Verdadeiramente Presente
Caminho até a sala de visitas da clínica, meu coração batendo um pouco mais rápido. Não sei por que estou nervoso, já fiz esse trajeto tantas vezes que deveria estar acostumado. Mas, mesmo depois de todas as visitas, sempre há aquela ponta de incerteza, de não saber o que esperar ao cruzar aquela porta.
Seguro a maçaneta por um momento, respirando fundo antes de abrir e entrar. O ambiente é o mesmo de sempre, mas hoje... algo está diferente. Meus olhos encontram Rindou, sentado na cadeira do outro lado da mesa, e noto de imediato que seu olhar mudou. Há uma leveza ali que eu não via há meses. Ele parece... menos perdido.
— Oi, Rindou. — cumprimento, tentando soar o mais natural possível enquanto me sento à sua frente. Minha mente já está em alerta, observando cada detalhe, cada expressão dele, procurando por sinais do estado em que ele está hoje.
— Oi, Angry. — ele responde, e sua voz soa... normal. Não tem aquele tom distante, quase ausente, com o qual me acostumei nas últimas visitas.
Minhas sobrancelhas se erguem um pouco em surpresa.
— Você... parece diferente hoje. — comento, sem conseguir conter a curiosidade. Ele me olha por um momento, como se ponderasse o que vai dizer, e então dá um leve sorriso, ainda que tímido.
— Eu... acho que estou me sentindo um pouco melhor depois dos médicos terem mudado e ajustado as medicações. — ele confessa, seu olhar desviando para o chão por um segundo antes de voltar para mim. — Ainda não sei como explicar, mas as coisas parecem mais... claras.
Meu coração se aquece um pouco ao ouvir isso.
— Sério? — pergunto, me inclinando levemente para frente, tentando captar cada nuance do que ele está dizendo. — Isso é bom, Rindou. De verdade.
Ele dá de ombros, um gesto simples, mas que carrega um significado enorme.
— Acho que só... cansei de ficar preso no mesmo lugar, sabe? — ele respira fundo, parecendo buscar palavras. — A conversa com Ran me fez pensar... e na terapia, eu consegui falar sobre algumas coisas que estavam me sufocando. Talvez isso tenha ajudado.
Minha mente gira com tudo o que ele está dizendo. É estranho ouvi-lo falar assim, com um tom que lembra o Rindou que conheci antes de tudo isso acontecer.
— Fico feliz de te ver assim. — digo, sincero. — Você nem imagina o quanto.
Rindou me observa por um momento, seus olhos analisando os meus. Então, ele sorri um pouco mais abertamente, e há algo ali, um brilho que eu pensei ter desaparecido.
— E você? — ele pergunta, me pegando de surpresa. — Como você está? Eu nunca pergunto, né?
A pergunta faz meu coração quase parar por um segundo.
— Eu... estou bem. — respondo, tentando processar o fato de que ele está realmente se interessando por como eu me sinto. — Quer dizer, preocupado com você, mas... bem. A gente só quer te ver melhorar, sabe?
Ele assente lentamente, parecendo absorver minhas palavras.
— Eu sei. — ele murmura, seu olhar suavizando. — E... eu agradeço por isso. Todos vocês... você, Ran, Smiley... têm sido incríveis comigo. Jamais vou esquecer de todo o apoio que vocês estão me dando e sempre me deram.
Não sei o que dizer por um momento. Ele está falando comigo normalmente, como se a nuvem que pairava sobre ele tivesse se dissipado, pelo menos um pouco.
— A gente se importa, Rindou. Nos importamos muito com você. — digo finalmente, com um nó se formando na minha garganta. — E é bom ver você assim, sabe? Conversando, presente.
Rindou solta um suspiro, mas é um suspiro leve.
— Eu ainda tenho um longo caminho pela frente. — ele diz, quase como se estivesse pensando em voz alta. — Mas... acho que estou começando a querer lutar de verdade.
Eu não consigo evitar o sorriso que se espalha pelo meu rosto ao ouvir essas palavras.
— É isso aí. — digo, minha voz saindo mais animada do que pretendia. — É só um passo de cada vez, mas cada passo é importante.
Ele me dá um olhar firme, e pela primeira vez em muito tempo, sinto que ele está ali, comigo, na sala.
— Obrigado, Angry. — ele diz, sua voz soando mais sólida. — Por sempre vir, por nunca desistir.
Meu peito se enche de algo que não consigo descrever.
— Eu nunca vou desistir de você, Rindou, nunca vou. — afirmo, e ele me olha com algo que parece gratidão, esperança. E naquele momento, eu sei que, pelo menos hoje, ele está melhor. E isso já é tudo o que eu podia pedir.
A atmosfera está tão diferente, não tão carregada, e Rindou, que está sentado na minha frente, parece mais... presente. Ele me encara com um olhar sereno, o mesmo olhar que eu costumava ver quando a vida não era tão complicada.
Ele respira fundo antes de falar, como se estivesse reunindo coragem.
— Sabe, Angry... — começa, a voz um pouco hesitante. Eu levanto a cabeça, atento a cada palavra que ele vai dizer. — Você é uma pessoa boa. Sempre foi.
Meus olhos se arregalam um pouco, e uma surpresa calorosa se espalha no meu peito.
— Eu... eu só tento ajudar. — murmuro, meio sem jeito. — É o que eu posso fazer, principalmente para você.
Rindou solta um leve suspiro, desviando o olhar para a janela por um momento antes de voltar a me encarar.
— Quando eu sair daqui... quero fazer muitas coisas com você. — ele diz, um brilho diferente em seu olhar, algo que não via há muito tempo. — Quero jogar videogame, como a gente fazia antes... Andar de skate, sabe? Como a gente prometeu que faria.
Minha garganta se aperta e eu sinto um calor estranho subindo pelas minhas bochechas. As palavras dele me atingem em cheio, e eu percebo que estou sorrindo, sem nem mesmo perceber.
— Eu adoraria. — consigo dizer, minha voz saindo um pouco embargada. — Sinto falta disso, sabe? De... passar o tempo com você, mesmo quando você implicava comigo.
Ele me dá um sorriso fraco, mas é verdadeiro.
— E... também quero ver o pôr do sol. — continua, seus olhos ganhando um ar sonhador. — Aquele lugar que você falou, lembra? Onde o céu fica todo laranja e roxo... Eu quero ir lá com você.
Eu só consigo assentir, as palavras travando na minha garganta. Nunca imaginei que ouvir algo assim dele pudesse mexer tanto comigo.
— A gente vai, Rindou. — digo, minha voz cheia de uma esperança que não sinto há muito tempo. — Assim que você sair daqui, a gente vai fazer tudo isso. Eu prometo.
Ele me encara por alguns segundos, e vejo uma luz diferente em seus olhos. É como se, por um momento, todas as sombras que o atormentam tivessem se dissipado, deixando espaço para um vislumbre do Rindou que eu conheço.
— Eu quero acreditar nisso. — ele sussurra, sua voz carregada de emoção.
— Então acredita. — insisto, com o coração batendo mais forte. — Porque é a verdade. Eu estarei aqui esperando você pra gente fazer tudo isso juntos.
Rindou sorri novamente, um sorriso pequeno, mas cheio de significado. E, pela primeira vez em muito tempo, sinto que ele está verdadeiramente presente, pensando em um futuro fora dessas paredes. E esse pensamento me dá forças para continuar ao lado dele, a cada passo dessa jornada.
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