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15 • | the smell of your perfume still stuck in the air

Sorri involuntariamente ao sentir uma doce e fresca brisa acariciar minha pele. Por um momento era como se a paz reinasse em minha mente e coração, tamanha era a calma em que me encontrava. O que infelizmente foi arruinado por aquela luzinha amarela, que parecia estar querendo queimar minhas córneas. Em um momento tudo estava escuro e tranquilo e de repente lá estava ela, se infiltrando nas minhas pupilas e clareando tudo de uma forma irritante e desagradável. Eu quero manda-la para longe, mas meus músculos estão todos travados e eu me sinto como se estivesse amarrado.

- Harry... - Alguém me chama, com a voz mansa - Aqui, pode me ouvir? - Repetiu, e eu consegui piscar, sentindo a pessoa afastar os dedos dos meus olhos, assim como a luz - Ótimo, temos repostas das pupilas. Consegue apertar minha mão? Pode ser de leve.

A minha visão está completamente borrada e a sua voz parece acompanhada de ecos que me impedem de discernir a quem pertence. Então apenas tento fazer o que ele pede, acreditando que isso, de alguma forma, me ajudará a voltar ao normal. Tento fechar meus dedos nos seus, contudo apenas três deles se movem de forma desordenada e dolorosa. Os outros eu não consigo nem ao menos sentir.

Uma mão se esfrega ao longo do meu braço, num gesto reconfortante.

- Tudo bem, meu amigo. Que tal tentarmos com a outra, an? - Sugere e eu posso sentir sua pele tocando a minha mão esquerda. Me concentro o máximo que posso para mover o pulso e encaixar meus dedos nos seus, o que felizmente acontece e ele comemora: - Ótimo. Bom, muito bom mesmo. Os seus reflexos estão um pouco lentos, assim como os movimentos, mas já era de se esperar.

- Q-quem...? - Balbucio, piscando mais algumas vezes, conforme minha visão vai se clareando aos poucos, deixando que eu consiga reconhecer o vaso de flores sobre a penteadeira do meu quarto. Elas estão morrendo... Eu morri também?

De repente, a imagem dos lírios é coberta pela de um corpo largo vestido em branco, cabelos negros armados e um sorriso grande e acolhedor que eu conhecia desde bem pequeno. Ele passa a mão pela minha testa, afastando meus cabelos antes de deixar um beijo carinhoso, como sempre fazia.

- Grim-m... - Me esforço para falar, porém a minha língua dói e pesa. Meu maxilar parece travado, duro demais para se permitir mover.

- Harry. - Ele me chama, mas meus olhos já caíram para meus braços enfaixados, alguns dedos das minhas mãos firmementes apertados em gesso e meu calcanhar em cima de um amontoado de travesseiros, completamente engessado e imobilizado. Eu estava sem camisa e isso me permitia ver as muitas e muitas marcas que cobriam meu corpo. Tento me levantar inutilmente por não conseguir sentir quase nada do pescoço pra baixo.

- Harry, eu preciso que você fique calmo. - Nicholas pede, se sentando ao meu lado e aquela simples aproximação causa calafrios por toda a minha pele, o ar fica cada vez mais rarefeito, assim como a imagem do quarto vai se desintegrando pouco a pouco diante dos meus olhos. É uma sensação esmagadora, que pesa sob meu peito e a única certeza que eu tenho é de que estou prestes a morrer.

- Girafinha, ei, girafinha. - A voz sopra baixinho no meu ouvido. Me segurando antes que eu caia no abismo. Por ela eu consigo respirar fundo e me acalmar, mantendo os olhos fechados, sem querer ver o mal que aqueles imbecis me fizeram.

Eu não sei ao certo o que aconteceu, no entanto ainda haviam vagas lembranças da surra, do armário, Louis e a volta para a mansão e então, mais nada. Era um compilado de tragédia após tragédia.

- Eu disse que era melhor que o senhor esperasse do lado de fora. - Ouvi Nicholas dizer.

- Como se eu fosse do tipo que recebe ordens. - Louis rapidamente respondeu. Eu podia sentir seu corpo próximo ao meu, o cheiro de seu perfume com meu nariz rente ao seu peito, suas mãos acariciando meu rosto e dando leves batidinhas - Haz, tudo bem? Eu sei que pode me ouvir, precisamos que você acorde agora, okay? Vamos, você consegue, garotão!

Luto contra o peso das minhas pálpebras para conseguir encarar novamente o clarão, agora do sol que invadira o quarto e deixara tudo aceso demais. Identifiquei de primeira a camisa de Louis, uma seda azul macia que acariciava minha bochecha, mais acima estava o seu rosto bonito. Os traços perfeitos, dignos de um anjo, mas pertencentes a um homem, um homem que me tinha em seus braços com tanta ternura que em nada se assemelhava ao que chicoteara um garoto e espancara outro.

As costas de seus dedos correm por meus braços e eu recuo, tremendo pela sensação incômoda que se apodera de mim. Não se trata mais de afeição, carinho ou desejo. O toque constante dele me causa algo que eu nunca havia sentido por ninguém, nem mesmo por Anthony. Eu sinto nojo de Louis. Tanto nojo que eu tenho a certeza de que se suas mãos continuarem em mim irei vomitar aqui e agora.

- D-dou-dout-or. - Novamente estou unindo todas as minhas forças para estender a mão em direção a Nicholas, que na hora pede que Louis me coloque de volta nos travesseiros. Eu me arrasto para o mais longe possível dele, querendo evitar qualquer tipo de contato.

- Eu não entendo. Porque ele está falando assim? Você disse que ele não tinha fraturado a mandíbula. - Tomlinson pergunta, ainda não ciente que eu o quero distante e se senta protetoramente a minha cabeceira.

- Não, acredito que tenha sido por conta da sedação. Ele vai voltar a falar normalmente em poucos minutos.

Observo com os olhos atentos Nicholas andando de um lado para o outro no quarto. Há equipamentos e malas por toda a parte. Eu não sei para o que servem, mas tudo me remete a um quarto de hospital. Eles construíram uma espécie de UTI pra mim?

- Como se sente, amor? - Louis se inclina, aproximando o rosto do meu e eu guincho, o fazendo saltar para trás - Mas o que significa isso?

- Oh, Sr. Tomlinson, ele acabou de acordar, está confuso e assustado. Peço ao senhor que por gentileza evite contatos tão diretos com ele.

- Certo. - Ele se afasta, descansando as mãos no colo - Está bem.

- Obrigado pela colaboração. Agora, Harry, pode me ouvir? - O Dr. Grimshaw volta a falar diretamente comigo. Ele se senta em uma cadeira ao lado da cama, uma máquina estranha que parece um televisor está ao seu lado, nele há uma figura estranha, meio borrada. A ignoro para assentir a resposta do médico que sorri para mim - Ótimo, eu estou aqui porque o Sr. Tomlinson pediu que eu viesse de Holmes Chapel para Londres, cuidar de você. Houve um acidente, um acidente desagradável no seu colégio e eles te feriram, bastante. Se lembra disso? - Concordo - Isso teve consequência, na hora você pode não ter percebido, mas você ficou muito ferido. Dois de seus dedos da mão direita foram quebrados, o calcanhar torcido, há escoriações, luxações e fraturas por diversas partes do seu corpo. Os seus braços apresentam hematomas profundos, devido aos golpes recebidos e pelo inchaço que se apresentava na sua coluna achamos que seria melhor mantê-lo inconsciente. Sedado.

- Quanto t-tempo? - Perguntei aquilo no tempo em que um discurso seria feito, embora estivesse orgulhoso por não ter gaguejado e ter conseguido completar a pergunta.

- Três dias. Devido ao tempo em que você ficou preso dentro daquele armário, a falta de comida e água resultaram em uma desidratação, consequentemente também da falta de ventilação. Seus pulmões tiveram que trabalhar o dobrado, assim como o seu coração, que tem se apresentado bem cansado utimamente, Harry.

- C-como assim?

- Lembra daquele problema cardíaco que muitas pessoas da família do seu pai tem?

- A do coração acelerado?

- Essa mesma. É uma arritmia cardíaca, coisa comum, porém na sua família ela aparece um pouco mais severa. Bem, até demais, três tios seus sofreram de morte súbita. - Ele diz, com cuidado, se certificando de que eu esteja entendendo e entrelaça seus dedos, olhando fixamente para mim ao completar: - Você tem um problema cardíaco, Harry. Não é fatal, mas precisa ser controlado, o que não poderá acontecer porque a medicação é forte demais e...

- E pode matar o bebê... Se ele já não estiver morto. - Louis diz do meu lado, a voz carregada de um severidade assustadora que só me levou a me afastar ainda mais dele.

- O bebê... O bebê está bem?

