2 • | some kind of proof it's not a dream
Na semana seguinte eu não escapo da missa para ter um encontro secreto com Zayn. Naquele domingo eu não vou a lugar algum além do banheiro, para vomitar de cinco em cinco minutos. Tem havido boatos de uma gripe poderosa que causa enjoos e minha mãe tem os cabelos brancos com o pensamento de que eu a peguei. Então ela arranca meu pai do trabalho mais cedo, para nos levar ao hospital no mesmo dia. O Dr. Grimshaw fez uma série de exames, mas só teríamos o resultado no meio da semana.
Desta forma eu continuo acamado sentindo náuseas e dores no estômago até terça-feira quando eu acordo revigorado, como se nunca tivesse ficado doente. Estou bem o suficiente para vestir o blazer azul escuro, calças sociais e gravata listrada que compõe o uniforme do colégio e vou para a aula. Os professores sabendo do meu mal estar me mimam o dia inteiro, me livrando dos exercícios e trabalhos que tinham programado para o dia. Algumas garotas do sétimo ano me levam biscoitos e Luke Hemmings, o presidente do corpo de alunos do último ano, se enfia no armário de vassouras comigo com a desculpa de "querer me fazer sentir melhor".
O que acaba funcionando brilhantemente.
Seus fios loiros se prendem com força entre meus dedos quando eu os aperto, trazendo sua cabeça de encontro ao meu membro que ele chupa tão fervorosamente, sua mão livre massageava minhas bolas e meus olhos giram para trás quando ele pressiona firmemente os lábios na glande me fazendo gozar em sua boca. Depois de engolir tudo, Luke levanta minha calça e prende o cinto, se colocando de pé a minha frente ajeita minha gravata e até se atreve a tentar dar um jeito no amontoado de cachos bagunçados na minha cabeça. Eu sorrio com seu gesto, ele forma um paralelo interessante com Zayn. Luke é zeloso, ele cuida de mim como se eu fosse a criatura mais frágil da terra e eu meio que gosto disso também.
— Como se sente? — Ele pergunta, agora tentando arrumar o próprio topete.
— Bem melhor. — Garanto com um satisfeito sorriso que expõe as covinhas em minhas bochechas. Luke toca uma delas com a ponta dos dedos e eu não consigo parar de pensar no quanto eu gostaria de poder beijá-lo.
— É melhor irmos agora.
Ele faz menção de seguir até a porta e eu agarro um de seus braços, o impedindo.
— Espere. — Meu desejo é me jogar contra o seu corpo grande e beijar sua boca até ter meus lábios dormentes, mas sei que não devo, então apenas passo o polegar no canto de sua boca, recolhendo o resto de gozo que ainda restara e o chupo do dedo com os olhos presos aos seus azuis — Podemos ir agora.
— Eu vou primeiro, depois você sai, certo? — Concordo e Luke deixa um beijo rápido em minha bochecha antes de sair. Deixo que alguns segundos se passem até que eu também saia, discretamente, pelo corredor extenso e agora empanturrado de alunos indo de um lado para o outro no intervalo das aulas e é fácil me misturar entre eles.
Quando as aulas do dia acabam, Niall, Luke, Ed e eu estamos nos apertando em uma mesa com poltronas vermelhas acolchoadas com grandes taças de milkshake a nossa frente e a velha jukebox ecoando o novo single do Chuck Berry. Um tal de Hamilton já fez a versão branca da música, que é uma grande porcaria diga-se de passagem. Eu gosto do Miller Milk, a lanchonete local onde todos os jovens passam suas tardes, porque aqui não tem essa de música de negros ou brancos se é bom toca, sem exceções.
Luke está batucando Johnny B. Goode com os talheres e vez ou outra ele os deixa cair em seu assento só pra deslizar a mão pra debaixo da mesa e me alisar por entre as pernas pra me provocar. Niall e Ed estão em mais um de seus épicos duelos de quem consegue comer mais sanduíches sem dar um gole no milkshake. Como era de se esperar o ruivo acaba cedendo e Horan é o campeão invicto.
