•Trigésimo Segundo•
- como soube?- ele diz visivelmente confuso e perturbado
Eu não estou muito melhor
Só quero ir embora o mais rápido possível
- Nancy me contou... Encontrei com ela a umas semanas e ela não poupou palavras pra dizer que você ia embora e o quanto eu te faço mal, acho que arranjou uma boa porta voz- debocho tentando conter meu choro e também tentando abrir a porta mas sua mão pressiona a mesma me impedindo
- ela não é minha porta voz, só fica preocupada comigo, ela estava lá quando recebi a mensagem, quis quebrar tudo e quis ir até sua casa brigar com o Zayn e te fazer vir embora comigo, ela me impediu... E sinceramente agradeço eternamente por isso- ele me olha sério e eu engulo minha angustia goela a baixo
- certo, já entendi, sou péssima, você está com raiva e eu mereço que esteja assim, posso ir agora?- digo séria mas ele coça a cabeça irritado
- por que você é tão difícil? Era pra eu estar zangado com você e de alguma forma você ainda consegue terminar brava e eu vindo aqui atrás de você- ele reclama porém dou de ombros
- não te pedi pra vir atrás de mim- digo bicuda e ele bufa
- e alguma vez já pediu? É o que fazemos Sophie, não dá pra evitar- ele me encara mas sinceramente não tenho mais nada a dizer então apenas desisto de entrar no carro já que ele não sai de cima da porta e dou a volta no mesmo me sentando na guia da calçada com a cabeça pulsando
Estava cansada de discutir e de ir e voltar e de brigar e de qualquer coisa relacionada
Não demora pra Harry bufar e vir se sentar não tão próximo a mim e ficar, assim como eu, olhando os próprios pés
- quando você vai?- decido perguntar logo
Fingir que não me importo com sua partida é algo inútil já que ele sabe como me sinto
Esses cinco anos que passei longe dele não foram fáceis, mas eu sempre tinha outra coisa pra me ocupar como a morte de Ben, ou a morte do senhor LeBlanc, praticamente a minha própria morte com tudo que estava sentindo e a doença que estava enfrentando ou até mesmo com a raiva que eu sentia do próprio Harry
Sempre tinha algo pra me distrair me fazendo não pensar nele
Mas nesses últimos meses, com aquele maldito almoço onde nos reencontramos depois de tudo é como se tudo voltasse a tona, as borboletas no estômago, as brigas, o choro
Eu me tornei alguém tão madura nesses cinco anos mas em um mês voltei a ser essa pessoa indecisa e medrosa com medo de se entregar e se machucar ou não me entregar e continuar assim
Dividida
Entre o que quero e o que sei que é bom pra mim
E Harry não é bom pra mim
Mas por Deus, ele é a coisa que mais quero em minha vida
- não sei ao certo, Nancy que está vendo tudo... Mas ela está tentando ver se conseguimos ir logo depois do casamento das meninas- ele diz depois de muito tempo pensando e meu peito se espreme
- é daqui dois meses...- calcúlo e ele sem dizer nada apenas me encara triste e faz que sim com a cabeça
Aquele balançar de cabeça parece durar uma eternidade pra mim
Suspiro
- bem, você vai ser muito útil lá, é um médico excelente Harry- digo sincera e forçando um sorriso o que só faz meu coração doer mais
- obrigado, eu... Eu nunca pensei em prestar essa bolsa, eu... Eu sou bem apegado com as coisas aqui!- ele diz me olhando firme e logo entendi que esse "apego" era comigo- se não fosse a Nancy eu nunca teria coragem de me inscrever, acho que no fim foi bom
Ele dá de ombros e volta a olhar pros pés e eu fico ali lhe olhando
Ele estava feliz com aquilo
E talvez isso bastasse
- ela está certa, ela se preocupa e com certeza viu seu potencial- sorrio fraco porém tentando ao máximo transparecer que apesar de tudo estou feliz por ele
Ele me olha por um tempo e suspira
- sabe, podíamos sei lá, tentar ser amigos... Ou qualquer merda do tipo- rio fraca pela sua escolha de palavras e suspiro
- como faríamos isso Harry? Não percebe que tentamos nos enganar com isso toda vez? Não sabemos ficar juntos... De jeito algum- ergo os ombros conformada
- mas podíamos tentar, por que ou tentamos ser amigos ou teremos que nos afastar de vez e acredite não quero isso... de novo não!- ele está certo
Se não fosse pra nos acertarmos também não dava pra ficar nesse vai e vem eterno entre nós
Suspiro cansada
- quer ser meu amigo então?- digo com uma careta como se esse convite fosse a coisa mais estranha que já fiz
E acho que é
- se isso é tudo que podemos ser então sim- ele diz calmo sem nem vestígio daquele Harry inconsequente e rebelde que conheci
E francamente eu amava
- ok, acho que somos amigos então- lhe estendo a mão e ele rindo a aperta e sacode
É incrível como minutos atrás fizemos a maior cena e agora estamos aqui
Sentados na beira da estrada apertando as mãos
Juro que nem eu entendo
- eu, eu vou jantar com meu pai sexta a noite- resolvo contar-lhe, afinal se não contar a ele vou contar a quem?