- Ainda não chequei.

- Que belo incompetente!

- Sr. Tomlinson...

- Pro inferno com o Sr. Tomlinson, eu o trouxe aqui para cuidar do bebê e tudo o que você tem feito até agora foi enrolar.

- Eu estava cuidando do Harry. De que vale prestar atenção ao feto e deixar quem o carrega a Deus dará?

- Coisa que podia ter feito em minutos, mas não, você só tem arranjado desculpas para prejudicar a criança e agora vem com essa ideia idiota de remédio. Estou desconfiando que você esteja de comunhão com os pais de Harry. Fale a verdade, quanto os urubus te pagaram para vir aqui fazer o aborto?

- O senhor está me ofendendo! - Nicholas exclamou, um pouco alterado.

- Foda-se, eu não confio em você. - Louis rosna, se progetando sobre mim como um leão raivoso que protege a cria. Os dentes apertados e as unhas fincadas no colchão, até mesmo o topete caramelo se assemelhando a uma juba. Isso me causa uma nova onda de asco por ele.

Da onde vem esta raiva súbita?

- Acho que precisa se acalmar.

- E eu acho que você precisa me dizer se a minha filha está viva ou morta. - Sua voz ecoa forte e decidida e os olhos do doutor se arregalam em espanto, os meus também estão, mas Louis parece não se dar conta do que ele acabou de dizer. O olho e ele não aponta nem um pouco de arrependimento ou desconforto pelo que disse, talvez nem tenha se dado conta, ainda assim o doutor prefere se calar. Ele espreme um tubo em suas mãos e esfrega o gel frio sobre a minha barriga, estremeço e torno a sentir Louis acariciando minha bochecha.

- Vamos ver como o bebê está. - Nicholas passa uma maquininha estranha na altura do meu umbigo e a esfrega na região. Não entendo o que aquilo significa até o quarto ser embargado por um som ritmado e inconfundível.

- Isso é...?

- O coração do bebê, ele é forte, não?

As batidas se tornam mais altas e eu viro o rosto para o pequeno ser na tela. Eu já havia visto isso uma vez, quando minha prima estava grávida e tivemos que acompanha-la, não entendia porque ela ficava toda encantada olhando para a tela com os borrões em preto e branco, não significava nada pra mim. Eu não enxergava nada lá, porém agora, eu vejo. Sim, definitivamente vejo.

- Bem, você estava certo, Sr. Tomlinson, é uma garotinha. - O fato de Nick informar aquilo a Louis me incomoda profundamente, o que se agrava quando ele aproxima seu rosto da tela, quase tapando a minha visão apenas para dizer:

- Ai está ela. Eu sabia que a Melly estava bem.

- Vai embora! - Grito de repente. Um vinco surge no meio das sobrancelhas do médico.

- Quer que eu me retire?

- Não você, o Louis.

- Quer que eu saia, Harry? - Ele inquere, descrente, apertando os olhos cegos em minha direção, os lábios entreabertos.

- Quero, por favor.

- Por quê?

Porque eu quero distância de você!

- Senhor, é só por um momento, ele acabou de acordar e está ouvindo o coração do bebê pela primeira vez. É preciso assimilar tudo, alguns minutos sozinho lhe fará bem. Eu fico aqui para garantir que ele esteja em segurança.

- Mas...

- Venha, eu lhe ajudo... - Nicholas faz menção de levantar para ajudar Louis a sair e eu imediatamente balanço a cabeça, indicando que é melhor não. Louis suspira, passando a mão pelos cabelos ainda confuso e se levanta. Eu não viro para olhá-lo partir, mas escuto o som de sua bengala martelando o piso e então da porta sendo fechada.

Quando ele sai ficamos em silêncio, ouvindo apenas o som das batidas do coração de Melanie. A imagem na tela pode ser borrada e difícil de discernir, mas eu via com clareza a cabeça, um narizinho minúsculo, bracinhos encolhidos e perninhas afastadas e a ausência de um órgão ali deixava claro que sim, aquela era a minha garotinha. A maldade daqueles garotos, por sorte, não foi o suficiente para feri-la.

Me perdi na tela, memorizando cada detalhe seu, o mínimo movimento era captado pelos meus olhos e as vezes eu esquecia que ela estava dentro de mim e só quando o Dr. Grimshaw movia o aparelhinho, lembrando a mim mesmo que eu a carregava e o quanto ela dependia de mim. Se algo me acontecesse, aconteceria a ela; se aqueles garotos vierem atrás de mim, viram atrás dela também; se o meu coração parar ela também morre e se... se Louis ter mais um de seus ataques de fúria e me ferir, irá feri-la também.

- Como pode ver ela está bem. Ela é bem grandinha e ainda estamos nos quatro meses, imagino como estará aos nove. - Ele comenta, não arrancando nenhuma reação de mim. Apenas encaro o monitor, impassível. Então ele o desliga e seca minha barriga, antes de puxar os cobertores abaixo do meu pescoço e eu não posso mais fingir que estou alheio ao que ele diz - Precisamos conversar.

Silêncio.

- Certo, então já que só eu vou falar é melhor ir direto ao ponto. O que há entre você e o Sr. Tomlinson?

- Nada.

- Harry, por favor. - Bufa, coçando a têmpora - Nós somos amigos, lembra? Eu disse que não contaria a ninguém e não contei, mas agora eu preciso que seja totalmente sincero comigo. Seus pais vieram atrás de mim, eles sabem e estão furiosos, e então do dia pra noite esse homem manda que eu seja trazido as pressas para tratar de um "simples funcionário". Quer dizer, se a preocupação excessiva e ele acampando ao seu lado não tivessem sido pistas suficientes o amor dissipou qualquer dúvida que eu tivesse de que há algo entre vocês. Não pretendo julgá-lo, porém não pude deixar de notar que ele é um homem com o dobro da sua idade, cego e obscenamente rico.

- Acha que estou com ele por interesse? - Levanto os olhos para encara-lo e Nick nega.

- Bem, você não me pareceu muito entusiasmado com ele. Acredito que ele é quem deva ser a parte interessada, imagine um garoto jovem, assustado, bonito e desamparado surge a sua porta, parece uma oportunidade e tanto não acha?

- Ele está se aproveitando de mim. - Concluo o seu pensamento, sem ao menos levar em consideração. Eu não sei o que acontece ao certo, mas eu me sinto diferente, meus olhos para com esta casa não são mais os mesmos que há dias atrás, é como se tudo estivesse mudado, principalmente à mim. Me sinto seco, vazio, totalmente oco.

Talvez meio morto.

- Ele é o pai do bebê? - Movo a cabeça em negação e ele franze a testa - Isso só me faz desconfiar ainda mais de seu comportamento. Ele parece empolgado demais com uma criança que não é sua, ainda mais quando sabemos dos riscos que estão envolvidos.

- Ele é assim, voluntarioso. Em um dia eu sou o caipira burro e no outro seu amor.

- Wow, acho que você não gosta muito dele. Oh céus, garoto, não me diga que está com ele apenas pela criança?

Viro o rosto para o teto, examinando o gesso branco e refletindo sobre sua pergunta. Porque eu estava com Louis mesmo? Que diabos me levou a dividir a cama com um homem intempestivo como aquele? Louis não era muito melhor do que Zayn ou Anthony. Ele me tinha na coleira como um cãozinho, pronto para acatar as suas vontades e tolerar seus ataques, sinceramente, o que pode haver nele que compense tantas coisas ruins? Acho que esse ataque me serviu para, enfim, acordar!

- Você o ama?

- Não. - Respondo automaticamente.

- Harry.

- Sim?

- Eu estou preocupado com você, você me parece bastante distante desde que acordou.

- Me sinto normal.

- Você age daquele jeito com Louis?

- De que jeito?

- Frio, distante, você nunca foi assim. Te conheço desde criança. Tem a ver com o que houve na escola? Quer falar sobre isso?

- Você disse algo sobre um problema cardíaco. Significa que eu vou morrer? - Observo Grimshaw enrijecer, ele abre e fecha a boca algumas vezes, provavelmente desconcertado pela minha mudança abrupta de assunto.

- An, não! Ainda assim não é inofensivo, os remédios estão suspensos por hora, mas eu lhe receitarei uma receita balanceada, nada de atividades físicas e procure se manter em ambientes calmos. Longe de fortes emoções.

- Acho que terei que me mudar, então. - Resmungo para mim mesmo. Deixando que meus olhos vagassem para um envelope timbrado em cima da cômoda, eu conheceria um daqueles a léguas. Meu pai já emitira tantos do escritório - Louis foi intimado?