— Eu sempre ganho, nem tem mais graça. — Niall exclama, se espreguiçando em seu assento, os braços acima da cabeça e a gravata enterrada no bolso — Que tal eu e você, Haz?
— Não obrigado, gosto de zelar pela saúde do meu estômago. — Respondo, levando o canudo entre meus lábios e sugando o milkshake de chocolate sorrindo internamente pela forma como Luke me encara. Extasiado.
— Já pegou os resultados dos exames? — Ed pergunta em seu habitual tom preocupado, ele é o cara desesperado que espera o pior de tudo. No fim de semana quando não me viu na missa pediu ao seu pai, o xerife da cidade que começasse uma busca a minha pessoa por estar com um mal pressentimento.
— Ainda não. Eu vou mais tarde. Não deve ser nada demais, já passou.
— Tomara.
Luke pediu licença dizendo que ia ao banheiro, coincidentemente no mesmo instante em que Michael Clifford entrou pela porta. Por um segundo pensei que eles fossem se falar, mas o pai de Mike estava ao seu lado e passaram reto por ele. Mike acenou timidamente para nós e retribuímos o gesto, meio sem jeito.
— Se eu fosse ele nunca mais ia sair de casa. — Niall murmurou ainda ostentando o sorriso forçado que dera a Clifford.
— Não diga isso, não foi culpa dele. — Ed defendeu.
— Claro que foi. Ele abriu as pernas porque quis. Todo mundo sabe que esse tipo de coisa... É proibido. — O irlandês fez questão de dizer isso me olhando diretamente. Não, eu nunca havia sido aberto sobre o que eu fazia quando ninguém estava olhando, mas as suspeitas estavam sempre presentes e Niall sendo meu melhor amigo desde sempre deveria me ler feito um livro. Eu posso não contar, mas ele sabe — ainda mais tendo a possibilidade de... Bem, vocês sabem.
Claro que sabemos. Não exatamente como aconteceu, mas dizem ter sido um pouco antes da guerra, um médico louco e cruel do lado dos nazistas que fazia experiências com os judeus conseguiu mexer com seus DNA's, alterando o curso natural das coisas, ele gostava de transplantar órgãos femininos para corpos masculinos e vice-versa. Na época diziam não ter dado em nada, mas então houve o primeiro episódio de Mpreg. Ou simplesmente gravidez masculina, um rapaz homossexual em Milão estava gerando uma criança, não houve tempo para que estudassem seu caso, ou tentassem entender como isto era possível.
Os fanáticos religiosos da redondeza encararam isso como um desrespeito e afronta ao poder de Deus e o executaram. Dizem que a família exigiu que os órgãos femininos dentro dele fossem retirados antes do enterro. Depois disso outros casos surgiram e todos acabaram da mesma forma. Por isso foi decretado a lei de que um homem, sofrendo de Mpreg deveria dar fim de imediato a gestação, manter o assunto o mais sigiloso possível e interromper suas práticas sexuais imorais, do contrário estaria sujeito a pena de morte por crimes sexuais. Mesmo que não fizesse sentido algum pra mim, assim eram as coisas. Seu corpo era propriedade do estado, não seu.
No início do verão, Michael Clifford chocou todo o colégio quando teve um mal estar durante a aula. Uma professora percebendo que sua respiração estava fraca abriu-lhe a camisa para fazer uma massagem cardíaca e o queixo da classe caiu ao ver a pequena barriga de gravidez que ele ostentava. Seus pais não sabiam que ele estava com quatros meses, Luke também não. O levaram imediatamente ao hospital, os médicos realizaram o procedimento e deram fim ao problema. Mike desde então anda de cabeça baixa, seus estudos continuarão sendo em casa e ninguém tem permissão de ficar sozinho com ele. Há boatos de que estão lhe arranjando um casamento com uma jovem parisiense que não sabe do ocorrido, provavelmente a única que o aceitaria.
