03 - Um paradoxo de otimismo e pessimismo
Não que sua única frase do dia tivesse sido uma obra prima. Não mesmo! Tinha sido bastante desnecessária até. Não era importante se ele achava que ela era freira ou noviça. Ele nem ao menos deveria saber a diferença entre as duas coisas. Não tinha porque saber. E dava no mesmo, foi o que ela se repetiu uma e outra vez enquanto andava apressadamente pelos corredores do colégio.
Mas no fundo, ela sabia que não era a mesma coisa. Ser noviça era uma responsabilidade muito menor. Tinha consciência de que não poderia mais correr pelos corredores e nem rolar com as crianças pelo jardim quando virasse freira. A Madre disse um dia desses que esse dia estava chegando.
Mary tratou de se convencer que a fisgada que sentia no peito cada vez que pensava nesse assunto era de ansiedade. Porque talvez realmente fosse, ela estava há muito tempo esperando para fazer seus votos, nada mais natural do que se sentir esquisita sobre isso, não é mesmo?
Mas esquisita de uma maneira boa, vale frisar.
Logo quando chegou ao jardim do colégio, suas crianças vieram todas de uma vez cumprimentá-la. Fazia tempo que não via nenhuma delas. Culpa do seu antigo trabalho na biblioteca, mais uma razão para odiá-lo, caso ódio fosse uma emoção permitida entre noviças. Por conta da arrumação de livros empoeirados, poucas vezes ela podia visitar seus pequenos anjinhos no horário do recreio deles. Contudo, com esse novo serviço que tinha, teria tempo de sobra para vê-los e mimá-los, sempre que não tivesse trancada numa sala com aquele intrigante Theodore Hopkins.
Deixando de lado seus pensamentos sobre Theodore, se concentrou no lado bom que toda aquela reviravolta da manhã proporcionou. Um belo recreio com suas criancinhas.
- Noviça Mary! Noviça Mary! Do que vamos brincar hoje? – perguntou Angelina com todo entusiasmo enquanto abraçava os joelhos de Mary com toda a força de seus bracinhos.
- Hmm, estava pensando em brincarmos de jogo da memória! – disse a noviça enquanto tentava se equilibrar diante da avalanche de bracinhos.
- Ah não! Isso é chato! – respondeu Katy, Charlote e Lynn em uníssono.
- Então... Vamos montar um quebra-cabeça bem legal que eu achei esses dias!
- Ah não! – gritou Angelina ainda enroscada na perna da noviça.
- Mas é de princesas! É um quebra-cabeça bem interessante! – disse Mary torcendo para que sua propaganda surtisse efeito em suas crianças.
Mas é claro que não deu.
- Vamos brincar de pique-pega como da outra vez em que veio nos ver! – exclamou Lynn enquanto puxava a barra do habito de Mary.
- Ora, meninas! Sabem que a Madre não gosta de me ver correndo!
- Mas a Madre não está aqui – sussurrou Rosalie como se estivesse contando o mais preciosos dos segredos.
Mary não levou menos de três segundos para tomar sua decisão, afinal de contas, esse era justamente o lado bom de ter um trabalho de alta responsabilidade. Depois que ele terminava tinha bastante tempo para ser tão irresponsável quanto quisesse.
E isso incluía, logicamente, correr com suas crianças.
E enquanto rolava pela grama junto com Rosalie, Lynn e Charlote, sentindo o sol esquentar seu rosto e a grama esfriar seu hábito, não podia deixar de agradecer aos céus por ter mais uma oportunidade de brincar com as crianças. Feito criança, brindando a vida em pensamento. Com água!
Afinal de contas, a vida era bela. Ela tinha aprendido isso num filme. Que viu escondida uma vez.
**
A vida...
Bem, a vida era uma droga, pensou Thed pela sétima vez na última hora. Não a vida enquanto fenômeno biológico. Isso era realmente algo muito impressionante, mas a vida moderna, principalmente a sua vida moderna, aquela sim era um belo desastre.
Repetia isso uma e outra vez enquanto ouvia, ou pelo menos fingia que ouvia enquanto sua mulher fazia um monólogo que ela costumava chamar de "discussão".
Mas que ele particularmente preferia chamar de monologo mesmo, pois tinha a ligeira impressão de que para ser uma discussão era necessário ter duas pessoas discutindo entre si.
E esse monólogo, assim como todos os outros, tinha o mesmo assunto principal. O mesmíssimo que habitava sua cabeça naquele momento: a vida.
Mas claro, na concepção de Christine a vida de Thed era muito pior do que uma simples droga, como ele humildemente considerava. E ela fazia questão de expor sua visão sempre que possível. Principalmente durante suas frequentes discussões. Ou monólogos, para quem possa preferir classificar assim.
- Não fomos convidados para o evento beneficente da família Hallings, este é o terceiro evento em que não somos chamados. E tudo é sua culpa, Thed! A que buraco você pensa em levar nossa vida?
- Já te disse que você não é nem engraçado e nem interessante o suficiente para se encaixar em um grupo da sociedade. Já é a hora que você começar a pensar no bem estar da nossa família, e tratar estabilizar a gente como membro da alta sociedade porque se não... O que vamos fazer da nossa vida?
