19 • | once in a life time
"Sabe, o Louis é como um super-herói, normalmente eles crescem e se tornam um, mas aquele menino não, ele já nasceu assim."
.....
1934, Doncaster, South Yorkshire;
- Abra os olhos, Louis Tomlinson.
- Só mais cinco minutinhos. - Resmungo contra o travesseiro, esperando que ela tenha piedade e me deixe ter o sono dos justos.
- Mais cinco minutos uma ova! Se deixar você dorme o dia todo e já fazem dias que não vai a escola, que futuro você espera ter sem estudo? - Minha mãe continua a falar na minha orelha.
- Como se eu fosse ter um futuro. - Puxo a coberta sobre a minha cabeça, colando os joelhos no peito e querendo ser menor pra poder me encolher em uma bolinha quentinha e sonolenta. Ah delicia. Quando eu finalmente tenho um cobertor só meu não posso tirar proveito, isso é tão injusto.
- Já chega, criança! - Então minha felicidade se esvai e eu tremelico inteiro, sem o aconchego do meu cobertor e ficando só de cueca com as janelas abertas em puro inverno. Ela não tem piedade - Vai levantar por bem ou por mal. - Fico emburrado, fechando os olhos e fingindo estar dormindo. Até que ela desce a mão na minha bunda, dando um tapa tão forte que me faz saltar - Anda seu bundudo preguiçoso.
- Não fale da minha bunda, sua barriguda. - Sento, apontando o dedo para ela ofendido e Johanna estreita os olhos, colocando as mãos nos quadris e empinando ainda mais aquela barriga de melancia na minha direção.
- Eu tenho a desculpa de estar grávida de gêmeos e quanto a você? Só tem nove anos e tem a maior bunda que eu já vi.
- Devo ter herdado isso de você! - Retruco mostrando a língua e ela suspira profundamente, antes de tirar as sandálias e sair atrás de mim que corro em disparada derrubando minhas irmãs no caminho pelo bem da minha sobrevivência.
Por eu ser o mais velho, e já um homem feito, minha mãe deixava que eu levasse as minhas irmãs mais novas para a escola. Charlotte, a minha sombra de cabelo amarelo e Felicite, a menina mais esperta de todo o mundo, andavam na minha frente com suas mochilas, que eram originalmente azuis como a minha, mas eu as ajudei a pintar de rosa pra ficar como das outras garotas que continuavam a olhar daquele jeito estranho para elas.
Eu sabia o porquê. Ouvia meus pais conversando no meio da noite. Falando sobre as dividas. Também podia ver o estado da nossa casa caindo aos pedaços e a escassez em nossos pratos. Nós estávamos na miséria, mas eles jamais nos diriam isso. Eu precisava fazer alguma coisa pra ajudar.
- Bom, chegamos. Se comportem e comam todo o lanche. Principalmente você, Fizzy. Eu venho buscar vocês mais tarde.
- Do que está falando, Lou? - Fizzy vira seus olhos arregalados para mim.
- Eu tenho assuntos a resolver. - Digo empurrando seus ombros em direção a entrada - Vai logo.
- Louis! Não pode continuar matando aula, vai repetir de novo se continuar assim. - Charlotte, como a intrometida de sempre, se intromete.
- Ficar na escola não vai impedir que as bebês passem fome. A farmácia vive vazia e a mamãe não aguenta mais trabalhar com aquela barriga. Eu tenho a obrigação de fazer alguma coisa.
- Mas...
- Shiii, Fizzy. O Lou está certo. Vá para aula. - Instrui a mais nova, virando-se para mim - Eu vou com você.
- Não precisa...
- Claro que precisa, alguém tem que cuidar de você.
- Tudo bem.
- Eu vou com vocês.
- Não, maninha. - A seguro pelos ombros, me abaixando para poder encarar seus olhos - Você precisa estudar e aprender pra nos ensinar depois.
- Isso!
- Tá bom. - Ela suspira com um bico, dando um abraço em cada um de nós, antes de andar receosa em direção ao portão. A diretora nos olha e nos manda entra entrar já. Lottie agarra minha mão e nós corremos para o lado oposto.
Lottie e eu passamos o horário inteiro da escola na rua Conisbrough, onde as pessoas usam casacões de pele, tem carros bacanas e os cachorros recebem mais cuidados que nós. Temos nosso ponto oficial. Uma caixa de madeira onde eu deixo exposto os meus magníficos perfumes, que mesmo estando em embalagens de remédios são muito bons e criação minha. Minha irmã faz caricaturas das madames, mas quando ela acha que não estou olhando fica copiando as jóias que vê nas vitrines.
Quando voltamos pra casa, nossos bolsos tem alguns poucos trocados que conseguimos colocar dentro do potinho de finanças e mamãe sorri quando encontra, achando ser algum dinheiro esquecido.
Em breve ela saberá de onde veio quando a diretora ligar.
Eu e minhas duas irmãs mais novas nos apertamos na minha cama, com uma vela acesa e Fizzy no meio segurando um dos únicos livros do papai, que acabou sendo dado a ela por ser apaixonada pela capa. Era com ele que nós tínhamos aulas de leitura:
- Sub-Subito-to-m-m - Lottie tentava ler com toda a dificuldade do mundo.
- Dá isso aqui. - Puxo o livro pro meu lado - Subitamente, sua burrona!
- Não sou!
- É sim.
- Lou, seja bonzinho. - A mais nova pede, puxando delicadamente o livro e eu só deixo porque Felicite é a minha predileta.
- Isso é chato, podemos ler Geine Austin? - Lottie pergunta entornando a boca e eu rio da sua burrice, de novo.
- É Jane Austen, bobona, e eu gosto desse livro. Eu vou ser esse cara no futuro. Muito rico e então vou poder comprar uma casa bem grande pra todos nós morarmos, exceto a Charlotte, a deixarei num canil.
- Lou, não seja malvado.
- E você, minha linda Fizzy, terá um castelo só seu, minha princesa. - Dou um beijinho em sua bochecha e ela ri, ficando com o rosto vermelho.
- De nada vale esse dinheiro todo se não tiver quem amar.
- Eu vou ter uma esposa bem bonita.
- Vai não, você é feio, Louis.
- Eu sou um gatão e você é invejosa. - Mostro a língua pra ela, que bufa, chamando Fizzy para sua cama. Antes de descer a menor passa os braços ao redor de nós dois, nos apertando em um abraço.
- Eu amo muito vocês! - E nós acabamos por devolver o abraço, numa grande bola de Tomlinson's. Até que ela vai para a cama que divide com Lottie e eu vou para debaixo dos meus cobertores. Meus olhos já estão fechados quando sinto um beijinho na minha sobrancelha.