Emma e Ashley estão loucas por causa do casamento, eu não vejo Liam a meses por conta de seu trabalho e de sua namorada, eu amo Louis mas não tenho intimidade suficiente pra conversar com ele sobre tal coisa
E o Zayn, bom, Zayn não entenderia...
O que me resta é Harry ou Ben
E creio que Ben não entenderia nada então cá estou
- por que?- ele parece chocado e eu rio franzindo a sobrancelha
- nem pergunte- rio da minha própria estupidez e massageio minha testa- é que ele veio todo desarmado e a Kate, a Kate ficava me encarando com aqueles olhos de misericórdia e eu... Eu sei lá, eu só...
- Sophie, admita que quer conhecê-lo, não há problema nisso- ele diz calmo e eu o encaro quase que suspirando
- acha que não?- sinto meu peito esvaziar em total alívio
- bem, se não quisesse não perderia seu tempo pensando nele ou teria sequer aceitado- ele dá de ombros como se não fosse nada mas sei que está me aconselhando de coração
- valeu Harry- lhe dou um empurrãozinho de leve na brincadeira o fazendo sorrir de lado
- oh antes que me esqueça, olhe quem encontrei esses dias- ele se esforça pra tirar o celular do bolso enquanto eu o encaro
O encaro demais
Mas desvio assim que ele consegue tirar o aparelho do bolso
- estava no parque com o Ben esses dias e olhe quem vi- ele me dá o celular mostrando uma foto de Suzy
Caralho
A quanto tempo não a via?
Acho que desde que saí da faculdade!
Como eu gostava daquela simpática senhora que estava sempre me esperando com um café quentinho
Sorrio pra foto mas logo franzo a testa e tomo a liberdade de dar um zoom na foto
- quem é esse senhor com vocês na foto?- pergunto olhando um senhor negro que estava abraçado junto a Suzy que não me era nada estranho
- é o namorado dela, senhor...- ele parece se esforçar pra pensar mas num flash me lembro porque ele me é tão familiar
- senhor Jackson!- quase que grito deixando Harry assustado
- sim, isso! Como sabe?- ele questiona e eu rio para a incrível coincidência
- meu Deus, ele era praticamente meu Uber particular. Quando eu não sabia dirigir chamava ele pra me levar pra todos os lados, fazia anos que não o via- sorrio feito uma criança pra foto olhando o senhor simpático na foto que começa até a me dar um sentimento de saudade- a vida é realmente louca!
Digo inconformada com esse casal improvável
- parece que Suzy se demitiu do campus e foi trabalhar numa cafeteria um pouco mais longe e o senhor Jackson virou motorista particular, Suzy viu o anúncio dele e o contratou para levá-la todos os dias para o trabalho e acabaram se apaixonando ou algo assim- rio da cara do Harry ao tentar demonstrar não se sensibilizar com a história de amor
Já eu não escondo nada, estou radiante de felicidade
- sinto falta daquele tempo, sabe? De vez em quando- dou de ombros olhando para a foto me lembrando de tantas lembranças, na sua maioria boa
- eu não!- ele diz carrancudo e eu rio
- qual é? Não sente falta de nada do tempo da faculdade?- pergunto nostálgica e ele me encara firme e com o olhar escurecido, seus olhos transitam entre meus olhos e lábios
Certo, péssima pergunta
- bom eu sinto...- resolvo continuar para tirar o clima estranho- sinto falta de não ter preocupações, de não estar sempre trabalhando e quando não estou, estou pensando em trabalho e principalmente sinto falta de ter aquela incerteza entende? Aquele medo do novo... Faz um bom tempo que não sinto isso
Digo reflexiva, minha vida é boa não tenho do que reclamar, mas francamente não tenho muita emoção nela, a verdade é que nesses últimos meses que Harry voltou a aparecer em minha vida foi meu pico de emoção em 5 anos
- sente falta de usar suas roupas cafonas também?- ele pergunta ríspido cortando todo meu clima reflexivo e sou rápida em lhe dar um tapa no braço
- eu não era cafona!- reclamo e ele ri debochado
- o que? Você era terrível Baltimore, uma vez usou uma saia por cima dos jeans- ele diz com nojo
É... Realmente não foi meu melhor momento
- eu vi uma mulher na televisão assim ok? E achei bem bonito na época- dou de ombros como se já não tivesse botado fogo em qualquer foto que eu tenha aparecido com aquela roupa
- pois não era, sua sorte é que fica bem com qualquer coisa, porque você não tinha nenhum senso de bom gosto- ele me esculacha e abro a boca em "O" o fazendo rir
- você é péssimo!- digo não conseguindo segurar meu riso e voltamos a encarar nossos pés
Suspiro e pisco algumas vezes
- sabe do que mais eu lembro?- digo ainda olhando pra baixo brincando com meus pés- das brincadeiras que sempre fazíamos, lembra aquela que eu contava algo e depois era sua vez e tínhamos que ser 100% sinceros?
