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Eu não estava mais desesperada. Os sentimentos conflituosos tinham ido embora e agora eu estava tranquila, não nego que foi difícil vê-los juntos pelos corredores, mas eu estava tranquila. Tinha entregado tudo nas mãos de Deus e confiava bastante nele para me deixar levar pelas minhas emoções.
Claro que minhas amigas não concordavam com isso e deixavam minha vida um pouquinho mais difícil.
— Não sei como você consegue, eles praticamente esbanjam amor, parece um comercial de manteiga. – Clarisse diz observando o casal margarida de longe enquanto mordia sua torrada. Reviro os olhos me mantendo focada demais no meu creme brulé. — Você é muito calma.
— Uhum. – Becky concorda com a cabeça terminando sua garrafinha d'água, já que a mesma diz estar de dieta para o próximo jogo. Eu não a entendia, ela tinha o corpo perfeito de atleta e cabelos graciosos platinados que a faziam entrar na lista das mais bonitas da escola, mas mesmo assim se jogava de cabeça nas dietas. — Se dependesse de mim seria eu no lugar dela. – Aponta com a garrafinha para Nicole.
Mas é claro! Se dependesse de mim eu também estaria no lugar de Nicole, mas não depende e só de pensar nisso já me cansa. Prefiro deixar tudo para Deus, discutir isso com Clarisse e Becky era total perda de tempo, elas não entendiam a minha fé, não entendia no que eu acreditava, nem todas as palavras do mundo poderiam fazê-las ver isso.
Por esse motivo, acenei com a cabeça e mudei rapidamente de assunto para algo que elas estavam mais interessadas, deu certo já que o falatório começou em força total. Mas enquanto eu ria e fingia animação, o olhei de esgueira, rapidamente. Você sorria para a rodinha de pessoas em volta de vocês enquanto abraçava Nicole por trás, igualmente radiante. Realmente parecia comercial de margarina.
Por um segundo, sua cabeça se virou em minha direção, seus olhos azuis alheios ao que via me fitou rapidamente antes de voltar a conversa. Suspirei em frustração me sentindo pior do que quando você não notava minha existência. Assim era melhor, você não sabia da minha obsessão e eu estava protegida embaixo do amor platônico.
No fim das contas, seu namoro com Nicole durou oito meses e mesmo depois do término, vocês ainda conversavam e riam juntos pelos corredores. Achei aquilo bonito e fiquei enciumada ao mesmo tempo. Incrívelmente irritante.
Você estava solteiro de novo e aquilo recuperou minhas forças, mas mesmo assim não consegui me aproximar. Não entendia o porquê, me dava tremedeira e falta de ar, o nervosismo era tão grande que quando te via no corredor corria para o outro lado, totalmente patética.
Um dia, depois de uma terapia intensa com Clarisse e Becky, com elas me dizendo que me arrastariam a força até você se eu não falasse pelo menos um "oi", coloquei na cabeça que era fácil, eu iria apenas falar com uma pessoa normal. Caminhei ainda relutante até o estacionamento onde eu sabia que estaria lá com os rapazes do time, era isso que você fazia todo fim de aula.
Quando cheguei, vi uma movimentação estranha entre os rapazes e por medo e um pouco de curiosidade me escondi atrás de uma árvore, observei tudo de longe com os ouvidos apurados.
— ... Quem trás uma bíblia para a escola? – Um dos jogadores que não me recordo o nome ria alto para um garoto de xadrez azul, que o olhava sem demonstrar sentimento algum.
Eu o conhecia, era Dereck. Um jovem de uma das igrejas filiais da minha. Aquela era claramente uma situação de bullying, infelizmente frequente na escola. Eu queria entrar naquela rodinha de merda e acabar com aquilo, mas estava curiosa para saber o que você faria. Quem você era Scott? Alguém que ajudava nessas situações? Você fazia essas situações?
As atenções voltaram para você, eu não era a única esperando uma resposta, eles eram telespectadores da sua vida tanto quanto eu, você era o capitão do time, tinha a pedra na mão e todos esperavam você atirar para começar. Sua expressão era neutra, não expressava nada tanto quanto Dereck.
Por um momento, não acreditei no que vi, ou pelo menos queria não ter visto. Naquele instante eu queria poder voltar no tempo e nunca ter saído daquela escola, queria poder ter pego carona com Clarisse como todos os dias e ido para casa na minha habitual rotina de faxina. Queria poder ter sofrido algum acidente no corredor e ter que ir às pressas para a enfermaria. Queria ter saído mais cedo por um imprevisto familiar ou nunca ter colocado os pés para fora da minha cama.
Queria ter feito qualquer coisa, menos estar ali vendo aquela cena.
Você riu Scott, riu e concordou com os marmanjos que caçoavam da fé do garoto, a mesma fé que eu tinha. Se juntou nos insultos e apoiou aquela atitude grotesca e imatura.