- Eu sempre vou cuidar de você, coisa feia. - Charlotte sussurra quando acha que estou dormindo.
Xx
1941, Folkestone, Kent;
O terreno era íngrime e rochoso, os pedregulhos judiavam dos pés daqueles que perderam suas botinas durante a batalha. A água havia se acabado, os enlatados não eram suficientes para quarenta e seis homens. Embora fôssemos um número muito inferior ao que partiu duas semanas atrás. Nossa posição ficava no porto, onde defendíamos a costa. O eixo enviava navios, soldados, submarinos o tempo inteiro.
A cidade precisou ser evacuada.
Sabíamos que nós seríamos o alvo quando a bandeira nazista fora hasteada no topo da torre Eiffel. Minha esposa havia me enviado uma carta dizendo o quanto chorara quando soube, mas que não pouparia esforços para encontrar meus pais e irmãs e se certificar de que estavam bem.
Ainda não haviam notícias de Charlotte e meu coração estava apertado.
Há um ano atrás tinha certeza de que venceríamos em um mês. Essa certeza vem diminuindo a cada corpo que cai, ensanguentado e inocente a minha frente.
Josh e Dan estão as minhas costas cantando uma música que me lembra minha mãe. Enquanto seguimos em marcha lenta de volta a base, sem nosso comandante que teve os miolos estourados ao meu lado. Teremos um novo líder e novas missões, me sinto exausto só de pensar em voltar pra lá. Ouço mais a frente um ruído estranho, um grito agoniado e nenhum movimento. Empurro os corpo moribundos a minha frente, até chegar as bordas do precipício, uma mão se agarrava nas pedras, tentando manter seu corpo.
Não hesito antes de agarrar seu braço, mas o rapaz de cabelos castanhos e olhos que parecem duas pepitas de chocolate é muito mais pesado do que eu posso aguentar e começo a escorregar junto a ele.
- Vão ficar só olhando? Me ajudem, malditos. - Grito para os espantalhos as minhas costas que não parecem sequer conscientes. Esses merdas são múmias.
- Você vai cair também. - O garoto diz, olhando para baixo.
- Não irei te soltar, soldado. - Seguro-o com o outro braço, sentindo meu peito sendo prensado nas rochas e escorregando para frente.
- Não precisa...
- Cala a boca, eu vim aqui pra ser um herói. Eu vou salvar você, nem que pra isso eu morra. - Insisto, mas estou caindo, sem forças para puxa-lo e então algo me agarra pelos tornozelos e me puxa, sem grandes dificuldades, trazendo o rapaz comigo. Ele se senta no chão, ofegante.
- Como está, soldado? - Uma voz grossa e severa ressoa e nós dois voltamos os olhos para o homem forte e alto, com uma carranca, cabelos grisalhos e muito bem fardado. Ele tem mais medalhas do que eu sei contar.
- Bem, capitão. Obrigado. - O rapaz disse, se voltando para mim e me estendendo a mão - Obrigado, soldado, eu sou Liam Payne e tenho uma divida com o senhor.
A aperto dando um sorrisinho.
- Louis Tomlinson.
- Soldado Tomlinson! - O capitão chama e eu me levanto, ficando em posição de sentido a sua frente - Fez um bom trabalho, sei o quanto é difícil agir depois de um combate violento, mas sua conduta foi honrosa.
- Obrigado, Capitão... - Baixo os olhos para o nome bordado em seu peito, tento assimilar a escrita, mas por melhor que eu tenha me saído com números no colégio quando maior, a ausência de estudos na infância fez de mim um péssimo leitor - S-Sta...
O homem segue meu olhar para seu peito e arqueia as sobrancelhas.
- Tem algum problema com a leitura, soldado?
- Não, só a minha visão que não é muito boa. - Minto, sentindo o olhar dos outros queimando sobre mim.
- Um atirador com a visão ruim não é de se apreciar, soldado. - Ele diz e eu abaixo a cabeça, constrangido - Venha até mim amanhã de manhã. - Levanto o rosto, surpreso por não ser destituído do meu posto, o capitão me dá as costas, marchando em direção ao acampamento, mas interrompe o passo para virar o rosto e me encarar - E eu sou o capitão Desmond Styles.
Depois de termos nos alojado no acampamento, Liam e eu acabamos por escolher camas próximas e conversamos durante a noite. Ele me fala sobre sua vida e eu lhe conto a minha, antes de adormecermos ele volta a reafirmar que está em débito comigo.
- Liam... - Digo, sabendo com clareza a melhor forma de ser retribuído. O rapaz de sorriso gentil me ouve com atenção - , se um dia eu faltar, quero que cuide da minha família. Proteja aqueles que eu amo, então sua dívida será saldada.
- Tem minha palavra, Tomlinson!
O sol está nascendo quando eu sigo até o campo de treinamento, ainda abotoando minhas calças e bocejando sonolento. O capitão está em pé, feito uma estátua em frente a um arsenal invejável de armas de fogo, me coloco ao seu lado batendo continência, ainda curioso quanto ao que ele quer de mim.
- Falei com seus companheiros e eles me disseram que é muito habilidoso, soldado. Onde aprendeu a atirar? Soube que sua unidade não teve um treinamento muito abrangente.
- Um amigo me ensinou.
- Bom, então eu decidi que irei aprimorar estes ensinamentos. - O capitão Styles escolhe um rifle, o carrega e me entrega.
- Como assim, senhor? - Pergunto confuso, deixando que ele me guie até o meio do campo, onde um espantalho de palha fora montado, ele pega uma venda e balança diante dos meus olhos.
- É um experimento que estou fazendo. Acredito que os olhos só atrapalham e já que você tem problemas de visão, acho que ajudá-lo a aprimorar seus outros sentidos vem bem a calhar. - Dito isto, passa a venda por meus olhos, levando-me a escuridão - Agora acerte-o na cabeça.
- Não posso mirar sem enxergar.
- Claro que pode. Use a intuição, a audição, tato, olfato o que não lhe faltam são recursos, Louis. Tente!
Seguimos com este treinamento bizarro por seis meses. Entre ataques, confrontos e batalhas sanguinárias, com os porcos nazistas em cima de nós, conseguimos seguir com ele. Styles era estranho, ele levava a sério seu experimento e com o tempo eu o respeitava e me orgulhava por ter me tornado um dos melhores soldados do batalhão, sabia me mover com bem mais agilidade, minha mira era impecável e eu não precisava de meus olhos para enxergar o alvo. Eu via com os meus outros sentidos.
- Muito bom. Está cada vez melhor. - O capitão me parabenizou, deixando que eu abrisse os olhos para ver os sete tiros consecutivos acertados no centro do alvo - Prometa-me que vai continuar treinando quando eu não estiver mais aqui.
