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Capítulo 20 - A Hora da Caçada

Eu e as garotas recuamos em um círculo, uma de costas para outra.

Tentei manter a calma, mesmo sendo difícil com o enorme barulho dos soldados batendo suas armas nos escudos metálicos de forma frenética. Era visível a urgência por sangue naquele lugar. Internamente, só pedia para Aliat não me abandonar. Reunindo o que existia de coragem em mim, murmurei:

– Luna, Tracy, vou distrair os guardas. Vocês correm e pedem ajuda. Cuidado para não serem seguidas. Jane, vou precisar de sua ajuda. – Elas concordaram de imediato. – 5, 4, 3, 2... Abaixem!

As três se ajoelharam. Chamas saíram pelas minhas mãos e percorreram a área da clareira. Alguns se agacharam a tempo e outros começaram a pegar fogo. Esses últimos correram desesperados com a dor, flambando outros guardas. Uma passagem foi aberta entre os inimigos.

– Vão, vão, vão! – Gritei para Luna e Tracy.

Elas obedeceram. Preparei-me para atacar novamente e coibir qualquer perseguição às meninas. Porém, antes que pudesse agir, uns soldados começaram a gritar e correr do nada. Jane devia estar usando o seu dom neles.

Por fim, restaram sete guardas intactos, juntos a Katerine e Thomas. Dominei a água das gotículas de orvalho, as juntei e passei sobre os homens que pegavam fogo. Não queria sujar minhas mãos de sangue. Katerine desceu, em um salto, da árvore, pousando silenciosamente no chão de uma forma que me lembrou um guepardo. Os guardas remanescentes se prepararam para atacar, porém Thomas mandou eles ficarem parados.

– Vamos ter uma luta justa. Dois contra dois. – Jane falou prepotentemente.

De coração, queria que minha nova amiga ficasse calada. Desde que assumi o cargo como Senhora da Luz, não tinha mais surtos de poderes para nos salvar. E, se me lembro bem, ela apanhou de Katerine da última vez. Além disso, por mais estranho que fosse, refutava a ideia de matar tanto Katerine quanto Thomas. Eu precisava ser melhor do que uma assassina. Necessitava provar que Pedro estava errado.

Todavia, aparentemente um dos nossos adversários gostou dessa provocação. Katerine se agachou como uma leoa se preparando para atacar a presa indefesa.

– Com prazer, princesinha. – Katerine riu de modo macabro e pulou para matar Jane.

A garota de olhos de oceano desviou do primeiro ataque e derrubou Katerine com seu dom. Talvez dessa vez o final da luta entre elas fosse diferente.

Não pude prestar mais atenção nelas, eu tinha meu próprio oponente para lidar. Apesar de ser menos animalesco, ele passava um ar de letalidade ainda maior. Fitava o menor movimento de Thomas. Ele era mais habilidoso que eu. Nathan me ensinou que nesses casos devia aguardar para encontrar padrões e aproveitar oportunidades.

– Enny, Enny, Enny. – Thomas estalava a língua. – Por que os defende? Estas pessoas não se importam com você. Ninguém, em sua vida inteira, lhe deu valor como deveria, exceto Victor.

– Sério? Uma pena que não estou aceitando prêmio de consolação. – Tentei zombar dele, mas o medo transparecia em minha voz.

– De fato, uma lástima. Terei que lhe caçar, então.

Ele retirou uma adaga de seu cinto e correu em minha direção com velocidade. Desviei para a esquerda, criei uma chama com minhas mãos e a joguei em sua direção. Se agachando, ele conseguiu não ser atingido.

Olhei para o lado e vi Katerine acertar um golpe em Jane, a derrubando. Corri para tentar ajudar minha amiga, sem nem olhar onde meu rival estava. Senti algo perfurar profundamente a lateral do meu quadril.

Desci a vista e encarei a ponta da adaga. A arma me transpassou. Nenhum gemido de dor saiu, afinal eu estava com a adrenalina correndo em meu corpo. Puxei-a pelo cabo sem qualquer hesitação. Girei sobre meus calcanhares, encarando meu oponente com choque.

– Deixe-as resolverem seus problemas. É uma rixa antiga. – Thomas riu. – As más línguas contam que você já brigou com o generalzinho. Eu o faço seu escravo caso queira, pequena. Diga uma só palavra.

Um micro grito saiu pela minha garganta e eu ataquei Thomas com ferocidade. Soquei sua face repetidas vezes. Peguei o seu pulso quando ele tentou me atacar e girando pelo corpo do rastreador, imobilizei o braço atrás de suas costas, empurrando para cima, tentando deslocar o membro.