- Se sairmos completamente do circulo social, como estamos prestes a fazer, como vamos arrumar contatos para sua firma de contabilidade decadente? Como vamos sustentar a vida que levamos hoje?
- Thed, você precisa tomar um rumo para sua vida.
Essas, entre outras muitas perguntas, resumiram a discussão do dia. Exaustiva para o ouvido de qualquer homem, mas Thed não poderia deixar de fazer pequenas correções mentais enquanto ouvia a falação sem fim de sua esposa.
Essa exclusão dos eventos sociais realmente mudaria a vida deles, porém, para ele, seria uma mudança para melhor. Ou para o não tão mal assim. Seria o fim de conversas enfadonhas e presunçosas. De noites intermináveis na companhia de gente que ele não gostava e que claramente não gostava dele. Pessoas que o encaravam como o alpinista social que seu avô foi. E que sua mulher ainda persistia em ser.
Mas não dava para levar Christine a mal, era uma linda mulher, com seu cabelo loiro pálido seu olho de um azul céu podia conquistar a qualquer homem, nenhum deles ousaria pensar mal dela. Mas ela ousou se casar com Theodore. Algo estranho havia naquilo. E foi unânime uma decisão da sociedade achar que a estranheza estava com ele.
Christine era determinada, forte e muito dedicada quando se propõe a alcançar seus objetivos. Era uma visionária, sempre olhava adiante, e se adiante também se localizasse um pouquinho mais acima da escalada social, tanto melhor.
Christine, assim como o avô de Thed, ambicionava estar no topo da sociedade. Aliás, tinha sido ideia de seu próprio avô esse casamento tão absurdo. Ele dizia que Christine poderia consertá-lo, pôr um pouco de juízo em sua cabeça e fazê-lo subir mais alto do que ele almejava. Ou até mesmo merecia. Chegava a ser engraçado como seu avô apostava tanto numa mulher que tinha ainda menos recursos do que eles.
Após a morte de seu avô, quem o criou e educou toda a vida, Christine fez exatamente o que o senhor Hopkins esperava dela: assumiu a posição de maior alpinista social da cidade. E, para uma falsa socialite, ela até que desempenhava o papel muito bem, pelo menos melhor que Thed. Ela sabia o que estava fazendo, até parecia que nasceu para isso, mesmo quando seu avô a achou numa suja lanchonete de subúrbio.
Mas o que Christine não sabia era que Thed já tinha arrumado um rumo para sua vida, e felizmente não tinha nada a ver com as rodas da sociedade, pelos menos não diretamente. Diretamente seu rumo tinha a ver com aquela noviça que estava fazendo todo o trabalho para ele.
Aquela criaturinha pequena e muda estava praticamente sustentando sua família sem nem se dar conta que o fazia. Talvez devesse agradecê-la de novo, mas falando francamente, tinha receio que caso agradecesse, não fosse respondido. De novo.
- Estou esperando uma resposta, Thed! – exigiu sua minúscula mulher como se fosse um enorme general.
Ela geralmente fazia isso e ele naturalmente não suportava.
Ela não teria uma resposta, não como a que estava esperando, Thed não era precisamente um cara muito aberto, não dava para considerá-lo falante. E atualmente, quando as coisas só faziam piorar, ele cada vez mais se retraia. Sua vontade de se comunicar com o mundo à sua volta ia gradualmente diminuindo, à medida que ele percebia o quanto não valia a pena estar na companhia das pessoas que ele geralmente estava. Mas ainda assim, Christine era sua mulher, ele prometeu respeitá-la.
Por isso, ela receberia ao menos uma dica sobre alguma de suas perguntas:
- Estou indo para o trabalho. – era a dica que Thed tinha para dar.
Ela era esperta, ia entender que se o problema dela era a falta do trabalho de Thed, ele estava resolvido, ao menos por hora. E ele contava que ela se acalmaria com isso. Ou pelo menos ele torcia.
___________________________________________________________
POR ESSA VOCÊS NÃO ESPERAVAM, né? Thed! CASADO! BOOM! (eu tinha me ESQUECIDO desse detalhe) (e demorei um tempo pra me acostumar e continuar revisando o capítulo como se ESTIVESSE TUDO BEM). Mas não tá, né? A Christine tem tudo pra ser um belíssimo pé no saco. Espero que vocês não me odeiem por ela. Nem pela demora em postar! Minha vida, como sempre, tá louca! Mas acho que logo ela vai entrar nos eixos de uma rotina, conto pra vocês como, assim que isso acontecer.
Mas e aí, gente? Como vocês vão? Tão gostando? Digam que sim, prfvr, nunca te pedi nada! (Mentira, peço estrelas o tempo todo e aproveito pra pedir agora também =^.^=) Acho que eu sou a maior mendiga de estrelas aqui do Wattpad, mas olha, não acho vergonha nenhuma, viu?
Beijos estrelados dentro do coração de todos vocês que leram esse recadinho :*
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro