Epígrafe
Em uma vila nada hospitaleira, onde as pessoas gostavam de ser delicadamente cruéis, vivia uma garotinha. Ela tinha grandes olhos que eram tão escuros quanto o seu cabelo encaracolado, um nariz rechonchudo, assim como as bochechas grandes e rosadas que adornavam o seu sorriso quase eterno. Certo dia essa menina, particularmente alegre demais, tagarela demais e que dava opiniões demais, assim como qualquer criança de sua idade, ouviu de alguém próximo demais que ela tinha que ser diferente.
A menina sorriu e calou, pela primeira vez a garotinha não tinha respostas e ela sempre as tinha na ponta da língua como dizia a sua avó, "mas como posso ser diferente?" a menina pensou. A pessoa próxima demais remendou, "desse jeito ninguém vai gostar de você", a menina sorriu novamente e ficou sem graça, enquanto sentia todos os seus sorrisos e a sua tagarelice sumirem no estalo de um dedo. A garotinha ficou triste, mas entre os afagos e brincadeiras daquele dia, aquilo virou apenas uma bola de gude vermelha em seu pote cheio de bolas de gude verde.
Em um dia particularmente ensolarado a garotinha que vivia sorrindo ouviu novamente de alguém próximo demais que ela precisava mudar para ser ainda mais linda, porque se não fizesse isso não seria amada quando crescesse. Dessa vez a garotinha sorriu sem mostrar os dentes, escondendo a sua vontade de chorar. "Eu tenho mesmo que mudar? Ninguém vai me amar? Eu sou insuficiente?" a menina pensou.
Logo a garotinha tinha mais uma bolinha vermelha e opaca no seu pote antigamente cheio de bolas verdes brilhantes. A menina agora atenta a todas as bolas vermelhas que lhe davam não tardou para perceber que a cada bola vermelha que ganhava duas verdes sumiam. O grande problema é que agora aqueles dizeres se repetiam para a garotinha e em algum momento ela passou a enxergar apenas as bolas vermelhas que recebia, ela não conseguia mais acreditar nas verdes, então elas ficaram tão vermelhas e opacas quanto as que sempre foram vermelhas.
A garotinha que um dia foi sorridente, tagarela e particularmente "perguntadeira demais" já não mais sorria ou falava tanto assim e, não muito tarde, ela tinha potes e mais potes de bolas vermelhas. Algumas bolas vermelhas ela recebia dos outros, outras ela mesma acrescentava e, as vezes, quando recebia uma bola verde de alguém ela magicamente ficava vermelha ao entrar em contato com as outras bolinhas opacas e contagiosas demais.
Em uma vila nada hospitaleira, onde as pessoas gostavam de ser particularmente cruéis, vivia uma garotinha. Ela tinha grandes olhos que eram tão escuros quanto o seu cabelo encaracolado, um nariz rechonchudo, assim como bochechas grandes e rosadas que adornavam o seu não-sorriso. Um dia a garotinha que agora mal falava, mal sorria e mal saia decidiu que não colecionaria mais as bolas vermelhas, mas quanto mais bolas vermelhas e opacas ela jogava fora mais bolas vermelhas e opacas apareciam dentro de seus potes.
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