Item 10: Drogas?
Escolhas.
Eu sempre fui boa em fazer questões de múltipla escolha nas provas, respondia as perguntas de forma rápida, mas quando o assunto se tratava da minha vida, eu nunca sabia tomar decisões.
Escolher é difícil, as diversas opções sempre me assustaram.
Escolher uma alternativa de matemática era fácil, fazer contas, trabalhar com os números não era difícil para mim, mas com as pessoas é outra história...
Mas naquele dia eu tinha certeza da minha escolha, eu tinha escolhido me divertir.
A tarde foi repleta de brilho e de cor, vivi um perfeito exemplo de "CARNAVAL DA BAHIA", o que eu sempre via em filmes e escutei falar, com direito as palavras "oxente" e "barril" e com muito acarajé.
Conhecer outra cultura foi incrível, mas me fez sentir falta de casa, do "égua", do açaí, mas principalmente da minha família.
A arquitetura da cidade era maravilhosa com as cores vibrantes nas casas. E eu desejei por um momento nunca ir embora de lá, sobretudo quando olhei para o lado e vi Sandiego, Luz e Lola pulando e dançando.
—O que você acha de irmos para outro lugar? —eu me arrepiei quando a loira se aproximou de mim e falou bem perto do meu ouvido devido à música alta e contagiante.
Eu apenas balancei a cabeça confirmando, com o coração ainda acelerado pela sua aproximação.
Ficamos mais um pouco ali, mas não demorou muito para Lola dizer que um amigo dela que morava na cidade estava fazendo uma pequena social em casa e a havia chamado. Ela convidou Luz e Sandi também, mas Luz disse que eles não iriam, pois eu e Lola deveríamos ficar a sós, depois ela me enviou uma piscadela e foi embora com a promessa de que nos veríamos em breve e eu torci para que aquilo fosse verdade.
—Você gostou? —Lola me perguntou com um grande sorriso.
—Eu amei! —exclamei segurando a sua mão.
Nós entramos no carro antigo que antes pertencia ao meu avô. Olhando mais de perto agora, o carro tinha a personalidade do meu avô e da minha avó. Afinal, o que combinaria mais com os dois do que um fusca amarelo com as poltronas de couro branco?
—Você quer escutar alguma música? —Lola perguntou assim que eu coloquei o cinto de segurança.
—Pode ser.
Lola mexeu no rádio e logo uma melodia calma se expandiu pelo carro. O som me encheu de alegria e me lembrou de Luz, Sandiego, Lola e Miguel...
Enquanto a canção tocava, eu só conseguia observar a paisagem da cidade iluminada. A minha atenção foi desviada quando Lola segurou a minha mão e começou a cantar.
Parei o carro em um sinal vermelho e olhei para ela. Ela me olhou tão intensamente que senti minhas bochechas ficarem vermelhas, o aperto em minha mão ficou mais forte e isso fez o meu coração acelerar.
—"Talvez não seja nessa vida ainda. Mas você ainda vai ser a minha vida. Então a gente vai fugir pro mar. Eu vou pedir pra namorar. Você vai me dizer que vai pensar. Mas no fim, vai beijar."
Mesmo que a música tenha sido escrita e cantada por um artista, naquele momento eu senti que a letra estava saindo apenas da boca de Lola para mim, como se ela tivesse escolhido aquelas palavras especialmente para mim.
O sinal do trânsito ficou verde, os carros atrás da gente começaram a buzinar, mas eu não me mexi e não liguei para nada ao meu redor. Os automóveis começaram a passar pelo fusca amarelo, mas eu não fiz nenhum movimento, eu só conseguia olhar para Lola, meus olhos não desviaram dos seus em nenhum momento.
— "Talvez não seja nessa vida ainda. Mas você ainda vai ser a minha vida. Sem ter mais mentiras pra me ver. Sem amor antigo pra esquecer. Sem os teus amigos pra esconder. Pode crer, que tudo vai dar certo." —Lola continuou cantando.
O sinal voltou ao vermelho e eu aproveitei para retirar o cinto do banco e me aproximar dela.
Na minha cabeça tudo estava em câmera lenta: os carros em volta parando do nosso lado, as pessoas passando na calçada e na faixa de pedestre e Lola cantando animada a música.