Nicholas dobra o pescoço e se levanta, caminhando até o envelope e checando se está aberto. Ao confirmar ele puxa o papel de dentro e balança a cabeça, enquanto fala:

- É uma intimação por agressão, tem duas. Uma por quebrar a mão de um adolescente e a outra por... Céus, o menino está em coma! Quanta brutalidade! - Ele exclama embasbacado e se vira para mim - Harry, este homem tem claros problemas, você não pode ficar nem mais um segundo perto dele, quanto mais no seu estado. Tenho uma casa de campo em Kent, pode se mudar para lá quando estiver recuperado. - Nicholas torna a se aproximar, se ajoelhando próximo ao meu leito - Nada o prende a esta casa. Eu farei tudo o que estiver ao meu alcance para ajudá-lo, não precisará se entregar a este homem cruel.

Um pequeno e solicito sorriso se forma em seus lábios, enquanto ele bagunça meus cabelos e anuncia que fará os preparativos. Assinto, sentindo minhas pálpebras pesadas demais para se manterem abertas e fechos os olhos, embargado para um sono sem sonhos, tampouco tranquilidade.

Acordo com os chamados agudos e incessantes de Louis por meu nome. O sol já parece prestes a se pôr quando consigo me sentar no colchão, o vendo de braços cruzados em frente a minha cama, olhos fundos e o rosto pálido e sofrido, como se estivesse exausto.

- Que história é essa de ir para Kent com aquele merdinha?

- O que você acabou de dizer, estou indo para Kent com o Dr. Grimshaw. - Respondo em meio a um bocejo.

- Ah, entendi. Você está zombando de mim, certo, certo, muito engraçado, girafinha. Sim, eu gosto de você e quero que fique. Pronto, estamos entendido. - Ele bate as mãos e solta um gritinho animado, como se estivéssemos realmente em uma brincadeira, apesar de continuar a encara-lo sem expressão.

- Não estou tentando chamar a sua atenção.

- Então...?

- Estou de partida.

Louis inclina a cabeça para o lado e esfrega os dedos pela barba, as sobrancelhas se estreitando.

- Seu senso de humor é um grande mistério pra mim.

É claro que ele não me leva a sério. É claro.

- Deus te odeia, Louis Tomlinson. - Digo e ele dá um salto para trás, a boca pendendo aberta e a confusão em seu rosto crescendo ainda mais. Coloco meu pé com cuidado no chão e apoio na cabeceira para conseguir me colocar de pé, de imediato uma dor aguda afeta todos os nervos do meu corpo, mas eu me esforço para não dar atenção a ela. Não agora e me arrasto com todo o meu corpo moído em direção a Louis - Deus odeia você e agora ele me odeia também.

- Da onde você tirou isso? Está drogado por um acaso? Com certeza foram aqueles remédios que aquele traste te deu. Eu vou resolver isso agora mesmo. - Dito isto, ele se vira, tencionando ir atrás de Nicholas.

- Antes de você a minha vida era boa. - Ao ouvir minha voz ele interrompe o passo - Antes de você eu nunca vi uma arma, nunca vi ninguém sendo ferido, antes de você nada de ruim tinha me acontecido.

Observo seus ombros enrijecendo e sua cabeça caindo. Os olhos encarando um infinito nada.

- Você machuca as pessoas, Louis. Machuca de verdade. Você se acha muito superior, sempre fazendo discursos e se achando o maior sofredor do mundo, mas você não passa de um maldito. Um desgraçado arrogante que tem me destruído a cada dia.

- Harry... - Chama, ainda de costas.

- Eu não sei o que deu na minha cabeça esse tempo todo, mas agora estou vendo. Estou acordado. O que aconteceu me fez entender, sim, eu entendo tudo.

- O que você entende? - Sua voz sai mais rouca ao que ele vira, com os lábios entre os dentes, em um claro sinal de exasperação e nervosismo.

- Que você é perigoso e todo esse tempo eu só estava com medo. - Digo, vendo seus olhos se fecharem e um longo suspiro romper de seus lábios - Por isso eu fiz, por isso eu me entreguei a você.

- Sabe que não foi por isso.

- Por que mais seria?

- Porque gosta de mim. - A simples ideia de gostar daquele.... Daquele monstro me faz estremecer, não de medo como costuma ser, mas de ódio.

- Eu tenho nojo de você. - Minha voz soa tão fria e dura como eu jamais ouvi, enquanto vejo seu efeito instantâneo no rosto de Tomlinson cada vez mais desestruturado.

Dou um passo para frente ao tempo que ele recua. Louis Tomlinson recuando de mim. Essa é nova.

- Você está delirando. - Diz, sem firmeza alguma - Já vi isso, são os hormônios e o trauma falando. Você está assustado, não tem ideia do que está dizendo.

- Claro que sei!

- Não, não sabe! Isso é um surto. Apenas um surto, a adrenalina e a raiva estão dominando. Eu entendo, já passei por isso, você estava lá, você viu isso acontecendo.

- Não é um surto! Essas coisas ruins que tem acontecido comigo é um claro sinal de que Deus está aborrecido comigo, ele também me odeia.

- Da onde você tirou essa história de que Deus odeia alguém?

- Meus pais sempre diziam que...

- Ah sim, é claro que os seus pais fanáticos e idiotas tinham alguma coisa a ver com isso, mas só pra deixar registrado pessoas como eles. Cheias de julgar e condenar são as que estão mais distantes de Deus.

- Cala a boca. Nós vamos pro inferno!

- Não, não vamos. Seja como for você mesmo me disse que não há um inferno.

- Então é o diabo que me odeia.

- Que tal ninguém te odiar, Harry? São apenas humanos, humanos fazendo coisas ruins para os outros. Apenas.

- Principalmente você. - Levanto os olhos ardentes sobre ele - Eu soube o que houve com Anthony e Andrew.

- Eles tiveram o que mereciam.

- Não, você não entende. É por isso que eu não queria que soubesse. Você age como um animal e não como um ser humano, não é dente por dente ou olho por olho.

- Quando se trata de você é sim.

- Pois eu não quero mais que se trate de mim. Eu não quero ter que tomar cuidado com o que digo ou falo, não quero ter que ficar com medo de você tendo um dos seus surtos, querendo atirar nas coisas ou lançar vasos em mim. Eu vou ter uma filha e ela vai precisar de um pai, eu não posso continuar aqui sendo seu cachorrinho. - Grito, sentindo meu rosto e pescoço arderem e é sufocante a sensação de falar e não ser compreendido. Ele lembra meus pais, se colocando a cima de mim. Impondo a sua opinião e vontades. É como se eu tivesse fugido de uma prisão e me metido em outra, ainda mais opressora.

Ele não me escuta, não dá relevância a nada que sai da minha boca. Apenas mantém os braços cruzados e o semblante de descaso. É claro que ele não se importa, ele sabe que eu não tenho pra onde ir, estragou tudo pra mim com Zayn, com meus pais e agora nem ao menos para o colégio eu posso voltar. Louis me prendeu em sua mansão feito um pássaro na gaiola e ainda por cima quebrou minhas asas.

- Amor... - Estreita os olhos, como se tivesse tentando me encontrar, mas eu não quero que ele me ache. Quero ser invisível, como deveria ser, para ele. O rodeio, em silêncio, deixando apenas que o silêncio nos circunde até quebra-lo com o som do vaso de lírios sendo arremessado contra o chão e ele dá um salto, tão apavorado quanto a vez em que ele virou uma mesa sobre a minha cabeça e me ameaçou. Ele não é o único capaz de assustar.

- Não. - Fico sério, olhando para ele, que gira o corpo em direção a minha voz, a mão repousando no peito ainda pelo susto. Abro a porta com cuidado para que ele não possa ouvir e me aproximo ainda mais de Louis - Eu assisti você morrer. Eu ouvi você chorar toda noite no seu sono. - Sussurro, seu maxilar se aperta e suas mãos abrem e fecham ao lado do seu corpo - Eu era tão jovem. Você deveria saber mais do que apenas contar comigo. - Ergo uma mão, a dor é tamanha que me recuso a reconhece-la. Me sinto anestesiado ao deslizar as pontas frias e secas dos dedos pela pele quente da bochecha de Louis. Um sorriso triste molda em meus lábios ao lembrar que há algum tempo atrás ele quem costumava ser frio - Você nunca pensou nos outros, você só viu sua dor. E agora eu choro no meio da noite, pelo mesmo maldito motivo.

- Por favor, Harry. - Sussurra ele, a voz rouca. Afaga meu rosto com doçura, limpando uma lágrima, que eu nem me dera conta de ter derramado, com o polegar - Por que você tem que usar isso para sair da minha vida?

- Que vida? Nós nunca tivemos uma vida em comum, desde que eu cheguei aqui eu tenho sido o seu bonequinho. Te distraio, te divirto, cuido de você, mas e quanto a mim... O que eu ganho além da sua amargura? Eu cansei de ser o seu saco de pancadas. - Olho para ele impassível, sem pestanejar ou recuar - A pior decisão da minha vida foi ter vindo para essa casa.