- O quê? Está de partida, senhor? - Indago desolado. Nós havíamos nos tornado bons amigos.
Styles sorri de lado, como se estivesse contendo um sorriso maior e apoia a mão pesada em meu ombro.
- Estou indo pra casa, conhecer meu filho, Louis.
- Oh, o pequeno Harry nasceu?
- Sim. Um menino bonito e saudável. Ele precisa de mim agora e eu dele.
- Fico feliz pelo senhor. Ele tem sorte de tê-lo como pai.
De repente, ele rompe toda a nossa atmosfera de soldado e capitão para me dar um abraço paternal, eu diria.
- Senhor?
- Espero que ele seja como você.
- Baixinho? - Brinco, estando apavorado por dentro.
- Um grande homem. - E eu me rendo ao seu abraço.
Xx
1943, Gloucestershire, Gloucester;
Dolly McWatter havia sido trazido da cidade antes do sol raiar. A velha veio com o rosto acinzentado resmungando que tinha mais outros partos para fazer ainda hoje e precisava que Lydia colaborasse. Eu dei minha palavra de que não seria mais do que umas poucas horas e poderia seguir viagem, então assim ela entrou no quarto e não saira pelas próximas horas.
Os soldados abatidos que repousavam em nossa casa, acolhidos por minha esposa, estavam sentados na sala de estar, roendo as unhas. Alguns tinham terços e rezavam baixinho, tinha até um homem que não parava de resmungar sobre a demora e falta de notícias.
Parecia que todos ali eram os pais.
Eu, por outro lado, estava com a testa grudada na porta, me remoendo a cada grito que ela dava. Já haviam se passado doze horas e nada!
- Senhor Tomlinson! - Dolly berra, abrindo a porta e eu tombo para frente, caindo dentro do quarto.
- Louloulouloulou... - Lydia repetia, estendendo as mãos em minha direção. Seus cabelos estavam presos, o rosto vermelho e suado, as pernas abertas de uma forma aparentemente desconfortável. Por sorte havia uma toalha na frente. Meu pai sempre me dissera que tinha um limite para o que você podia ver de uma mulher dando a luz.
- Estou aqui, querida. - Digo, sentando as suas costas, e a abraçando. Seus dedos finos prenderam os meus com uma força surreal.
- Não dá, Louis. Eu não consigo. Eles podem ficar aqui, não podem? Eles vão ficar em segurança. Por favor...
- Lydia, você sabe que isso não é possível. - Beijo sua têmpora, observando Dolly voltar a ficar entre as pernas dela, balançando a cabeça, me instruindo a motiva-la - Vamos, querida, eu sei que você consegue. Só faça um pouquinho de força.
- Um pouquinho de força? Vá se foder, Louis Tomlinson! - Grita raivosa - Essa porra dói demais. Caralho, caralho, caralho.
A velha me olha com os olhos alarmados. Normalmente as moças não tem uma boca tão suja. Mas, bem, Lydia tem.
- Eu vou morrer! - Ela começa a chorar, ignorando os pedidos para que ela respire.
- Lyd, olhe pra mim.
- Não.
- Lydia, não seja teimosa. Não agora. - Seguro seu queixo, o rosto empalidecido pela exaustão que a vencia depois de tantas horas - Lembra-se de quando nos conhecemos?
- Como poderia me esquecer de quando encontrei meu bebê chorão?
- Isso, eu estava tão assustado e chorava sem parar, dizendo que queria morrer. - Lydia balança a cabeça, dando um pequeno sorriso - Talvez eu até tivesse morrido, mas você... Você me mostrou que eu só estava com medo e não há nada de errado em ter medo. Isso não nos torna covardes, apenas humanos. Não qualquer humano, mas guerreiros. Nós somos fortes. Podemos fazer qualquer coisa, esse é só o início das nossas vidas e ele é magnífico, quem poderia imaginar que dois idiotas como nós fossemos capazes de ter dois bebês incríveis. Está guerra vai acabar, nós vamos vencer e os nossos filhos vão ser muito felizes, a nossa família vai ser muito feliz, mas antes disso batalhas precisarão ser travadas, essa não é uma luta fácil. Nada que é importante é fácil de se obter e tudo bem, porque você dá conta. Você sempre foi a mais forte de nós dois e tem uns vinte homens lá fora acreditando que você pode fazer isso, não nos decepcione, Lyd.
- Eles acreditam que eu posso? - Lydia ofega, firmando o aperto em minhas mãos.
- Todos nós!
- Okay. Okay. - Suspira voltando a respirar fundo e empurrando quando Dolly pede, suas mãos parecem a ponto de quebrar as minhas, mas nada disso importa porque ela está conseguindo e então ouvimos o primeiro choro de bebê. A ajudante de Dolly o leva para o outro lado do quarto e eu resisto ao impulso de correr para conhecer meu filhinho e continuo com Lydia, sussurrando que ela pode enquanto ela usa todas as suas forças dando a luz ao segundo bebê, e quando a garotinha chora ela respira aliviada, jogando o corpo mole e cansado sobre o meu.
Sua respiração acelerada vai se acalmando, uso algumas toalhas sobre os travesseiros para secar sua testa suada e eu me perguntava se era possível amar alguém mais do que eu a amo.
- Bom meus jovens, aqui estão seus filhos. - A parteira traz os bebês, os ajustando nos braços de Lydia que mesmo sonolenta os segura com firmeza. Apoiando as costas no meu peito.
- Eles são perfeitos. - Sussurro tocando a pontinha arrebitada do nariz do menino. Ele tem a pele cor de café, alguns fios escuros no topo da cabecinha e os olhos tão pequenos que não é possível dizer a cor.
- Esse rapazinho aqui, se chamará William. - Lydia diz, dando um beijo na testa do bebê que boceja e é bizarro como ele se parece comigo - Quero que ele seja forte e bom como o pai.
Não consigo segurar meu sorriso bobo e apaixonado.
- Então, essa donzela aqui. - Dou um beijo na bebê que suspira baixinho - Será Abigail. - Lyd abre a boca para descartar seu nome do meio que ela tanto detesta - Quero que ela seja forte e boa, como a mãe.
- Certo. - Concorda, beijando minha bochecha e quando Dolly puxa um lençol sobre ela e abre a porta, uma trupe de soldados mal trapilhos entra no quarto com os olhos brilhando - Meus amigos, eu lhes apresento Abby e Will Tomlinson.
- Esse é o dia mais feliz da minha vida. - Cochicho contra o seu ombro.
Xx
1945, Gloucestershire, Gloucester;
Era mais sangue do que eu vira no campo de batalha, depois de um bombardeio. Nunca é fácil ver alguém morrer, nunca é fácil ver alguém perdendo todo o sangue e os olhos se apagando para sempre, mas existia certa indiferença quando se trata de um desconhecido, porém quando é alguém especial, ou melhor, uma parte de você, como é o meu caso.