Me inclinei em sua direção, Lola arregalou os olhos e suas bochechas ficarem vermelhas quando percebeu o que eu iria fazer. Apoiei minha mão esquerda na sua coxa e a outra levei até o seu pescoço e depois a sua nuca. Aproximei o meu rosto do seu, nossas respirações se misturaram e colei delicadamente os nossos lábios, o beijo foi simples e nossas bocas ficaram grudadas durante um tempo antes de eu meu afastar.
Lola abriu um sorriso brilhante para mim e segurou a minha mão ainda na sua perna.
E naquele momento eu me senti especial...
~♧~
—Você está gostando da Bahia, Lia? —Salvador, amigo de Lola, me perguntou me oferecendo uma garrafa de cerveja.
Eu fiquei tímida em dizer que não bebia, então quando ele me estendeu a garrafa, eu só a peguei.
Ele era um rapaz negro, alto e musculoso, muito bonito, tinha um sotaque baiano que eu amei. Lola disse que ele estudava na universidade junto com ela.
Ele sentou do meu lado e continuou a conversa. Ele me falou sobre a universidade e perguntou que curso eu fazia, eu expliquei para ele que não havia passado em medicina e diferente do que eu pensava que aconteceria quando eu contasse para alguém, ele não me olhou com pena ou fez um comentário sobre isso como as pessoas costumavam fazer quando eu falava sobre a faculdade.
Tu sabes que tem que estudar muito, não é?
Tem certeza que quer fazer isso? É muito difícil.
Tá estudando, não é?
Estava cansada disso e gostei dele não seguir por esse caminho, na verdade ele me perguntou outra coisa.
—Você vai tentar de novo?
Aquela pergunta me pegou de surpresa e eu não sabia respondê-la. Eu ainda não havia pensando sobre isso.
—Oi, gente! —Lola sentou do meu lado no sofá, colocando o braço em volta dos meus ombros.
Quando chegamos, Lola me apresentou para todos, um grupo que consistia em apenas oito pessoas. Ela havia se afastado um pouco para conversar com alguns amigos e me deixou com Salvador.
—Algum problema com a bebida, Lia? —Lola perguntou perto do meu ouvido quando a campainha tocou e Sal saiu para atender.
Todos naquela festa estavam bebendo e se divertindo, fiquei envergonhada de estar de fora, o que me fez sentir ainda mais como uma adolescente diante daqueles adultos universitários. Eu gostaria de dizer para Lola que eu só havia bebido apenas uma vez. O problema é que ela provavelmente gostaria de ouvir essa história e eu teria que falar de Miguel. E eu não gostaria de falar de outra pessoa com quem eu tive um envolvimento para ela.
Enviei-lhe um sorriso forçado, balancei a cabeça em negação e tomei o primeiro gole.
A cerveja caiu rasgando a minha garganta e eu me aguentei para não fazer uma careta. Tomei mais um pouco com o seu olhar sobre mim, com medo do possível efeito do álcool.
—Eu vou comer alguma coisa. —falei para Lola e me levantei com pressa indo em direção à cozinha, mas não sem antes de vê a expressão confusa dela e o seu grito dizendo "Espera!".
Meu plano era jogar toda a cerveja dentro na pia, voltar para a sala e dizer que havia bebido tudo.
Cheguei na cozinha com passos rápidos e com tanta pressa que não prestei atenção no balcão no centro da pequena cozinha e bati o meu pé na quina dele.
—Aí! Que merda! —soltei com o susto e com a pequena dor que se instalava no meu pé calçado pelo meu all star vermelho vinho, que não combinava nem um pouco com a fantasia dourada de sol.
—Está tudo bem aí? —me espantei com o garoto que se levantou do outro lado do balcão com uma assadeira cheia de brownies.
Meu rosto esquentou diante do flagra, achei que estivesse sozinha ali.
Ele colocou o utensílio em cima do balcão e se abaixou para fechar a parte de baixo do fogão, onde fica o forno.
Ele voltou e ficou me olhando, esperando a resposta.
—Está! Eu só me bati. —respondi sem conseguir olhar em seus olhos.
—Aaahh... O que você está fazendo aqui? —ele perguntou enquanto colocava os brownies em uma bandeja de plástico.
—Eu estou com fome. —menti com a voz fina. Eu tinha que parar de fazer isso, toda vez que eu mentia a minha voz parecia que identificava isso e ficava mais aguda, o que a deixava estridente e irritante.
Olhei para o balcão cheio de comidas e bebidas.
—Legal. Bom, você chegou na hora certa. —ele me enviou um sorriso enorme e estendeu a bandeja para mim. —Eu acabei de fazer brownies, estão quentinhos, saídos do forno!
