Cheguei em casa exausta, como se eu tivesse corrido uma maratona inteira abaixo de um sol escaldante. E não era pra menos, toda aquela ansiedade, angústia e medo me fez deitar na cama e adormecer rápido. Lembro-me de acordar com papai ao meu lado, segurando minha mão gentilmente. Nunca vou esquecer aquele olhar no seu semblante. Era um misto de melancolia com preocupação. E medo. O mal que estava assolando nossa família.

- Olá, florzinha. Descansou bem?

Eu ainda estava processando tudo que havia acontecido, lembrei-me de como tudo foi tão estranho. Depois da conversa com Abigail, pedi ao papai que me levasse pra casa. Foi como se alguém dissesse a ele que tudo que ele estava pressentindo era realmente verdade.

- Oi, pai. Acho que sim... Por favor, perdoe-me! Eu não queria ter estragado tudo daquela forma. Eu sou realmente um caso perdido! – Falei, com um pesar enorme.

Ele beijou minha testa e depois de um longo suspiro, falou: - Ninguém é um caso perdido, querida. Muito menos você. Não há pelo quê pedir desculpas. Você quer conversar?

- Papai, quando eu era criança você costumava dizer que tudo que cultivarmos, crescerá. Sejam plantas, dinheiro, amizades e por aí vai. Mas sabe que há um perigo no cultivo.

- Por que, Amy?

- Porque o cultivo pode facilmente tornar-se exagero. Água demais, trabalho demais e companhia excessiva...

- Sim, faz sentido Amélia. – Mas na verdade todo meu raciocínio para o papai não fazia o mínimo sentido, pelo menos não aonde eu queria chegar. Por isso, continuei.

- Papai, eu estive cultivando tantas coisas durante essa minha curta vida, e como sabes sou tão intensa que quando me empenho por algo, eu realmente o levo a fundo.

- Sim, como aquela vez que você queria fazer de tudo para seu peixinho voltar a viver.

- Sim. – Eu disse com um sorriso cansado no rosto. – Ele tinha morrido naquele instante, e na minha concepção deveria haver algum remédio que o "ressuscitasse"!

Essa era a verdade eu sempre fui imensidão. Dedicava-me ao máximo em tudo que fazia. Traços do perfeccionismo que mal sabia eu que habitava em mim.

- Florzinha. Se você não estiver se sentindo confortável para conversar agora não há problema, podemos continuar outro dia...

- Não, está tudo bem. Desculpe, eu faço tantos rodeios para chegar onde quero.

- Essa mente cheia de sonhos e ideias não para nunca, não é mesmo? Amo isso em você, Amy!

- Pai, eu exagerei no cultivo dos meus pensamentos e agora sinto que estou presa dentro deles. Sinto um medo enorme de voltar ao meu peso anterior. Mas por favor, não me entenda mal. Quando falo isso em voz alta sinto como que se estivesse sendo fútil. Não é apenas a forma corporal, mas todo o "peso" que ela carrega. Sinto que, agora finalmente, estou sendo aceita, estou sendo amada e valorizada. Mas o pior de tudo é que agora eu quero a perfeição, e ela está cada vez mais longe. E sinto que pra chegar nesse destino eu preciso negar a mim e aos meus desejos. A comida se tornou uma verdadeira inimiga. Pai eu não sei mais o que fazer... E, porque raios as comidas são tão gostosas? – Nesse momento eu já estava aos prantos de novo. Acredito que me olhar naquele momento não era nem um pouco prazeroso.

Isso se tornou constante em minha mente. O fato de as comidas serem extremamente deliciosas me enlouquecia, porque eu queria comer, meu corpo pedia por isso, mas minha força interior me impedia. Esse é o real perigo das dietas. Ela condiciona sua mente que seu dever é comer pouco, e "bem". Que você deve cortar os doces, os carboidratos e comer apenas coisas "leves", com poucas calorias. Mas a verdade é que isso não é nem um pouco sustentável. Imagine que dissessem a você para não pensar em Cacto. Qual a primeira coisa que viria a sua mente? Um cacto! Se te dizem para não pensar em comida, ou na sua fome, que é inerente ao ser humano, é claro que tudo o que você vai pensar é em comida! É natural seu corpo sentir desejo de doce, o organismo precisa sim do carboidrato, senão o próprio cérebro não funcionará bem. Mas aí que tá! Fizeram-nos acreditar que tudo isso é besteira, e que o que importa é comer "saudável" e ter o corpo "perfeito". Esse uso excessivo de aspas é para fazer você, caro leitor, refletir no real significado da palavra. Por que te fizeram acreditar que saudável é comer um prato de saladas, fazer jejum intermitente, low-carb e por aí vai? Perdoe-me estar sendo tão repetitiva e tão aparentemente, extremista. Tudo isso foi o que fez levar meu corpo e mente à ruína, e o tempo que levei para enfim entender o que hoje entendo foi longo e tortuoso. Por isso quero lhe encurtar esse caminho e fazer que você não caia nos mesmos buracos que eu.