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3. O ANTES

3. O ANTES

Quinze minutos. Esse era o tempo que faltava para o início do jantar de boas-vindas dos novos embaixadores. Enquanto isso, eu tentava atravessar a cidade no horário pico.

Naquele semestre as minhas segundas-feiras seriam muito atarefadas. A primeira aula na universidade começaria às sete da manhã e a última terminaria às três e meia da tarde. Depois eu tinha trinta minutos para chegar na casa de dona Gertrudes, uma viúva que não tinha filhos e que gastava seus sessenta minutos de aula de piano para bater papo. Eu a deixava falar. Com sua idade avançada, ela não tinha urgência em memorizar o Cravo Bem Temperado de Bach, repertório no qual já ensaiava há três anos. Dali eu seguiria para a casa de um outro aluno, um pirralho de oito anos que me dava nos nervos. Marcelinho puxava meu cabelo, chutava a minha canela, não prestava atenção em meus ensinos e rasgava as partituras. Engraçado era que sua mãe estava sempre me dizendo que ele ficava ansioso por nossas aulas.

Ansioso para me espancar, né? Só se for por esse motivo, minha senhora!

Mas naquela segunda-feira tive que cancelar a aula do mini-boxeador para conseguir chegar a tempo no jantar. Eu tinha me livrado das agressões do meu aluno fedelho para ser agredida moralmente por Júlio.

– Tudo bem. É a vida. Um dia fico livre dos dois. – Falei, engatando a primeira marcha quando o semáforo abriu no alto da avenida Afonso Pena.

De repente, o Concerto para Piano número 3 de Rachmaninoff ressoou por todo o carro. Era apenas o toque do meu telefone, no qual insistiu até cair, para logo, voltar a tocar.

Pela primeira vez, a obra do compositor russo me irritou.

Eu já imaginava quem estava do outro lado da linha, mas atender àquela chamada não me transportaria ao local em que eu deveria estar. Pelo contrário, eu me atrasaria ainda mais se tivesse que procurar pelo aparelho dentro da minha bolsa desorganizada.

Depois de vinte e cinco minutos, com a entrada liberada na mansão, estacionei meu carro na garagem. Foi impossível não notar a figura magricela de Aldo com as mãos na cintura me encarando com desagrado. Aquilo não me intimidou. O filho mais velho de Júlio e Milena era um grande amigo, o coração mais bondoso dos quatro Albuquerque.

Antes de sair do carro, peguei minha bolsa e olhei para a pequena pilha de partituras. Fiquei em dúvida se as levaria comigo ou não. Nenhuma delas tinha valor financeiro, eram apenas cópias. Mas ali estava todo meu estudo dos últimos meses. Cada compasso tinha uma anotação feita a lápis, rabiscos que definiam a minha própria técnica de performance. Perdê-las significava retroceder em meu árduo aprendizado.

Isso foi o bastante para minha cabeça pensar nas piores e mirabolantes catástrofes.

E se algum ladrão conseguir atravessar os vigias da guarida e roubar meu carro? Bem, só se for um ladrão burro. Quem vai roubar uma lata de sardinha quando se pode roubar um Jaguar? Mas... se um raio atingir meu carro? E se vazar óleo e pegar fogo?

Imediatamente, segurei a pilha de papéis e as abracei contra meu peito.

– Vocês vão comigo!

Saí do carro um pouco desengonçada. O chão do jardim era feito daqueles pisos esburacados que intercalam concreto e grama, então preocupei em andar com cuidado para que o salto do meu scarpin não afundasse na terra. Meu vestido preto estava torto no corpo e muito justo; eu tinha engordado alguns quilos nas férias de julho. Para finalizar, minha calcinha machucava o meio do meu bumbum.

Eu odiava me sentir uma bagunça; deselegância não combinava comigo. Mas acontece que, quando algo fugia do meu domínio, eu me embaralhava.

– Muito bem, dona Rúbia! Vejo que ainda não perdeu o costume de nos fazer te esperar. Tá se a achando a Martha Argerich, não é mesmo?

– Ah, vê se não enche e me ajuda a carregar essas tralhas!– resmunguei fatigada. Eu precisava fazer alguma atividade física com urgência!

Aldo riu e tomou todos os meus papéis para si.

– Poderia, pelo menos, ter atendido minhas ligações.

– Eu estava dirigindo.

– Essa desculpa não cola, princesa. – Ele piscou e começou a andar em direção a entrada principal da mansão. – Os convidados chegaram.

– Todos? – perguntei surpresa enquanto caminhava logo atrás. Vi que ele gesticulou um sim. – Poxa, não imaginei que fossem tão pontuais!

– Pois é. Que coisa, não? – ele debochou. – Agora apressa o passo que estão todos te esperando.

– Preciso ir no banheiro antes.

– Precisa não.

