Capítulo 11 Reza
Eu estava debruçada em minha janela quando avistei a Bruna andando ao lado do Ian; eles passeavam livremente pelo acampamento, sorriam, se olhavam com cumplicidade. Não entendi aquela aproximação que me parecia tão íntima, ainda mais ali entre os nossos, e também não entendi o sentimento ruim que me abateu. Em seguida a vi dançando em uma roda formada em volta da fogueira, no que parecia um sinal de aceitação, ela se vestia como uma cigana, o que significa que finalmente se tornaria uma de nós.
— Natacha?
Uma voz distante ecoava em minha mente, então tudo mudou; o dia se tornou noite, uma dor aguda invadiu meu peito me fazendo encolher. O calafrio foi aumentando, e em meio a imagens confusas, vozes misturadas, me vi perdida como uma folha seca soprada pelo vento.
Em um instante estava em casa, sorrindo com minha família e em outro, caminhando pela estrada de chão, sozinha, perdida, levando comigo apenas algumas peças de roupa. Olhava para trás e só existia o vazio da escuridão, dor e abandono, esse era meu destino, vagar eternamente como uma alma solta no mundo, sem lar. A liberdade que tanto queria não era tão doce quanto pensei, eu havia sido banida.
Raios cortavam o céu enquanto trovões estremeciam a terra; a dor da decepção era algo que beirava a linha do insuportável, eu chorava muito, sentia o estômago revirar, enquanto aquela tristeza sem fim invadia minha alma. Vi uma festa grande onde todos se divertiam, Ivan; Ian; Samuel; minha família; eu havia sido esquecida, eles me apagaram de suas vidas.
— Natacha!
A voz de Soraia me trouxe de volta a realidade, eu me sentei na cama e sequer conseguia chorar, apenas olhava para o nada que se formou a minha frente.
— Nat, o que foi? — ela perguntou. — Você estava com os olhos abertos dizendo umas coisas sem sentido, foi uma visão?
— Eu não sei, acho que foi um sonho, está tudo tão confuso.
— Quer que eu chame a mãe?
— Não, eu só preciso de um pouco de água.
Soraia alcançou uma garrafinha que sempre deixava à beira da cama e meu deu.
— O que você viu?
— Eu sendo banida do nosso grupo.
— Santa Sara!
— Você demorou para ter intimidades com o Cristian?
— Ué, Natacha, que pergunta é essa agora? — Soraia me olhou com o rosto corado. — O assunto não era a sua visão?
— É importante, Soraia, demorou, ou não?
— Demorou, é claro, eu hein!
— Quantos dias?
— Meses, Nat, foram meses até que ele conseguisse me convencer e quebrar aquela barreira do proibido. No início tivemos vários impasses por conta do conflito de costumes, mas com o tempo fomos aprendendo a lidar um com o outro.
— Meses?
— Sim, ele vinha de um namoro onde a garota passava o fim de semana todo na fazenda, dormiam no mesmo quarto, frequentavam baladas, viajavam juntos. Inclusive, quando ia para a cidade ele ficava na casa dela.
— Eles fazem isso mesmo, que estranho né? — comentei ao me lembrar de algumas meninas da vizinhança, lá no sul.
— Eles pensam o mesmo de nós, mas é isso, ele tinha um relacionamento bem liberal, aí se envolveu comigo e encontrou essa barreira — ela afirmou. — Não foi fácil, Cristian me cobrava muito o fato de nunca poder se aproximar nas festas da fazenda, de ter que estar sempre se encontrando às escondidas. Já se foi um ano, mas ainda hoje é uma luta ter que viver um relacionamento proibido, e escondido.
— Não sei se eu e o Samuel vamos nos entender assim.
— Por quê?
— Eu não tenho um ano de tempo até que ele consiga entrar na mesma sintonia.
— Você tem certeza do que sente?
— Não sei, mas também não acho que tenha tempo para incertezas, meu destino já está traçado — falei ao me lembrar da visão de minutos atrás.
— Olha, minha irmã, sei que é estranho te dar conselhos, quando eu mesma segui por caminhos tortuosos, mas tenta manter os pés no chão. Eu sempre soube que ele era intocável para mim, assim como eu para ele, então não posso reclamar por estar nessa situação hoje. Se não fugi ainda, é exatamente por amar meu povo e saber que a partir do momento em que sair daqui, dos meus, não tem mais volta.
— É uma situação difícil, mas ao menos está feliz — comentei.