Ele arqueja, seu polegar traça o contorno do meu lábio inferior.

- Você só está machucado.

- Você me machucou. - Fecho os olhos, sem conseguir mais olhar para ele. Sinto meus olhos arderem pela força que eu os aperto, sem querer deixar que mais lágrimas caiam. Eu não quero chorar, não quero mais ser fraco. Eu preciso começar a ser forte. Agora. Antes que possam me ferir ainda mais. No entanto, ele ainda me daria o seu golpe de misericórdia ao dizer:

- Estou apaixonado por você.

Quando o som da sua voz pequena e até receosa chega aos meus ouvidos tudo parece mais lento, mais frágil. Deixando que eu ouça com clareza o som das nossas respirações, o bater dos nossos corações e principalmente o quebrar de um deles, quando a minha resposta vem em forma de um empurrão poderoso contra seu peito que o lança ao chão. Me mostrando que eu carrego o mesmo sangue ruim e covarde do meu pai. Louis conseguiu colocar as mãos no chão a tempo de evitar que suas costas se chocassem com o piso, mas mantendo-se sentado no chão, praticamente no corredor.

- Harry!

- Não, não diga meu nome. Não abra essa maldita boca para me dirigir a palavra. - Berro as palavras que um dia ele dirigiu a mim e o vejo em pânico, tentando se levantar e tentar uma reaproximação, então fecho a porta e giro a chave e ele já não pode me tocar. Colo as costas contra a madeira. Sinto um aperto agudo no coração, como se alguém tivesse acabado de cravar uma faca nele e desabo, escorregando até o chão com um série de soluços mudos que fazem com que todo o meu corpo dolorido espasme sem intervalos.

Mas Louis ainda está lá, provavelmente ajoelhado por suas batidas na porta estarem na altura da minha cabeça.

- Me desculpe, eu fui um merda. Eu sempre fui um merda com você. Fiquei tanto tempo sentindo pena de mim mesmo que... que acabei esquecendo que existem pessoas no mundo que também sofrem e você, você esteve do meu lado todo esse tempo e eu não me importei o bastante. Achava que bastava te encher de beijos e caricias que os problemas sumiriam, mas não é assim que funciona. Você precisa de mais do que isso, precisa de alguém que te escute, que te entenda, que se importe.... - Ao ouvir sua voz chorosa eu o odiei ainda mais. Por que ele estava fazendo isso? Por que simplesmente não me expulsava da sua casa e acabava com isso. Por que mentir e fingir se importar? -, que te ame.

- Cala a boca. Sai daqui. - Grito com tanta força que minha garganta arranha e meu peito pulsa pela dor estridente do meu choro que só se intensifica, cada vez mais forte, cada vez mais alto.

- Desculpa por não ter sido o que você precisava, o que você merecia.

- Me deixa em paz. - Peço em meio a soluços, batendo a cabeça contra a porta querendo mandar toda aquela dor embora. Não adianta e eu grito em agonia. Ouço vozes do lado de fora, mas não consigo entender o que dizem, por que dói demais. Dói mais que os chutes e pontapés dos garotos, dói mais do que meu pai me renegando e Zayn me mandando para o inferno, dói porque não é o tipo de dor que se sente no corpo ou no coração, ela é mais profunda, mais potente. É na minha alma e ela sangra, sangra rios simplesmente porque eu posso ouvi-lo chorar e suas unhas arranhando a madeira tentando cavar um buraco e me puxar de volta para os seus braços e meu nome sendo repetido como uma prece e não a desgraça que ele realmente é.

Vou me encolhendo até estar enrolado em meus membros no chão, alguns cachos mais compridos grudam no meu rosto molhado e é difícil respirar enquanto eu engasgo nas minhas lágrimas. Tudo o que eu queria era poder voltar no tempo, na época em que eu era um garotinho com medo dos trovões que a minha mãe abraçava com força e cantarolava até o medo passar, queria poder me esconder em seus braços para sempre, mas eu não posso mais. Não há esconderijo, não há saída, no mundo dos adultos ou você é forte ou você morre e eu não sei como ser forte, contudo preciso aprender o mais rápido possível.

Eu tenho um bebê e preciso encontrar uma maneira de sobreviver.

Mas não com ele, eu não posso. A ultima vez que eu ousei sentir algo por alguém a minha vida virou de ponta cabeça, é loucura me entregar a isso de novo. Por que amar alguém com quem eu nunca poderei me casar, tampouco andar de mãos dadas na rua? Eu não posso! O sacrifício não vale a pena. Mesmo que isso me mate por dentro.

- V-você falou sobre ser meu cãozinho, sabe que isso não é verdade. Você não é um fantoche, de jeito nenhum. Sabe, é engraçado que você tenha essa obsessão em se tornar um homem de verdade, forte e corajoso, porque você já é um, Haz, desde o primeiro dia. Você é a pessoa mais forte e corajosa que eu conheço, eu queria de verdade ser metade do homem que você é.

- Eu não quero ouvir suas mentiras. Vai embora. Morre, Louis!

- Não, girafinha, eu não vou morrer enquanto você não se der conta do homem incrível que você é.

Encolho os ombros, tremelicando no chão e querendo mais do que tudo ser feito de poeira para que o vento que entra pela minha janela pudesse me levar para longe ou simplesmente apagar a minha existência.

O silêncio do outro lado reina, por minutos, horas, dias talvez. Eu realmente não sei ao que continuo a me entregar à minha dor. Até ouvir uma voz, melhor um suspiro, tão baixo e suave que eu não sei dizer ao certo se fora real.

- Sinto muito por ter te machucado.

Deve ter sido apenas um sonho.

Xx

Estou tão cansado de ficar aqui, o meu quarto é sem graça. Monótono demais, com suas paredes rosadas, cortinas creme e móveis brancos. Parece sem cor, sem vida, assim como eu. Observo a figura fantasmagórica no espelho, com a pele pálida, beirando a transparência devido a falta de sol em semanas, meus olhos se habituaram ao inchaço pelas lágrimas que se recusam a parar de escorrer durante a noite. Ao longo do dia é assim que eu me mantenho, seco e estéril. Nada parecido com os dias de outrora em que eu tinha beijos suaves me acordando nas manhãs e investidas duras, acompanhadas de gemidos roucos ao anoitecer.

Minha pele parece gelada e ríspida todo o tempo, não importa quantos banhos quentes ou cobertores grossos eu coloque sobre mim. O frio não passa e tudo pela ausência do toque macio dele... Não, não, não. Eu não posso pensar nisso, tenho ido tão bem, já haviam se passado três semanas sem que eu o visse. Os hematomas pelo meu corpo estavam sumindo, havia uma nova dieta e a calmaria impedia que eu tivesse qualquer aceleração no coração, meu tornozelo estava quase que totalmente curado e eu mancava pouco, o bebê estava bem e o Dr. Grimshaw ficara em Londres para acompanhar meu pré-natal. Passado os primeiros meses os enjoos e tonturas diminuíram consideravelmente, restando apenas o sono infindável onde eu era capaz de dormir até de olhos fechados, os desejos absurdos que obrigavam Clare a ir até os confins de Londres para encontrar e por fim, a fome que não me abandonava nem um segundo do dia. Acredito que se continuar a comer do jeito que estou não vou mais conseguir passar pela porta, já que o cheinho inicial da gravidez, deu lugar ao imenso, era carne demais nos lugares errados. Há uma semana atrás quando Ed e Niall vieram me visitar - os trocados que Louis disse ter lhe dado tinham sido mais do que o bastante para que ele comprasse uma fazenda em Galway, onde ele, Gemma e o cavalo roubado viviam alegremente - depois de ter dado um ou dois cascudos naquela cabeça amarela dele por ter roubado minha irmã, nós jantamos e eu soube que estava em maus lençóis quando repeti o dobro de vezes que Niall.

Isso era um péssimo sinal.

Esfrego os dedos pelo meu rosto, apertando as bochechas só para me lamentar pelo quão redondo meu rosto está, apesar do sono excessivo haviam marcas escuras abaixo dos meus olhos, não eram mais pelos socos e sim pelas noites mal dormidas, naquelas em que o rosto de um certo alguém assombrava os raros sonhos agradáveis que tinha. Eu não queria ver ou pensar nele, então sentava na cama e encarava a escuridão e consequentemente pensava nele.

Tudo me lembrava Louis.

Ele estava impregnado nas minhas veias, feito uma droga na qual sou viciado. Tinha a impressão de escutar sua voz, de ouvir os seus passos e até mesmo vê-lo no meio da noite ao pé da minha cama como uma miragem.

