memoria
Dean Bianchi
Tre anni fa
(Três anos atrás)
Eu nunca gostei do silêncio, mas passei a aprecia-lo.
Vivendo em uma casa com sete pessoas, sempre fora difícil encontrar um momento de ausência de som, e eu nunca o quis procurar, até completar idade o suficiente para entender o que meu pai fazia, e o que eu teria que fazer também. Desde então, qualquer momento de silêncio passou a ser apreciado por mim, mas apenas os bons, quando soube passar ao distinguir dos ruins, e foi da pior maneira possível.
Fecho a porta do carro assim que Matteo e Dante conseguem passar os braços de Pietro por sobre os ombros após o tirar do banco de trás. Martina toma a frente, dizendo que vai abrir a porta e verificar se não seremos flagrados com Pietro, mas sei que é apenas uma desculpa porque não quer ver seu irmão gêmeo desmaiado de bêbado.
Solto um suspiro e passo as mãos com força no rosto, todos nós sabemos que a situação de Pietro não é boa, que ele está virando um fodido alcoólatra, mas Martina não quer admitir, e nos impede de tomar alguma atitude, enquanto isso, temos que ficar o vigiando e quando falhamos, como hoje, temos que lidar com a situação enquanto ela se tranca no quarto.
Eu sempre admirei a força que há na nossa família, como nos protegemos defendendo uns aos outros, mas também sempre detestei como somos um bando de orgulhosos filhos da puta que não enxergam os próprios erros, e é por isso mesmo que não poderia bater de frente com ela, eu seria um maldito hipócrita, e não estava a fim de a ouvir jogar a merda de sempre na minha cara de novo.
— Acha que papai está acordado? – Dante pergunta quando passo a caminhar ao seu lado após fechar o carro. Preferimos parar na frente de casa do que na garagem, evitando fazer mais barulho.
— Espero que não. – Sussurro em resposta enquanto nos aproximamos da porta que Martina tenta abrir na entrada.
— Mamãe avisou que era uma péssima ideia levar ele a festa. – Matteo sussurra do outro lado.
Apenas engulo em seco e abaixo a cabeça. Eu sei que era uma péssima ideia, soube assim que anunciaram a festa no começo do mês, mas porra, era nossa última festa do ensino médio, a comemoração de que aquele inferno finalmente acabou e sei que Pietro estava mais aliviado do que nós, eu não sei como ele aguentou as merdas que o fizeram ouvir por ser gay, supostamente sem pais e de uma família de traficantes.
Martina abre a porta da frente e eu entro atrás dela, e é quando eu percebo que a algo errado. Nossa casa nunca ficava vazia, sempre tinha algum empregado, parceiros de meu pai ou Antonella cantando por aí, mas hoje o lugar está silencioso pra caralho. Olho para meus irmãos por sobre o ombro, que passam com Pietro pela porta de entrada e me devolvem olhares confusos.
— Dean. – Levo o olhar de volta para frente quando ouço meu nome ser chamado.
Daniel Bianchi sai do pequeno escritório embaixo da escada e engulo em seco quando vejo seu rosto. Meu pai quase nunca sorria, quando ocorria, era por alguma palhaçada que eu e meus irmãos fazíamos, mas fora isso, vivia por aí com seu maxilar trincado, sobrancelhas grossas e escuras, acima de olhos castanhos, franzidas, o cabelo arrumado sempre em perfeita ordem.
Eu ainda me surpreendia com o quanto somos parecidos, sei que Dante também tem as mesmas características, mas há algo em nossa expressão que nos torna idênticos, pelo menos por fora. Enquanto isso, Matteo com seus cabelos loiros e olhos azuis, e Martina e Pietro como uma cópia esculpida do meu tio, não parecem em nada conosco, ainda assim são nossa família.
Acontece que ao contrário do usual, o rosto do meu pai parece abatido, seus olhos estão mais fundos e seu cabelo parece que fora puxado várias vezes, em desespero, em agonia. Algo muito ruim aconteceu.
— Cadê Antonella? – Pergunto, recebendo um negar de cabeça em resposta.
Foi o primeiro silêncio ruim.
Eu odeio o silêncio, e esse está me matando por dentro.
Todos nós acompanhamos com o olhar o trajeto do caixão até chegar ao fundo do buraco, um silêncio mortal entre todos. Ouço Matteo fungar entre nós, o único cujo realmente ela era a mãe de sangue, mas que ainda assim, faz lágrimas escaparem dos olhos de todos, inclusive dos meus.
Eu sempre soube que um dia algum de nós morreria, possivelmente da forma mais trágica possível, meu pai não contrabandeia apenas drogas, ele faz merdas piores, e achei que essas merdas que iriam nos matar, mas não contava que um câncer poderia causar isso mais cedo.