Estavam muitos cheirosos e o aroma contaminava todo o ambiente.
—Muito obrigada, mas eu não gosto muito de bolo e nem de chocolate. — contei com um sorriso torto.
Ele fez uma cara de decepcionado e triste.
—Vai! Come só um pouco. Tenho certeza que vai gostar. Você vai ser a primeira pessoa a provar dos meus dotes culinários. —ele me enviou um sorriso empolgado e me senti mal em lhe negar aquilo.
—Tá bom. —aceitei o seu pedido e peguei um brownie.
Assim que dei a primeira mordida, o bolo se desfez na minha boca e deixou um gosto maravilhoso, que me fez ter vontade de comer vários daquele.
Saiu um gemido da minha boca que não consegui controlar, um som de prazer de estar provando aquela comida.
—Isso está incrível! —exclamei comendo mais um pedaço em seguida.
—Eu disse que você ia gostar. —ele afirmou com um sorriso presunçoso no rosto e depois comeu um brownie. —Cara, como eu sou incrível!
—Você é mesmo. Isso está maravilhoso! O que você fez? —perguntei com o meu coração estranhamente batendo mais rápido.
Peguei mais um pedaço enquanto esperava a sua resposta e comi em duas mordidas.
—Só joguei um pozinho mágico. —ele riu da própria fala e continuou comendo.
Não entendi o que ele quis dizer, então apenas ignorei e bebi do líquido da garrafa em minha mão. A cerveja não parecia mais tão ruim, então continuei tomando enquanto comia.
Quando já estava no meu quarto pedaço, decidi que já era hora de voltar para sala. Peguei um guardanapo e coloquei mais um pedaço nele para levar para a sala.
—Bom, eu já estou indo. Obrigada pelos brownies! —agradeci me dirigindo a saída da cozinha. —Aaahh... Eu já ia esquecendo. —me virei para falar com ele e com esse movimento fiquei tonta. Me segurei no balcão para ter equilíbrio. —Eu sou a Lia. —me apresentei com a sensação de leveza.
—Prazer, Lia. Eu sou o Davi. —o rapaz com os olhos e cabelos castanhos respondeu com a cabeça apoiada em uma das mãos. Ele parecia também se sentir leve.
Ele me enviou um sorriso bobo e eu não sabia se ele estava me vendo ou não, pois seus olhos piscavam lentamente.
Voltei para a sala, onde estavam no sofá conversando Lola e Salvador.
—Voltei! —exclamei sentando no meio deles.
—Olha só! Parece que temos alguém aqui animada. —Salvador riu da minha empolgação repentina.
—Você demorou. —Lola disse enquanto mexia em uma mecha do meu cabelo.
Eu já ia respondê-la de que havia conhecido Davi, mas Sal começou a falar.
—Sim, Lia. Voltando ao assunto. Você vai tentar de novo o vestibular para medicina? —Sal me olhou intensamente e senti a atenção de Lola queimando em minha pele.
—Eu não sei. —respondi com sinceridade.
—Mas medicina não é o seu sonho? E não devemos lutar pelos nossos sonhos? —Sal me perguntou com uma expressão confusa por causa da minha resposta.
—Na verdade, eu não sei se é realmente o meu sonho. Eu nunca pensei muito bem sobre isso. —estranhei que eu estivesse sendo tão sincera sobre aquele assunto.
—Então, de onde surgiu essa ideia de fazer medicina? —Lola se colocou na conversa.
—Minha família toda é da área da saúde, minha mãe, meus avós, meus tios e primos, todo mundo. Então desde pequena eu sabia que também seguiria esse caminho, sempre foi essa profissão. Acho que meu caminho já estava traçado desde o dia que eu nasci, assim como o das minhas irmãs está ou dos meus primos pequenos. —expliquei para eles. Me senti sem filtro e continuei comendo o bolo.
Bebi mais um pouco da cerveja tentando disfarçar o rubor em meu rosto e me arrependendo de ter sido tão sincera, mas eu não estava conseguindo me controlar.
—Sabe, Lia, se não for medicina que você queira fazer, está tudo bem. —Salvador colocou a sua mão sobre a minha e me enviou um sorriso acolhedor.
—É verdade. —Lola se remexeu do meu lado. —O que você quer fazer, Lia? —ela me olhou com empolgação.