Isso não importa de qualquer forma, porque hoje eu tirei o gesso do pé e as faixas dos braços. Meus dedos precisariam de um pouco mais de tempo, mas eu estava plenamente recuperado. Começaria a arrumar minhas malas e em breve daria adeus a esta casa.

É a coisa certa a se fazer e com o tempo todas as feridas irão sarar.

- Com licença. Posso entrar? - A pergunta de Charlotte vem acompanhada de duas batidinhas na porta, trancada, apenas para manter certas pessoas afastadas.

- Claro. - Digo, sorrindo pequeno ao abrir e lhe dar passagem. Ela tem seus cabelos platinados em cachos bem ordenados, puxados para trás por uma tiara, um vestido amarelo de mangas longas com rendas nas saia de pregas e um cinto na cintura, uma bolsa de mão da mesma cor que suas roupas e o rosto lindo e impecável como sempre. Na verdade, a Srta. Tomlinson estava radiante - Está encantadora, senhorita.

- Oh. - Ela diz, baixando os olhos para si, como se só agora se desse conta disto e sorri para mim com seus olhos azuis brilhantes - Também está muito bonito, Harry. - Passo a mão por meu suéter azul que tem alguns farelos da torta de ameixa que eu devorara inteira há poucos minutos, estava usando meu jeans mais largo com um tom alaranjado que minha mãe sempre odiou e bem... Eu acho que definitivamente já tive dias melhores, mesmo assim agradeço ao seu elogio - Como se sente?

- Bem. É ótimo não ter faixas e gesso por todo o corpo.

- Sim, imagino. Eu falei mais cedo com o Dr. Grimshaw e ele me informou sobre a sua decisão de ir com ele para Kent. Sabe que sua partida será uma grande perda.

- Sei que encontrarão alguém para me substituir. - Murmuro, tentando soar otimista, mas seus olhos baixos e a linha reta em sua boca evidencia que não é sobre o emprego ao que ela se refere. Todos ouviram por horas Louis Tomlinson gritando a minha porta uma série interminável de eu te amo's e também viram eu o afastando com unhas e dentes. As coisas não podiam estar mais complicadas.

Lottie suspira pesado antes de levantar o rosto para mim, um olhar estranho, seguido de um animado ao que estende uma mão.

- Gostaria de me acompanhar a um lugar?

- Que lugar?

- Preciso fazer uma visita a Fizzy e acho que ela gostaria de te conhecer. - Diz simplesmente.

- Fizzy? Felicite? A irmã de vocês?

- A própria, o que me diz?

É minha vez de lhe lançar um olhar estranho, sem saber em que mundo seria apropriado tal encontro.

- Charlotte, eu não acho que seja uma boa ideia.

- Serei obrigada a discordar de você, querido. Por favor, dê a ela uma chance. Apenas um encontro. - Ela insiste com a voz doce, me convencendo apenas com seu sorrisinho de lábios comprimidos que tragicamente me faz lembrar de seu irmão. Encaro sua mão estendida mais um pouco antes de segurá-la.

- Está bem.

- Magnifico! Venha. - Charlotte segue para fora, mantendo sua mão na minha e acompanhando meu passo lento, me dando apoio ao descer da escada de onde podemos ouvir uma conversa, diga-se de passagem bizarra, vinda da biblioteca.

- Filho de uma puta cega! - Alguém exclama do lado de dentro. As portas estão fechadas, mas pelo tom pode-se dizer que a pessoa está aborrecida.

- Obrigado pela parte que me toca. - É a voz de Louis, o que causa calafrios de imediato por toda minha epiderme. Ela parece rabugenta, como sempre. Eu senti tanta falta... Não, Harry, não faça isso.

- Pela parte da puta ou da cega? - Desta vez posso dizer com convicção que a voz pertence a um homem, mas não se trata de Liam.

- Sr. Rowland! - Charlotte chama de repente e a porta se arrasta, estico o pescoço tentando ver algo do lado de dentro, mas ele a fecha logo em seguida. O ar é impregnado pelo cheiro de cigarros e licor, as coisas prediletas de Louis em todo o mundo. O tal senhor Rowland é um sujeito muito estranho, e eu decido que não gosto dele, não sei se é pelo sorrisinho cínico em seus lábios ou pelo passo demorado, ele parece estar se deliciando com cada segundo que se demora para chegar até nós. Ele para exatamente a minha frente sendo exatamente da minha altura, o corpo esguio em um terno escuro, cabelos negros e uma barba quase tão bem moldada como a de Louis, afasta o cigarro de seus lábios soprando a fumaça para cima.

- Mitch Rowland, seu humilde criado. - O homem se dobra, fazendo uma revência exagerada como se eu fosse algum príncipe.

- Mas o que...? - Viro a cabeça para Charlotte que tem um olhar sagaz para a cena.

- Mitch é um velho amigo da família...

- Sim, Louis e eu costumávamos ser amantes. - Sinto meu pescoço estalar com a velocidade que volto o olhar para Mitch que começa a gargalhar feito um idiota.

- Deus, você precisava ver a sua cara. Foi meio assustador. - Ele fala em meio aos risos.

- Err... Como eu estava dizendo, Mitch é um velho amigo da família, ele serviu junto com o meu irmão e cuidou dele por alguns anos.

- Ah, saudades do tempo em que eu ficava bebendo e fumando com Louis o dia inteiro e vocês me pagavam pra isso. - Diz com um suspiro sonhador e se debruça no corrimão para me encarar - Soube que você teve uns problemas na escola. Valentões de merda, é uma pena que tenham demorado tanto pra me contratar eu podia ter dado um jeito neles.

- Te contratar?

- Você não sabe? Eu sou seu novo guarda-costas, Sr. Styles. Nossa! Eu gostei desse nome, é legal, tem estilo, literalmente. Acho que vou comprar um gato e dar esse nome pra ele.

O encaro, em parte confuso e em parte irritado e uma outra parte menorzinha fica com raiva ao lembrar que Sun me abandonou para se mudar para o quarto de Louis e nem ao menos olhava na minha cara quando o encontrava no corredor e tentava brincar com ele. O cretino me desprezava totalmente.

- Eu não quero um guarda-costas.

- Querer não é poder, Sr. Styles. - Mitch retruca, voltando a fumar e examinando as unhas.

- Não você não entendeu, eu não quero um guarda-costas. Eu sou um cara normal, não o presidente.

- Legal. A segurança do presidente Styles é prioridade máxima. - Desta vez até Charlotte imita minha carranca ao olhar para o tal segurança que está imitando a voz de algum agente secreto do cinema.

- Pode parar de repetir o meu nome?

- É mais forte do que eu, Sr. Styles. - Reviro os olhos e Lottie aperta meu braço.

- Ele é um pouco implicante, mas estamos pensando na sua segurança, Harry. Ainda mais agora que pretende se mudar para Kent, não quero que nada aconteça a você ou a criança. - Ao que ela diz aquilo olho de canto para Mitch que não esboça nenhuma surpresa. Oh, mais um que sabe de tudo - Por favor, aceito-o, pelo menos por hora.

Sou obrigado a aceitar sabendo que por mais que eu não queira um segurança é o melhor a se fazer. Anthony chegou a entrar uma vez nesta casa, sem que ninguém sequer desconfiasse e ele tinha todos os motivos do mundo para tentar novamente e não apenas para roubar uma bengala, mas para causar estrago de verdade.

Mitch serviu como nosso motorista, ele conduziu o cadillac vermelho-vinho com teto branco de Charlotte, o automóvel mais lindo, luxuoso e extravagante que o dinheiro podia comprar e o qual eu ambicionava andar desde que cheguei até a mansão dos Tomlinson. O Sanatório Hope London ficava a poucas quadras e em nada se assemelhava a minha visão de sanatório. Imaginei um lugar feio, com árvores mortas, paredes velhas manchadas com sangue, teias de aranha e o uivo de um lobo só pra completar, o que na verdade não tinha nada a ver com o que era na realidade. Havia um jardim tão grande e bem cuidado quanto o da mansão. Árvores grandes, com frutos suculentos, galhos cortados e até alguns passarinhos voando ao seu redor. Moitas bem aparadas, a grama rente e verdinha, apesar do frio estava sendo regada por uma moça bonita de cabelos escuros, cantarolando um sucesso antigo de Little Richard, pois mais a frente estava uma roda de pessoas com roupas brancas dançando Lucille em pares, seguindo os passos do professor. Eles riam e inventavam seus próprios passos e não pareciam loucos assustadores.