Eu lamento por Mike, é um bom garoto e não merecia isso.
— Luke não recebeu nenhuma punição? — Perguntei.
— Nah, sabem que o pai dele é advogado e tratou de jogar toda a culpa no pobre Michael. Foi declarado como indução a práticas imorais. Basicamente o Michael abusou do Luke perante o tribunal, mas como o pai do Clifford tem dinheiro conseguiu livrar ele da cadeia e da castração química.
Se fosse comigo estaria encrencado, meu pai poderia nos garantir estabilidade, mas nunca poderia me livrar da cadeia ou da castração química. Era uma fortuna.
— Oh, é melhor pararem de falar, lá vem ele. — Levantei o rosto esperando ver Luke, mas meus olhos se fixaram na porta onde Zayn Malik, muito bem vestido, vinha acompanhado de Perrie Edwards, a filha do padre — Mas o que é aquilo? — Niall se pronunciou vendo o mesmo que eu.
Perrie tinha um sorriso brilhante em seu rosto. O cabelo preso em uma laço rosa combinando com seu vestido rodado cheio de babados e as duas mãos apertando firmemente a bolsinha em frente ao corpo. Malik tinha as vestes simples, porém impecáveis e bem passadas, os cabelos úmidos e penteados e sorria bobo pra ela.
O corpo grande de Luke caiu ao meu lado me impedindo de ver para onde iam quando ele gritou e acenou:
— Hey, prima! — Maldição, havia me esquecido do parentesco. Outro motivo para Luke ter sido absolvido, era o sobrinho do padre.
— Luke! Olá, primo, como tem passado? — Perrie parou diante de nossa mesa, com um Malik tímido ao seu lado. Não me importei em disfarçar o quanto eu o encarava.
— Bem. Está tendo um encontro?
Suas bochechas coraram e ela olhou com um meio sorriso para Zayn que enterrou as mãos no bolso e deu de ombros.
— Podemos dizer que sim. — Sua resposta fez meu coração afundar.
— Ora, ora, quem diria, Malik. — Luke cantarolou — É melhor tomar muito cuidado com essa princesinha.
— Pode deixar. — Garantiu, sem olhar para mim, uma vez sequer. Então se virou para Perrie tocando numa mecha solta de seu cabelo — Vamos, boneca?
Precisei de toda a minha força de vontade para não chorar ali mesmo. Eu pensei que eu era sua boneca, mas pelo visto estava enganado. Eu sou um garoto e por isso sempre serei um nada pra qualquer um por quem me apaixonar.
Quando eles se afastaram, Niall e Ed começaram uma nova disputa e Luke apertou minha coxa sussurrando em meu ouvido:
— Que tal um segundo round no banheiro?
Xx
As três e meia da tarde estava sentado do lado de fora do consultório do Dr. Grimshaw. Gemma folheava uma revista com Marlon Brando na capa, uma matéria polêmica falando sobre seu insaciável desejo sexual e era um milagre que minha mãe ainda não tivesse tomado a revista da mão dela. Talvez ela não tenha visto por estar lendo outra com o rosto de Clarke Gable e um assunto não muito distante descrito na manchete. Aguardávamos até que eu fosse chamado, já que chegamos uma hora antes, mamãe levava muito a sério a tal pontualidade britânica. Provavelmente ela era mais pontual que a rainha.
Bati meus sapatos recém engraxados no chão branco quando a enfermeira com o crachá escrito Lucy parou a nossa frente, um sorriso gentil quando pediu que eu a acompanhasse.
