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02. Procura-se um futuro

O rosto de Henry se transformou em uma careta dolorida quando viu a criança ser derrubada de costas contra o chão forrado, o sorriso orgulhoso no rosto da que acabara de derrubar seu colega o fez lembrar de Piper.

- Angie, talvez fosse melhor você não querer matar seu amigo da próxima vez. - opinou um tanto sério a vendo revirar os olhos e dar de ombros.

Angie deu às costas ao garoto caído e foi à procura de uma nova vítima, ou colega de treino. Henry observou Brian se levantar e fazer um sinal de positivo em sua direção, o garoto caminhava em direção aos bancos quando o Hart sentiu seu celular vibrar no bolso frontal de sua calça. Olhando ao redor para ter certeza de que ninguém iria mais tentar cometer assassinato, atendeu a ligação enquanto procurava um lugar mais discreto no ginásio em que dava aula.

- Alô.

- Henry Hart?

Assentiu para a voz grossa e um tanto séria do outro lado, porém logo lembrou que ele não poderia vê-lo.

- Sim, sou eu. Quem está falando?

- Sou o reitor Rodriguez, responsável pela Líbero Academy. Liguei para falar sobre sua entrevista.

Henry sentiu seu coração disparar, observou seus alunos ainda treinando e passou pelas portas do ginásio para o corredor vazio.

- Acredito que esteja me ligando para falar sobre a data?

- Sim, isso mesmo. Ela ficou marcada para a próxima sexta-feira às cinco da tarde. Escute bem, senhor Hart. - Rodriguez começou, abaixando o tom de voz, o que fez Henry apertar o celular ainda mais contra sua orelha. - Liguei pessoalmente porque estou particularmente animado com sua entrevista, ouvi falar muito bem sobre a sua temporada em Dystopia e pelo visto seu trabalho como treinador na escola do Manchester não deixa a desejar.

- Obrigado, senhor. - agradeceu animado.

- Gostaríamos de ter alguém como você treinando nossas crianças, alguém que sabe o que está fazendo e, principalmente, que gosta do que está fazendo. - frisou, soltando o ar ruidosamente em seguida. - Você não sabe quantas pessoas existem que estão dispostas a levar as crianças para um lado mais tortuoso. Nós treinamos os nossos, os ensinamos o certo e o errado, porém o outro lado faz o mesmo, sem medir esforços para formar um exército contra nós.

Assentiu novamente, mesmo que ele não pudesse enxergá-lo. O reitor Rodriguez parecia ser um homem íntegro e Henry sentiu que poderia confiar nele. Charlotte talvez dissesse que ele teria que conhecer o homem primeiro, mas até ela sentiria uma pontada de confiança em relação à alguém que claramente se preocupava com o bem estar de seus alunos.

- Então está confirmado, senhor Hart?

- Sim, senhor. Sexta-feira estarei aí.

- Muito bem, tenha uma boa tarde.

- O senhor também.

Encerrou a ligação com um imenso sorriso no rosto. Amava ensinar na escola de Ray, mas o centro era algo pequeno e restrito, seus amigos não estavam muito interessados em realmente ampliar para mais pessoas. Ao contrário da Líbero que estava sempre à procura de novos alunos, lá Henry poderia aperfeiçoar suas técnicas de luta e tanto ensinar quanto aprender com estudantes de inúmeras nacionalidades.

Estava na hora de dar um novo passo em sua vida, se tudo desse certo na entrevista, e ele torcia para dar, teria que deixar sua cidade novamente, mas dessa vez por um tempo indeterminado. Estava a um passo de entrar no ginásio quando sentiu seu celular vibrar novamente, era um e-mail de Bish com a lista de afazeres, dez pontos brilhavam na tela e riu ao pensar em quanto Charlotte iria xingar a amiga. A sorte era que a cidade onde a entrevista ocorreria era distante poucas horas de onde sua melhor amiga estava, talvez até pudesse ficar uns dias com ela se falasse com Ray. A Page iria amar.

《◇》

Charlotte apressou os passos em direção ao prédio de Psicologia, estava quase dez minutos atrasada para a aula e se detestava por isso. Fora dormir tarde pensando em assuntos que não deveria focar e acabou perdendo a hora pela manhã. Desviava com habilidade dos alunos que caminhavam calmamente ao seu redor, em seus braços apertava pastas cheias enquanto balançava a cabeça para afastar as tranças que caíam em frente ao seu rosto, deveria tê-las prendido antes de sair.

- Charlotte!