O Sanatório era um prédio com tijolos vermelhos, silencioso e calmo. Ninguém gritava ou falava em línguas lá dentro, parecia um lugar como qualquer outro. Muitas pessoas entravam e saiam, saltitando pelas escadas ou empurrando alguém em um cadeira de rodas pela rampa. Faziam pouco mais de vinte minutos que Charlotte tinha subido aquelas escadas e deixado Mitch e eu no carro, à sua espera.

Ela disse que voltaria em breve para me buscar.

- Argh, acho que engoli um inseto. - Mitch reclama do banco do motorista, pigarreando na tentativa de tirar o tal inseto da garganta - Merda viu!

- Ah.

- Você não fala não? - Ele arranca o cinto, colocando o cotovelo no encosto do banco antes de se virar para mim. As sobrancelhas acima do óculos escuro inquisitivas.

- Falo.

- Tá, mas o Louis me disse que você era tagarela.

- Não fale dele. - Resmungo, puxando um fio solto do punho do suéter para não ter que lhe dar atenção. O escuto bufar, irritado pela minha recusa em manter uma conversa com ele.

Mais alguns minutos com um silêncio desconfortável pairando sobre nós até que Mitch começa a me dar sérios motivos para acreditar que ele seja hiperativo quando tamborila os dedos na lataria do da porta, assoviando em conjunto e me fazendo ter uma vontade louca de bater a cabeça na janela.

- Sabe isso me lembra um história engraçado sobre um namorada que eu tive no Tibet... - Diz, aleatoriamente, chamando minha atenção.

- Você já esteve no Tibet?

Então ele se vira, arrancando os óculos e me encarando com imensos e atrevidos olhos verdes. Prenso com força minhas costas no banco achando que o tempo nesse lugar o fez ficar louco e ele está prestes a me matar.

- Nah, Styles, só estava puxando assunto. - Ele diz, adotando uma expressão mais normal - O capitão da nossa divisão costumava dizer que eu não conseguia manter a boca fechada, aquele velho chato. Tinha o mesmo sobrenome que o seu.

- Nossa, que interessante. - Digo, fixando os olhos em uma trepadeira perto de um dos bancos de pedra.

- Eu só estou tentando fazer amizade. Sou uma pessoa muito sociável. Acho que podemos ser grandes amigos, do tipo que fazem pactos e toda essa caralhada? - Esgueiro os olhos para ele, as sobrancelhas arqueadas e a boca torta em total incompreensão. Por sorte Mitch se dá conta e se apressa em explicar - Não pactos de sangue, okay? Sabe daqueles que tipo prometem não comer carne por um ano ou deixar o cabelo crescer, isso a gente podia fazer. Ia ser legal.

- Não tenho planos de ser seu amigo, de fazer pactos, tampouco deixar o cabelo crescer.

- Ah, qual é?! Você ia ficar um pão e tanto. - Levanta uma mão para dar um tapinha em um cacho perdido na minha testa.

- Obrigada, mas eu prefiro ser um ser humano a uma massa.

- Essa foi quase engraçada. Acho que estamos começando a chegar em algum lugar... Opa, estamos sendo convocados. - Olho para a direção que ele aponta. Charlotte está em pé na entrada balançando os braços no ar, indicando que devemos ir até ela, num primeiro momento eu abro a porta pronto para sair, mas Mitch consegue me alcançar antes que eu coloque os pés pra fora empurrando um casaco para mim - É melhor colocar isso se não quiser explicar pra toda essa gente como conseguiu engolir uma melancia inteira.

- Minha barriga não está tão grande. - Cochicho me enfiando dentro do casaco que é grande demais para mim e o fecho, mascarando por completo a minha gravidez.

- Em comparação com a minha está gigante. - Ele brinca estendendo a mão para mim.

- Não gosto de você. - Saio do carro por conta própria, me aproximando de Lottie.

- Tudo bem? - Pergunta e eu assinto, a seguindo por um pequeno corredor com paredes azuis até parar em uma porta com o nome Fizzy pintado com estrelas e corações ao redor - Ela está ansiosa para conhecê-lo.

- Não sei se é uma boa ideia. - Reluto, sentindo meus dedos gelados pelo nervosismo.

- É claro que é, vocês tem tanto em comum.

- Como o quê?

- São apaixonados pela mesma pessoa. - Ela responde rapidamente, abrindo a porta e me empurrando para dentro, antes de bate-la as minhas costas. Ainda estou perdido quando olho ao redor do quarto, ele é gigantesco, o dobro do meu na mansão. Janelas largas com cortinas claras, naturalmente há barras de ferro, mas ele é cheio de vida. As paredes inicialmente brancas estão cobertas por tintas, estas que pintam imagens. Todas da mesma pessoa, partes e ângulos diferente, sempre o mesmo rosto.

Meus passos são dados com cuidado, os sapatos se arrastando pelo assoalho que também estava cobertos por desenhos, quadros e pinturas.

"São apaixonados pela mesma pessoa" Agora as palavras de Charlotte fazem todo o sentindo, enquanto aprecio o rosto de Louis Tomlinson cravado nestas paredes. Ele não está como eu conheço, na maior parte aparenta ser dez anos mais jovens, com o rosto liso e um sorriso arteiro e em outras é um garotinho. O rosto pequeno, cabelos caídos pela testa, e dentes faltando em seu largo sorriso banguela que chega até seus olhos. Há desenhos de metade do seu rosto, apenas da boca, alguns rabiscos dele de corpo inteiro, mas o que mais prende a minha intensão é um gigantesco acima da cama. São seus olhos.

Não os olhos opacos, sem foco ou luz. São seus verdadeiros olhos, aqueles que eu não tive tempo de conhecer.

E Deus como eles são lindos... A riqueza de detalhes retrata as pálpebras um pouco fechadas, como se as tivesse relaxadas, as orbes tomada de um azul intenso, nada frio ou indiferente. É a exata cor do céu durante um dia de verão, fresco, quente, puro e verdadeiro e dentro dela é possível ver alguns chamuscados de verde, ela é circundada por um anel preto, que só ressalta o anil. A pupila é feita em tinta óleo, o que faz com que a minha imagem seja refletida nelas. Ela se ocupou em fazer suas sobrancelhas arredondadas, os cílios longos e até as rugas nos cantos dos olhos que é possível se perder naquele olhar.

- É bonito não? - Dou um salto pelo susto, virando em direção a voz rouca que dissera.

Encontro um reflexo exato de Louis. Eu costumava achar Charlotte parecida com ele, mas essa garota é a sua cópia fiel. Os cabelos escuros estão presos em traças que batem na altura de sua cintura, os olhos menos expressivos porém tão luminosos quanto os dele, em um azul claro, doce e gentil, como seu sorriso. Ela é um linda visão, com um corpo surpreendentemente alto vestido com calças e camiseta branca, como as pessoas que eu havia visto do lado de fora. Felicite me examina a distância, quando sua cabeça se inclina para a direita o cabelo se afasta, deixando que eu veja um corte profundo, está cicatrizado, porém não consigo desviar os olhos do rasgo que fora feito do início de sua orelha, marcando a bochecha e descendo pelo pescoço, com seu final se tornando oculto pela gola da blusa.

- Céus. - Arfo pela severidade daquela cicatriz e Felicite abraça seu corpo, puxando o cabelo para frente do rosto - Desculpe. Eu não quis ser rude. - Me apresso em dizer, me aproximando dela que continua a recuar até bater as costas na parede e deslizar até o chão em câmera lenta. Os olhos vidrados em espanto e terror, embora eu não tenha feito nada.

- Mal, mal, mal, mal, mal.... - Ela repete, abraçando os joelhos contra o peito.

- Fizzy...

- Mal, mal, mal, mal... - Teima em repetir, ignorando completamente o que eu digo. Olho ao redor e a porta me parece muito atraente. Eu não deveria estar aqui, deveria estar terminando minhas malas para partir com Nicholas, mesmo assim, aqui estou, me colocando de joelhos e tocando uma mecha de cabelo da garota.

- Você gosta do Louis.

O nome surge um efeito mágico nela, que abaixa os braços e arregala os olhos, não mais espantados e sim encantados.

- Você conhece o anjo?

- Anjo?

- Sim. - Se levanta, puxando minha mão e me guiando para o centro do quarto, indicando suas pinturas - Ele é meu anjo da guarda. Eu o vejo nos meus sonhos, ele fala comigo e até cuidou de mim.

- É mesmo? - Sigo com o olhar, avaliando obedientemente cada pintura que ela me mostra. Uma em especial de três crianças deitadas em uma cama. Uma menina de cabelos louros com um biquinho aborrecido nos lábios, na ponta está outra com um sorriso leve, agarrada a um ursinho cor de rosa encardido e no meio está um menino, o mesmo das outras pinturas. A bochecha pressionada contra o travesseiro, um corpinho pequeno e rechonchudo, mas ele ainda parece bem ameaçador com suas sobrancelhas franzidas. Ele tem um livro pressionado contra o peito, me aproximo para tentar ler melhor o título e Fizzy toma a frente, chegando primeiro.