—Eu... —comecei, mas travei quando não soube a resposta.
Não saber as respostas para as perguntas que me faziam me deixava inquieta, eu sempre soube responder todas, sempre fui boa nos testes da escola e nos questionários que os professores passavam, mas eu não estava mais no colégio, isso era a vida real. E qualquer escolha que eu fizesse iria interferir em tudo.
—Melhorando a minha pergunta. —Lola instigou quando viu a minha hesitação. — Qual é o seu sonho, Lia?
Aquela pergunta era difícil.
Qual era o meu sonho?
Ninguém nunca me fez essa pergunta. Era estranho...
As pessoas tinham sonhos?
Essa palavras sonho me parecia algo tão distante...
Aos cinco anos de idade meu sonho era ser dançarina e meus pais me colocaram no balé. Saí da dança quando tinha quinze anos, sentia que aquilo não era mais para mim, odiava ter que viver naquele mundo competitivo e cheio de pressão. Sentia-me mal todos os dias comigo mesma e com a minha aparência, as garotas do balé nunca foram muito legais comigo e minha professora sempre criticava o meu corpo por não ser muito magro.
Quando eu fiz oito anos, meu sonho era ser pianista, pedi ao meu pai que me matriculasse em uma escola para aprender a tocar piano, mas ele se recusou e disse que só faria isso se antes eu fizesse aulas de violão.
Com doze anos meu sonho era tocar violão e guitarra e meu pai me matriculou em uma escola de música, foi uma das melhoras épocas da minha vida. Descobri que levava jeito para tocar esses instrumentos e estava sempre me apresentando nos recitais da escola.
Quando fiz treze anos, meu sonho era ser cantora e meus pais logo me matricularam nas aulas de canto. Era divertido, mas eu morria de vergonha quando subia no palco e preferi ficar somente nos solos de guitarra.
Com catorze anos meu sonho era fazer parte do teatro. Então entrei em um grupo no colégio e escrevi uma peça. Não foi lá grandes coisas, mas foi legal e engraçado. A plateia pareceu ter gostado.
Quando eu fiz quinze anos, meu sonho era ser compositora, comecei a escrever músicas sobre como eu me sentia e apresentava elas na escola de música. Meus pais ficaram orgulhosos e até falaram de irmos ao um estúdio de gravação, mas o peso do vestibular e do ensino médio ficaram maiores e eu deixei todos esses sonhos para trás...
Aos dezesseis anos descobri meu amor pela escrita e mesmo que eu me obrigasse todos os dias a focar apenas em medicina, quando a noite chegava e todos iam dormir, eu abria o computador e começava a escrever e toda a imaginação que eu mantinha presa dentro de mim era libertada. Eu amava fazer isso...
—Eu acho... —hesitei com medo de dizer aquelas palavras em voz alta. —Meu sonho é ser escritora. —declarei com segurança na voz. —Eu quero fazer jornalismo. —ri com aquela confissão, meus pais me matariam se soubessem disso. Nunca havia falado isso em voz alta, parecia engraçado para mim.
Lola arregalou os olhos, surpresa com a minha resposta e com a minha reação.
—É sério, Lia? —Ela perguntou com um sorriso teimando em aparecer em seu rosto, mas vi a confusão no seu olhar diante do meu ataque de riso.
Balancei a cabeça confirmando.
—Isso é muito legal! —ela exclamou me abraçando de lado.
—Você acha? —perguntei desconfiada com o fato de alguém apoiar o meu sonho.
—Claro que sim! Você pode fazer cursos de escrita criativa. Pode já começar a escrever um livro! —ela disse empolgada.
—E publicar depois. Você pode escrever artigos para revistas. —Sal disse com um sorriso brilhante. —Viu só! Você já sabe o que quer. Agora só falta correr atrás. —ele me enviou uma piscadela.
Sorri tímida diante da animação dos dois com o meu futuro.
—Meus pais não deixariam. —afirmei com um balanço de cabeça enquanto tomava mais um gole da cerveja.
— Seus pais não precisam deixar, Lia. —Lola disse com uma leve irritação na voz.