— Ah, Nat, ele me faz muito feliz, é tão bom quando estamos juntos. Ainda sinto aquele frio na barriga quando o vejo se aproximar, meu corpo esquenta quando me beija, fico mal quando vai para longe, e comemoro toda vez que ele volta — ela exibiu um sorriso bobo enquanto falava. — Nossa primeira vez foi bem aqui, ele pulou a janela quando depois de uma briga eu disse que aceitaria meu destino me casando com Ariel.
— Aqui? E ninguém percebeu?
— Não, e também não foi nada planejado, aconteceu.
— Você acha que um cigano experiente saberia identificar se a cigana foi tocada por outro?
— Claro, Nat, eles sabem.
— Valha-me!
— Eu já me perdi pela vida, minha irmã, não siga meus passos. Talvez a banida de sua visão não seja exatamente você.
— Era eu, Sô, tenho certeza.
— Nat, nós mulheres não temos as mesmas oportunidades que um homem tem. Qualquer cigano aqui do acampamento que caísse no mundo, teria condições de trabalhar e se manter ao menos com o mínimo para sobreviver. Mas nós mulheres, sem estudo ou preparação alguma, eu diria que até mesmo uma moça não cigana enfrentaria situações bem mais complicadas se pega de surpresa com uma situação assim.
— Se pudesse voltar atrás, faria diferente?
— Olhando pelo lado amoroso, sim, mas olhando pelo vínculo familiar, e a importância disso em minha vida, não tenho tanta certeza.
— É nisso que penso — falei com tristeza. — Tenho muito medo de jogar minha vida no vento.
— Eu sou de origem romani, essa aqui é minha essência, minha vida. Mas infelizmente em breve terei que dar adeus — disse ela com lágrimas nos olhos. — Vou trilhar um caminho sem volta, e se você não quer passar pelo mesmo abismo, desvie agora antes que seja tarde.
— Eu não queria que você fosse embora — falei ganhando um abraço.
— Eu não queria ir, mas como te disse, para mim não existe outro caminho. Eu amo o Cristian e não quero ficar sem ele.
— Seus olhos brilham quando fala dele. Será que um dia eu vou me sentir assim também?
— Não sei, Nat, mas queria muito que fosse feliz, de preferência sem ter que passar por tudo o que venho passando.
— Gestena, irmã, eu me orgulho muito de você.
— Não há do que agradecer, Nat, só... se cuida, eu não quero que sofra.
Soraia foi para o trabalho e eu fiquei em casa me torturando sobre as coisas que vi. Era comum ter sonhos premonitórios, mas aquele foi muito real e agora eu tinha certeza de que não importa o que fizesse, não havia mais saída para mim, se o Samuel não decidisse ficar comigo, eu teria que conseguir um cigano que aceitasse uma noiva que não fosse mais pura.
***
Com os pensamentos acelerados, praticamente engoli meu desjejum e saí torcendo para uma notícia boa trombar de frente comigo, mas quem trombou foi ele, o meu calango salvador da pátria...
— Caiu da cama? — Ivan perguntou, parando a moto perto de mim.
— Saí para tomar sol e pensar um pouco.
— Faz bem — disse ele, se preparando para sair.
— Ivan, eu queria falar contigo, tem como?
— Seja rápida, meu irmão e o seu devem estar vindo aí — falou tirando o capacete e colocando sobre sua perna.
— Eu consegui falar com Samuel e ele disse que vai pensar em alguma coisa para me ajudar.
— Que tipo de coisa?
— Não sei, mas já é uma luz.
— Você tem certeza do que está fazendo, Nat?
— Eu sei o que sinto quando estou com ele, Ivan, e não acho que consigo sentir o mesmo com aquele homem estranho, ainda mais agora...
— Agora?
Respirei profundamente me lembrando de minha visão, eu não tinha o costume de pensar muito nas coisas que fazia, mas agora um vacilo mudaria drasticamente o rumo da minha vida.
— Eu preciso de você — arrisquei a dizer.
— Eu já te dei a minha palavra, e também minhas condições — ele me olhou desconfiado. — O que está acontecendo Natacha?
— Nada, é que... — desviei o olhar, envergonhada. — Não se importa por ele ter me beijado?
— Não.
— E se o beijo foi um pouco mais ousado?
— Não vou te cobrar por coisas que aconteceram antes de ficar comigo, Natacha. Sei o que é certo e errado, mas estou entrando nessa história ciente do que eu vi.
— Como é bom ouvir isso — sorri aliviada.