Você morre junto.
Não chora, grita ou esperneia. Simplesmente morre.
A pouco mais de dois metros a minha frente estava o que costumava ser a minha esposa. Minha doce e valente Lydia. O amor da minha vida partiu de forma dolorosa, mas ela foi forte até o fim, não chorou apenas me disse para aguentar firme.
Como eu poderia aguentar?
Eu não sabia onde estavam os corpos das crianças, eles as levaram para o andar de cima. Queria ir até eles e lhes cortar a garganta, mas o grandalhão as minhas costas quebrou minhas duas pernas e eu não conseguia fazer nada além de me manter de joelhos, sentindo o sangue do corte na minha testa escorrendo, o vento gelado batendo contra o meu rosto e balançando meus cabelos, mantinha os olhos cravados no vermelho do sangue banhando o chão.
A madeira rangendo quando um dos outros porcos nazistas desce, carregando duas malas com tudo o que temos. Eles estão fugindo porque perderam, mas querem deixar um rastro de maldade em nome de seu maldito Führer. Outro merda que já teve o seu encontro com o capeta.
- Gordon, dê um fim no judeu! - Ordena com em seu alemão carregado.
- Quais são suas últimas palavras, inseto? - O tal Gordon rosna próximo a minha orelha, sinto seus dedos se fechando nos cabelos da parte de trás da minha cabeça e respiro fundo, fechando os olhos.
- Que Deus tenha piedade de vocês, pois eu não terei.
Ele ri, achando graça e levando a minha cabeça de encontro ao chão.
Com dificuldade eu abro meus olhos e tudo está vermelho-escuro. Penso ser sangue e tento limpa-los com a mão, mas ela não se move, assim como meu corpo inteiro que lateja como se eu tivesse facas cravadas em cada centímetro de pele. Consigo, a pulso, trazer a mão direita até o os olhos e os esfrego para clarear a visão, mas nada muda. Continua igual, até que vai escurecendo...escurecendo... escurecendo e estou completamente cego.
Xx
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"Eu gostaria de congelar esse momento para sempre."
"Eu não. Prefiro ter uma vida inteira cheia de momentos incríveis ao seu lado..."
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1958, Londres, Inglaterra;
" Eu estava começando a gostar de você, Harry. Imaginado um bebê girafa, todo meigo e desajeitado. Mas você atrapalhou meus sonhos e eu voltei a querer atirar em você..."
" Styles! Enfia a porra da mão no meu prato mais uma vez e eu mordo ela."
" Se aproveitar, tocar, beijar ou qualquer tipo de contato feito com alguém contra a sua vontade é abuso, Harry."
"Você cheira a juventude, inocência, luxúria e... Uma pitada de covardia."
"Tudo o que eu tenho é medo, Harry. Medo de viver mais um dia, medo do futuro e do que me aguarda e principalmente de que a melhor época da minha vida tenha ficado para trás..."
"Esse foi o melhor dia da minha vida em muito tempo... Obrigada, girafinha."
"Não faz sentido, porque você iria me querer? Eu sou um cego, manco e velho... Eu não sou nada."
"Pois eu morrerei todos os dias sem sua presença."
"Não precisa ser agora, nós temos todo o tempo do mundo... Nós podemos ficar abraçados e eu te beijarei até que você durma, parece bom pra você?"
"Você é como um novo capítulo da minha vida, um que não me viu no meu pior, mas que não me conheceu no meu melhor. Você apenas não tenta me controlar, como os outros fazem, ao seu lado eu não me sinto um inválido, não te vejo como alguém que sente pena de mim ou tem interesse. Eu me sinto bem e feliz, feliz de verdade com você. Nesse pouco tempo em que estamos juntos eu posso dizer que você se tornou o meu melhor amigo."
"Shiii, amor, não diga besteiras. Ninguém pode te tocar, nem te fazer mal. Não quando você está no lugar mais seguro da face da terra."
"Não houve guerra, só paz. Vivemos no paraíso, apenas eu, você e a nossa filha."
"Não, girafinha, eu não vou morrer enquanto você não se der conta do homem incrível que você é."
"Sério? Falar de disfunção erétil te excita? Oh, esses jovens."
"Eu amo você... Eu amo a nossa bebê. Eu amo a nossa história e amo o nosso amor."
"Sim. Poderíamos viver em Santorini, apenas eu, você e a dúzia de filhos que teremos porque do jeito que nós gostamos de sexo não me surpreenderia se fizéssemos um por ano, mas nada disso seria problema porque estaríamos vivendo em uma ilha paradisíaca no meio do Mar Egeu, longe de toda a merda que nos assombra, estamos na primavera, é a hora de um recomeço, Haz."
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"Sinto muito por ter te machucado."
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1959, Londres, Inglaterra;
- Como normal? Eu disse sangue, pessoas saudáveis não vomitam sangue, doutor. Tem algo de muito errado e Louis Tomlinson está morrendo agora por sua culpa. Então trate de trazer esse seu traseiro incompetente para cá agora senão eu juro por Deus que irei atrás de você até nos quintos dos infernos.
Observava a uma distância segura Bleta gritando no telefone. Era a quarta vez seguida que ela ligava para o doutor Delchev que até onde eu sabia estava fora do país e não atendia as suas ligações.
Ao que tudo indicava se tratava de um salafrário. Um salafrário que só piorou tudo.
Um novo ruído sufocado vem do quarto de Louis, a agitação perceptível no quarto me dá indícios de que ele está tendo outro ataque. Eu vi um - quando Liam o trouxe de volta depois da cena no cavalo, há três dias atrás - Louis parecia totalmente inconsciente até saltar da cama e se arrastar até a borda para vomitar o que me pareciam litros de sangue que eram da mesma cor que sua cama. Era como se Lou estivesse se afogando num mar de sangue.
Depois disso eu não o vi mais.
Meu coração acelerado me levou a desmaiar algumas vezes e com a ausência de Nicholas, Adam foi chamado para checar se estava tudo bem comigo e a bebê. Ele disse algo sobre um possível parto prematuro, mas não dei atenção, apenas me arrastei até o corredor, esperando que alguém me deixasse entrar.
Eles não deixaram.
Clare era a única que permanecia, sem exceções, ao meu lado. Seu rosto já estava abatido e os ombros provavelmente doloridos por me ter chorando sobre eles.
Quando, enfim, tudo estava perfeito isso acontece.
Bleta joga o telefone, enfurecida e eu me arrisco a levantar e ir até ela, na esperança de que me diga algo sobre Louis.
- O que você quer? - Pergunta assim que me vê.
- E-eu queria saber como o Lou está.