O pior de tudo isso Scott, não foi você nos zuar pelo que acreditamos, mas foi você zoar o nosso Deus. Você riu dEle sem dó, apenas para divertir seus amigos, porque eu o conhecia um pouco que seja, eu havia te observado de longe por todos esses meses e aprendido um pouco do seu jeito, admirado sua personalidade. Você não gostava desse tipo de atitude de terceiros, mas você o estava fazendo para ser aceito pelo time, afinal, você tinha se tornado capitão recentemente. Mas agora eu estava sendo apresentada para seu lado podre, e não gostei nada do que vi.
O odiei Scott, como nunca havia odiado alguém. Eu estava me sentindo enganada, irritada e ofendida. A imagem que eu tinha de você se destrói por completo, bem em frente dos meus olhos.
Marcho para fora do meu esconderijo e caminho a passos rápidos e irritados até aquela rodinha. Empurro alguns caras que protestam irritados e seguro a mão de Dereck que me olhava com um misto de surpresa e alívio.
— Olha só, sua namorada evangélica Dereck? – Outro marmanjo com a jaqueta do time diz parecendo divertido com toda a situação, sendo acompanhado nos risos dos outros.
Desviei meus olhos dele para você, vi quando seu sorriso morreu quando se deu conta de quão estúpida era aquela atitude, vi quando suas sobrancelhas se uniram e um pouco de arrependimento dançou em suas feições e me deliciei quando finalmente a máscara que você criou para seus amigos idiotas caiu.
Virei para o primeiro cara que zuou Dereck e arranquei a bíblia de sua mão, segurando firmemente na mão dele o puxei para fora da roda ignorando as zoações.
Nós andamos até o carro velho de Dereck estacionado em uma das vagas mais distantes. Ele destravou o carro com a chave e eu deslizei para o acento do passageiro enquanto ele entrou no motorista.
— Obrigado. – Dereck diz encostando a testa no volante, não demorou muito para as lágrimas descer pelo seu rosto caindo com abundância em seu colo. Meu coração quebrou em pedaços ao vê-lo daquele jeito, e eu o odiei mais ainda, Scott.
— Pare de chorar. – Eu posso ter parecido insensível, mas precisava de alguém neutro naquele momento.
— Eu sou fraco, Amy. Não sei se vou aguentar isso, eu...
— "Jovens... – Minha voz aumentou alguns tons para sobressair a dele. Ele levanta a cabeça para me encarar, esperando que eu continue. — ... Eu vos escrevi porque sois...
— Fortes." – Dereck ri concordando com a cabeça. — João estava certo, somos fortes, o que são colegiais comparado ao império romano?
E então as forças de um jovem estava se recuperando outra vez. Eu apenas queria que as minhas forças para te amar se recuperasse, mas ao invés disso, vi morrer na minha frente tudo o que um dia senti por você.
Meus olhos ardiam pela necessidade de chorar, eu só queria chegar em casa logo. Não podia desmoronar ali na frente de Dereck, um de nós devia ser o forte e ele já havia aguentado bastante coisa naquele dia. Não era justo.
Dereck estacionou o carro na frente da minha casa, agradeci a carona e o incentivei a melhorar, um total egoísmo da minha parte já que por dentro eu desmoronava. Bati a porta do carro e corri para a portinhola da cerca branca que como sempre estava emperrada. Nunca gostei daquela cerca, dava a visão da típica casa americana mas só servia de obstáculos nos meus dias de atrasada, isso foi bom porque me exercitou durante todo esse tempo, mas naquele dia só serviu como combustão para minha raiva.
A chutei sem dó, a vendo abrir em um estrondo, bater na cerca e voltar na mesma velocidade. A intercepto antes que bata outra vez, não quero que ninguém da minha casa morra de infarto, embora a idéia de Tyler, meu irmão mais velho, seja tentadora.
Corro até a porta cruzando os dedos para que não tenha ninguém na sala quando subi ao quarto. Infelizmente, não pedi com tanta vontade. Minha mãe estava no último degrau da escada quando abri a porta tentando ser silenciosa. A encaro surpresa, e um pouco frustrada.
Os olhos avaliativos dela não deixavam passar nada, eles me analisaram dos pés a cabeça e inconscientemente esperei a pergunta de um milhão de dólares chegar.
— Você está bem? – Esse foi o gatilho. As lágrimas esparramaram para fora dos meus olhos com força o suficiente para encher uma piscina.
Ali parada na porta fui inundada de soluços enquanto as lágrimas atrapalhavam minha visão.
— Vem cá. – Sinto os braços acolhedores de minha mãe em meus ombros, me puxando para mais perto. Ela me guia até o sofá e me puxa para o seu colo.
Afundo minha cabeça em seu pescoço e deixo-me ser embalada naquele abraço. Eu sou um pouco maior que ela, mas era incrível a capacidade que ela tinha de me deixar confortável mesmo embalada como um bebê.
Espero que você saiba, Scott, que aquela foi a primeira vez que chorei daquele jeito. Meu coração estava em frangalhos enquanto na minha cabeça só passava uma dolorosa despedida.
Eu não o queria ver nunca mais.
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