— Olá, Har- — A saudação morreu na garganta do doutor Nicholas quando me viu sendo escoltado por minha mãe e irmã. Ele esfregou uma mão na outra e deu o seu melhor sorriso fingido — Senhoras, creio que a presença de vocês aqui não será necessária. — Dois grandes pares de olhos verdes o encararam em choque.
— Eu não acho que seja prudente....
— Mamãe, tudo bem. É rápido, pode continuar na sala de espera lendo sua revista. Voltarei em breve. — Lhe garanti, dando um beijo em seu rosto, a fim de suavizar sua expressão contrariada. Até que decidisse fazer o que pedi, arrastando Gemma para fora da sala.
— Tome cuidado, querido, se precisar de mim, grite.
— Pode deixar. — Com isso, Lucy fechou a porta deixando o doutor e eu a sós. Estava prestes a me sentar diante de sua mesa quando Nicholas instruiu que eu devesse me deitar na maca encostada à parede.
— Algo de errado, doutor? — Pergunto fazendo o que me foi pedido, deitando na maca e o observando se aproximar.
— Relaxe, Harry. — Ele pede repentinamente desabotoando meu blazer e levantando minha camisa. Suas mãos frias tocam meu abdômen e eu me encolho pela diferença de temperatura. Não satisfeito, seus dedos alcançaram o botão da minha calça e os agarro.
— O que pensa que está fazendo?
— Por favor, confie em mim. Sei o que estou fazendo. — Ele diz, Nicholas é meu médico desde que me entendo por gente, não há motivos para pensar mal dele e então solto sua mão e deixo que ele solte os botões, sua mão pressione abaixo do meu umbigo. De início há um pequeno desconforto, que cresce quando ele pressiona com mais força até se tornar doloroso e eu gritar — Isso doeu, não?
— Muito. — Choramingo.
— Tudo o que fiz foi uma pressão leve, tem sentido dores ou desconforto abdominal recentemente?
— Sim, acho que eu devo ter comido algo que me fez mal.
— E as náuseas e tonturas? Alguma alteração no paladar?
— Sei lá, eu tenho de vez em quando. — Em seguida pede para que eu me sente e escuta meu coração e pulmão, comentando que eles parecem estar trabalhando o dobro. Não dou muita atenção até que estamos sentados em sua mesa, ele abre uma gaveta com um envelope cobre e eu imagino serem os resultados dos meus exames
— Harry, infelizmente isso não é o tipo de coisa que podemos identificar, a falta de estudo e pesquisa deixa profissionais no escuro quanto a isso, então o exame que eu realizei foi feito ilicitamente. Por isso eu preciso que você seja sincero comigo. Você mantém relações sexuais com outros homens?
Meu sangue gela dentro das veias.
— O-que? N-não. Mil vezes não.
— Harry, por favor...
— Como se atreve a me perguntar uma coisa dessas. Eu vou chamar a minha mãe. — Levanto e lhe dou as costas, decidido a ir à sua procura.
— Então terei de dizer na frente dela que você está grávido? — Nicholas pergunta e eu congelo no meio do caminho com a mão segurando a maçaneta.
Incapaz de decidir entre sair correndo dali ou cair no chão e morrer.
Fecho os olhos e longos minutos se passam até que eu seja capaz de abri-los e constatar que eu estou no mesmo lugar com a pior notícia que eu poderia receber na minha vida.
— Querido, sente-se. — Ele pede com a voz branda e mecanicamente o obedeço, sentando novamente — Eu não vou julgá-lo, nem pretendo contar a ninguém.
— Mentiroso.
— Estou dizendo a verdade. Irei proteger seu segredo.
— Não pouparam nem heróis de guerra, por que se importaria em guardar o meu segredo?
— Não fui eu quem os entregou e seja como for, minha intenção não é prejudicá-lo. — Nicholas estende as mãos sobre a mesa até alcançar as minhas e envolvê-las em um aperto cálido e reconfortante — Pessoas como nós devem se ajudar.
