Capítulo 9
O dia demorou passar, não pude ficar mais de cinco minutos sem pensar no que a professora disse. Havia algo errado comigo, e eu precisava consertar isso. Talvez fosse por essa razão que muitos me tratassem mal. Talvez eu fosse realmente feia. Meu olhar ia entre mim, Abigail e as meninas da minha sala. Todas elas eram mais altas, tinham pernas fininhas. O rosto parecia fazer um grande V. Barriga reta. Enquanto eu era baixa. A calça estava sempre justa, porque minhas coxas eram grossas. Meu rosto estava longe de formar um V. Estava mais para a letra O. Talvez eu precisasse mesmo ir ao médico.
- Mamãe! – corri ao encontro dela e pulei em seus braços. – Como está Sarabi? Ela está quase chegando?
- Venha, Amy. Conversamos no caminho de casa, pode ser? – Disse ela abrindo a porta do carro para eu entrar.
- Papai!
- Oi senhorita bonitinha! Como foi seu dia?
- Foi bom.
- Mesmo? Estou achando você preocupada Amy. – disse mamãe me olhando nos olhos.
- Papai, você me acha feia?
- Não, querida. Por que você diz isso?
- E você acha que eu sou gorda?
- Filha, o que aconteceu para você estar fazendo essas perguntas?
- Apenas me digam a verdade. – quando soltei essas palavras, um pouco mais alto do que o normal, lágrimas já escorriam pelo meu rosto. – Essa é a razão de as pessoas rirem de mim? É porque sou gorda. Como eu não percebi isso antes! Abigail tem um cabelo bonito, pele sem manchas feias e é magra, e todos a amam!
Nesse momento eu já estava soluçando, e papai chegou até parar o carro para poder entender o que estava acontecendo. Mamãe me olhava assustada e eu soube naquele momento que todos estavam certos. E que eles não podiam simplesmente dizer que tudo aquilo não passava de um equivoco. Eu vi os olhos de mamãe marejar. Eles não sabiam o que me dizer. Era como se o patinho feio realmente descobrisse o quanto é feio.
- Mamãe eu preciso ir ao médico! Eu tenho certeza que ele vai resolver meu problema. E por favor, nunca mais faça cookies. Eu nunca mais vou comer. A partir de agora faça apenas salada de frutas.
- Por favor, Amélia diga-nos o que realmente aconteceu? Eu não estou conseguindo entender.
- A professora Isabel perguntou se mamãe já havia me levado em um nutricionista. Ela disse que eu estou gorda e doente. E que eu deveria comer apenas o lanche da Abigail, porque salada de frutas é leve e faz parte de uma dieta.
Papai e mamãe se entreolharam, encabulados com o que estava acontecendo. A sua doce e pequenina de apenas oito anos estava sofrendo por um comentário irrefletido de uma mera professora que não tinha o mínimo direito de opinar sobre isso. Antes daquele momento eu jamais havia me preocupado com o corpo, muito menos com o formato dele. Mas foi ali que eu percebi que eu era diferente de Abigail. Que eu era diferente de todas as outras meninas da minha classe. Que eu era diferente de todas as minhas priminhas e vizinhas do bairro. Elas eram altas para a idade, tinham perninhas finas, e quando vestiam um short havia um vão entre as coxas. Elas também tinham o braço pequeno, e a barriga parecia uma tábua. E eu era totalmente o contrário. Meus braços às vezes não entravam nas blusas e eu tinha uma bochecha enorme. Sem contar a diferença dos meus cabelos vermelhos e a pele cheia de bolinhas marrons. Naquele momento eu realmente me senti a Fera. Era isso. Eles estavam certos. Eu era a Fera, e Abigail a Bella.
Quando chegamos em casa mamãe e papai me abraçaram e falaram que estava tudo bem e que isso não deveria me preocupar. Que eu era muito mais do que tudo aquilo que a professora falou. E em parte, eu sabia que eles estavam certos. Mas não adiantava mais. Uma grande lacuna havia sido aberta em meu coração, e nada iria tirar as palavras dela da minha mente. Mal sabia eu, mas aquele aparentemente pequeno, e simples conselho iria mudar muita coisa em minha vida. Uma parte da Amélia havia quebrado nesse momento, e os cacos que restaram ainda iriam lhe ferir muito. Cada pedacinho teria de ser colado no lugar. E talvez nunca mais 'Amélia' se sentisse completa novamente.
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