– Aldo, por favor! – pedi fazendo manha. – Hoje tive um dia de cansativo! Acordei cedo para ir à universidade, tive aula até o meio da tarde, ouvi a dona Gertrudes reclamar uma hora sobre o cachorro da vizinha, voltei para casa e custei para encontrar um vestido que coubesse em mim, fiquei presa no trânsito dentro de um carro com o ar condicionado quebrado, minha lente de contado está perdida no olho e minha calcinha... – parei debaixo do lustre do hall e continuei: – Minha calcinha está atolada em meu fiofó! Você tem ideia do quanto isso é desconfortável?

– Te dou cinco minutos para se recompor. – Ele olhou para trás e concluiu: – Aproveita que todos estão na sala se empanturrando de canapés e coxinha no palito.

Não esperei nem mais um segundo e corri para o lavabo. Deixei a porta entreaberta para que pudéssemos conversar.

– Duvido que eles estejam preocupados com meu atraso. Relaxa. Ninguém fica entediado comendo coxinha. – Eu falava ao mesmo tempo que colocava a calcinha em seu devido lugar. O alívio foi tão grande que falei algo espontâneo: – Meu Deus, como isso é bom!

– É, coxinha é bom mesmo. – Ele pensou que minha última frase era por causa da comida. Ri baixo e deixei passar batido. – Binhazinha, o que você vai tocar?

– Debussy.

– Não é Impressionista demais para uma plateia leiga? Eles não estão acostumados com...

– A plateia pode ser leiga, mas sou uma pianista de verdade! Além disso, Estampes tem apenas quinze minutos. – Eu o interrompi porque estava certa com minha escolha.

– Quinze minutos é muito tempo para o perfil dos convidados de hoje.

– Claro que é muito tempo! – critiquei, tirando as lentes de contato. – Tempos demais para aprender um pouco da alta cultura e tempo de menos para ouvir músicas sertanejas que só têm três acordes.

– Tem hora que você parece uma velha falando.

– Eu me sinto uma velha em muitos aspectos. – Peguei a caixa de óculos de grau no fundo da bolsa. – Mas voltando ao assunto do repertório, tocarei só o primeiro movimento. Você acha que sua estimada plateia aguentaria me ouvir por seis minutos?

– Seis minutos de impressionismo é o suficiente. – Sua voz parecia um pouco mais aliviada.

Coloquei os óculos, mas desfiz o coque para obter um ar mais jovial.

– Ô Binhazinha?

– O que foi dessa vez? – perguntei já conhecendo o tom de voz pidão do meu amigo.

– E se pedirem para tocar algo mais popular?

– Não toco popular. – falei resoluta enquanto dava uma volta diante do espelho. A calcinha continuava a ser um problema, mas, dessa vez, ela marcava sob o tecido do vestido.

– Não seja antipática. Será que não pode pelo menos tocar bossa nova? Que tal Garota de Ipanema?

– Se continuar insistindo, tocarei todos os Nocturnes de Chopin. Pedir para que eu toque música popular é como, sei lá, pedir para Alcione cantar pop americano. – disse pensando seriamente em tirar a minha calcinha. Ela era um grande problema no meu visual.

– Mas você não é a Alcione.

– Pois é! Não sou Alcione, nem Martha Argerich! – levantei a saia e comecei a tirar minha peça íntima. – Sou Rúbia Sarmento, a garota chata que toca piano, a ambiciosa e nojentinha. Você acredita que semana passada uma caloura do trombone me chamou de vaca metida?

– Não me diga! – exclamou com deboche. – Quem teria coragem de dizer uma coisa dessas? Justo para você, que é um amor de pessoa!

– Eu estava fazendo um favor de correpetí-la* em seus estudos. Ela me pediu para acompanhá-la numa masterclass. Nos ensaios, a menina se perdia no ritmo, não fazia os crescendo do jeito certo e desrespeitava a fermata. A gota d'água foi ela desafinar. A nota escorregou tão feio que não aguentei e disse que o som parecia um peido de elefante!

– Você deveria ter mais paciência com a caloura.

– Sim, deve ser por isso que ela me chamou de vaca metida. – Joguei a calcinha dentro da bolsa e comecei a reajustar o vestido em meu corpo. – Sabe o que fiz? Juntei minhas coisas, mas antes de me retirar da sala, falei que sou pianista e que pianistas, diferente de trombonistas, não precisam de ninguém para cor-repetir*. Com essa deixa, saí de cabeça erguida, sem perder a elegância.

– Isso foi cruel.

– Eu sei. Mas ela logo esqueceu. Foi para aquele bambuzal, que tem do lado do prédio da escola de música, e fumou um baseado.

– É engraçado como nos cursos de artes tem muita gente maconheira e metida a ser vegano.