Tenho um ligeiro instante de incompreensão até me atentar ao que ele se refere. Mesmo que estivesse me enganando para lhe confessar jamais diria ser como eu. Pessoas preferem as masmorras do que dizer algo assim em voz alta.
— E-eu já tive relações com outros rapazes. — Engulo em seco, descrente de que disse aquilo. O doutor assente parecendo nada chocado.
— Algum atualmente?
— Sim.
— Um ou mais?
Sinto minhas bochechas corarem.
— Penetração apenas com um.
— Eu fui tão tolo, acreditando que aqueles seus sangramentos nasais eram apenas uma alergia. — Resmunga consigo mesmo e meus olhos se arregalam em espanto.
— Não pode estar insinuando que aquilo era...? — Toco meu nariz e logo afasto a mão ao pensar que os tais sangramentos causados por uma alergia misteriosa coincidiam com a mesma semana todo mês.
— Sim, era e creio não ter ocorrido no último mês. — Ele está certo — Segundo o que disse esses mal estares começaram a pouco mais de um mês, nós fizemos o teste... — Minha mente vagueou até aquele mórbido teste realizado nos sapos e meu estômago embrulhou na hora.
— O resultado foi positivo. Então acho que estou correto ao afirmar que a gestação ainda está recente, entre quatro a cinco semanas.
Agora todas as tonturas, enjoos, tudo faz sentido. Como isso pode acontecer?
— Sei que deve estar em pânico. Acontece em um a cada duzentos homens. Ainda é difícil dizer ao que esse fenômeno se deve, infelizmente muitos estudiosos se recusam a fazer uma pesquisa mais profunda. Então é tudo muito vago, mas como médico é meu dever lhe encaminhar para a cirurgia de remoção do embrião o mais rápido possível.
Puxo minhas mãos de volta e envolvo os braços ao redor do corpo, de forma a tentar me proteger e consequentemente a vida que acabo de descobrir estar carregando.
Grimshaw percebe o quanto a ideia do aborto me afetou e suspira, passando os dedos por seu topete e se levanta, dando a volta na mesa e se ajoelhando ao lado de minha cadeira.
— Como médico é o que eu devo fazer. Porém, como ser humano, eu lhe aconselho a não fazê-lo. Homossexuais são caçados feito baratas nos dias de hoje, um nazista é visto como mais digno do que nós e você, Harry, é apenas uma criança que nada sabe do mundo, mas mesmo assim já se vê numa situação impossível. Sua família inteira é superprotetora e extremamente conservadora, é um procedimento delicado, não havia como realizar a extração do feto sem que eles soubessem. Além disso, estaria sujeito a lei e seria condenado por crimes sexuais. Você seria executado.
Sinto meu lábio inferior tremer e uma lágrima quente escorrer por minha bochecha ao saber do trágico destino que me espera.
— O que eu faço? Não posso tirar o bebê sem que saibam do meu crime e obviamente não posso ficar com ele.
— E quanto ao pai? Tente falar com ele. Veja se ele pode te ajudar, afinal é responsabilidade dos dois.
Falar com ele...
Zayn não quer me beijar quem dirá ter um filho comigo. Eu estou sozinho nisso.
— Certo. Eu posso fazer isso. — Minto descaradamente, fitando seus olhos escuros preocupados — Falarei com ele.
— Promete?
—Prometo. Por favor, não diga a ninguém.
— Confie em mim. — Pedi mais uma vez, segurando meu pulso — Mas não tente lidar com isso sozinho.
Xx
Eu realmente não pretendia lidar com isso sozinho. A ideia era contar a Zayn e torcer para que ele se alegrasse com a chegada do nosso bebê de cabelos negros e olhos verdes, mas as expectativas estavam tragicamente baixas, então apenas me limitei a pedalar até o bar. Já era tarde e as luzes estavam apagadas, entrei na viela, deixando minha bicicleta e me aproximando da janela, mas antes que eu pudesse entrar eu os vi.
