29- Pressentimentos: A Teia do Destino
7 dias para o dia da luz
Às cinco e meia da manhã, John dormia tranquilamente ao lado de Maggie até que um pequeno barulho na cozinha o despertou. Maia Cruz, sempre contando os segundos, nunca falhava nos horários; ela estava na casa de John para realizar algumas limpezas e outras tarefas. Maggie também acordou, incomodada com o barulho que Maria fez.
— O que se passa, John? — questionou Maggie, claramente insatisfeita por ser abruptamente acordada.
— É apenas a Maria, fazendo uma pequena limpeza — respondeu John.
— Precisava vir a esta hora?
— É o único horário disponível para ela. Sei que precisa de dinheiro, e como é orgulhosa demais para pedir, eu disse que precisávamos de uma limpeza.
— Não quero que ela tenha a chave de casa.
— Ela é da família...
— Acaba com essa história da família, podes fingir que tens uma família, não me importo. Agora não me incluas no mesmo saco que o dos mexicanos.
— Vamos dormir, conversamos amanhã.
De volta a Maria, esta segurou o seu novo celular, recentemente comprado a pedido de John, e o colocou cuidadosamente na estante, ao lado do celular de Maggie, que por acaso era exatamente igual, até a capa. O seu plano estava concluído, só precisava realizar algumas limpezas para disfarçar a troca. Enquanto organizava tudo, não resistiu e pegou o retrato de John segurando os seus dois preciosos afilhados, Jesus John e José John, os adoráveis filhos de Maria e Óscar. A lembrança do quanto deviam a John emocionou-a, e ela sentia gratidão por tê-lo como padrinho das crianças.
Maria saiu, ciente de que o trabalho ainda não havia terminado, havia mais a ser feito. Ela faria tudo o que John pedisse e ainda mais, se necessário. "John é um anjo, e Deus cuidará dele", refletiu Maria. Ela não gostava de Maggie, a considerava falsa e dissimulada, e sabia como enxergar o coração das pessoas. Alguma coisa devia ter acontecido para enganar o coração puro de John, e ela não acreditava que fossem apenas os encantos femininos dela. Um dia descobriria e auxiliaria o homem que um dia a salvou e agora cuidava dos filhos como se fosse o próprio pai.
O mais interessante é que os membros da família Cruz faziam tudo isso para salvar Maggie, não John. John havia contado à família Cruz que Maggie corria perigo de vida devido à máfia russa e que ajudá-la era o mesmo que ajudá-lo. Se matassem Maggie, certamente o matariam também. Eram exatamente seis horas da manhã quando Maria saiu da casa de John.
Enquanto isso, num hotel distante, Yuri acordou sobressaltado, encharcado de suor frio. O rosto pálido refletia o terror que o assolava. Ele havia tido um pesadelo recorrente que sempre o atormentava antes de realizar um trabalho. Naquela visão noturna, ele via-se diante do próprio diabo, cujos olhos eram negros como a mais profunda escuridão. Essa visão havia surgido vinte anos atrás, na fatídica noite em que tirou a vida de uma mulher.
Desde então, aqueles olhos negros o atormentavam implacavelmente, como uma sombra impregnada na alma. Na véspera de cada trabalho, ele era arrastado para um reino de pesadelos assombrosos, onde a figura demoníaca do diabo o observava com malícia indescritível. A dor dos seus pecados parecia manifestar-se fisicamente, como se o fogo do inferno queimasse dentro dele. Sentia a mão esquerda sendo penetrada por uma lâmina incandescente e a barriga queimar num rasgo longitudinal.
Yuri levantou-se, tomou um banho, não permitindo que o passado assombrasse o presente. As primeiras luzes do dia pareciam trazer algo de positivo; os pesadelos ficavam na cama, e os sonhos bons iam com ele.