—É claro que precisam. Eles investiram bastante em mim, pagaram cursos nas férias, pagaram cursinhos, a escola, professores de redação e de matemática, materiais caros. Tudo para que eu chegasse ao objetivo final, que era conseguir passar em medicina. E agora eu vou chegar para eles e dizer "Olha aqui, pai e mãe, na verdade, eu nunca quis fazer medicina, esse era o sonho de vocês para mim, não o meu". Eu vou decepcionar toda a minha família. Eu já tenho o meu futuro pronto e garantido, Lola. Eu só preciso seguir o roteiro. Eu prefiro ser infeliz e rica do que feliz e não ter uma garantia. —contei sem medo de ser escutada, geralmente tinha medo até de fala sobre isso quando os meus pais não estavam.
—Você não quer ser feliz, Lia? —Sal me perguntou com a voz doce e um olhar de acolhimento.
—O tempo todo. —confessei com o olhar distante. —Mas eu estou feliz agora, fazer essa viagem me deixou feliz. —respondi segurando a mão de Lola, que sorriu com o meu gesto e entrelaçou os nossos dedos.
Lola se espantou quando eu me inclinei e lhe dei um leve e rápido beijo, me surpreendi também comigo, não sabia de onde tinha vindo aquela coragem, mas Lola pareceu gostar.
Continuamos a conversa, falamos sobre coisas bobas e do dia a dia, mas depois de um tempo, comecei a ficar com fome.
Me surpreendi quando olhei para a minha mão e vi a garrafa de cerveja vazia, não havia percebido que tinha bebido tudo. A conversa estava tão boa que nem me toquei que continuei bebendo daquele líquido. Mas agora eu estava com um pouco de dor de cabeça.
Dei um bocejo que chamou a atenção de Lola e Salvador.
—Você já está com sono? —a loira deu uma pequena risada.
—Eu acho que eu pareço com o meu pai. —bocejei de novo, mas dessa vez mais alto, enquanto olhava para cima, o teto daquela casa parecia bem interessante. –Quando ele bebe, ele fica com sono.
Sal achou graça.
—Tá bom. Acho que já chega de álcool para você. —Lola retirou a garrafa da minha mão e fez uma cara de surpresa quando viu ela vazia. —Nossa. Você tomou tudo!
—Lia, você está bem? Parece meio aérea. —Sal tocou no meu rosto me analisando, parecia preocupado. —Você só tomou uma garrafa de cerveja. —ele pensou alto. —Talvez a sua resistência ao álcool seja pequena.—concluiu.
—Eu estou bem!—falei alto tentando parecer confiante, mas acho que só soou como um grito. —Acho que eu quero mais uma cerveja.—falei me levantando, mas antes que eu ficasse totalmente em pé, Lola me puxou para baixo, me fazendo sentar novamente.
—Égua! —exclamei com o susto. Acho que foi um pouco alto demais, pois algumas pessoas da casa olharam para mim.
—Você me chamou de quê? —Lola me lançou um olhar severo e a sua voz era dura. Ela até havia soltado a mão do meu braço e afastou um pouco o seu corpo do meu.
—Eu não te chamei de nada, bobinha. — falei enquanto tocava o seu nariz com a ponta do meu dedo indicador.
Ri com a sua ignorância, um riso que se intensificou quando vi a sua expressão fechar com a minha resposta.
—"Égua" é um termo que é usado no meu estado, amor. Não estava me referindo a você. —expliquei enquanto me controlava para não rir.
Vi que o rosto de Lola suavizou e um rubor cresceu nas suas bochechas, acho que foi pela palavra amor, pelo menos eu esperava que fosse.
—E o que significa? —ela perguntou mais calma, mas com o semblante ainda desconfiado.
Coloquei a mão no rosto e olhei para cima pensando, fiz cara de pensativa. Eu usava "Égua" para tudo, não tinha um significado específico para mim.
Estava pensando em uma resposta, mas a cortina do outro lado da sala que cobria a janela me chamou atenção. Ela era horrível. Quem compra uma cortina rosa pink para decorar a casa? Eu precisava avisar Sal que aquilo não era bom para os olhos. Não combinava com a tinta verde da casa.
—Lia! —Lola me sacudiu.
—O que foi? —perguntei assustada.
—Eu estou te chamando há um tempão, mas você só ficou aí parada olhando não sei pra onde. —ela colocou as mãos na cintura e fez uma cara de chateada, pose que fez eu me lembrar da minha mãe.
—Eu estava olhando para a cortina. —apontei para o pano horroroso na minha frente.
—Lia, você está bem? —Sal se aproximou mais de mim preocupado. –Você parece meio brisada.
Aquela palavra era interessante...