- Como ele está? - Eu me encolho pelo peso de seu sarcasmo ao que ela dá um passo a frente, com o maxilar tensionado e as mãos abrindo e fechando, como se lutasse para não me socar ali mesmo - Morrendo, é assim que ele está. Está feliz agora? Será um milionário, livre e desempedido.
- O quê? Não! Eu não quero o dinheiro dele.
- Claro que quer. Tudo estava indo muito bem, até você chegar e o levar a ruína. Não me surpreenderia que estivesse trabalhando em conjunto com o tal médico para envenena-lo e repartir a fortuna. Sou conhecedora da sua fama em sua antiga cidade.
Minha expressão é de horror perante a acusação incabível. Ela acredita realmente que eu desejo matar Louis, pra ficar com sua fortuna ao lado de outro homem? Em que universo isto faria sentido? Definitivamente não neste!
- Vamos, Harry, confesse que é um assassino.
- Não há nada a ser confessado, muito menos para você. - Grunhi piscando enquanto passava os dedos nas têmporas várias vezes, tentando não deixar que suas palavras se embrenhassem em minha mente - Sabe que eu não faria isso, eu o amo. Amo mais do que a mim, mais do que tudo. Jamais faria qualquer coisa para feri-lo, diferente de você, que acredito preferir vê-lo morto do que feliz ao lado de outro alguém.
Um vinco se forma entre suas sobrancelhas.
- O que está insinuando, garoto?
- Que eu acho que os remédios que você tem dado a ele todos estes anos foi o que realmente o deixaram mal e dependente. - Respiro fundo, antes de completar o que sei ser um absurdo, mas a amargura fala mais forte, quando concluo: - Você o está envenenando porque não aceita que ele não te quer.
O castanho dá lugar a um vermelho enfurecido ao que toda a ira fulminante de Bebe se revela e antes mesmo que eu possa associar o que está havendo, ela me dá um tapa no rosto, totalmente inesperado.
Cambaleio para trás, descrente do que aconteceu, sentindo minha bochecha ardendo. Volto os olhos para ela, que avança em minha direção, mas é impedida por um outro corpo que se coloca entre nós.
- Quem você pensa que é pra bater no meu marido? - Clare rugi, me mantendo as suas costas protetoramente, enquanto peita Bleta.
- Agora, não, Clare. Não se meta. - Ela suspira revirando os olhos.
- Ah, mas eu vou me meter sim. Você precisa se acalmar. Acha mesmo que está certa em dizer esse tipo de coisa para o Harry? Culpá-lo pela doença de alguém? Louis está doente há muito tempo e seu dever como médica é tentar ajudá-lo. Eu sei que está sofrendo, mas se você o ama como diz, sabe que ele não gostaria que tratasse Harry desta forma. - Seu tom ameno mudou totalmente para um de alerta, quando ela deu um passo a frente e apontou o dedo no peito de Bleta, que recuou instintivamente - Esse foi o meu aviso, levante a mão pra ele mais uma vez e nós vamos resolver isso lá fora. Entendeu?
A loira suspira em derrota e ira contida, sem o menor interesse em ganhar um olho roxo por minha causa.
- Eu vou ver o Louis. - Anuncia, sem me dirigir o olhar.
- Melhor assim. - Clare concorda, enquanto a outra bate a porta e se volta para mim, segurando meu rosto - Deus, a mulher tem uma mão pesada. Ainda bem que ela não quis brigar.
- Você teria dado uma surra nela. - Sorrio pequeno.
- Provavelmente não, a boa de briga aqui é a Sarah. A única vez que briguei apanhei tanto que acordei dias depois. Mas eu não podia deixar de defender o meu marido. - Ela diz, massageando minha bochecha para aliviar o ardor.
A semana se arrasta turbulenta, sem que eu tenha um vislumbre sequer de Louis até quarta, quando Charlotte me acompanha até o seu quarto, onde toda a vitalidade e brilho que o acompanhara da última vez que nós vimos estava ausente.
Ele sorriu fraco e apertou a minha mão quando eu sentei ao seu lado na cama.
Por mais que eu quisesse acreditar no contrário, sabia que ele estava cada vez pior.
Passo o dia inteiro no quarto, olhando para as paredes e só não me entupindo de remédios para dormir porque Clare se mudou para o meu quarto, com a desculpa esfarrapada de que marido e mulher deviam dormir juntos, quando na verdade ela só estava me vigiando. Decido subir até o terceiro andar, onde uma pequena saleta, com piso, paredes e teto em mogno maciço, bancos longos, um corredor estreito com um altar repleto de velas acessas e a imagem de Jesus na cruz.
Entro discretamente, avistando Charlotte ajoelhada em frente ao altar, as mãos unidas rente ao queixo e olhos fechados. O ruído dos meus sapatos a faz olhar para trás e tentar esboçar um sorriso.
- Olá, Harry.
- Não sabia que era católica. - Aponto a imagem, me aproximando e sentando no banco da frente.
- Não sou. Está capela já estava aqui quando chegamos. Eu só gosto de vir aqui porque é silêncioso e bonito, dizem que Deus a habita, então estou arriscando uma conversa.
- Está orando?
- Acho que sim. - Dá de ombros, levantando e puxando o xale por seus ombros.
- Pedindo para que Louis seja curado?
Ela nega com a cabeça.
- Que ele tenha paz, não importa onde, apenas quero que meu irmão descanse.
- Eu não entendo como você pôde abrir mão dele deste jeito.
- Harry, você é ainda tão jovem, é natural que tenha esse fervor e ânimo por lutar, mas precisa se colocar no lugar dele... E se fosse você preso em uma cama, sem poder enxergar ou andar, colocando todo o sangue do seu corpo pra fora. Iria mesmo querer viver só porque as pessoas ao seu redor não querem ficar sem você? O amor nos faz loucos, nos faz egoístas, é preciso maturidade para lidar com um sentimento tão astuto, criança. - Diz, abaixando o rosto e deixando um beijo em minha testa, em seguida partindo.
Ergo o rosto para a imagem, acima das velas. Aqui, sentado em frente a ela, é como se eu tivesse três anos novamente e ouvisse a missa, com meu pai de cara fechada, assistindo em silêncio, minha mãe tentando controlar a rebeldia de Gemma que ficava triturando pedaços de papel para jogar nas cabeças alheias e bater o ombro no meu, me fazendo escorregar do banco e rir feito louca.
Depois disso nós entravamos no carro e mamãe começava a cantar somewhere over the rainbow, que era a música predileta de Gem, eu olhava pela janela, observando a paisagem passando em flashes por meus olhos e pensava no que estaria reservado para mim do lado de fora.
