mão. — Louis levanta sua mão queimada e desliza por meus cabelos, puxando meu rosto para mais perto do seu — Foi graças a ela que eu consegui me arrastar, talvez por horas, dias, eu não sei. Mas conseguiram me encontrar e me levaram até Bleta, ela conseguiu pôr meus ossos no lugar, me ensinou a andar e falar novamente, porém meus olhos nada mais podiam ver e o pior de tudo, você sabe qual é a pior parte, criança?
— N-não, senhor.
Ele ri contra a minha boca, roçando levemente os lábios nos meus, inconsciente de seu ato eu me afasto e sua mão se fecha violentamente em meus cachos, criando uma ardência em meu couro cabeludo.
— Qual foi a última coisa que eu vi? — Louis grita, entrando em seu estado histérico como na primeira vez em que o vi.
— Louis... — Digo em meio a uma súplica com medo de sua reação. Ele pode não ver, mas eu certamente sou a pessoa inofensiva aqui.
— Você diz meu nome como ela fazia. Tão suavemente. A sua voz é doce e macia. — Sua fala acalma e o aperto se dissolve em uma carícia — Sinto falta deles o tempo todo. Já fazem treze anos. Treze malditos anos. — Ele soluça e lágrimas salgadas começam a banhar seu rosto e pela proximidade o meu também. Suas lágrimas em minha pele me fazem fechar os olhos e pensar que eu encontrei alguém um milhão de vezes mais fodido do que eu — Dói tanto.
Concordo, minha mão ainda em seu rosto desliza pelas maçãs de seu rosto até seu queixo. O carinho constante de seus dedos em meu cabelo me deixa sonolento e eu permito que ele chore sobre mim o tempo que achar necessário, até que a minha boca grande resolva estragar tudo.
— Eu entendo.
Bebe me alertou sobre as constantes variações de humor que Louis sofria, mas eu não esperava por uma agora. Suas mãos antes ternas e carinhosas agora me empurravam com força contra o chão, fazendo minhas costas baterem na mesinha de centro. Mesmo cegos seus olhos transbordavam ira, os punhos fechados prontos para golpear quem se aproximasse.
— Entende? Você não entende nada! Criança estúpida! — Ele cospe, lançando seu livro em minha direção. Consigo desviar a tempo, mas Louis insiste em tacar o que encontra pela frente, mesmo que não consiga descobrir a onde estou ele continua a jogar livros, candelabros, tudo — Eu estou no escuro aqui! Na porra do escuro, o tempo todo!
— Louis...
A menção de seu nome só o fez mais alucinado.
— Não, não diga o meu nome. Não abra essa maldita boca pra me dirigir a palavra. Você é um garoto estúpido e eu o quero longe de mim. Vá embora. — Grita, as veias em seu pescoço estão ainda mais grossas e parecem a ponto de estourar.
— Eu não vou embora. — Digo com firmeza, embora esteja covardemente debaixo da mesa. Como também me foi avisado, seus outros sentidos trabalhavam muito bem e não deveria ter sido surpresa quando ele seguiu tateando o lugar até alcançar minha mesa, agarrar as bordas e virá-la de uma vez só. Não tive tempo para registrar o ocorrido e logo tinha suas mãos agarrando a gola da minha camisa e me prensando contra a parede.
— Você vai sair, vivo ou morto. — Sua voz é baixa e perigosa e meu coração afunda.
— Por favor, não me mate. — Murmuro quase em pânico com a força que ele me segura, afastando meus pés do chão.
— Me dê um bom motivo. — Rosna e em uma de suas mãos há uma adaga de punho vermelho-sangue e sei que ele não está blefando. Louis nunca blefa.
Um bom motivo.
Um bom motivo.
Um bom motivo.
Minha demora o deixa impaciente e ele leva a adaga até o meu pescoço e eu grito o único motivo que existe para que eu continue vivo.
— Eu vou ter um bebê! — Pressiono os olhos com toda a força, o que me leva a saber o que houve são os sons: Sua respiração vacilante, a adaga caindo no chão e passos se distanciando.
Quando torno a abrir os olhos, Louis está distante, de costas para mim.