—Brisada? —repeti. Soava estranho para mim. —Brisada. —disse mais uma vez, mas agora com a voz grossa, tentando imitar a voz de Sal. —Brisada. —repeti com a voz aguda que pareceu de uma criança. —Eu não sei o que essa palavra significa. —concluí. —É tipo brisa? —olhei para Salvador e comecei a fazer uma dancinha, tentando imitar o movimento dos ventos. Eu fiquei balançando o meu corpo e as minhas mãos para o lado e para o outro.
—Lia, para! —Lola segurou os meus braços e desceu eles até o meu colo, depois prendeu os meus ombros entre as suas mãos, me fazendo ficar parada.
—Brisada é quando você usa drogas ou algo do tipo e fica meio do jeito que você tá. —Sal explicou me observando.
—Eu não uso drogas. Não pode. —eu falei sussurrando para ele, com medo que os meus pais escutassem.
—Lia, alguma coisa aconteceu. Você não é assim. —Lola se remexeu do meu lado desconfortável.
Eu já ia responder aquela afirmação, mas fui interrompida com o som de batidas na porta.
—Nossa. Quem será a essa hora? —Sal olhou em volta da sala contando a quantidade de pessoas.
Olhei para o relógio na parede e vi que marcava quase 23h, estava relativamente tarde para alguém chegar ali.
—Está todo mundo aqui. —Sal virou confuso para Lola. —Será que eu esqueci que convidei mais alguém?
Mais algumas batidas na porta soaram, mas dessa vez mais forte, parecia que a pessoa do outro lado já estava ficando sem paciência.
Sal se levantou para atender, mas eu o puxei em um movimento rápido para baixo que o fez cair no sofá.
—Você não pode ir? E se for os meus pais? Eles podem ter ouvido você dizer que eu estava brisada. —sussurrei assustada.
—Lia, não são os seus pais. Relaxa, amor. —Lola me puxou para um abraço me acalmando.
—O seu cheiro é muito bom. —falei aproximando mais o meu nariz do seu pescoço.
Ela riu disso. Me afastei dela para olhar o seu rosto corado e segurei a sua mão.
Sal abriu a porta e quando a figura do outro lado se materializou na minha frente, eu tive certeza de que eu estava brisada.
Soltei uma gargalhada que fez todos da sala se virarem para mim, eu não conseguia me controlar, só sabia rir e rir.
—Salvador, eu tenho certeza que eu estou drogada. Só usando drogas para alucinar desse jeito. Impossível o Miguel estar aqui. —tentei falar entre os risos.
—Drogada? Como assim? —a voz grossa de Miguel me fez paralisar.
Ele nem esperou ser convidado para entrar, apenas deu um leve empurrão em Sal para tirá-lo do meio do caminho e veio preocupado em minha direção.
O tatuado se abaixou, ficando na mesma altura que eu, que me encontrava sentada no sofá sem acreditar ainda que ele estava ali.
—Lia, o que houve? —Miguel colocou uma mão em cada lado do meu rosto e me analisou atentamente.
Meu coração acelerou com o seu toque em mim, a sua voz era música para os meus ouvidos, uma canção que eu queria nunca mais parar de escutar.
Fiquei paralisada diante da sua presença. Não consegui dizer nada, apenas fiquei olhando para o seu rosto, que parecia ainda mais bonito desde a última vez que nós nos vimos.
Nossos olhares se encontraram e eu fiquei hipnotizada pelos seus olhos verdes. Eu amava os seus olhos...
—Lia, fala comigo. —ele pediu levando uma das mãos para o meu cabelo e fazendo um carinho.
Senti Lola se remexer do meu lado, vi pela visão periférica que ela parecia tensa. O seu aperto em minha mão aumentou.
Quando eu não disse nada, Lola interferiu.
—Nós não sabemos o que houve. Lia estava aqui com a gente e de repente ela ficou estranha. —ela explicou.
E pela primeira vez desde que chegou, Miguel olhou para a loira, vi que a sua atenção correu para as nossas mãos entrelaçadas, ele levantou uma sobrancelha e demorou uns segundos ali antes de voltar o olhar para Lola. O badboy era intimidante, principalmente com a sua cara séria, mas a garota do meu lado não fugiu do seu olhar, ela também parecia ter um grau de seriedade no rosto.
Os dois se encararam, estavam se analisando, suas expressões não eram nada boas e eu sabia que não podia esperar uma amizade vinda dali.
—Por que vocês estão se olhando desse jeito? — perguntei rindo alternando o meu olhar entre eles.