Enquanto dava uma nova conferida em meu visual, ri alto e falei:

– Aldo, você é o gay mais conservador que existe! Como isso é possível?

– Sou uma bicha clássica, mas, voltando ao assunto da música popular...

– Se pedirem para tocar outra música toco Odeon de Ernesto Nazareth. Satisfeito?

– Hum, melhor. Esse gênero maxixe soa bem brasileiro por lembrar choro e samba. Acho que os convidados vão gostar.

– Relaxa, Aldinho? A única convidada que deve entender um pouco de música é a artista plástica. A blogueira vai querer tirar fotos e os jogadores de futebol se comportarão como jogadores de futebol.

– Mas seja piedosa, você sabe que os atletas são importantes para a divulgação do nosso trabalho. Eu sei que se você fizer um pouco de esforço, conseguirá sorrir, ser simpática e ter uma conversa agradável.

– Não vou puxar papo com quem eu não tiver vontade! Vim aqui para tocar piano! – Virei de lado e, encarando meu perfil no espelho, murchei a barriga. – Além disso, eu não consigo conversar com atletas. Não tenho inteligência esportiva.

– Que desculpa esfarrapada. Sei muito bem que quando quer ser social, você consegue.

– Acontece que eu não quero! Essa não é minha função no Instituto! – a insistência de Aldo estava me irritando. Meu amigo, diretor da instituição, tinha uma necessidade descabida de mostrar serviço ao pai. Apesar de ser o filho mais velho, seu jeito afeminado e sua falta de traquejo com os negócios da família, colocava-o numa posição desprivilegiada em comparação ao seu irmão, Igor.

Sempre fui complacente com toda essa situação. Aldo era caridoso por natureza, e como amiga, o mínimo que eu poderia fazer era apoiá-lo. Eu estava ali não somente pela ajuda financeira que recebia, ainda que eu não fosse o melhor exemplo de altruísmo e tivesse os meus próprios interesses, confirmei presença naquele jantar por causa dele também. Mas a minha maneira de enxergar o restante dos Albuquerque tinha mudado. Eu não estava com saco para tolerar aquela família latino-aristocrata. Por isso, antes de sair do lavado, fechei o zíper da minha bolsa e falei em voz alta:

– Meu Deus, Aldo! São jogadores de futebol! Que tipo de interação eu poderia ter com esse tipo de gente? Eu não entendo nada sobre a profissão deles, eles não entendem nada de música erudita. Farei o esforço de ser simpática por causa das crianças, por mim e, também, por sua causa! Mas não me peça para puxar assunto com quem não tenho a mínima vontade de conversar! Hoje estudei escalas complexas no piano, tive uma aula exaustiva sobre os textos de Schopenhauer, Heidegger e Bauman! Como vou conversar com pessoas que não tem estudo depois de debater escritos de grandes pensadores? – abri a porta e fui logo falando: – Olá, sou Rúbia! Sabe, eu estava aqui pensando... como os tempos líquidos, no qual vivemos, influencia diretamente na sua cobrança de pênaltis?

Encarei meu amigo e ouvi uma risada ressoar logo atrás dele. Imediatamente ampliei minha visão e me deparei com um sorriso largo.

Aldo olhou para trás e sussurrou:

– Nossa Senhora, eu tô lascado.

O homem veio em nossa direção sem deixar de sorrir. Dentes tão brancos contrastavam com a pele preta. O jeito boleiro de andar, malaco e confiante. Mesmo aflita, consegui reparar em suas roupas; típicos trajes de alguém que passou boa parte da vida sendo pobre, que ficou rico do dia para noite, entretanto, ainda não tinha bom gosto o suficiente para fazer combinações adequadas e finas.

Era um dos jogadores de futebol!

Tive certeza disso não só pela atitude preocupada de meu amigo. Na verdade, é fácil ler as pessoas quando se estuda arte diariamente. Mas, foi com ele mais próximo que senti o sangue gelar de vez. Reconheci aquele rosto. Há um tempo tínhamos nos esbarrado no estacionamento do Instituto Bravíssimo.

Senti meu futuro escorrer entre os meus dedos por causa de um impulso idiota ocorrido num passado recente demais para ser esquecido.

O tal jogador de futebol parou entre Aldo e mim, e olhando diretamente em meus olhos, ele disse:

– Vejam só quem está aqui! A megera do jipe!

Minha barriga doeu porque, no caso, a megera do jipe era eu.

*Correpetir e/ou cor-repetir: É o ato de acompanhar ao piano o bailarino, o cantor lírico e outros instrumentistas (caso precisem de correpetição).

A correpetição não se restringe apenas ao piano como um instrumento acompanhador. Um violão, por exemplo, pode correpetir a flauta transversal.

A palavra é de origem francesa, Répétiteur, e infelizmente ainda não está no dicionário português (brasileiro).

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