17
Kelly encheu a banheira decidida a relaxar. Ela tinha passado a tarde toda tentando entender o álbum de fotos que tinha achado no sótão, álbum esse que ela podia dizer que era bizarro. Talvez devesse vasculhar aquele sótão em busca de mais alguma coisa. Iria convidar Adilson para fazer isso mais tarde.
A ideia de que seus pais estiveram participando de algum tipo de ritual satânico que envolvia orgia sexual a deixava pasmada. Ela não se lembrava de absolutamente nada que pudesse lançar luz àquelas dúvidas. Agora sabia que a estranha mulher da padaria estava, de alguma forma, envolvida. Ao menos conhecia seus pais diretamente. Ela aparecia naquelas fotos. Mas também não conseguia se lembrar da presença dela ali, naquela casa.
De repente ela estremeceu, percebeu que o mistério envolvendo o assassinato de seus pais, podia ser escabroso, terrível.
A coisa toda formava um turbilhão em sua mente, a deixava perturbada e de certa forma em pânico.
Talvez seus pais estivessem de fato envolvidos naquela coisa de orgia satânica, talvez algum tipo de seita. Mas não havia como saber se aquilo estava diretamente ligado ao terrível assassinato deles na noite de halloween de 1983, há 18 anos atrás. No fundo ela sabia que sim, e aquilo era apavorante, terrível. Era o tipo de coisa que podia acontecer. Havia assassinatos bizarros naquelas seitas, coisas que era difícil acreditar que existiam.
Kelly precisava relaxar, então resolveu encher a banheira e pelo menos tentar. Ela nunca tinha usado aquela banheira antes. Era uma hidromassagem, mas isso já não funcionava mais, mas a água era quente o que já estava de bom tamanho.
A sensação da água quente, quando ela entrou foi reconfortante. Ela suspirou, fechou os olhos e tentou relaxar. Mas a casa tinha sons, e aqueles sons se assemelhavam a vozes. As vozes dos fantasmas do passado que ainda assombravam aquela casa, e, acima de tudo, assombravam sua mente. Alguém podia ser assombrado, ela pensava. Ela mesma sentir-se uma pessoa assombrada, cheia de medos e inseguranças ligadas ao seu tenebroso passado.
" Quem eram eles? Quem eram as pessoas naquele álbum. "
Ela visualizou cada rosto que vira nas fotos. Havia um outro rosto, mas agora já não se lembrava. Por algum motivo pensou no delegado que eles tinham visto quando chegaram na cidade. Ele também com certeza sabia de alguma coisa. Lembrava-se como o homem tinha ficado branco ao ouvir o nome da rua. Como se tivesse visto um fantasma. A reação de quem sabia e guardava um segredo há muito tempo, mais especificamente há 18 anos.
" Quem são eles? O que eles estão fazendo? "
Uma orgia. Um culto satânico. Algum tipo de seita.
Kelly sentiu um arrepio estranho.
Um domingo, um piquenique; sexo, uma orgia satânica, alguma coisa que era realizada ali. Naquela casa? Teriam sido aquelas fotos tiradas ali?
" Não. Aqui não. "
" Que lugar era aquele? Um porão? Um sótão."
"Tenho que vasculhar aquele sótão."
Havia alguma coisa. Alguma verdade oculta, e era terrível. Ela sabia, mas a coisa estava encoberta pela escuridão. Ela não conseguia ver. Parte de si não queria ver. Era uma verdade terrível demais e ela precisava ser poupada.
Ver a verdade. Ela estava li para ver. Mas agora não sabia se realmente queria. E se fosse terrível demais? Coisas terríveis demais precisavam ficar ocultadas, porque a mente não era capaz de suportar quando a verdade era mais terrível que a perda da razão. Quando era assim, a mente entrava em modo de defesa e todos os pensamentos eram jogados na escuridão.
Kelly tentou relaxar. Ficou ali de olhos fechados tentando focar no passado, ouvindo os diversos sons que a casa produzia. Era como se aquela casa estivesse viva. Nunca tinha morrido de fato, apenas permanecera adormecida, e agora despertava, dezoito anos depois, porque a garotinha estava de volta, a sobrevivente do massacre estava de volta ao lar, de volta ao pesadelo.
A palavra pesadelo relampejou em sua mente, acendeu como um letreiro luminoso.
Ruídos...
(Vozes).
A chuva caindo...
Tempestade. O terror que se escondia na tempestade.
O som trepidante dos trovões. Os relâmpagos clareavam de segundo a segundo o que estava oculto no meio da escuridão. As sombras fugiam como fantasmas assustados. A floresta ao redor parecia a reunião de seres esqueléticos tenebrosos. Seres que estavam mortos, e cujas mentes haviam apodrecido.
Sangue. Havia o sangue que pingava do machado. A cabeça de seu pai estava caída no barro, aos seus pés. Os olhos abertos a fitavam com aquele ar de pânico congelado no olhar. Um sorriso macabro estampado nos lábios. E havia o cheiro, o cheiro de carne podre. O cheiro da morte.
Seu pai estava vivo. Vivo apesar de morto, e a morte o enlouquecera. A morte fazia isso, era capaz de enlouquecer, era capaz de gerar monstros.
- Fuja Kelly. Tem que fugir . O demônio está aqui. Ele habita as paredes! ESTÁ NAS PAREDES!!
Ela olhava para trás e via sangue escorrendo na parede da sala, formando letras que formava uma palavra, e a palavra era um nome.
Kelly arregalou os olhos porque sabia que nome era aquele. Ela conhecia...
Kelly abriu os olhos, não conseguindo evitar que sua boca emitisse um grito abafado. Seu coração estava palpitando. Ela quase engoliu água. Por alguns segundos estivera dormindo. Será? De certa forma não tinha noção do que era real ou imaginário, tudo se misturava, parecia irreal demais. Um pesadelo.
Kelly olhou para a cortina que ocultava o box do banheiro e seus olhos saltaram da órbita. Um medo gélido se apossou dela.
Havia alguém lá, parado, inerte, atrás da cortina.
Ela abriu a boca para gritar e o grito não veio.
Saiu da banheira nua. Seu corpo tremia, o medo fazia seu corpo todo se arrepiar. Estendeu a mão, segurou a cortina de plástico e a abriu.
Nada. O box estava vazio.
Kelly respirou aliviada, mas então sentiu-se observada, a sensação de que não era a única pessoa naquele banheiro se apossava dela de maneira plena.
Olhou para a porta e viu pegadas no chão. Alguém saira da banheira caminhando até o quarto e deixando marcas de pés molhados no chão.
O coerente era pensar que ela mesma tinha feito aquilo, afinal era a única pessoa que estava naquela banheira. No entanto não se lembrava disso.
O medo voltou com força, todo seu corpo estremecia, as pernas estavam bambas e ela sentia que ia cair.
O medo não a impediu de seguir as pegadas. Elas iam até o quarto e acabavam no guarda roupas à esquerda.
Havia alguém lá, Kelly podia sentir o olhar fixado nela. Quase que podia ouvir a respiração.
Então a porta do guarda roupas se abriu lentamente, as dobradiças rangeram, e em meio ao silêncio sepulcral que desabava sobre a casa aquele som parecia ensurdecedor.
Kelly, dominada pelo pavor, não conseguia se mover. Seus olhos contemplavam a cena com terror. Ela começou a chorar e a tremer.
Uma mão envolta em uma luva preta pôde ser vista segurando a porta do guarda roupas.
Então Kelly abriu a boca e gritou.
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