Perdido nos devaneio, mal me dou conta de que alguém se sentara ao meu lado. Dou um pulo ao me deparar com cabelos louros e lisos e o perfil compenetrado da doutora Rexha. Ela abaixa os olhos e eu percebo um terço entre suas mãos, os dedos girando as contas.
- Foi nessa capela que eu o vi pela primeira vez. Estava agradecendo por termos chegado em segurança quando ele saltou de trás do altar me dando um grande susto. De primeiro eu fiquei muito irritada, o filho de uma doméstica mexendo com a sobrinha do patrão. Oh, isso era inadmissível. Mas antes que eu corresse atrás do meu pai, ele se sentou naqueles degraus com um sorriso arteiro e ficou olhando para mim... Você não conheceu, mas o olhar de Louis era tão intenso e límpido. Normalmente as pessoas evitam te olhar diretamente, esse não era o seu caso ele olhava em seus olhos firmemente, não de um jeito que te julga ou avalia, era o tipo de olhar que o fazia se sentir acolhido, querido. Em seu olhar só havia amor, então em questão de instantes eu percebi que o menino com os cabelos bagunçados e roupas modestas seria a minha grande paixão. Ele foi, ele é...
Não sei o que dizer, então opto por permanecer quieto. Ouvindo o ruído da chuva batendo contra a janela.
- Eu o amei antes de você, antes dela. - Depois de um curto silêncio ela recomeça, com a voz limpa - Mas eu nunca movi um dedo para tê-lo. Eu só fiquei ali, esperando que ele me amasse de volta, e ele amou, amou-me como uma irmã. E isto basta, ter o amor dele, não importa como, é a melhor coisa do mundo e vê-lo feliz me faz feliz e por mais que me doa, sei que é você o responsável por essa felicidade. - Ela esboça um sorriso relutante olhando para mim - No começo eu achei que fosse passageiro, nada além de mais um caso sem importância e então você partiria, como todos os outros e ele voltaria para mim. No entanto, não foi o caso, porque o que vocês têm é amor, o tipo de amor que não acaba ou se pode reprimir. Acredito que vocês sejam almas gêmeas, você pode ter chegado dezesseis anos atrasado, Harry, mas o que importa é que você veio e se encontraram no momento certo, o que eu considero estupidamente errado. - Desabafa com a voz afetada, ficando em pé na minha frente - Se ele era pra ser seu porque eu continuo o amando? Porque não consigo deixar de ser apaixonada e espero há anos por uma coisa que nunca vai acontecer?! Por que eu não posso simplesmente sair dessa mansão e mandá-lo para o inferno?
- Porque ele é a sua casa
- Como assim?
Também me coloco de pé, passando a mão pelos cabelos.
- Eu costumava pensar que casa era só o lugar onde você vive, mas quando eu conheci o Louis descobri o verdadeiro significado. Casa, se refere ao nosso lar e o verdadeiro lar é onde o seu coração está. O meu tem estado com Louis desde que nos conhecemos, ele é a minha casa, é com ele que eu me sinto seguro e amado e o mesmo acontece com você.
- Não, não, nós não temos nada sentimental para que eu possa vê-lo desse jeito. - Ela diz evasiva.
- E quem disse que o seu lar não pode ser um melhor amigo? Não importa quem seja ou o que seja, a única coisa relevante é que você tenha um porto seguro. Você tem feito dele o seu porto seguro todos estes anos, não é o amor que você pensa, talvez nunca tenha sido.
Dou um passo a frente, ousando tocar seu ombro bem levemente.
- Se dê a chance de amar outro alguém, Bleta. - Digo docemente, embora ela tenha sido rude comigo, eu entendia. Eu enxergava em seus olhos o mesmo amor ilusório do qual eu já fui vítima. Às vezes nos apegamos muito a alguém e convecemos a nós mesmos que é amor. Amor não é o tipo de coisa que você sabe de cara, como Liam me disse certa vez, simplesmente acontece e você nem se dá conta.
- Então.... - Ela suspira, colocando a mão sobre a minha e eu me surpreendendo pelo gesto gentil - , se ele é a nossa casa, quando ele morrer ficaremos desabrigados?
Meu queixo cai quando não encontro uma resposta por nunca ter pensado nessa possibilidade que se mostra cada vez mais verdadeira e próxima.
- Harry, existe uma chance de salva-lo.
- Q-qual? - Gaguejo meio aéreo.
- Você responde por ele agora e como ele se encontra inconsciente pode me dar a autorização para a amputação.
- Eu posso autorizar que ampute a perna dele?
- Exato. - Garante com uma nova determinação - Apenas o consentimento verbal já é suficiente. Diga e eu faço agora mesmo.
- Mas... - Recolho minha mão, cambaleando para trás até cair sentado no banco, atordoado.
- Diga! - Insiste, se ajoelhando a minha frente.
Diga sim! Você sabe que essa é a melhor coisa a se fazer. Ele te odiaria de início, mas iria te perdoar, é claro que irá. Diga sim! A minha mente gritava, fazendo meu crânio latejar e Bebe esperava por uma resposta.
Mas definitivamente não por está.
- Acorde-o e pergunte a ele. - Minha voz está rouca por causa das inoportunas lágrimas contidas - Será aquilo que ele decidir.
Volto a encara-la e seu olhar antes ansioso, agora está furioso ao que ela recua.
- Você vai se arrepender disso, Harry.
Xx
Eu nunca tinha tempo para rezar, mas era justamente o que eu fazia desde que Bleta entrara no quarto de Louis, há quatro horas atrás. Eu estava de joelhos em frente a lareira da biblioteca, com o livro de Lydia preso ao peito, implorando a Deus incessantemente que Louis escolhesse viver.
O silêncio perpétuo era rompido por meus ocasionais choramingos nos quais os meus temores se manifestavam.
E se ele escolher partir?
Não, não, não...
Seco os olhos, iniciando uma nova oração, ainda mais fervorosa do que as últimas quarenta, quando a porta da biblioteca é aberta com cuidado e Liam entra, sem sorriso ou tranquilidade, ele está desolado e há sinais de choro em seus olhos, se Liam que é a base forte desta casa está chorando é porque o mundo veio a baixo.
- Louis, está acordado. Ele deseja vê-lo, Harry.
- Liam... - Levanto meu rosto choroso para ele e num átimo ele vem até mim, me abraçando forte e respirando ofegante em meus cabelos -, ele piorou?
- Não, não, ele está melhor. Bem melhor. - Garante, quase alegre, embora esteja me segurando como se precisasse de todo o apoio do mundo para dizer aquelas palavras que eu duvidava serem verdadeiras.
Ocasionalmente ele nos afastou, me ajudou a seguir até o quarto de Louis, de onde Fizzy saia aos gritos, sendo segurada por Mitch e Charlotte.