Eu amava aquilo, se eu fechar os olhos consigo voltar exatamente a Sophie de 18 anos e consigo sentir todo o frio na barriga de ter Harry no quarto, deitado em sua cama lhe contando tudo sobre ele, como aquele pequeno gesto me fazia feliz...
- lembro... Era um bom jogo- ele dá de ombros ainda sem me encarar
- você... Sempre foi sincero não é? Em tudo que me disse quando brincávamos disso?- pergunto engolindo um seco e ele sobe o olhar pra mim
- 100%- ele responde firme e eu sorrio e desço meu olhar brincando com minhas mãos mas sinto seu olhar ainda sobre mim o que faz minhas bochechas corarem
- não me lembro das marcas ainda estarem tão visíveis assim- ele diz pegando meu braço e eu gelo na hora
- é eu, eu meio que, me cortei de novo quando estava na clínica, nada demais já faz bastante tempo- sou rápida em puxar meu braço novamente pra mim e pressiona-lo mais perto para evitar que ele o pegue de novo
Harry nunca questionou muito sobre a época que me cortava e sou grata por isso, mas hora ou outra quando tomávamos banho juntos ou nos deitamos ele passava os dedos pelo meu braço e ficava encarando por um tempo em silêncio e pensativo
- na verdade é demais sim, disse que não faria mais essa merda- ele diz severo e já sinto um nó na minha garganta
- olha Harry, não sabe o inferno que foi lá ok? Se eu não tivesse feito amizade com a Lucy lá dentro não sei se teria aguentado- seco rapidamente uma lágrima que começa a sair e ele fica me encarando parecendo não saber o que dizer
- sinto muito que tenha passado por isso- ele ainda diz carrancudo e eu fecho os olhos enquanto uma lágrima cai
Não gosto muito de lembrar disso
- podemos mudar de assunto?... Por favor?- ele me encara sério e encara meu braço mais uma vez e eu sou rápida em cruzar um no outro o fazendo desviar o olhar suspirando conformado
- te falei que não tenho mais medo de peixes?- ele pergunta com um sorriso e eu agradeço imensamente por ele mudar de assunto e começo a tirar sarro dele esquecendo completamente da dor que a pouco se formou no meu peito
Ficamos ali na calçada conversando por 1,2,3,4 horas
Era como se nunca faltasse assunto entre nós
Mutuamente não citamos nossos demônios internos, ou nada que tenhamos passado no tempo que estávamos separados e isso foi ótimo
Se não falamos sobre o passado ou sobre nós, não há briga e tudo que quero é estar numa boa com ele
Apenas falamos sobre assuntos genéricos como os tempos da faculdade, problemas nos nossos serviços e coisas do tipo
Aliás Harry me contou que soube que o cara que tentou me violar no estacionamento uma vez, que hoje descobri se chamar Tony Bennett, está preso por tráfico de drogas
Não posso dizer que não gostei de saber disso
- porra está tarde!- olho no meu celular mas mais por admiração de estarmos tanto tempo aqui sem nenhuma discussão e sem ter ficado desconfortável por nem um minuto do que por preocupação de estar aqui com ele
- acho que sim- ele comenta neutro e se levanta me dando a mão para me auxiliar a ficar de pé
A encaro por uns segundos mas aceito sua ajuda no final
Quando subo ficamos ali, centímetros um do outro
Eu queria dizer-lhe tanta coisa e sinto que ele também, mas talvez qualquer coisa que digamos relacionada a nós gere outra discussão
Como sempre
E estragaria todas essas horas boas que tivemos
- bom, melhor eu ir!- digo suspirando e ele faz o mesmo dando um passo pra trás
- é, eu também!- ele diz com o olhar distante por mais que o mesmo esteja me encarando
- certo- digo com um sorriso morno
- certo!- ele afirma mas assim como eu continua parado
- certo- falo mais uma vez e crio coragem para me aproximar e percebo que ele tem a mesma idéia e assim nos abraçamos
Era um abraço apertado e quente no qual eu me acostumei tão facilmente a estar
"Não vá! Fique comigo que é onde deve estar e com quem deve estar. Não viaje para o outro lado do país e me deixe aqui tentando juntar meus pedaços e reunindo pessoas para tentarem suprir o que ninguém pode... Você!"
E depois de lhe dizer tudo isso dentro do meu subconsciente me solto de seu abraço
- até!- caminho rapidamente e abro a porta do meu carro entrando no mesmo tentando encara-lo o mínimo possível e depois de me encarar por uns segundos ele resolve fazer o mesmo saindo com as mãos nos bolsos
Sem olhar nem um minuto para trás
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