— Saia da minha casa. — Murmura — Se em uma hora você ainda estiver aqui eu mato você e seu maldito bebê.
Estremeço com suas palavras. Lanço um último olhar as suas costas e eu não sou capaz de sentir pena por suas perdas, nem empatia como antes. Tudo o que sinto por Louis Tomlinson neste momento é medo.
Então, eu corro o mais longe possível dele.
Xx
Consigo enfiar todas as roupas que havia colocado nas gavetas de volta na minha mala em poucos minutos. Tenho o coração acelerado enquanto dou duas voltas no cachecol vermelho em meu pescoço e visto um sobretudo, o tempo está quente, mas não sobrou espaço para guardá-los. Tropeço nos meus próprios pés, tentando arrastar a bagagem enquanto olho para todos os lados com medo de que aquele psicótico me encontre, agora ele sabe o meu segredo e tenho pouco tempo até que ele conte a todos e a polícia chegue, desço as escadas o mais rápido que consigo sem tropeçar e sair rolando e para o meu desespero, uma Clare sempre sorridente me espera.
Oh, meu deus, ele contou pra ela!
Sem escapatória, paro no final da escada, agarrado a minha mala com os olhos vidrados nela.
— Algum problema com seu quarto? — Aponta para a mala e eu nego — Não me diga que está querendo trocar de quarto, a Srta. Tomlinson gostaria que ficasse o mais próximo possível do patrão ou pretende ir embora? — Seus pequenos olhos se arregalam em espanto.
— Não, eu só... só queria organizar algumas coisas e queria poder continuar de olho no Sr. Tomlinson na... Biblioteca!
— Ele ainda está na biblioteca?
— Sim.
Clare franze o nariz, olhando para a porta da biblioteca e se move, pensando em ir até lá. Entro em sua frente.
— Desculpe, Clare, mas o Sr. Tomlinson não gostaria que ninguém o incomodasse. — Digo, em parte por não querer vê-lo e outra por não ter tanta certeza de que ele está lá dentro.
— Tem razão. Eu só fiquei preocupada por um momento. Você é um bom garoto, Harry, tenho certeza que está cuidando muito bem dele.
Meu inconsciente dá uma risadinha nervosa e eu descaradamente concordo.
— Okay, querido. Irei continuar com os preparativos para o jantar. — Ela afaga rapidamente meus cachos e refaz seu caminho de volta à cozinha.
Tenho o caminho livre, mas ainda não faço a menor ideia do que fazer quando chegar em Holmes Chapel. O telefone da sala de estar dos Tomlinson parece brilhar da onde estou, caminho até ele, deixando minha mala ao lado do sofá e vasculho nos bolsos até encontrar o número da casa de Zayn. Rezo para que ele me atenda, estamos nisso juntos.
Disco o número, ouvindo chamar. O tempo de espera parece uma eternidade e estou quase terminando de contar as bonequinhas de porcelana acima da lareira quando uma voz familiar invade meus ouvidos.
— Alô?! — É Zayn. É ele quem está falando do outro da linha. Sua voz é tão bonita e eu senti tanta saudade em ouvi-la. Minha boca se abre para lhe dar uma resposta, contudo um estrondo me emudece — Alô? Tem alguém aí?
Essa não. Os estrondos só continuam e mesmo sendo contra a minha vontade eu coloco o telefone de volta ao gancho, e marcho em direção a sucessão de barulhos. Se não me engano alguém sofreu uma queda e eu sei bem quem foi.
Não conheço muito bem a casa, acabo me perdendo entre um corredor ou outro até alcançar a porta escancarada de onde o som ecoou, ele é escuro e no primeiro degrau sinto a madeira sob meus pés cedendo. Tateio a parede e ligo o interruptor, é o porão, e no final da escadaria está meu patrão estatelado com vários pedaços de madeira velha ao redor. Completamente imóvel. Sem hesitar pulo o primeiro degrau e desço correndo pelos demais, afasto os pedaços de madeira que por sorte não tem nenhum prego ou parafuso presos, mas alguns são um tanto pesados e tudo o que ouço é a voz da doutora Rexha na minha cabeça repetindo "Ele não pode tropeçar ou cair em hipótese alguma"
Bem, se eu tiver matado Louis Tomlinson não vai ser tão prejudicial, estava condenado a cadeia de qualquer jeito mesmo. Sento no chão e puxo seu corpo para o meu colo, ele parece tão pequenino e frágil, desacordado com o cabelo nos olhos. Afasto sua franja e mordo o punho para não gritar, sua testa tem um corte enorme, é superficial, mas sangra o suficiente para manchar toda a lateral de seu rosto e é justamente no rosto, onde qualquer um pode ver que sim, ele caiu.