- É Gatsby. É meu, eu lia pra eles. Os ensinava a ler. - Ela explica - Eles não sabiam. Eram mais velhos, mas não sabiam porque não iam a escola.

- Não iam a escola? - Franzo a testa, estranhando que alguém tão obcecado por conhecimento como Louis cabulasse aula.

- Não, eles fugiam para a Conisbrough Square, para conseguir dinheiro. Nós tínhamos tão pouco e os bebês estavam chegando. Ele não queria que eu dormisse com o estômago doendo, não queria que os bebês chorassem, ele me disse que um dia seria tão rico como o moço do livro, que me compraria um castelo, faria de mim sua princesa e daria o meu nome a um perfume e todos amariam, porque todos amam a Fizzy.

- Então ele cuidava de você, Fizzy? - Ela não hesita em balançar a cabeça várias vezes, feito uma criança. No caminho para cá Charlotte me explicou um pouco sobre a situação de Felicite, ela foi mandada para os guetos com sua família e depois viveu por três anos em Auschwitz, sobrevivendo apenas porque o pai a escondia quando recolhiam as crianças, mas mesmo que tenha sobrevivido ela viu muitos morrerem, ouviu os gritos das pessoas nas câmaras de gás e escapou milagrosamente delas uma vez, assistiu todo o terror, o medo e a desgraça do holocausto quando tinha apenas doze anos.

Quando o pai foi brutalmente assassinado por um dos oficiais ela se escondeu em um dos alojamentos e ficou sozinha por dias, sem comida ou água. Apenas escondida com os olhos apertados e quando a encontraram ela não se lembrava de nada dos últimos anos. Pelo que os médicos disseram a Charlotte, o trauma a afetou ao ponto de seu cérebro repudiar todas estas memórias e se concentrar unicamente nos primeiros doze anos da sua vida, antes da guerra, antes das perdas, e ele simplesmente parou de evoluir.

Mesmo que tivesse vinte e oito anos ela agia, pensava e acreditava ser uma menina de doze anos, mas ainda haviam surtos violentos e lembranças sombrias da guerra e uma fixação doentia por Louis, ou melhor pelo seu eu criança, quando eles eram crianças eram muito próximos. Lottie não dizia a Felicite que era sua irmã e Louis nunca foi a visitar, eles mantinham sua ilusão, porque ela era feliz dentro dela.

Eu acabei não partindo com Nicholas que permaneceu na mansão a convite de Charlotte, ainda cuidando de mim e o que era pra ser uma única visita se tornou rotina. Eu ia ao sanatório várias vezes na semana, passar tempo com ela, a ouvindo cantarolar palavras desconexas, pintar e falar por horas a fio das artimanhas de seu irmão. Era estranho ver Louis pelos seus olhos, para ela ele ainda era um garotinho bom e destemido, não corrompido ou ferido.

- Sinto falta dele, espero que ele volte da guerra algum dia. - Meus olhos quase saltaram das órbitas quando a ouvi citar a guerra em um dia que estávamos sentados a beira do lago.

- V-você lembra da guerra? - Pergunto receoso, olhando ao redor procurando por um enfermeiro caso ela esteja perto de um surto. No entanto ela sorri de canto, passando a mão sobre a água, a florzinha que se prendia em seu cabelo cai na água e fica boiando na superfície.

- Louis é um herói, ele vai vencer os homens maus e salvar a todos nós.

É tudo o que ela diz e eu não posso evitar de sorrir. Há tanta esperança em sua voz. Louis vai salvar a todos nós.

- Porque você vem todos os dias? - Indago quando a visita se encerra e Fizzy é levada de volta pra dentro. Encosto as costas na lataria do carro, ao lado de Mitch que continua a observando acenando da janela com um grande sorriso. Ele faz isso, todos os dias.

- Sou seu guarda-costas. Tenho que te proteger. - Diz, com o cigarro rolando entre os dedos e nem ao menos pisca.

- Não preciso de proteção quando venho aqui e Liam é o motorista. - Digo e não tenho certeza alguma de que ele está me ouvindo. Suas pupilas estão dilatadas e o maxilar se pressiona com cada vez mais força, como se sofresse, então sigo seu olhar até a janela que agora tem suas cortinas abaixadas e Felicite está fora de vista - Você a ama.

Finalmente ele desvia os olhos para encarar os pés, jogando o cigarro no chão e amassando com o bico do sapato.

- Pelo jeito ninguém consegue fugir da maldição do amor.

- Eu sim.

Mitch solta uma risada alta, tapando a boca com a mão.

- Que foi?

- Para, Styles! Eu não sou idiota. Você é caidinho pelo Louis.

Louis. Faz tempo tempo que eu não o vejo pessoalmente. Nunca mais nos cruzamos nos corredores de sua casa, eu apenas ouvia a sua voz de longe ou o som do piano quando ele tocava, sempre uma melodia triste. Talvez ele estivesse certo. Talvez aquilo não tivesse passado de um surto estúpido, onde eu descontei toda a minha raiva e frustração nele.

Será que ele me perdoará algum dia?

- Mesmo que seja, é impossível. - Enterro a mão no bolso da calça e sinto algo circular e gelado entre os dedos, aperto, me recordando da moeda que Louis me deu.

Ainda me resta um desejo!

- Por quê?

- Você sabe. - Dou de ombros.

- Você precisa mandar isso tudo pro inferno. - Ele rosna, num tom mais firme e exaltado do que o normal - O amor é assim, ele não vê cara. Não vai escolher a pessoa mais bonita, inteligente ou engraçada. Ele tá pouco se fodendo se esse alguém é perfeito, não é assim que funciona. Ele pega a garota com a mente tão fodida de tudo que se prende no seu mundinho privado, ou o manco cego com um humor trevoso ou até mesmo o pentelho grávido com toda a teimosia do mundo na sua estúpida cabeça cacheada. Pra ele não faz diferença se é homem, mulher, cego, louca ou um fodido, o que importa é que mesmo com tantas imperfeições ele consegue...

Ele para.

- Mitch?

Seus olhos encontram o meu e um resquício de tristeza perpassa por seus olhos antes de um sorriso.

- Nos fazer perfeitos um pro outro.

- O amor não faz sentido.

- Faz sim. - Ele discorda, abrindo a porta para que eu possa entrar - Nós que somos burros.

Entro no carro, mas antes que ele se afaste coloco o rosto na janela.

- Acho que eu gosto de você.

Ele assente como se já imaginasse.

- Eu disse. Este é o início de uma grande amizade.

Quando voltamos para casa naquela tarde eu não tenho coragem de entrar no quarto de Louis mesmo quando escuto sua voz melodiosa recitando uma poesia. Encosto a cabeça na madeira para ouvir melhor quando ele diz:

*Aqueles seres celestiais
Aqueles os quais
Se adornam com asas as tais
Que sopram o vento no caís,
E choram por aqueles finais.

Um desses anjos talvez
Visitou-me certa vez
Mostrou-me minha estupidez
Mas também, a sensatez.

Tomou meu coração
E cantou-me uma canção.
Prometeu-me em oração,
Que estaria comigo em qualquer ocasião.

Mas,
Como todos os sonhos
Desapareceu em frente aos meus olhos,
Para nunca mais voltar.

Meu coração parecia estar sendo apertado e puxado para fora do peito e tudo o que havia era o silêncio, o silêncio ensurdecedor do lado de dentro embargado pela minha covardia que me impedia de entrar por aquela porta e o beijá-lo até acabar com toda aquela saudade que eu sentia dele.

- Lindo, realmente lindo. Mas eu tinha dito pra recitar algo alegre. - A voz de Mitch se faz presente, junto a risada gostosa de Louis.

- Esse poema me lembra do Harry. Eu o perdi e desde então eu me sinto mais cego do que antes.

- Isso é só a fossa.

- Não, Rowland, este sou eu ferrando com tudo. Como sempre. Tudo o que eu amo eu perco. - Ele suspira e posso imagina-lo com os olhos baixos, o corpo jogado em sua poltrona de forma desleixada com um cigarro numa mão e um drink na outra. Uma linda e dolorosa imagem - Sinto tanta falta da minha girafinha.

- É um apelido fofo. - Mitch diz, a voz soando mais próxima até que a porta se abre abruptamente. Ele não diz uma palavra, apenas deixa o caminho livre para que eu veja Tomlinson, exatamente como eu havia imaginado, por duas mínimas diferenças, primeiro ele estava fumando um charuto e segundo, ele estava sem camisa. Os cabelos numa confusão selvagem, o peito bronzeado exposto inteiramente para mim, reavivando todo o desejo que queimava em mim por ele. Seus lábios finos se partiram soltando a fumaça devagar.

