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VI. Um Tremor no Mundo

 Fora uma segunda-feira cansativa onde Amanda não conseguiu descansar, pensando na reunião do dia seguinte.

Os preparativos para a feira estavam indo muito bem.

A comitiva da empresa já estava preparada, mas se comprometeram em ajudar Amanda na inclusão de Luke.

Como já era habitual, a CEO pernoitou no escritório. Banhou-se num hotel e, cedo, estava pronta para a reunião.

De volta ao edifício, organizou uma boa recepção, esperando que o enviado Nazari fosse alguém acostumado a lidar com viagens ao exterior.

Por volta das sete, Mariana lhe notificou:

Senhora, seu convidado Nazari chegou...

A voz de Mariana estava um pouco diferente, apreensiva; mas Amanda não a indagou. Apenas seguiu à recepção para ser quem receberia e guiaria o convidado à sala de reunião.

O homem era alto e magro, tinha uma barba longa bem cuidada e cabelos escuros levemente ondulados até os ombros. Ele tinha postura ereta. Não abdicou das vestes típicas de casa, usava um chapéu redondo branco e longo manto escuro.

Amanda engoliu seco. Após um suspiro, abriu um modesto sorriso e se aproximou. Cumprimentou o homem com toda a tradicionalidade que anos de experiência lhe deram. Manteve o silêncio, convidando-o acompanhá-la apenas com um gesto.

O homem ficou agradado com a recepção, apesar do óbvio desconforto por lidar com moças despidas do hijab.

Na sala de reunião, Amanda finalmente falou:

— Um bom dia, senhor. Sou Amanda Franco da Silva, atual CEO da Franco & Silva Exportadora. Filha do fundador e maior acionista desse pequeno império da indústria halal.

Salaam Aleikum. — O homem a cumprimentou. — Sou Farhad bin Muhammad Nazari; segundo filho do homem com quem lidam há alguns anos e atual responsável pelo grupo.

A moça engoliu novamente seco e o coração em seu peito acelerou, mas ela se conteve, mantendo o sorriso no rosto.

— Posso lhe servir algo para beber? É fortuito conhecer o herdeiro de Muhammad, grande homem... muito sábio — elogiou, seguindo às bebidas para aguardá-lo pedir.

— Aceito apenas água. Gosto da bajulação quanto a meu pai, porém, estamos aqui meramente para negócios. Soube que o teor da conversa é justamente a resolução iraniana sobre o consumo, compra e venda de carne halal...

— Sim! — Amanda serviu ambos e foi à mesa. — Fiquei preocupada com o quanto nossa relação seria afetada com a resolução e não é de meu interesse perdê-los, senhor.

O homem cumprimentou ao pegar sua água para beber.

— Com isso em mente, quero trabalhar numa resolução para seguir atendendo suas demandas sem maiores dificuldades em me adaptar num futuro próximo.

— É uma ótima iniciativa. Muito apreciada por mim! — Farhad assentiu. — Casada... Amanda?

— N-não.

Foi sucinta ao suspirar para esconder o desconforto.

— Entendo... kafir ou nega o hijab? — indagou, levantando uma sobrancelha. — Não que difira — riu com certo desdém.

— Não professo a fé islâmica, senhor. Contudo, posso afirmar que nossas fazendas são rigorosamente averiguadas constantemente para garantir qualidade-

— Temos uma relação de negócios antiga... — Ele a interrompeu. — Como presidente do grupo, imagino que não lhe será um problema atender algumas exigências.

Amanda silenciou, respirando fundo.

As mãos já suavam bastante e ocasionalmente parecia que o ar lhe faltaria. O nervosismo já atingira níveis muito perigosos, mas a lenta respiração era sua esperança.

— A independer da resolução da minha corte, gostaria de mais atenção com o cuidado com nossas carnes. Estamos falando da comida do meu povo!

— Quais seriam as exigências?

— Compreendendo que uma nação kafir terá suas dificuldades com o que é halal, mas quero que os maiores responsáveis pela empresa também o sejam.

Amanda suspirou. Muita coisa se passou em sua mente, mas ela optou por não perguntar imediatamente.

— Não quero exigir dos acionistas, mas dos responsáveis operacionais: CEO, CFO, COO, CMO, CIO, CTO...

— Claro... pode me ajudar, senhor? — Ela franziu o cenho.

— Não posso exigir uma conversão ao islamismo, mas não quero negociar com o extremo haram de uma solteira, sem filhos, que me ajuda a alimentar meu povo...

Contrariada, Amanda apenas assentiu com a cabeça.

— Isso não é obrigatório. Estamos dispostos a custear o necessário da quebra de contrato e procuraremos por alternativas dispostas a nos atender.

— P-precisaremos de... tempo, senhor.

— Imagino... Há, ao menos, um ano de carência. — Farhad assentiu. — A depender da resolução em casa, ainda queremos tomar essa medida para o cuidado dos nossos.

Amanda apenas assentiu, sorrindo amarelo.

— Se quiser, pode conhecer as dependências. — Foi sua saída. — Meu pai o fez com o seu e será uma honra assumir essa responsabilidade — convidou com seu melhor sorriso.

O semblante sisudo de Farhad sorriu e ele aceitou.

Amanda passeou com ele pelo edifício. O prédio lidava, em maioria, com burocracias. O passeio fez o efeito correto, afinal, Farhad pôde ver os islâmicos que trabalhavam ali.

Não eram tantos, mas não era um edifício homogêneo quanto aos seus trabalhadores, o que lhe fez dizer ao fim:

— Vejo que não terá muito trabalho!

— Já somos muito familiarizados com sua cultura e abraçamos parte de seu povo — sorriu. — Mesmo nosso CFO, herdeiro das fazendas de onde vem nossa carne, tem ascendência árabe... fiel servo de Allah.

Amin! — bem-disse. — São dependências formidáveis. Gostaria de visitar as fazendas num futuro próximo.

— Estamos sempre abertos para recebê-los e mostrá-los o quão bem executamos o nosso serviço, senhor. — Amanda deu um sorriso receptivo. — A casa também é sua.

— Se lhe faltarem opções, o que duvido muito — disse o iraniano, se aproximando para fitar os olhos da moça —, posso ser um bom marido — ofereceu.

— Encantador! — falou, desconfortável com o convite.

— Partirei. Salaam aleikum... — Ele a cumprimentou.

Amanda ainda o acompanhou até a saída. Não conseguiu tornar o ar mais suave, afinal, ficou muito incomodada; mas ainda manteve o belo sorriso no rosto.

Quando Farhad partiu, ela respirou fundo. Desesperou-se em silêncio enquanto seguia até o escritório de Luke.

Nem bateu à porta para entrar e foi direto ao divã, comum em todos os escritórios, para se jogar e pôr ambas as mãos no rosto — se sentindo completamente derrotada!

Luke apenas a observou entrando com aquele péssimo semblante. Deixou ela se deitar para levantar e buscar um copo d'água. Estendeu-lhe o copo ao se aproximar, dizendo:

— Beba... percebo que não foi uma boa conversa.

— Só ruim não define! — A moça suspirou.

— Quer conversar sobre?

Amanda apenas meneou a cabeça para negar. Intrigado, ele silenciou, mas não insistiu. Sentou ao chão na frente do divã para acompanhá-la e seguir seu trabalho.

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