O rastreador gemeu de dor, mas balançou o quadril e bateu no meu corte aberto. Soltei-o inconscientemente graças à dor que senti. Ele correu, pegou a adaga e apontou com relutância para mim. Um riso me tomou ao ver que Thomas estava impressionado.

– Medo de mim? – Falei de forma provocativa.

– Por quê? Se nem o generalzinho é capaz de me matar, como você poderia? Além disso, não acha que eu viria aqui só com aqueles recrutas, acha? – Thomas gritou uma palavra que não pude entender.

O chão começou a tremer. O barulho de passos sincronizados aumentava. De repente, outros trinta homens apareceram. Todos armados das cabeças aos pés, pareciam mais fortes. Os sete remanescentes do primeiro batalhão se juntaram a eles.

– Você deve estar realmente desesperado para precisar de tanta ajuda, meu caro.

Apesar da confiança na minha voz, meu coração ia para o extremo oposto.

Implorava para que Luna e Tracy trouxessem logo ajuda. Porém, tinha que focar na realidade. Era eu e Jane contra aquela horda do mal. E ela já parecia estar tendo grande dificuldades só com Katerine.

Respirei fundo e me preparei para dar meu máximo. Enquanto eu pudesse lutar, Jane ainda sairia daqui para contar aos outros.

– Matem-nas. – O grito gutural de Thomas dominou o ambiente.

Os homens-animais vieram para cima de mim com suas lâminas brincando com a minha vida. Fiz um campo de força ao meu redor e fui em direção a Jane. Corri mais rápido que pude e bati o escudo nas costas de Katerine. A serva de Victor soltou minha amiga e, por um segundo, eu desfiz o escudo, abracei a garota, jogando-a para baixo e impedindo ela de ser atingida por um golpe no pescoço, refazendo a proteção do escudo bem a tempo. Três homens deram uma golpeada de uma só vez no meu campo de força e foram jogados para trás.

– Não consigo dominar dois dons ao mesmo tempo. Acha que pode distraí-los por um tempo? – Perguntei baixinho, bem aterrorizada pelo que poderia acontecer.

– Cinco segundos é o máximo que eu posso com tanta gente. Eu não estou conseguindo... respirar.

– Jane, preciso de você. Somos só nós duas! Quando eu disser já, você ataca. – Avisei.

Expandi o escudo o máximo que pude - até a margem da campina - e depois ele desapareceu. Os homens voltaram a correr assim que o escudo sumiu. Os da frente caíram desmaiados de medo ou gritavam de pavor e fugiam. Um, dois, três, quatro e cinco. O encanto se acabou! Usei a "levitação" e joguei um homem contra o outro.

– Jane, me ajuda! – Gritei e, ao olhar rapidamente, a vi cambaleante.

Puxei-a para perto de mim. Era nítido que iria desmaiar logo. Eu estava sozinha nessa. Precisava de um plano B para conter aqueles soldados até a chegada de reforços. Isso é: se essa segunda horda já não tivesse pego e assassinado Luna e Tracy antes delas pedirem ajuda. Meu coração apertou só na possibilidade disso acontecer e uma certeza me inundou:

Não posso deixar Jane morrer aqui.

Olhando a grama, tive uma ideia. Iria atacar o único lugar onde eles não tinham armaduras. Os pés. Transformei a grama em espinhos afiados e grandes. Os homens se cortaram, mas não se importaram com as gotas de sangue negro que escorriam dos cortes ou pedaços de carne que ficavam no trajeto.

Dominei a terra e fiz uma barreira de uns dez metros entre mim - e Jane - e os homens-animais. Vi as pontas das flechas que conseguiam atravessar a barreira por cima, descendo em nossa direção. Fiz uma chama que as incinerou antes de nos atingir, contudo alguns pedaços de metal ainda caíram em nós, cortando-me a testa.

– Jane, por favor, me ajuda! Jane! – Gritei seu nome e ela desmaiou.

Já esperava isso. Mas agora, que era real, estava muito mais ansiosa por estar sozinha. Eu tinha que ser a melhor. Não podia deixar meus aliados morrerem assim.

Baixei a barreira. As chamas que estavam em minhas mãos aumentaram e ficaram mais quentes, mais sedentas. Elas lamberam o lugar novamente com ferocidade e, dessa vez, só duas pessoas se queimaram: Thomas e Katerine.

Celebrei internamente e, por questão de contentamento, me demorei observando meus dois adversários. Consequentemente, não reconstruí a barreira, ficando exposta à horda maligna.