— Caso essa loucura se torne real, levarei em consideração o que fizer depois, mas o agora pertence a ti. Então saiba onde pisa, eu não aceito ser enganado.
— Será que se você me beijar eu vou sentir um gosto diferente e um frio na barriga?
— Ué, Nat, que pergunta é essa?
— Esquece, devo estar ficando louca.
— Você é uma boa menina, eu não toparia essa loucura se fosse com qualquer outra daqui. Só pense bem no que está fazendo, tenho muito medo de que se machuque.
— Obrigado, Ivan — em um impulso, o abracei beijando seu rosto.
— Você realmente não pensa — ele balançou a cabeça antes de colocar o capacete. — Juízo, ciganinha!
Ivan acelerou a moto e se foi; naquele instante me questionei se realmente sabia o que estava fazendo, e é claro que não sabia. Ao menos agora eu tinha uma garantia de que se o Samuel não decidisse ficar comigo, não seria jogada no vento, pois tinha uma boa alma disposta a me acolher. Eu tinha o dom de me envolver em situações complicadas.
***
— Oi, Nat, entra aí — disse a cigana Carmencita, quando cheguei em sua casa aquela tarde. — As meninas já estão lá na sala bordando.
— Eu estava ajudando a mãe, mas agora estou livre — comentei.
— Eu vou ali na cigana Aurélia levar umas ervas para ela passar no pé do neto, parece que ele caiu do pé de manga e se cortou, mas fique à vontade eu já volto.
— Nat! — Bruna sorriu acenando.
Quando entrei na sala senti uma pontinha de ciúme, minha amiga estava tão à vontade com a outra garota. Talvez fosse infantilidade, mas eu sempre fui assim, ciumenta com meus amigos, e ela era como uma irmã gerada em outro útero.
— Que novidade é essa, você frequentando o acampamento?
— Somos amigas a tanto tempo e eu nem sabia se podia ficar por aqui — Bruna confessou. — Eu ouvi uma vez alguém dizer que não podia.
— Recebemos visitas normalmente — afirmei.
— É que você disse uma vez que foi proibida a entrada de não-ciganos sem autorização, eu achei que não podia — Bruna afirmou.
— Bem, ao menos que seja um lugar público, em qualquer lugar precisa de autorização — expliquei. — Essa proibição era mais sobre as brincadeiras no riacho e algumas visitas constantes que os jovens recebiam e trouxeram alguns transtornos, mas isso acontece em qualquer grupo.
— Minha mãe não liga por eu estar aqui, mas já vi algumas meninas dizerem que os pais não querem que andem por esses lados — a outra garota disse, balançando a cabeça em discordância.
— Ah, que perigo, vai que a gente rouba alguma criança — revirei os olhos.
— Me roube! — a loirinha ergueu os braços. — Eu prometo que não fujo.
— Ah, pronto, mais uma querendo virar cigana — falei aos risos.
— Essa é a Karen, ela mora ao lado da minha casa lá na fazenda — Bruna nos apresentou. — Desde que a conheci venho falando de você porque são muito parecidas no jeito de agir.
— Ela me chama de Natacha versão loira — disse a garota de pele alva, cabelos dourados com fios longos e impecavelmente lisos. Ela vestia uma saia longa estampada, parecida com aquelas que usávamos e uma blusinha de alças finas.
— Oi, Karen, seja bem-vinda — apertei sua mão. — Você se veste como nós.
— Eu gosto do estilo — a moça de estatura pequena sorriu.
— Eu não sabia que gostava de bordar, Bruna. O que anda aprontando?
— Queria muito te ver, então inventei essa história de bordado, mas também não estou curtindo — confessou Bruna. — Parece que minha sina é tentar algo que não me atraia, para ficar perto daqueles que eu gosto.
— Olha o drama — balancei a cabeça aos risos.
— Eu soube que ficou de castigo — comentou a Bruna. — A última vez que fiquei de castigo deveria ter uns cinco anos.
— Eu saí do acampamento sem pedir permissão a minha mãe, e minha desobediência foi compensada com esse pé quebrado. O castigo foi justo.
— Acho meio exagerado te tirarem o celular, hoje em dia ninguém mais fica sem — Bruna fez uma careta estranha, voltando aos seus bordados.
— Se realmente tem a intenção de se tornar uma de nós, precisa mudar seus pensamentos — respondi.
— Nat, hoje em dia tudo é negociável.
Não sei o que ela quis dizer com isso, mas fiquei pensativa sobre essa vontade de ser uma de nós sem concordar com nossa cultura.
— Como estão indo às aulas de montaria? — perguntei.