Perrie Edwards, a santinha da cidade de quatro, seu vestido cor de rosa digno de uma princesa abandonado em cima de um caixote, os cabelos loiros sendo firmemente presos entre os dedos de Zayn que se movia selvagemente as suas costas. Os gemidos descontrolados vindo até mim como flechadas direto no peito, contudo, flagrá-los transando não se igualou a dor de assisti-lo se inclinar sobre ela e beijá-la, apaixonadamente.
Um beijo de verdade.
Porque ela merecia. Eu não era digno de tanto, não passava de um brinquedinho que ele usava e jogava fora quando bem entendesse. Coloquei a mão na barriga, me apavorando com a lembrança do que havia dentro de mim e eu somente não sabia o que fazer, não estava preparado, não podia... Eu estou sozinho. Meus pés me levam para trás até que minhas costas batam contra o amontoado de lixeiras, derrubando tudo e causando um estardalhaço. Os dois olham na minha direção e eu não sou capaz de encará-los. Corro o mais rápido possível de volta para a bike e parto mais rápido do que o vento.
Chego em casa em tempo recorde, batendo a porta atrás de mim, sentindo meu corpo inteiro tremer e minha boca seca, acho que vou desmaiar ou gritar até perder a voz, mas preciso deixar tudo isso para trás quando avisto meu pai sentado em sua poltrona. Tranquilamente lendo uma revista automobilística. Com o som dos meus passos, ele abaixa e sorri para mim.
— Querido, onde esteve?
— Andando de bicicleta. — Digo simplesmente, caminhando até ele e me jogando no sofá.
— Já são... — Des confere o horário em seu relógio de pulso antes de completar: —, oito e meia da noite, Harry. Não são horas de um garoto decente estar perambulando pelas ruas. — Balanço a cabeça sem prestar muita atenção. Um garoto decente não estaria grávido de um qualquer, então acho que tudo bem estar perambulando por aí. Sinto um lado do sofá afundar e o braço pesado de meu pai envolvendo meu ombro e me puxando para deitar a cabeça em seu peito — O que há de errado, filho? Está tão quieto, você não é assim, é a alegria desta casa.
Mataram a minha alegria, papai!
— Nada não. — Murmuro, puxando minhas pernas para cima do sofá e me encolhendo ainda mais contra seu peito, sem me importar de que estou parecendo um estupido bebê gigante — Só estou cansado, foi um longo dia.
Sinto seu peito movendo—se tranquilamente com sua respiração, em contraste com a minha, quase desenfreada. Eu nunca senti tanto medo em toda a minha vida. Aperto os olhos e seus dedos deslizam por meus cabelos, num carinho terno, quando ele diz:
— Vi o Sr. Clifford hoje, ele foi ao escritório.
— Oh, é mesmo? — Levanto a cabeça, atraído pelo assunto.
— Sim, Michael estava com ele. — Sinto uma pontada de esperança com a possibilidade de que meu pai diga algo bom sobre ele, talvez se ele não desprezar Michael também não me despreze — Eu não sei como ele tem coragem de andar com aquele menino pra cima pra baixo, fica impondo sua presença e nós somos obrigados a fingir que não sabemos o que ele fez. É tão desconfortável.
Não foi desta vez, Harold.
— O senhor não gosta dele?
— Porque eu gostaria de um mau caráter? Ele é nojento e eu quero você bem longe dele.
— Sim, papai. — Falo, mordendo o lábio, me sentindo pior do que antes, mas me arrisco a perguntar: — S-se por acaso fosse eu no lugar do Michael, o que faria?
— Isso é coisa que se pergunte, garoto! — Levanta o tom de voz, chocado.
— Hipoteticamente, pai, apenas.