Thomas retirou a blusa em chamas e a usou como um chicote. Como eu estava preocupada demais em proteger Jane de Katerine, uma dessas chicotadas atingiu as minhas costas em cheio - ficando presa em meu ombro - e eu caí no chão de dor. Thomas correu para agarrar seu tão desejado prêmio, eu.

Um grito estridente ultrapassou minha garganta quando ele usou a adaga para retirar a sua blusa das minhas costas, me cortando propositalmente. Quase podia sentir o sangue evaporar ao sair do meu corpo fraco. Olhei para o lado e pude ver uma Katerine com a pele do braço e pescoço queimada. Ela estava montada sobre Jane, a enforcando. De súbito, levantei minha mão e meus poderes a empurraram para longe.

Ouvi grasnidos altos e bizarros, também escutei passos e gritos. Uma garota de cabelo loiro criou um escudo e jogou Thomas para longe de mim. Com as próprias mãos, Tracy tirou a camisa que ainda tinha labaredas fracas. Um suspiro de alívio irrompeu o meu silêncio. Vi uma grande sombra em forma de um pássaro surgir no ambiente, um enorme pássaro. Olhei para o céu em resposta e os vi.

Eram sete em formação, o que levava a pensar que ser apenas um gigantesco. Um deles deu um rasante e cuspiu em um grupo de seis homens-animais. As roupas desses começaram a derreter ao menor contato com a saliva e depois a pele. Virei o rosto bem a tempo de não ver quatro homens da rebelião matando aqueles seis, golpes que na realidade eram mais de misericórdia do que um assassinato frio.

– Ajude Jane, vou me virar. – Supliquei e me levantei.

Eu quero sua ajuda para os tirar daqui, Aliat. Implorei mentalmente. Sem mortes, sem dor. Por favor! Aliat, eu preciso de você! Não sou uma assassina e não sei como fazer.

Levantei as duas mãos e fechei os olhos por um segundo, percebendo o leve aquecer do anel em meu dedo e do Coração de Rheyk sob meu seio. No outro, senti como se a energia dos meus poderes pulsasse em cada veia minha. Podia descrever a rede que interligava a origem dessa sensação. Iniciava abaixo do meu esterno, projetando-se pelo meu corpo como diversas trilhas. Estendi minhas mãos, com as palmas viradas para o chão, e senti a terra abaixo dos meus pés tremer violentamente.

– Tracy, escudo em volta da rebelião. – Ordenei.

Assim que ela terminou o seu serviço, eu ergui uma enorme camada de terra que estava sob os pés dos homens-animais e os joguei rumo ao castelo, enviando Katerine nesse grupo. Minha prioridade era mandar os dois de volta porque sabia que como prisioneiros, eram uma ameaça, e como lutadores, matariam muitos. Contudo não consegui achar Thomas, sobrando-me apenas a garota como alvo.

Outros quinze homens foram corroídos pelo cuspe das aves. Nesses momentos, eu preferi não olhar. Algum tempo depois, tudo estava acabado. Finalmente, a perda de sangue, o cansaço e a dor começaram a fazer seus efeitos em mim. Caí ao chão, exausta.

Ouvi um choramingar perto. Achei força em mim que não conhecia, pondo-me de pé. Então, vi um homem-cobra. Comecei a andar em direção a ele e afastei os galhos que o escondiam. Ele não me odiava, tinha apenas medo. Não havia marcas em seu rosto. Suas presas, olhos vermelhos e pele escamosa denunciava ser um soldado de Victor. Pelas vestes, ele era do primeiro batalhão que nos atacou. Sequer o vira com os sete remanescentes, devia ter se escondido antes. Um recruta. Fitei-o com pena e uma repentina vontade de ajudar.

– Por favor, não me machuque. – Ele choramingou, babando.

– Não vou. – Sussurrei. – Não sou um monstro.

Fui erguendo vagarosamente a minha mão. Ele esticou a sua e segurou a minha com confiança, deixando-se guiar para fora do seu esconderijo. O homem tremia a cada raio de luz solar que atingia seu corpo, como se isso pudesse o despedaçar em mil e um pedaços. Ao ganhar um pouco de confiança, parecia que o calor do sol era prazeroso, sensação essa a qual fora privado há muito.

– Parece que a mocinha encontrou mais um. – Um homem da rebelião falou, saindo do escuro manuseando um objeto prateado.

Com um movimento da espada, ele cortou a cabeça do homem-cobra em duas partes. O sangue melou a minha face apavorada e, quando o corpo caiu no chão, o mesmo líquido viscoso escorreu entre os meus dedos dos pés. Meus olhos encheram de lágrimas, mas não conseguia me mexer. Encarava estaticamente a fração decepada daquela cabeça.