Arranco o cachecol e coloco sobre a ferida, estancado o sangramento e Louis abre os olhos e eu, ainda incapaz de me acostumar que ele não pode me ver, os encaro, à procura de uma emoção, qualquer coisa. É tão difícil depender de suas palavras que na maior parte do tempo não fazem sentido.
— Quem? Quem é? — Balbucia aturdido, piscando sem parar.
Pressiono o pano com mais força e ele geme pela dor, escondendo o rosto no meu peito e agarrando meu antebraço com os dedos trêmulos.
— Sou eu. O Harry. — Mordo os lábios, vendo seu corpo inteiro enrijecer.
— Pensei que tivesse te mandado embora.
— E eu vou. Depois que te tirar daqui.
Tenho a impressão de ouvir um rosnado e Louis se esforça para se sentar, estapeando minha mão para que eu me afaste do seu ferimento.
— Eu não preciso da sua ajuda. Não toque em mim.
— É claro que precisa, você caiu. Deve estar sentindo dor. — Digo, continuando a tentar estancar o sangramento. Louis consegue segurar meu pulso e o aperta até que eu sinta dor — Meu deus, eu só quero te ajudar porque você não colabora?
— Porque eu não quero, seu caipira burro. — Num movimento rápido, ele acerta o cotovelo no meu peito e eu caio para trás, sem paciência para as suas malditas oscilações de humor. De manhã até a hora do almoço Louis era uma pessoa e desde então virou essa criatura hostil — Porque não vai abrir as pernas e deixar que enfiem mais bebês caipiras em você?
É a gota d'água pra mim. Me afasto, indo em direção às escadas e meus pés produzem sons pesados a cada passo.
— Foda—se, se vira sozinho então, eu cansei de você. Estou indo embora.
Estou quase alcançando a porta, quando Louis suspira o meu nome, viro para ele, encontrando seu corpo ainda sentado, o rosto sujo de sangue e os olhos girando perdidos pelo sótão.
— Eu não consigo...
— Não consegue o quê? Ter educação? Eu notei. — Cruzo os braços diante do peito.
— Não, eu não consigo andar, a minha perna esquerda... Não posso mexer-la, se eu fizer vou começar a sentir muita dor. — Falou constrangido, apertando a coxa, ele a moveu um pouco e soluçou.
— Pensei que não precisasse de mim. — Continuo a provocar, apesar de já estar descendo para ajudá-lo.
— Eu não preciso!
— Okay, então! — Bato o pé na escada, fingindo estar saindo, quando estou em pé bem ao seu lado.
— Não, espere, eu me enganei. Eu preciso de você, preciso da sua ajuda.
Fico em silêncio.
— Por favor...
Dou a volta, passando seu braço por meu pescoço e apoio todo o peso do lado esquerdo de seu corpo sobre o meu. Com cuidado nós subimos degrau por degrau e ele quase não resmunga ao que o carrego no último degrau. Em poucos minutos ele está sentado em sua poltrona na sala, comigo sentado ao braço da mesma terminando seu curativo na testa. Louis tem um copo de licor na mão e "observa" as chamas amareladas na lareira consumindo seu par de botas que ele culpou por terem causado sua queda e não o próprio por ter se aventurado a procurar sua antiga mesa de boticário sendo incapaz de ver.
— Harry!
— Sr. Tomlinson? — Digo, terminando de guardar os esparadrapos dentro da caixinha de primeiros socorros.
— Tem um remédio naquela estante, próximo a janela, pegue pra mim, sim?
— A doutora Rexha disse que ela era a única que te medicava.