Miguel e Lola vivaram para mim surpresos por eu ter notado e suavizaram suas expressões quando ouviram o som da minha barriga roncando.
—Eu estou com fome. —falei o óbvio.
Miguel riu, mas sua risada logo parou quando eu levantei a minha mão e comecei a afagar o seu cabelo.
Vi que Salvador enviou um olhar estranho para Lola.
Eu já ia perguntar o que estava acontecendo, mas vi Davi passar pela sala.
—Davi! —chamei animada ele, que veio em nossa direção com um sorriso. —Você tem mais daquele brownie? Eu estou com fome. —me encostei no sofá, ficando inclinada com as pernas esticadas.
Miguel sentou do meu lado e segurou a minha mão desocupada.
—Aaaww... —Davi fez cara de culpado e coçou a nuca, o que não passou despercebido por Sal.
—Que brownie, Davi? —Salvador perguntou com um olhar severo.
—Eu fiz uns brownies na sua cozinha. —Davi respondeu envergonhado.
Lola soltou a minha mão e ajeitou a sua postura.
—Aí não, Davi. Você não fez isso!—ela se levantou chateada.
—Ele não fez o que exatamente? —Miguel colocou os cotovelos nas pernas e se inclinou, enviando para Davi o seu olhar "matador" eu diria, nunca vi ele olhar assim apara alguém.
—Você comeu o bolo, Lia? —Lola ignorou Miguel. Balancei a cabeça confirmando. —A Lia provavelmente comeu brownies de maconha. —ela explicou receosa.
—O quê? —Miguel levantou em um pulo e foi para cima de Davi, mas foi impedido por Sal. —Você drogou ela?
—Cara, foi mal. Eu moro aqui com o Sal e ás vezes uso a cozinha dele para fazer bolos de chocolate, alguns são de maconha, eu faço para mim e para os meus amigos e quando o Salvador dá festas como hoje. A Lia apareceu na cozinha e eu ofereci para ela. Eu deveria ter avisado que eram brownies de maconha. Isso foi irresponsável da minha parte. —Davi se explicou fugindo do olhar de Miguel. —Desculpe, Lia. —pediu com sinceridade.
O lindo rapaz de olhos verdes ficou o olhando com uma cara de indignado.
—Eu vou bater em você. —Miguel declarou simplesmente.
Porém, antes que isso realmente acontecesse, segurei a mão dele, o puxando levemente, o que o fez parar e deu a oportunidade para Davi sair correndo para fora da sala.
—Não precisa disso. Eu só quero ir dormir e comer. —falei tentando acalmá-lo.
—Tá bom, linda. Vou te levar para a minha casa, lá você vai ter uma cama quentinha e muita comida. —Miguel fez um carinho na minha cabeça, que eu encostei na sua barriga definida, mas coberta pelo tecido branco e pela jaqueta de couro preta.
—Você não vai não. —Lola ficou de frente para ele. —Lia está drogada e provavelmente bêbada. E você...
—Você bebeu? —Miguel interrompeu Lola olhando para mim.
—Sim. Por quê? Algum problema? —ela respondeu por mim cruzando os braços.
—Tem sim. A Lia não bebe, ela não gosta disso. —Miguel retrucou de modo rude e colocou o braço em volta dos meus ombros.
—Você não bebe? —Lola me olhou espantada.
—Pois é. –sorri torto. —Eu fiquei com vergonha de admitir isso.
—Era só você ter me dito, Lia. Desculpe por trazer você para essa festa. —ela disse triste com a cabeça baixa.
—Está tudo bem. Não precisa se desculpar. —segurei a sua mão. —Acho que vou acrescentar na minha lista o item "drogas". —Miguel me enviou um olhar chateado. — Eu pensei em colocar ele no início, depois que assisti um filme de adolescentes, mas desisti. Mas agora que eu provei dessa substância ilícita. —murmurei, atenta com a possibilidade da minha mãe surgir de algum lugar. —Vou colocar na lista. —expliquei alto com a voz estranha, ela parecia meio embolada.
Ninguém disse nada e ficou um silêncio constrangedor, de um lado estava Miguel com o braço sobre os meus ombros me olhando intensamente e do outro, Lola segurando a minha mão.
—Então, vamos? —Miguel quebrou o silêncio, me ajudou a levantar e começou a caminhar para a porta.