- Não, não, por favor, não! - Ela gritava totalmente fora de controle, chutando a porta e se debatendo para tentar se libertar dos outros, que não olharam para mim apenas a levaram para longe. Olhei para Liam que deu um sorriso minúsculo, apertando meu casaco ao redor do corpo tomei coragem para entrar, encostando a porta em seguida e encontrando Louis sentado na beira da cama, os pés tocando o chão e o rosto voltado para a tarde escura e chuvosa. Até mesmo a primavera ficara triste por ele.
- O remédio afetou os meus pulmões. - Ele diz depois que eu anúncio a minha chegada, sentando na outra ponta da cama, afim de dar a ele o espaço que eu sei que precisa.
- Eu sei.
- O tratamento foi interrompido, com isso as dores e a evolução da bactéria voltaram com ainda mais força.
- Também sei disso. - Murmuro quietamente, estendendo minha mão sobre o colchão, ansiando poder tocar em seus dedos que repousavam pálidos e frágeis sobre seu colo.
- Você está me vendo no meu pior, Harold. - Ele diz com uma lágrima escorrendo por seu rosto e abaixa a cabeça fazendo os cabelos caírem por seu rosto - Eu não queria que você visse, agora tudo está destruído.
- Não, Lou...
- Eu vou perder a perna. - Diz com severidade, a voz soando tão trovejante quanto o próprio que corta o céu do lado de fora. O vento intenso empurra as cortinas pelas janelas abertas invadindo todo o quarto com sua tempestade violenta e Louis permanece inerte diante dela, como se não pudesse sentir o frio ou os pingos d'água caindo sobre ele.
Vou até as janelas, fechando-as.
- Eu não sei porque estamos entrando nesse assunto de novo, já disse a você que não me importa. Que eu ficaria mesmo que você mexesse só um dedinho.
- Naquela época eu acreditava que demoraria. E que isso, entre nós já teria acabado.
- Estava apostando no nosso fim? - Pergunto, incrédulo.
Ele sorri sem humor.
- É claro, Harry, você é tão jovem e perfeito, eu sabia que em algum momento iria se cansar de mim e se tocar de que consegue coisa muito melhor do que eu. Então nós teríamos vivido um romance épico, daqueles que você contaria a garotinha aí, é claro que diria ter sido com uma mulher e eu teria estas lembranças suas que me aqueceriam durante as noites frias e este seria o retrato do nosso amor, belo, puro e inesquecível, mas se você ficar... se você ficar para me ver padecendo pouco a pouco, porque sem os olhos eu consegui, mas sem a perna... Não há garantias de que isso não se espalhe e eu perca mais membros.
Ando até ele, tentando não deixar que essa angústia que sobe pela minha garganta me emudeça e me esforço para soar bem humorado ao que digo:
- Desde que o seu pau não esteja incluído, desculpe péssima hora. - Bato na minha testa, esperando que ele bufe e me chame de girafinha idiota, mas ele não faz. Ele ri, ri de verdade como se tivesse sido a coisa mais hilária que já ouviu em toda a sua vida.
- Não tudo bem. - Fala ainda em meio ao riso, secando as lágrimas que escaparam - Eu vou sentir saudades do seu senso de humor.
- Saudade? - Franzo as sobrancelhas, confuso.
- É hora de dizer adeus.
- Você está de partida?
- Eu não. - Suspira, se agarrando a uma das pilastras da cama e levantando com muita dificuldade. Liam entra no quarto, com sua postura ereta e uma expressão fria.
- Sr. Tomlinson, o senhor e senhora Styles te esperam. - Anuncia com a voz ríspida.
Arregalo os olhos, olhando de um para o outro.
- O que meus pais estão fazendo aqui?
- Vieram te buscar. - Liam responde, acrescentando um me desculpe baixinho e eu não me demoro mais no cômodo, empurrando-o para fora do meu caminho e descendo as escadas em passos apressados para encontrar meus pais esperando no hall de entrada, assim que me vê os olhos de minha mãe ficam enormes.
- Oh meu deus, Harry, a sua barriga... - Ignoro a sua observação irrelevante, parando em frente a meu pai, que encara as escadas com olhos estreitos.
- O que estão fazendo aqui? Se pensa que eu pretendo ir com você estão muito enganados. - Ele me olha por um instante, depois franze a testa - Como se atreve a vir até aqui depois de ter agredido o Louis?
Ele dá uma risadinha.
- Foi o próprio quem me convidou, Harry.
- Eu senti tanto a sua falta, meu bebê. - Mamãe se agarra ao meu pescoço, me enchendo de beijos e eu observo meu pai dando alguns passos a frente quando Louis surge no topo da escada sentado em sua cadeira de rodas, que é segurada por Mitch e Liam, um de cada lado, que o descem até deixá-lo exatamente na frente de Desmond.
Os três ficam lado a lado, e de repente, batem continência.
- Que merda...? - Balbucio sem entender porque estão fazendo isso.
- Descansar, soldados! - Meu pai ordena - Embora você não precise disso, Tomlinson, sua patente é mais alta que a minha.
- Não importa, eu sempre o terei como meu superior, senhor. - Louis diz com a voz fraca. Por um acaso eles se conhecem?
- Tomlinson, só quando vocês tinham partido que eu me dei conta de que era você. Mudou bastante.
- Imagino que o senhor também.
- O que houve com os olhos?
- Nazistas.
- Porcos! - Os quatro falam ao mesmo tempo e que porra é essa? Olho para minha mãe que não parece querer nada além de ficar me alisando como um bebezinho. Me desvencilho dela para ir até o centro.
- Eu não entendo o que está acontecendo. - Declaro parando entre eles.
- Seu pai foi meu capitão em 41. Ele me ensinou bastante e por isso serei eternamente grato.
- Me é tão grato que corrompeu o meu filho.
- Ele não me corrompeu! - Grito irritado.
- Harry, não fale assim com seu pai.
- Senhor Styles. - A vozinha pequena e frágil de Louis se faz presente mais uma vez, tentando tomar o controle da conversa - Eu quero lhe pedir perdão.
Certo. Isso não faz sentido.
- Que porra é essa, Louis?
- E-Eu quero pedir perdão por ter bagunçado tanto a vida do Harry, quando ele chegou a minha casa tinha um plano, um plano muito bom e ele queria resolver tudo ao seu modo e voltar para vocês, mas por causa de toda a minha intromissão, o atrapalhei. Atrapalhei e o arrastei para o fundo do poço comigo.
- Meu amor, não diga isso. - Mesmo sob o olhar aborrecido do meu pai, ajoelho ao lado de Louis, segurando sua mão.