Duas horas depois, ele estava no sexto andar de um prédio em construção, era sábado e não havia trabalhadores. "Hoje promete ser um dia calmo, o céu está limpo. Talvez mais tarde eu vá passear e ver as pessoas alegres caminhando", refletiu Yuri, tentando animar-se. Um esforço em vão, pois, os monstros internos tinham mais poder de alterar o seu semblante do que o sol radioso.
As mãos não tremiam, habituadas a matar, eram armas frias, mas estavam inquietas. As pontas dos dedos batiam na arma como uma melodia inquietante; ele esperava ansiosamente pelo momento certo. Daria um tiro na cabeça de Robert Walles e pronto, seria seu último trabalho, "se Deus quiser". Já tinha economizado o suficiente para comprar a sua própria quinta e talvez até casar e viver uma vida normal, como uma pessoa comum. Hoje seria seu último trabalho. "Talvez seja o medo da mudança que me inquieta", pensou Yuri. Ele ouviu um pequeno barulho, possivelmente um rato, um gato ou até um cão. Não era preocupante, mas o que o preocupava ainda mais era o pesadelo, que dessa vez fora mais intenso do que nunca, um mau presságio.
O sombrio amanhecer trouxe consigo apenas mais incertezas e o presságio de que o pior ainda estava por vir. Afinal, no âmago da escuridão que cercava Yuri, a linha entre o mundo real e o sobrenatural se tornara turva, e ele sabia que em breve seria confrontado com um destino tão terrível quanto os seus próprios pesadelos. No entanto, tinha esperança de que isso não acontecesse. A solução que Yuri enxergava para o seu tormento era abandonar essa vida, talvez o diabo se esquecesse dele, e ele não podia deixar que o desespero o dominasse. "Nem tudo o que parece perdido é queimado pelo fogo do desespero, precisamos nos levantar", refletiu Yuri. A sua alma estava queimada, mas ele acreditava que ela poderia renascer das cinzas se abandonasse essa vida.
Neste sábado, quem ajudaria Yuri a cometer o crime eram Pauline e Alenichev. Embora não precisassem de ajudar no assassinato em si, seriam cruciais para incriminar o alvo. Pauline tinha a função de incriminar, enquanto Alenichev a função de conduzir. Neste momento, ambos estavam nos seus postos, tudo estava preparado. A preparação de Pauline não foi fácil.
Ao sair de casa, ela percebeu que um detetive metediço de nome Rodrigo a seguia. Teve que parar o carro e ligar para Sergei, um parceiro de confiança. Pauline então se embrenhou por uma rua estreita com o detetive no encalço. Ela já conhecia o carro de Rodrigo, não era a primeira vez que o despistava. "Ele não vai durar muito nesta vida", cogitou Pauline, imaginando intenções ainda não planeadas para dar um fim ao detetive. Ela saiu da rua estreita, virou à esquerda e da direita apareceu, repentinamente, Sergei no seu carro creme, bloqueando a passagem de Rodrigo. Mais uma vez, Pauline ludibriara Rodrigo, e assim, chegou incógnita ao local onde o crime ocorreria. Estacionou o carro a um quilómetro de distância da casa de Robert Walles, tirou a gabardina e colocou uma peruca negra e luvas de látex, estava equipada para correr. Pegou um envelope do tabliê, fechou a porta do carro e começou a correr. Robert Walles desconhecia que hoje era seu último dia.
Robert, um homem bem-sucedido no meio jurídico, preparava-se para comprar pão. Abriu a porta e olhou para o relógio, eram nove horas, a segunda fornada de pão devia estar a sair. A menos de um quarteirão dali ficava a padaria onde todos os sábados ele ia comprar pão... Adorava o pão fresco. Do outro lado, no prédio em construção, a menos de 300 metros, estava Yuri, com a arma apontada. Aquela distância, ele não erraria, bastava apenas Robert chegar ao passeio. Yuri pegou no celular e com apenas um toque, pediu para Pauline apressar a corrida. Com Robert na mira, pronto para dar o tiro fatal, algo estranho aconteceu; ele sentiu como se fosse ele a presa. Robert abriu a cancela, Pauline corria, e Yuri ainda teria de esperar mais 20 segundos para o momento, do disparo, ser o mais preciso possível. "Não há motivo para estar nesta ansiedade, tudo corre conforme o planeado", pensou Yuri.