— Eu parei — ela respondeu.
— Mas por quê?
— Não foi uma boa ideia, Nat. A prova dos três tambores nunca foi algo que eu quisesse fazer e não ia conseguir manter essa farsa por muito tempo.
— Mas vocês dois ao menos conversaram?
— O Ian é um fofo, me confunde às vezes. Ao mesmo tempo que me trata com carinho, cuidado, não demonstra um interesse em específico, por mais que eu goste desse jogo de conquista, me sinto perdida, estou quase desistindo.
— Ele é reservado assim mesmo, mas não deveria desistir — falei ao me lembrar de minha visão. Porém, decidi não dizer nada, Bruna não era muito crente nessas coisas.
— Como é ser cigana, Nat? — Karen perguntou.
— Olha, eu não saberia te explicar, precisa ser mais específica em sua pergunta.
— Me desculpa, é romani que fala, não é? — Karen perguntou. — Não, romani é a língua, seria rhomá?
— Sim, rhomá — concordei surpresa. — Fez o dever de casa direitinho.
— Rhomá? — Bruna me olhou confusa.
— É que cigano é um nome criado pelos não-ciganos para identificar uma série de povos diferentes — expliquei. — Lá no passado, os povos que eram nômades e não gostavam de manter contato com pessoas estranhas eram chamados assim. Significa intocável.
— Que interessante, eu não sabia — Bruna se mostrou curiosa.
— Me lembro de minha avó dizer que existiam os , Rom, Calon e Sinti, se não me engano — Karen afirmou.
— Vocês são de qual, Nat? — Bruna perguntou.
— Somos do grupo Rom.
— Eu sempre fui apaixonada pela cultura cigana, amo tudo o que envolve liberdade e natureza. Queria saber como é poder viver livre pelo mundo.
— Mas, eu nunca vivi livre pelo mundo — sorri. — Meus antepassados faziam isso, acredito que seja algo único.
— Admiro muito a alegria de vocês, essas roupas coloridas, é como se sempre estivessem de alto astral.
— Então, ser cigano vai muito além de usar roupas coloridas, dançar em volta de uma fogueira, ou fazer adivinhações — esclareci. — Inclusive, tem ciganas que vivem na cidade ou até mesmo em comunidades, que usam roupas comuns, calça, por exemplo, só vestem saias longas em festas. Muita coisa mudou com o passar dos tempos.
— Sim, é uma pena que as pessoas não conheçam sobre essa cultura tão linda — Karen afirmou, colocando a peça que bordava sobre o colo. — Minha avó tinha uma prima que fugiu com o circo e era um circo de família cigana. Sempre que passavam pela região, ela visitava a família e contava como era sua vida depois de ter se casado com um cigano. Uma coisa que acho muito bacana é o valor que dão à família.
— A família é tudo nessa vida — comentei.
— Hoje em dia as famílias estão se reunindo cada vez menos. Os avós, que antes tinham suas casas cheias, estão sendo deixados de lado — Karen estreitou os olhos como se um filme passasse por sua mente e então voltou sua atenção para mim outra vez. — Os filhos não respeitam mais os pais, casamentos se desmoronam, lares são desfeitos como se o amor deixasse de ser um compromisso. É tanta coisa ruim acontecendo que dá até medo do futuro.
— Isso é verdade — Bruna concordou. — Eu mesma nunca conheci meu pai, mas também não sei e faria diferença agora.
— Já pensou em conversar com ela novamente? — perguntei. — Talvez agora que está crescida, sua mãe te conte a verdade sobre ele.
— Ela só me disse que é um bom homem e que me ama. Mas penso que se me amasse teria me procurado, eu não tenho culpa de seus erros, casado ou não, eu precisava de sua presença em minha vida.
— Mas sua mãe disse à minha, outro dia, que ele sempre quis se aproximar, foi ela que não deixou. Ele queria participar de sua vida, te acolher, mas ela não quis, deve haver um motivo para isso.
— Se ele fosse cigano, nada disso teria acontecido — Buna lamentou. — Vocês valorizam bem mais o vínculo familiar do que nós.
— Nem sei o que dizer sobre isso — falei compassiva.
— Não diga nada, voltemos a falar sobre ciganos que é mais interessante — disse a Bruna, ajeitando sua postura no sofá de um lugar, onde estava sentada, bordando. — Karen conhece muito sobre a cultura, eu preciso aprender.
— Sim, eu disse que sempre tive paixão por tudo o que envolvia esse povo, inclusive sei os doze mandamentos de cor.
