Ainda passei alguns dias no hospital, recebendo diariamente a visita do meu pai e da minha irmã.

A minha irmã sempre me via com alegria e falando susto passou com o meu "acidente", pode ser impressão minha, mas achei o meu pai, mais carinhoso, porém um tanto quanto triste e calado, como se ele realmente soubesse da verdade...

Foi um tempo complicado porque a minha pele se descamava como se eu tivesse ficado muito tempo exposto ao sol sem nenhuma proteção, as minhas veias estavam fracas e a agulha do soro não permanecia e eu recebia "agulhadas" diariamente e isso não era nada fácil!

A enfermeira que se chamava Laura cumpriu a promessa que havia feito ao meu pai todos os dias ia me visitar e conversava um pouco comigo, ela sempre enchia o meu pai de elogios afirmando que eu era de sorte pela família que eu tinha!

Suas visitas me faziam bem! Houve um dia, em especial, em que Laura foi me visitar assim que acabou o seu plantão, eu já me sentia mais forte e de uma certa forma ela abriu o seu coração:

—Sabe Flávio, ano passado um rapaz quase da sua idade com os olhos da mesma cor que os seus, talvez ele era um pouco mais velho, veio a falecer nesse hospital, ele tinha um câncer raro no cérebro e não resistiu a cirurgia, e um dos maiores desejos dele era viver! Cuidei dele durante o tempo que ele passou por aqui, ele era especial! Muito especial!

Falou com um olhar distante, como se revivesse cada detalhe, respirou fundo, tomando folego continuou:

— Quando eu o preparava para a cirurgia, ele me falou que tinha certeza de que de qualquer modo a cirurgia daria certo! Porque ele sempre amaria e cuidaria da família dele onde quer que ele estivesse, e pediu pra que eu falasse isso pra mãe dele, caso ele não pudesse dizer isso pessoalmente!— nessa hora ela se sentou na beira da minha cama e afagou os meus cabelos com carinho. — Eu tive que dar esse recado pra mãe dele, nessa hora, mesmo chorando ela me agradeceu e me falou que ele era um filho muito especial! E que era difícil para uma mãe enterrar um filho, que não era a ordem natural da vida!

Mas sabia que ele havia cumprido a missão dele! Ele amou e se preocupou com a família até o último minuto, e ela falou que ia viver honrando esse amor e esse gesto até o último dia da vida dela!

— Nossa que história triste, Laura!— Falei assustado.

— Estou te contando tudo isso, meu filho, pra te mostrar que a nossa vida nesse mundo é uma busca! E se a gente buscar motivos pra viver, por mais seja difícil a situação, você vai encontrar, e, por outro lado se você buscar motivos pra desistir, também não vai faltar! Então promete pra mim, que por mais que a sua vida esteja complicada, você vai buscar motivos para viver e não para desistir?

— Prometo! Prometo sim!— falei de forma bem sincera.
Ela me deu um sorriso de volta! Me senti em paz, depois de muito tempo!

— Eu sabia que você não ia me decepcionar! Mas agora eu preciso ir pra casa! Fique bem, tenha juízo! Logo você volta pra casa!— se levantou.

— Logo?— Perguntei assustado me levantando da cama.

— Sim... — respondeu me encarando— Você não quer sair daqui?

— Na verdade, eu penso que ainda estou meio fraco e talvez você devesse falar com o médico que eu deveria ficar aqui mais um pouco... O que você acha?— perguntei meio sem jeito.

—Na verdade, quem decide isso é o médico! O que posso te dizer é que você está muito bem fisicamente! Mas me fala com sinceridade! Porque não quer ir pra casa?— e me olhou de um jeito curioso.

— Sabe Laura! Eu não sei se consigo encarar as pessoas depois de tudo o que aconteceu...— respondi sem coragem de olhar em seus olhos.

— Mas foi um acidente... — ela me respondeu com um jeito de que estava entendendo tudo.

— Não! Não foi um acidente! Fiz de propósito! Eu queria morrer!— mal terminei a frase e os meus olhos já se encheram de lágrimas!

— Eu compreendo! Mas Flávio, pensa um pouco, você é um rapaz forte, bonito e com tanta vida pela frente! Tem a sua família pra te apoiar! Esse momento é realmente muito difícil, mas ele não é maior que você! Lute, busque apoio em sua família, talvez você tenha desenvolvido um quadro de depressão, mas com a ajuda de um bom profissional você superar tudo isso!— falou olhando nos meus olhos.

— Depressão?— perguntei meio sem entender.

— Sim! A depressão é uma doença, não tem nada a ver com frescura ou rebeldia! E ela é mais comum do que se pode imaginar! Porém, o mais importante é que ela tem cura! Com o tratamento adequado você pode ter uma vida normal!— me respondeu sorrindo.

— Nossa!— foi apenas o que eu consegui responder!

— Olha, agora eu realmente preciso ir! Mas pensa no que estou te falando! Não precisa se envergonhar! Saia daqui de cabeça erguida! Mas me prometa mais uma vez que vai buscar ajuda! Promete?

— Prometo! Prometo sim!— falei concordando com a cabeça.

— Isso é muito! Preciso ir! Até logo!— e se despediu beijando a minha testa.
Antes de dormir naquela noite, tirei um bom tempo pra pensar e já me sentia diferente!

Eu realmente estava disposto a seguir os seus conselhos e assim que eu saísse daquele hospital eu ia buscar algum tipo de ajuda, eu não sabia qual, mas as coisas não continuariam da mesma maneira! E na manhã seguinte recebi a visita do médico, ele me avaliou e disse:

—Tome mais cuidado com o mar! Porque você deu um grande susto na sua família e ainda me deu muito trabalho! Mas graças a Deus você é forte se recuperou muito bem! Vou prescrever alguns medicamentos e algumas recomendações e pedir para ligarem para o seu pai vir te buscar! Mas por favor se cuida!— falou sorrindo e apertou minha mão.