— Não é medicação é só algo pra aliviar a dor nos meus ossos já que eu caí. Imagino que Lottie ficaria furiosa se soubesse o que você deixou acontecer. — Louis comenta de forma casual, passando o indicador pela borda do copo.
— Ela entenderia se eu dissesse de seu ataque na biblioteca e seja como for, não importa pois estou de partida.
— Vai mesmo embora?
— O senhor exigiu isso, está esquecido?
— Tenho a memória fraca, mas não deveria levar em consideração o que digo em momentos como aquele. Às vezes sou assombrado por meus fantasmas do passado.
— Pouco me importa. Estou indo. — Abaixo para pegar minha mala e seus dedos se enroscam em meu pulso — Solte-me.
— Claro, você precisa voltar para a charmosa Holmes Chapel. Diga-me, Harry, seus pais sabem de seus gostos particulares?
— O que? Não te interessa. — Tento puxar a mão, mas Louis é mais forte do parece e me puxa de volta. Caiu sentado no braço da poltrona, com o rosto acima do seu. Um sorriso perverso crescendo em seus lábios finos.
— Como são seus nomes?
— Desmond e Anne.
— Hm, posso imaginar o Sr. Desmond Styles como alguém imponente, severo e disciplinado, a Sra. Anne Styles como alguém religiosa, prudente e conservadora. Tem irmãs ou irmãos?
— Uma irmã mais velha. Gemma.
Por que diabos estou lhe dando tantas informações a meu respeito?
— Gemma. É um lindo nome, para uma linda jovem, creio eu. Mas você é o caçula, o filho homem, o responsável por passar o nome Styles adiante. Seus pais devem adorá-lo como um deus, estou certo, meu estimado bebê girafa?
Olho para baixo sem entender o que ele quer com aquilo e como está adivinhando tão bem coisas sobre eles.
— Tipo isso.
— O que acha que Anne faria se soubesse que o doce anjinho dela está carregando outro anjinho? Ou quem sabe o Des, hein? Será que ele ficaria com a chegada do netinho? A propósito, você tem um namorado, Harry? — Suas palavras são denotadas de uma perversidade e zombaria que me enjoam. Luto para me soltar e seu aperto só se intensifica e ele me puxa para mais perto — Deixa eu adivinhar ele não está nem aí pra você e mesmo que tivesse não daria em nada, porque você é um poço de perigo, primeiro por ser homossexual, depois por estar esperando um bebê quando todos sabem que é proibido. A sua existência é um crime, Styles! Se alguém suspeitasse, Deus, você estaria perdido.
— Você vai me entregar?
— Não, minha criança. — As pontas de seus dedos acariciam a lateral do meu rosto, descendo até minha boca — Eu quero te ajudar. Fazê-lo rico! — Franzo as sobrancelhas, sem entender e ele pressiona o indicador em meu lábio inferior — Mas eu vou precisar de um favor.
— Que favor?
Louis levanta minha mão até sua boca e beija lentamente cada um dos meus dedos e não há nada de sensual ou romântico no que faz, pelo contrário, é frio e mórbido. Seus toques me assustam.
— Pegue o remédio pra mim, girafinha. — Torço o nariz, mas faço o que ele pede porque não é como se eu tivesse muita escolha. Encontro o pequeno frasco azulado e levo até ele — Pingue duas gotas no meu liquor.
Faço o que ele me pede e entrego sua bebida. Louis a toma num único gole e sorri satisfeito.
— Para que serve isso? — Pergunto, me sentando no sofá ao seu lado.
— Para acabar com a dor. — Suspira, tateando a garrafa e conseguindo encher novamente seu copo — Para sempre.
— Como...?
— É simples, Harry. Você me dará duas doses ao dia deste remédio por três dias e ao fim do terceiro, eu terei uma parada cardíaca. Eu vou morrer e você será o meu herdeiro, você e seu bebê ficarão milionários. — Disse com um sorriso largo no rosto como se não estivesse tramando sua morte.
— Louis...
— Shhh.... — Escutamos o trinco da porta e Charlotte está de volta, sorrindo e falando sobre o casamento sem sequer imaginar o que seu irmão tem em mente para os próximos dias.
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