- Girafinha... - Diz, tocando minha bochecha e eu o odeio por estar usando aquela merda de luva de couro, exatamente como fazia antigamente - , você foi como um bálsamo para as minhas feridas todo esse tempo. Obrigado! Agora eu quero que você vá com seus pais, tenha esse bebê e deixe que a sua irmã a crie, volte para a escola, seja um garoto como qualquer outro. Encontre a felicidade, ame e viva!
- Do que está falando? Eu estou com você, nós casamos lembra? Não irei a lugar nenhum, desista de tentar me fazer desistir de você, Lou, não vai acontecer.
- Desta vez a escolha foi tirada de você.
- Do que está falando?
- Os planos iniciais estão de volta. Você vai ter um bebê e voltar a sua vida de antes e eu irei morrer, como tinha planejado antes.
- Não! - Sinto minha cabeça rodando, quando um par de braços circunda meu tórax e me puxa para trás. Encaro Mitch, descrente de que ele vai ajudar Louis com aquele absurdo - Me solte, Mitch, que porra!
- Desculpe.
- Pensei que fôssemos amigos.
- Nós somos... Somos.
- Então porquê?
- É o melhor, Harry. - Diz ele, me apertando com mais força. Eu tento lutar contra seu aperto e chuto a cadeira de Louis durante o surto, não arrancando reação alguma dele. Tento um dos golpes que Mitch me ensinou e consigo golpeá-lo no estômago com o cotovelo, ganhando uma brecha para me lançar contra Louis novamente.
- Porque está fazendo isso? Eu sei que está assustado e com dor, eu entendo, mas... - Levanto os olhos marejados para ele, agarrando sua cintura e apoiando o queixo em suas pernas, querendo que ele me abrace e diga que não passa de uma piada de mal gosto e que não planeja me expulsar da sua vida como um cão sarnento.
- Você não entende a minha dor.
- Como se atreve? É claro que entendo! Nós sofremos por motivos diferentes, mas todas as dores são iguais. O sofrimento é o mesmo, Louis! Não tente colocar a sua dor acima da minha. - Soluço, me irritando pelas lágrimas gordas ensopando o meu rosto - Nós conseguimos, estávamos aguentando tão bem juntos, eu te ajudava e você me ajudava, então porque quando mais precisamos um do outro seguir em caminhos opostos? Porquê? - Agora eu estou à beira da histéria, tremendo e ofegando, sentindo meu peito latejando pelo bater descompensado do meu coração.
Seus braços se movem e por um milésimo de segundos eu alimento a vã esperança de que ele irá me abraçar, mas no lugar disso segura nas rodas da cadeira, recuando.
- Mitch, leve-o daqui. - Ordena num sussurro e então, Mitch está me segurando de novo, desta vez com muito mais força me arrastando para longe de Louis e o desespero toma conta de mim.
- Não, seu maldito, você não pode fazer isso comigo. Eu não sou uma criança!
- Mas é menor de idade e nosso filho e iremos te levar pra casa. - Meu pai me dirige a palavra, sem se sensibilizar com o meu sofrimento. Saindo antes, seguido pela minha mãe que tem uma mala na mão que eu reconheço como sendo a minha.
- Lou, por favor, não me mande embora. - Imploro, arranhando os braços de Mitch.
- Não vou deixá-lo aqui para me ver morrer. - É tudo o que ele diz e Liam se coloca atrás dele, o semblante caído e ele também não ousa olhar para mim, porque esse desgraçado também já sabia de tudo. Assim como Clare, Sarah e Charlotte. Todos me traíram.
Abro a boca, sem encontrar palavras para expressar toda a minha dor, meu desespero, minha incapacidade de ir e toma-lo como sendo meu. Pois no final ele não é um pássaro que eu posso simplesmente engaiolar, independente de suas limitações ele é um ser humano livre com suas próprias vontades e se ele quer morrer, eu deveria respeitar sua vontade.
Mas não quero.
Não vou.
Não posso.
Então a rosa espatifada me vem a mente, abandonada entre as páginas emboloradas de um livro com valor sentimental, que acolhera as lembranças de uma garotinha até o fim de sua vida, quando era uma mulher, uma mãe, uma esposa e que permanecera como um tesouro precioso para ele. Seu trecho predileto do livro se voltaria contra ele, como uma maldição entoada pela minha voz rouca e exausta:
- E eu, eu rezo uma oração... hei de repeti-la até que minha língua se entorpeça... Louis Tomlinson, possas tu não encontrar sossego enquanto eu tiver vida! Dizes que te matei, persegue-me então! A vítima persegue seus matadores, creio eu. Sei que fantasmas têm vagado pela terra. Fica sempre comigo... encarna-te em qualquer forma... torna-me louco! Só não quero que me deixes neste abismo, onde não posso te encontrar! Oh, Deus! é inexprimível! Não posso viver sem a minha vida! Não posso viver sem a minha alma!
Creio que ninguém jamais falará estas palavras com tanta paixão, raiva e agonia de uma só vez. Os olhos de Louis tremem e as mãos caem ao lado do corpo. Espero sua expressão, uma reação sequer, mas sou arrastado para longe do meu amor como se uma corrente se prendesse em meus membros e me puxassem contra aquilo que eu luto para alcançar, ele vai ficando cada vez mais distante. Mal sinto a chuva caindo sobre mim ou meu corpo sendo colocado dentro do carro, tudo que raciocino é que as portas estão trancadas e as janelas fechadas, minha mãe está sentada ao meu lado, tentando me acalmar.
- Filho... - Chama quando eu pulo sobre seu corpo tentando destravar a porta, tento a outra e continua na mesma - Harry, se controle.
- Abre essa merda! - Grito para ela, dando um soco na janela. Viro para olhar para a mansão pela janela traseira e lá está Tomlinson, debaixo da torrente olhando para mim uma última vez pela porta.
Bato nos vidros.
- Louis! Louis, não faz isso! Não, por favor, não. Eu vou ser um bom menino, eu prometo, mas não faça isso comigo. Eu serei melhor, pelo amor de deus, não faça isso. - Clamo como se ele pudesse me ouvir, sentindo meu corpo inteiro tremendo. Também chuto a janela que serve de repartição entre os bancos e meu pai me olha por cima do ombro, encaro o retrovisor esperando que Mitch ouse olhar para mim, o covarde não o faz. Colocando o carro em movimento me roubando do lugar ao qual pertenço.
A chuva embaça as janelas e os jardins vastos vão escondendo a mansão que fica para trás, engolindo a imagem de Louis, assim como nossa história, nosso amor e tudo o que me era importante.
- Eu quero ir pra casa. - Sussurro quando meu coração não é mais forte o bastante para aguentar a pulsação e eu vou escorregando no banco, Anne me embala em seu colo, afagando meus cabelos.
- Estamos indo pra casa, bebê.
- Não, eu sou um desabrigado agora... - E desfaleço nos braços da minha mãe.
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