— Bem, isso nunca aconteceria, sei que você é um bom garoto e se tornará um grande homem, pai de família, casado com alguém honrada, como Perrie Edwards, a filha do padre. — Me recordo bem da senhorita Edwards, porém acredito que sua honra já foi extinta — Mas se... se uma desgraça como essa caísse sobre nós eu daria fim ao seu sofrimento.
— C—como assim? — Me levanto de abrupto, encarando os seus olhos sérios e duros.
— Por mais que me doesse, filho. — Seus dedos ásperos tocam minha bochecha — Eu meteria uma bala na sua cabeça e apagaria qualquer rastro da sua existência. Não permitiria que o seu pecado manchasse o nome dessa família.
E sinto uma nova, maior e mais profunda flecha se alojando ao meu peito, justamente no meu coração. Engulo em seco, abaixando os olhos e voltando a me encolher em seus braços.
— Faz bem, pai, muito bem. — Suspiro, sentindo meus olhos arderem pelas lágrimas que seguro. Mas ele não percebe, está ocupado demais falando sobre me comprar um Cadillac no fim do ano. Desculpe, papai, não poderei dirigir, até lá você já terá me matado!
Xx
Eu não me orgulho de ter passado a noite inteira chorando, encolhido como uma bolinha entre os edredons e ter levantado antes do amanhecer. Vesti a primeira coisa que achei no armário e bem antes do expediente estava entrando na pequena padaria em que trabalhava três vezes por semana quando minhas aulas eram à tarde. A placa ainda mostrava estar fechada, então usei a minha chave reserva para entrar e começar a ajeitar as cadeiras e mesas. Quando comecei a trazer algumas fornadas de bolinhos para colocar na vitrine ouvi não muito longe a voz de Barbara conversando ao telefone.
— Sim, querida, eu sei. Não é fácil, mas você também não pode continuar adiando a sua vida.... Tão jovem e cego. Que tristeza... Com certeza, eu imagino! Era um garoto e tanto! Que Deus o perdoe por aquela boca imunda. — Ela gargalhou e talvez eu estivesse prestando mais atenção do que deveria — É difícil, mas eu vou ver o que posso fazer. Ela deve conhecer alguém que possa cuidar dele, bem, Londres não é exatamente na esquina, é um tanto longe e...
Londres? Londres é perfeito! Ninguém que eu conheço frequenta a cidade. Se eu encontrasse uma forma de me mudar para lá, pelo menos pelos próximos meses seria brilhante. Poderia dar um jeito de me livrar desse bebê ou até poderia tê—lo e deixar em alguns dos milhares de orfanatos que deve haver por lá. Pelo que pude entender ela precisava de alguém que cuidasse de uma pessoa cega. Eu posso fazer isso. Posso!
— Eu quero o emprego! — Exclamo quando Barbara aparece na porta. Preciso do dia inteiro a convencendo para que ela se renda e finalmente ligue para a sua amiga, uma mulher chamada Charlotte Tomlinson que precisava de alguém que cuidasse de seu irmão, um soldado ranzinza e cego. Até então não parecia nem um pouco difícil.
Depois disso precisei de mais um dia na biblioteca, produzindo uma falsificação perfeita de uma carta de aceitação do Eton College. Ficou tão perfeita que minha mãe teve um desmaio e meu pai precisou de longos minutos para se recuperar. Gemma ficou resmungando o tempo inteiro, com inveja. Em meio ao seu ataque de euforia inventei uma desculpa idiota de que o inicio teria de ser imediato, eles chiaram bastante, dizendo que era perigoso e mais um monte de baboseira que pais como os meus dizem. Mas por fim, aqui estou, entregando o bilhete na plataforma e embarcando no trem para Londres.
Quando sento no meu lugar, aceno da janela para a minha família que aos poucos vai ficando para trás quando começamos a partir. Suspiro entristecido, eu amo Holmes Chapel e gostaria de ficar aqui para sempre, me dói partir, mas será por pouco tempo, em breve eu estarei de volta e sem certos... problemas.
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