— E existe isso? — Bruna a olhou com surpresa.
— Sim, e nós respeitamos muito — confirmei.
***
Os 12 Mandamentos Ciganos
1º- Amar a Deus acima de tudo e respeitar todos os Santos;
2º- Respeitar a Semana Santa;
3º- Respeitar todas as Religiões e credos que elevam o nome de Deus – Nosso Pai;
4º- Ajudar-se mutuamente;
5º- Amar e não desmerecer nenhuma criança;
6º- Respeitar os idosos e não desprezar a sua sabedoria;
7º- Não mostrar o corpo;
8º- Não se prostituir;
9º- Manter a fidelidade entre os casais;
10º- Não se envergonhar de sua origem;
11º- Não deixar de praticar o dom da adivinhação;
12º- Não trair seu povo.
***
— Você nunca me falou sobre isso — Bruna me lançou um olhar curioso.
— Falamos sobre tanta coisa que pode ser que tenha se esquecido.
— Meninas, me desculpem, eu demorei porque estava fazendo um curativo na testa do Natan, o outro menino que se machucou — disse a cigana Carmencita. — Essas crianças não param.
— Não seria melhor levar ao médico? — perguntou a Bruna. — Pancadas na cabeça são perigosas.
— Vai ficar tudo bem, fiz um emplastro com ervas e dei um chá.
— Que perigo.
— A cigana Carmencita conhece muito sobre ervas — comentei ao perceber o olhar desconfiado da minha amiga.
— Sim, se perceber que há necessidade a mãe vai levar, mas por hora não precisa — a cigana afirmou conferindo os bordados das meninas.
Ficamos ali por mais ou menos duas horas e então a cigana Carmencita nos serviu bolo de cenoura com cobertura de chocolate e um suco de limão geladinho. Logo após, acompanhei as meninas até a porteira que dava para a estrada de chão.
— Eu gostei muito de passar a tarde com vocês, esse castigo está me enlouquecendo e foi uma sorte minha mãe deixar sair.
— Eu ainda acho um exagero, você já tem dezoito anos, quase dezenove, não é mais criança para ser punida com castigos.
— É cultural, distraída! — Karen deu um tapa na testa de Bruna.
— Ah, gente, eu esqueço!
— Quando vocês voltam? — perguntei animada.
— Amanhã — Bruna afirmou. — Mas preciso achar algo que consiga fazer porque estou sendo um belo desastre.
— Que exagero, mal começou a bordar — eu ri.
— Quem é? — Bruna apontou para o cigano que vinha a cavalo.
— É o cigano Venâncio, está à procura de uma noiva, não quer se candidatar? — brinquei.
— Misericórdia — Bruna fez uma careta. — O homem tem idade para ser meu pai, eu hein!
— Se Ivan não pedir minha mão logo, posso entrar para a lista de suas possíveis noivas — afirmei desanimada.
— Quem? — Bruna perguntou.
— Por tudo o que é mais sagrado, ninguém pode saber ainda — falei, inocente.
— Como o Ivan vai te pedir em noivado, se ele está comigo? — Karen me olhou de cenho franzido.
Eu disse que tinha o dom de atrair confusões, agora estava eu em mais uma, e para complicar o cigano em questão apontou na estrada montado em sua moto, ao início do pôr do sol, uma tarde linda para se meter em uma encrenca.
— Oi meninas! — ele disse sorridente.
— Que história é essa de noivado, Ivan? — Karen se aproximou do jovem, levantando o tom de voz.
Eu e Ivan trocamos olhares, ele fechou os olhos antes de soltar um suspiro profundo e balançou a cabeça de um lado para o outro.
— O que você fez, Natacha?
— Ela não fez nada — a garota batia com as mãos em seu peito. — Você é quem me deve explicações, achou que ia brincar comigo e não descobriria? Vocês homens são todos iguais!
— Karen, espera, Karen! — Ivan, virou a moto e foi atrás da moça que correu e atravessou a cerca correndo pelo pasto.
— Eu vou atrás dela! — Bruna disse atravessando a cerca.
— Por que disse a ela sobre o noivado? — Ivan estacionou a moto ao lado da porteira.
— Me desculpa, eu não sabia — tentei me justificar, mas ele estava muito alterado.
— Se ela me deixar por sua causa, eu juro que conto tudo ao seu pai.
— Valha-me!
— Tem fé? Então reza — disse ele passando a cerca e correndo atrás da garota.
Ivan a rapinha do tacho da cigana Carmencita
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