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•Vigésimo Quarto•

- Sophie?- ele arqueia a sobrancelhas e por um instante meu ar parece flutuar nos meus pulmões e ele para de funcionar mas Mark me sorri inocente - sempre adorei esse nome

Puta que pariu

Nem eu dizendo meu nome ele se lembra de mim

Ele me olha nos olhos, e não sente sequer um vínculo ou uma energia, um ímã cósmico ou sei lá

E isso só torna tudo pior

- bem, sente-se eu só pedi uma água creio que vai ser rápido para assinar os papéis certo?- ele diz simpático e eu ainda meio desconcertada me sento na cadeira de frente a dele e ele se senta na sua logo depois
- é... Claro, será rápido- digo perturbada me lembrando de tirar os documentos falsos que diz em vinte minutos no word antes de sair de casa e vejo ele batucar os dedos na mesa

Ele sempre fazia isso quando estava atrasado ou queria estar em outro lugar

Suspiro por me lembrar disso e crio coragem pra lhe perguntar

- tem compromisso depois daqui?- pergunto forçando um sorriso e em troca recebo um verdadeiro de sua parte
- é, meio que sim... Minha filha tem aula de ballet hoje e se eu não for ver o número novo dela ela me mata- ele ri parecendo se lembrar da filha e eu forço um sorriso mas já sinto um rombo crescer no meu peito

Por que caralhos eu sou assim?

Eu devia vir aqui de cabeça erguida, contar-lhe a verdade, me gabar, humilha-lo e dizer o quão irônico é sua filha vir pedir emprego logo na minha empresa

Mas ao invés disso, estou morrendo por dentro por pensar no amor que sua filha recebe e eu não recebi

- Kate tem cara de bailarina, ela deve ser muito boa- digo encarando os papéis me concentrando para não olha-lo e talvez me emocionar

Pra variar

- Kate? Nossa não Kate é uma dançarina terrível- ele ri- quem faz ballet é minha filha Casey ela tem 4 anos, precisa ver como é linda...espere acho que tenho fotos

Ele sorri e seu olho brilha de pura iluminação e vasculha no bolso o que imagino ser a carteira e percebo que estou certa quando ele tira o objeto marrom e abre o mesmo procurando por algo até que ele a mostra pra mim revelando duas fotos 3x4, pego a carteira com cautela, mais por não saber se eu realmente queria ver, e analiso a primeira foto onde eu reconheço a Kate, linda, loira olhos azuis, na verdade ela lembra muito a mim mesma na infância e sorrio por isso

Merda

Olho um pouco mais pro lado e vejo a Casey

A filha da puta é mais linda ainda, seu cabelo é ondulado e seu tom de cabelo vai pra um loiro mais escuro e seus olhos também são azuis porém num tom mais acinzentado

Realmente ele deveria se gabar, são meninas lindas

- suas filhas são, realmente muito bonitas- forço um sorriso que falta rasgar minhas buchechas e então engulo um seco- só tem as duas?

Me arrisco e ele ri balançando a cabeça negativamente

- oh não, também tenho o meu mais velho Jonah, está no verso- ele auxilia e me encara como se desse permissão pra eu virar a folha da carteira me deparando com um menino mais crescido, cabelos escuros e olhos azuis bem claros, ele tinha apenas alguns traços de Mark, os mesmos traços que eu tenho dele- acabou de completar 18 anos, ainda não acredito que já é um homem sabe? Ele entrou na faculdade faz pouco tempo e não o vemos a um tempo... A mãe dele é tão apegada, deve imaginar o drama que ela está fazendo por isso- ele ri simples e eu lhe encaro com minha garganta completamente fechada e meus olhos com certeza marejados
- imagino sim- digo somente e continuo a analisar a carteira até olhar um pouco pro lado e ver uma mulher extremamente linda, seus cabelos eram escuros e seus olhos tinham um tom parecido com os da Casey e me peguei sorrindo pra ela

Por que meu Deus?

- é sua esposa?- engasgo e espero que ele não perceba meu nervosismo
- sim essa é a Jill, sem dúvidas é o amor da minha vida, ela... Ela me conheceu numa fase não muito boa da minha vida entende? Sem ela, eu verdadeiramente não seria nada- ele diz com os olhos brilhantes enquanto encara a foto na carteira que está em minha mão e eu fico ali lhe encarando

Eu sei que é estranho

Mas não consigo evitar

- o senhor parece bem feliz com a família que tem- engulo o nó na garganta enquanto o vejo sorrir genuinamente
- com todas as minhas forças... Eles são tudo pra mim- ele diz encarando as pequenas fotos e após um longo suspiro ele pega a carteira da minha mão fechando-a e colocando-a no bolso novamente- mas e então? Os papéis...

Me desperto e paro de encara-lo

- claro!- coloco o cabelo atrás das orelha e arrasto os papéis até sua parte da mesa e fico ali hiperventilando sozinha enquanto o garçom deixa a água dele na mesa e Mark vai assinando papel por papel e eu fico ali lhe encarando

Com falta de ar

Com calor, literalmente, pegando fogo

Sendo que daqui eu já vejo as árvores do parques quase saírem do chão devido ao vento e a chuva que já se iniciara

- mas e você... Tem irmãos, senhorita Baltimore?- ele diz sem me olhar ainda concentrado nos papéis e se meu peito já estava doendo agora ele está morto

Eu simplesmente sinto que não consigo mais ficar perto dele

Mas eu não vou embora até me sentir resolvida

- não!- digo com pesar no coração- é só eu e minha mãe Meredith Baltimore... Te é familiar?

Seus olhos azuis sobem lentamente até me encararem profundamente e ele larga a caneta faltando assinar a última folha

- meu Deus...- ele diz quase que num sussurro mas eu permaneço firme

Ou pelo menos na minha cabeça

- lembrou de mim agora pai?- pergunto debochada já sentindo minhas bochechas fritarem- lembrou da sua filha renegada e esquecida? Lembrou da sua filha a qual você não precisava se preocupar em levar pro ballet porque você sempre dizia que eu era muito gorda pra fazer esse tipo de coisa ou porque sempre estava bêbado e não conseguia me levar pra lugar nenhum? Lembrou da sua filha a qual você nunca teve que ajudar a conseguir emprego ou ver se formar porque você nem sequer estava lá?- minha voz por mais que esteja trêmula está num tom controlado e me orgulho disso

Ele por outro lado está pasmo

Ele está encostado na cadeira e sua respiração está visivelmente prejudicada e sinceramente

Eu não ligo!

- Sophie, eu... Meu Deus do céu, não acredito que seja você, você... Você cresceu tanto- ele diz surpreso já tendo lágrimas nos olhos e eu rio com vontade
- é óbvio que cresci, você me abandonou faz anos... É o que acontece- digo debochada mas ele continua me encarando pasmo
- Sophie, eu, eu sei o que você deve pensar sobre mim mas acredite tudo que eu fiz foi pro seu bem- ele diz com a voz embargada se inclinando pra ficar mais próximo de mim e eu rio
- pro meu bem? Tipo o que? Bater na minha mãe? Bater em mim? Praticamente estuprá-la quando chegava do bar dizendo a ela na minha frente que queria comer ela bem ali? Me humilhar e me dizer várias vezes que eu era incapaz?- foda-se já estou chorando

Mas não estou triste, nem um pouco

Estou com ódio

- não, isso tudo foi terrível, essa é parte ruim a parte boa foi eu ter ido embora, isso que fiz por você. Ter abandonado você foi a escolha mais sensata que já tive- sua lágrima desce pela bochecha e eu resolvo encarar a janela chuvosa para não ter que olha-lo nos olhos
- filha eu juro por tudo que a última coisa que eu queria era ter traumatizado você- ele põe a mão sobre a minha e eu puxo a minha rapidamente como se ele fosse feito de fogo e eu lhe encaro com raiva
- não sou sua filha, você tem três filhos maravilhosos e acredite fico feliz por você e mais feliz ainda por não ser pra eles o mesmo pai que foi pra mim... Mas eu não sou uma de suas filhas, eu sou filha de uma mãe solteira que fez absolutamente tudo por mim, que me amou e zelou por mim, sou filha de uma mulher incrível que casou de novo com um homem incrível e teve um filhinho incrível que morreu enquanto pessoas terríveis como você continuam vivendo por aí- minhas lágrimas começam a cair sobre a mesa e eu me levanto e pego minha bolsa com raiva
- Sophie, por favor não vá embora... Eu, eu tenho tanto pra te falar- seu rosto começa a se inchar enquanto ele tenta falar comigo mas eu lhe encaro severa
- mas eu não tenho nada pra te dizer, e além do mais, você tem uma filha te esperando em casa ansiosa pra você levá-la ao ballet- limpo as lágrimas me virando de costas e caminhando firme atraindo o olhar de algumas pessoas e me viro uma última vez
- pode dizer a Kate que ela passou, vejo ela amanhã às 8:00- digo apenas deixando ele ali em pé chorando e eu não saio muito diferente

Caralho

Como esse homem me magoou

Como esse homem me magoa

Meus olhos estão embaçados mas vejo claramente a tempestade forte que se formou nesse pouco tempo que estive dentro do restaurante, lembrando que deixei meu carro super longe e então me dou conta de olhar no lugar que Harry estava estacionado e me surpreendo

Ele não está lá

Maravilha

Ele se foi

E eu não o culpo

Na verdade me surpreendo de alguém permanecer na minha vida com tantas mudanças emocionais que venho passando

Decido cruzar os braços e caminhar em meio a tempestade ficando extremamente molhada em segundos mas nada que eu me importe, só consigo pensar na conversa que acabei de ter e do quanto eu queria feri-lo, do quanto eu queria magoa-lo mas ao mesmo tempo sabendo que se eu o fizesse não mudaria nada do que passei ou que já vi

- Sophie!- ouço meu nome ser chamado de forma desesperada e olho pra trás vendo Harry completamente molhado vindo correndo em minha direção e eu arregalo meus olhos inchados sem entender

- ainda está aqui?- pergunto alto devido o barulho da chuva e sinceramente meio incrédula
- lógico, você pediu pra eu te espera- ele diz cansado provavelmente por ter corrido até mim- estou buzinando a meia hora, você não me ouviu? Tive que ir pro outro lado da rua já que a chuva fez um poste quase cair no meu carro

Porra, eu devo realmente estar distraída por não ter visto isso

- desculpa eu... Desculpa- digo cansada vendo ele me encarar ofegante e percebo que enfim ele repara no meu rosto que com certeza esboça o tamanho da tristeza que sinto agora
- vem, vamos entrar no meu carro o seu está mais longe- ele me estende a mão e fico ali no meio da rua e da chuva olhando aquela não estendida pra mim

De novo

Eu precisando de ajuda, de amparo

E Harry está ali pra mim

De novo

Suspiro e dou minha mão pra ele e ele me puxa enquanto corremos em direção ao carro dele entrando rapidamente já sentido o calor e cheiro aconchegante no mesmo

- vamos ter que ficar aqui por um tempo, ok?- ele me olha com suas belas esmeraldas verdes me trazendo todo o conforto e confiança que eu precisava nesse momento

- Ok!- lhe sorrio

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