Passo a mão por debaixo do nariz, tentando impedir mais lágrimas de cair, e é quando sinto algo ser posto dentro do meu bolso. Olho para o lado, encontrando a governanta e melhor amiga de Antonella parada ali, o olhar fixo no caixão, mas as mãos, recém voltadas à frente do corpo.
Olho ao redor, e com nenhum olhar em mim, me afasto do nosso pequeno grupo, retirando o que descubro ser uma carta dobrada, até se tornar um pequeno quadrado, do bolso do paletó preto. Me encosto contra uma arvore a alguns metros de distância e encaro meu nome escrito pela letra perfeita de Antonella no papel, a mesma letra que assinava os papéis de detenção para mim escondidos de meu pai.
Engulo em seco e respiro fundo várias vezes até tomar coragem de abrir:
"Querido Dean, se está lendo isso, essa doença de merda que venho escondendo a anos finalmente acabou comigo, mas não se preocupe querido, pelo menos não vai mais doer.
Me desculpe por não ter lhe contado sobre ela antes, mas eu nunca fui corajosa, não como você, como vocês, e é por causa disso também, que lhe escrevo essa carta.
Eu gostaria de ter lhe contado isso cara a cara, mas nunca ficamos realmente sozinhos, e quando isso acontecia, eu apenas queria o fornecer o meu colo e meu carinho, nada mais, mas talvez eu devesse ter insistido.
Quando cheguei a essa casa, meu coração estava partido, e eu soube que eu nunca iria conseguir preencher este vazio, mas conhecer você e os outros garotos amenizou minha dor. Lembro da primeira vez que os vi, os quatro tendo aulas de química avançada que nenhuma criança de cinco anos deveria ter, naquele momento, eu soube que poderia preencher o vazio cuidando do meu filho e das quatro lindas crianças que Deus me deu.
Mas a dor de deixar minha filha para trás nunca se foi.
Sim, eu tenho uma filha, na última vez em que a vi, ela ainda era a criança mais linda do mundo, seus olhos de um azul tão claro como os de Matteo e os cabelos antes claros se tornando loiros escuros. Tive que me afastar dela, não pense que foi uma escolha fácil, nunca seria, mas tive que fazê-la, e apesar de saber que o merda do pai sempre irá se preocupar com ela, e mesmo que não mereça, quero lhe pedir um favor:
Vá atrás dela, realize esse desejo por mim, conte que sua mãe nunca quis a deixar e que a ama mais do que tudo, conte que ela tem um irmão, cuide dela por mim. Mas espere o momento certo para se aproximar, quando ela sair da casa do pai, ele nunca irá deixar você se aproximar se souber quem você é, e se descobrir, irá a afastar ainda mais, e eu não quero que isso aconteça, ela merece finalmente saber que sua mãe não está morta, bem... não estava.
Mas aviso-lhe, minha garotinha é osso duro de roer, pelo que me contaram e o pouco que vi até seus cinco anos, ela tem o gênio do pai, determinada, forte e nunca abaixa a cabeça. Ela me lembra você, acho que foi isso que mais me aproximou de ti, você me lembra dela, e sei que se não forem arrogantes e cabeças duras, serão bons amigos.
Por favor, só conte para Matteo quando a contar tudo primeiro, conheço meu filho e sei que se souber, irá no mesmo momento atrás dela, e temo o que seu pai e o dela, possam fazer.
A todas as minhas crianças: obrigada por me permitirem ser sua mãe, vocês clarearam meus dias mais escuros e alegraram meus dias tristes. Sejam unidos, não deixem essa vida que vocês levam subir à cabeça, Deus sabe o quanto eu os desejo fora disso, mas sei que as coisas não são tão fáceis assim.
Família acima de tudo crianças, os amo imensamente.
Com amor,
Isobel – outro segredo que a mãe de vocês guardou -."
— Dean? – Ergo o olhar para cima, dando de cara com um Matteo embaçado pelas lágrimas, se aproximando de mim. – Você está bem?
— Ninguém está – Escondo a carta no bolso e passo as mãos pelo rosto. – O que foi?
— Daniel está lhe procurando.
— Agora? – Solto um riso – Que merda ele pode querer agora? – Matteo dá de ombros e desvia o olhar para onde o caixão terminou de ser enterrado.
— Acho que chegou a hora – Volta os olhos azuis, agora vermelhos, para mim. – De aprender sobre os negócios da família.
◤ NOTAS FINAIS ◥
É apenas isso por hoje amores, pouco eu sei, mas foi a última memória e pov de Dean ;(
Espero que tenham gostado e vejo vocês na quarta-feira, onde tudo vai começar a encaminhar para resolver o mistério.
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