—De jeito nenhum! —Lola exclamou aumentando o aperto em minha mão. —Eu não te conheço e você está levando a Lia com você. Eu não posso deixar isso acontecer, ela não está bem.
—Eu não sou um estranho. —Miguel não foi nem um pouco amigável ao retrucar.
—Mas para mim você é. —Lola sustentou o olhar dele.
Ele riu debochado.
—Aposto que já convivi mais com a Lia do que você. —Miguel segurou a minha mão e nos guiou para a saída, mas Lola me puxou de volta.
O badboy não pareceu gostar da atitude da loira e segurou mais firme nos meus dedos entrelaçados nos seus, o que fez ela se aproximar mais de mim.
Dei um pequeno grito.
—Dá para vocês me soltarem? Eu não sou uma boneca de pano! —gritei irritada com a atitude dos dois. Soltei as mãos deles e cruzei os braços.
Eles murmuraram um pedido de desculpa.
—Podemos ir para a sua casa, Lola? —perguntei. —Nós três vamos. —falei firme.
Ela confirmou com um aceno de cabeça, mas parecia receosa com a ideia.
Nenhum dos dois se moveu do lugar, a tensão ficou maior na sala, vi que todos os olhares estavam sobre a gente. Parecia que estávamos em um palco encenando e as pessoas na casa de Sal eram os espectadores do espetáculo. Tenho certeza de que se a maconha não estive no meu organismo, eu provavelmente teria saído correndo daqui.
—Quem é ele, Lia? —Lola me enviou um olhar que eu não soube decifrar.
—Sou o namorado dela. —Miguel respondeu.
O que deixou eu, Lola e todos da sala surpresos. Consegui escutar o "OU" da plateia que nos assistia.
Lola me olhou magoada, ela havia mesmo acreditado nele? Se eu tivesse um namorado, teria contado para ela.
—Quem é ela, Lia? —Miguel perguntou sério.
— Sou a namorada dela. — Lola disse firme e sustentando o olhar dele.
— Eita! — consegui escutar alguém falando do pequeno público.
Todos estavam olhando para mim, esperando que eu dissesse algo.
— Eles estão exagerando, galera. — me inclinei para a plateia. — Nós só ficamos algumas vezes. Eles não são os meus namorados. — tentei amenizar a situação, mas pelas expressões de Miguel e Lola, não havia funcionado. — Bom, está tudo legal. Muito obrigada por tudo, Salvador. E por favor, troca aquela cortina. —apontei para o pano. —Foi ótimo! Au revoir! — levantei a mão dando tchau. Me virei para a porta. — Eu não sei por quê disse isso.
Antes de ir embora puxei Miguel e Lola pela mão e saímos da casa de Sal, entramos em uma rua iluminada e com casas coloridas.
Quando paramos em frente ao meu carro, ficamos nos encarando. Eu não sabia o que dizer para eles.
— Eu estou de moto. Vocês vão no carro e eu sigo vocês. — Miguel disse antes de se afastar de nós duas.
Eu o observei caminhando, analisei suas costas largas e seu andar confiante, fiquei hipnotizada com a sua mão passando pelo seu cabelo macio.
Paralisei quando ele parou em frente a sua moto e como se sentisse o meu olhar, virou para mim.
Eu sabia que ele estava com dúvidas, perguntas que eu não sei se saberia responder. Eu só queria não tocar no assunto do que aconteceu enquanto estávamos separados e talvez continuar do ponto em que paramos.
Ele mordeu o lábio, estava pensativo. Naquele momento eu só tive vontade de beijá-lo.
Mas notei pela visão periférica que Lola me analisava com cuidado, virei o meu rosto para ela.
Ela estava tão bonita sob luz da lua, seu cabelo longo, cacheado e loiro brilhava. Eu também queria beijá-la.
Por alguns segundos desejei que Miguel não tivesse aparecido na casa de Salvador e depois desejei que eu nunca tivesse saído da casa dele.
No meio daquela rua silenciosa, fiquei com medo de que eles pudessem escutar as batidas do meu coração.
No meio daquela rua silenciosa, de um lado estava Miguel e do outro, Lola.
No meio daquela rua silenciosa, eu precisava fazer algo do qual não era muito boa.
No meio daqueles dois, eu precisava tomar uma decisão...
~♧~
Música do capítulo: Outra vida – Armandinho.
O que acharam desse capítulo? Tenso esse último momento, não é mesmo? Sobre que decisão vocês acham que a Lia está falando? Qual será a decisão dela?
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