Quem tinha planos diferentes era Xavier e Miguel Cruz. Há meia hora, Xavier, ao perceber que Pauline se afastava do seu carro, não hesitou em furar-lhe um dos pneus com uma faca. Antes disso, já havia enviado uma mensagem ao detetive Rodrigo, revelando o paradeiro de Pauline. No entanto, momentos antes de receber uma mensagem anónima, Rodrigo sentia-se frustrado com a sensação de que aquela víbora lhe havia escapado, novamente. A vida sempre reserva surpresas, e por um capricho do destino, o seu celular começou a vibrar. A mensagem enigmática indicava, "Pauline vai passar pela casa de Robert Walles...". E não parava por aí, pois também continha o endereço da residência, o que não era necessário para Rodrigo, pois ele conhecia bem aquele local.
Sem saber a origem da mensagem, Rodrigo agarrou-se às pistas fornecidas por ela. Estacionou o carro do outro lado da casa de Robert Walles, segurando firmemente a máquina fotográfica. Cerca de nove horas, Pauline surgiu correndo, mesmo com a peruca, era reconhecível. Algo estranho chamou a sua atenção: ela carregava um envelope e corria usando luvas de látex. Quando Robert Walles abriu o portão do jardim que dava para o passeio, Rodrigo não hesitou em disparar a máquina fotográfica incessantemente, registando cada detalhe.
Robert caiu no chão, o sangue jorrava da sua cabeça, indicando que um tiro havia sido disparado. Rodrigo, sobressaltado, continuava a fotografar a cena em meio ao choque. Pauline aproximou-se do corpo da vítima estendida no chão e abriu-lhe o casaco, deixando lá o envelope. Em seguida, como se nada tivesse acontecido, ela prosseguiu com o jogging matinal. O detetive ficou indeciso entre seguir Pauline ou comunicar à polícia, mas optou pela segunda opção, correndo em direção ao corpo para verificar sinais de vida. A esperança era escassa, o sangue era o prenúncio de uma sentença fatal.
Yuri encontrava-se a guardar a arma de onde saiu a bala mortal em direção à cabeça de Robert. Trabalho feito, agora está mais descansado, "A vida é o que fazemos dela, os planos tornam tudo previsível e eficaz". Os demónios do remorso que habitavam na mente de Yuri desapareceram, o trabalho correra bem, ainda não havia acabado, mas é "dar tempo ao tempo, que a fuga é calculada". Fechou a mala, onde guardara a arma com uma destreza assinalável e uma serenidade dada pela experiência. Ergueu-se, não queria acreditar. Dois homens mascarados apontavam-lhe armas.
Alfred e Tommy seguiam as instruções de Sammy segundo o plano de John. Sem hesitação, Alfred disparou dois tiros precisos, um em cada lado do peito junto ao ombro. Yuri caiu atordoado no chão, os dois homens levaram-lhe a arma, a segunda Barret que buscavam, o plano dera certo. Com mestria, revistaram Yuri e encontraram uma 9 mm adicional que ele trazia num coldre de ombro. Deixaram-lhe a carteira vazia e o telemóvel, enquanto Yuri estava estatelado no chão.
— Fica deitadinho, quieto — mencionou Alfred com voz ameaçadora — se não queres ir desta para melhor.
— Somos aquilo que a vida faz de nós — disse Tommy sem convicção, uma frase que John pediu para ser dita, como um cartão de visita, ninguém percebeu o motivo, mas a ordem estava cumprida.
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