Ignorou o grito, suspirando aliviada quando chegou em frente às portas do prédio, as empurrou com o ombro e se pôs a praticamente correr em direção à sua sala, mas foi parada no meio do caminho quando alguém a puxou pelo braço a fazendo se virar de encontro a um corpo forte. Piscou confusa, dando um passo para trás e inclinando a cabeça para encontrar o rosto sorridente da última pessoa que queria ver naquele momento.

- Você não me ouviu chamar o seu nome?

- Claramente sim e escolhi ignorar pelo o que você pode ver. - falou impaciente, puxando seu braço para longe da mão dele. - Agora se me der licença, estou atrasada. - o deu às costas, mas ele logo se colocou à sua frente novamente. Grunhiu irritada. - Que merda você quer agora?

- Um encontro. Só o mesmo que te peço desde o início do ano. - respondeu inocentemente, abrindo um sorriso malicioso enquanto passava os olhos por todo o seu corpo. - Você continua solteira, então não tem motivo algum para me dispensar.

- Além do fato de voce ser um babaca egocêntrico? - rebateu ácida, estremecendo de raiva quando o escutou rir. - Vou te denunciar por assédio, já avisei.

- Não estou fazendo nada de errado, somente perguntando quando você vai sair comigo. - declarou, levantando as mãos em rendição quando o olhar dela se tornou ainda mais frio. - Não precisa ser assim, gata, é só você dizer sim.

Charlotte apertou ainda mais seu material entre seus braços, estreitou os olhos em direção à ele, em sua mente se passavam inúmeras maneiras de fazê-lo gritar de dor, mas lembrou da aula que já estava acontecendo e somente o acotovelou na costela quando passou ao seu lado para entrar na sala. Não virou quando escutou o gemido de dor, mas um sorriso satisfeito adornou seu rosto por todo o caminho até sua cadeira.

- Você está atrasada.

O sussurro curioso de sua amiga a fez fazer uma leve careta para ela, deu de ombros quando virou em direção à professora que já estava envolvida no assunto que explicava. Por sorte a porta de trás do auditório estava aberta, então conseguiu entrar sem chamar muita atenção, Alice havia reservado uma cadeira ao seu lado para ela e Charlotte logo se pôs a ver as anotações da amiga. Estava na aula de Psicologia comportamental, apesar de discordar um tanto levemente da linha de pensamento que sua professora defendia, não podia negar o quão interessante era o assunto.

Dallas explicava sobre o Behaviorismo, que era a linha por qual a matéria se baseava. Os comportamentalistas, ou behavioristas, acreditavam que todas as ações humanas eram frutos da experiência, ou seja, não existia o estado de subconsciência ou consciência, o homem era o que era por conta do que via e experienciava. Com comportamentos aprendidos e não "criados", se encontra uma unidade entre mente e corpo, essa área da psicologia era responsável por estudar o comportamento do ser humano e entender os motivos que o levam a fazer o que faz.

Charlotte sempre amou as séries policiais onde se descobria o assassino a partir de seu perfil, conviver com criminosos por boa parte de sua vida também a ajudou a entender um pouco como funcionava suas mentes e até certo ponto tinha conhecimento dos motivos por trás do que faziam. Era essa a área que queria seguir, estudar o comportamento humano e desvendar ou prever seus próximos passos era desafiador e Charlotte Page adorava um desafio. Faltava um pouco mais de um ano para terminar sua faculdade e já escolhera em qual especialidade iria focar suas energias, só esperava que sua mãe a apoiasse, dona Page estava louca para ter uma filha médica.

Seus dedos voavam pelo teclado do notebook, praticamente anotava a medida que as palavras saíam da boca de sua professora, tentaria adiantar o máximo possível para ter tempo de cumprir a lista de Bysh. Esperava que sua amiga não tivesse exagerado e só lhe repassado as tarefas mais fáceis, do contrário ela iria redirecionar todas para os outros dois que dividiriam tudo com ela. Mordeu o lábio inferior com força para impedir o grunhido irritado ao lembrar de Jake, só esperava que ele mantivesse distância dela e guardasse as provocações para si. Ela não precisava ser lembrada constantemente do erro que foi dormir com aquele idiota, céus, ela estava realmente cercada por seres detestáveis se aquele que a abordara mais cedo era a prova.

Balançou a cabeça e se pôs a se concentrar na aula, nenhum deles iria tirar seu foco. Alice a cutucou com um lápis, encarou a amiga que a olhava preocupada e abriu um sorriso tranquilizador a observando aceitar a contragosto, com toda a certeza teria um imenso interrogatório pela frente ao fim da aula. Estalou seus dedos e retornou ao seu estado anterior, estava na hora de estudar como só Charlotte Page conseguia.

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