- O perdi pra sempre.

- Eu discordo.

- Você não o conhece. Ele deve me odiar, sou um escroto.

- Não. - Balbucio bem baixinho, dando alguns passos em sua direção e ele não me nota até então. Paro em sua frente lutando contra a vontade de me jogar sobre ele.

- Ele vai voltar, seja paciente. - Mitch o alerta com um sorriso malicioso, enchendo seu copo com uma nova dose de liquor.

- Maldição! Eu estou tão apaixonado. - Lamenta jogando a cabeça para trás, apertando os olhos.

- Aposto que ele também está.

- Claro que não. - Louis assegura. E pela primeira vez, Louis está errado. Completamente errado.

Xx

- Tudo está se mexendo. Eu nunca andei num desses antes. - Felicite grita batendo os dedos contra o vidro da janela do carro. Um sorriso quase partindo seu rosto em dois. Olho para frente, encontrando os olhos de Mitch que estão apertados revelando que ele sorri.

Foi preciso pedir permissão para que Fizzy pudesse sair do sanatório por algumas horas. Eu tinha tido a brilhante ideia de a convida-la para passar uma tarde na mansão, já que ela tinha ficado eufórica quando mencionei os cavalos e também porque eu esperava que essa fosse a chance perfeita de me reconciliar com Louis.

Ela ria e apontava para tudo o que via como uma criança, até estacionarmos em frente a mansão, Liam, Charlotte e Tommy estão nos esperando na porta, bem alinhados e tentando reprimir seus sorrisos para não assustar Fizzy que praticamente salta quando Mitch abre a porta e o amor que ele tem por ela não podia estar mais evidente, pela forma que ele a segue e assente a todas as suas observações como se fossem as mais brilhantes do mundo.

Liam nos guia até os estábulos onde Sarah está segurando a cela do corcel mais manso e pequeno que havia, o cavalo de Louis estava relinchando ao seu lado, erguendo as crinas no ar e batendo as patas, cavando a terra. O menor tenta imitar seus movimentos.

- Cavalos! São cavalinhos! - Fizzy comemora batendo palmas e correndo em direção a eles que relincham ainda mais alto.

- Quer tocar neles? - Sarah pergunta e a garota assente freneticamente, deixando que Sarah segure sua mão e a leve com cuidado até o focinho do animal.

- Ela parece levar jeito com os animais. - Liam diz se aproximando delas.

- Meu deus, eu nunca pensei que a veria nesta casa. - Lottie suspira - Ela tem estado melhor, gostaria de poder ter mais tempo pra ela.

- Você cuida de todo mundo. - Digo e ela me olha surpresa, as sobrancelhas quase tocando a raiz do cabelo - Deveria pensar um pouco mais em você. Eles vão ficar bem.

E neste momento ouço os latidos de Sun, ele vem correndo a todo vapor, sendo seguido por Clare que tem o braço direito enganchado no de Tomlinson. Ele balança a cabeça ao que ela fala, os óculos escuros repousando no topo da cabeça e os sapatos afundando na grama fofa.

Um sorriso está se abrindo em seu rosto quando Felicite se vira saltitante para nos contar algo sobre os cavalos e seus olhos se abrem em espanto ao encontrar o menininho de suas pinturas em carne e osso.

- Lou! - Ela berra e ele para.

Suas pernas ficam imóveis e sua risada morre. Eu quase posso ouvir os parafusos se soltando em seu cérebro.

Fizzy.

É o que consigo discernir com seus lábios se movendo sem expelir nenhum tipo de som. Louis continua parado e Clare o incentiva a dar um passo, mas Felicite se mostra mais uma vez ágil demais e dispara em sua direção, jogando seu corpo contra o dele e o derrubando sentado no chão. Ela ainda está enchendo seu rosto de beijos quando os alcançamos e Mitch a ajuda a se levantar, me ajoelho oferecendo a mão para Louis.

- Deixe-me lhe ajudar. - Sussurro, conectando seus dedos aos meus e os apertando com força ao senti-los trêmulos.

- É a minha irmã. Minha irmãzinha.

- Ela veio te visitar.

- Ela não consegue se lembrar de nada, eu não posso. - Balbucia, abaixando o rosto, fazendo com que os cabelos caiam sobre ele. Infiltro meus dedos entre a franja densa e ele levanta a cabeça de imediato - Harry.

- Ela está aqui. Não importa se ela irá se lembrar disso amanhã, o que importa é que vocês tenham esse momento juntos.

O sol fraco e amarelado reflete no seu rosto, ressaltando as pequenas sardas em suas bochechas e nariz. Eu tenho vontade de beijar cada uma delas e assim o faço, pressionando os lábios abaixo de seus olhos, entre as sobrancelhas, no queixo, nas bochechas, testa, mandíbula e a ponta do nariz, restando apenas seus lábios.

- Eu amo você. - Sopra contra minha boca antes de segurar minha nuca e me puxar de encontro aos seus lábios. Eu me entrego ao seu beijo, avidamente, como um último suspiro antes de um longo mergulho. Meus dedos esfregam seu peito e a outra mão permanece segurando a sua e eu nem ao menos me importo de o estar fazendo na frente de todos. É a primeira vez que eu não preciso me esconder, ou me envergonhar de quem eu sou e do que eu quero. Eu adoro a forma como eu posso ser com Louis. Sim, eu estou me tornando um homem e é graças a ele. Ele está me tornando um homem.

- Eles se beijaram. Eu vou contar pra mamãe, Lou. - Fizzy diz com uma voz mimada e infantil e nos afastamos para que Louis possa gargalhar, deixando que eu o ajude a ficar de pé.

- Fofoqueira. - Ele acusa antes de se propor a ensina-la a cavalgar.

Xx

As nuvens densas não deixam que a lua brilhe, a noite reina majestosa em toda a sua escuridão e eu estou afundando no aconchego dos meus lençóis quentes e da maciez do travesseiro pressionado contra meu rosto, quando alguém bate na minha porta. Tento ignorar tentando voltar a dormir, o que não dá certo, porque a pessoa persiste e eu sou obrigado a arrastar a minha carcaça cansada até a porta e abri-la. Meus olhos mal enxergam em meio ao breu, mas consigo discernir a silhueta de Louis, ajoelhado....ajoelhado?

- Que merda é essa? - Solto, esfregando os olhos para afastar o espectro do sono e ele empurra alguma coisa contra meu estômago, percebo se tratar de flores.

- Cala a boca se não eu vou fazer alguma merda e estragar tudo. - Diz nervoso - Q-quando... Quando você chorar, eu quero enxugar as suas lágrimas. Quando você gritar, eu quero lutar contra todos os seus medos. E eu quero segurar a sua mão por todos os anos que se seguirão, eu não quero te magoar, não quero te ferir. Eu quero ser a sua força, como você tem sido a minha. Eu te amo e mesmo que você não me queira, ainda assim, terá tudo de mim.

- Me perdoa. - Murmuro, esfregando o nariz nas rosas vermelhas, aspirando sua essência.

- Não há nada para ser perdoado. Tudo o que você tem feito desde que me conheceu foi ter me salvado feito uma donzela, eu não sei como você faz isso, Harry. Como consegue ser tão forte, tão genuinamente bom e valente. Você restaurou a minha fé na humanidade, existem muitas pessoas ruins, mas também existem pessoas como você. Anjos vindos diretamente do paraíso e eu não posso abrir mão do meu anjo. - Ele ri e noto o movimento de suas mãos passando por seus cabelos - Você estava errado quando disse que Deus me odeia. Ele me ama, ama tanto que me deu o seu anjinho mais precioso. Então eu gostaria de saber se você....se você... Quer namorar comigo?

- E-eu amo você. - Confesso num fio de voz, tendo tempo apenas de deixar o buquê sobre a cômoda antes de Louis se levantar, agarrando minhas coxas que se prendem em seus quadris e meus braços ao redor de seu pescoço, onde eu encho de beijos.

- Claro que ama.

- Mas no outro dia... - Digo, deixando que ele nos guie até minha cama, batendo o pé na borda e praguejando até cairmos nos lençóis macios de seda que não são nada perto de seus lábios traçando um caminho delicioso desde a minha clavícula até o meio do peito. Beijando meu coração.

- Eu disse de propósito, acha mesmo que haverá o dia em que Harry Styles esteja no mesmo lugar que eu e eu não te note? Você mesmo disse que nós somos um.

- Sim. - Sorrio, puxando seu rosto para perto do meu e quase morrendo com aquele mesmo sorriso arteiro das pinturas em seus lábios - Somos um.

E naquela noite eu retornei para o aconchego de seus braços como se nunca tivesse me afastado.

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