Olhei para o rebelde, que limpava o sangue daquele coitado em sua calça, rindo como se fosse um troféu. Um ganido saiu pelos meus lábios entreabertos.

– Idiota! Seu incompetente! – Nathan gritou com o homem. – A situação estava sob controle. Ele estava desarmado.

– General, o senhor disse que era para salvar as duas moças. – O homem estava trépido. – Foi o que eu fiz.

Um vulto sem camisa apareceu na copa da árvore. O homem de uma branquitude doentia mirava os corpos no chão, seu olhos banhados em fúria.

Ele me encarou e viu o meu pavor com a morte. Olhei Thomas rapidamente e vi uma imagem tatuada no seu ombro - uma flor roxa com o centro amarelo e sépalas multicoloridas. Percebendo o que eu observava, ele rotacionou o corpo para esconder o desenho.

– Covarde! – O rastreador xingava o rebelde que matou o homem-cobra.

Thomas se virou e partiu, indo de árvore em árvore. Sua partida anunciava o fim do ataque e meu corpo enfadado, enfim descansou de ignorar sua estafa. Meu joelhos falharam e eu caí inconsciente. A última coisa que ficou foi estar deitada em uma poça viscosa e quente do sangue do homem-cobra.

***

Acordei de supetão na cama de Nathan em Rheyk ao lado do corpo adormecido de Jane. Estava deitada de bruços ali. Luna, Tracy e Aline se assustaram com minha brusca movimentação. Após o pico de adrenalina passar, senti puxadas de dor vindo das minhas costas, percebendo então que estava despida na parte superior.

– Calma, Enny. – Aline colocou uma mão na minha cabeça e outra na base de minhas costas. – Suas queimaduras foram severas. Mesmo cicatrizando rápido, ainda precisa de repouso.

– Onde estão Angel e Nathan? – Minha garganta seca doeu com a tentativa de fala. Pigarrei, tentando amenizar o incômodo.

Tracy trouxe um copo de água que eu ligeiramente ingeri. Usei meu braço para cobrir meus seios e sentei na cama, senti a gaze repleta com um produto pastoso cobrindo onde outrora senti que a camisa de Thomas grudou. Gentilmente girei minha cabeça, procurando alguma camisa para vestir. Aline bufou, batendo a mão contra a testa, em nítido desagrado.

– Eles estão resolvendo problemas grandes. Zero chances de você ir lá desse jeito. – Aline continuou. – Eu não vou deixar!

– Isso é perigoso para sua saúde, Enny. – Tracy continuou quando eu me levantei da cama e peguei uma camisa larga que tinha por cima da cadeira bem trabalhada. – Para, por favor? Não quero te perder, amiga.

Vesti a peça, inalando seu cheiro acolhedor de limpeza. Meu corpo inteiro doía, pedindo solenemente que eu repousasse. Porém, ao olhar minhas mãos e o sangue embaixo de minhas unhas, a fúrias dos últimos momentos de lucidez me tomaram.

– Se vocês não me disserem, eu vou procurar e vai ser bem mais desgastante para mim.

– No Salão de Reunião. – Luna foi vítima de olhares ferozes após revelar. – Ela tem o direito de participar daquela reunião e vocês sabem.

– Obrigada. – Olhei para Jane que repousava serenamente. – Ela está bem? – Aline assentiu com um sorriso carinhoso. – Cuidem dela. Deu o melhor e precisa repousar.

Tomei meu rumo até o Salão de Reuniões. Do lado de fora, podia ver as luzes acessas pelas janelas e claraboias, que deixavam vazar a gritaria das conversas no interior. A exaltação era nítida e conseguia compreender acusações contra a minha pessoa. Ao redor, algumas pessoas observavam espantadas e tentando captar qualquer assunto para fofocarem mais tarde.

"Estou com você, pequena. Faça." A voz de Aliat ressoou em minha mente.

Com esse estímulo puxei abruptamente as portas. Todas as vozes se silenciaram e as cabeças se viraram para encarar a mim. O Salão era quente, estava lotado e o ar carregava o odor de morte e suor. Meu corpo quis fraquejar, mas me forcei a ficar firme.

Encontrei Nathan e Angel mais ao centro e, sentado no fim do salão, General Herquio ao lado de General Alberto, que tinha uma mancha horrorosa no pescoço. A tensão era visível no semblante de todos, pesando o ar daquele ambiente deveras quente. Um homem calvo e obeso deu um passo a frente, destacando-se dos demais.

– Ora, se não é o grande assunto da noite. – Ele escarrou em minha direção. Pelo canto dos olhos, vi Angel segurando Nathan pelo braço. – Nossa maior ameaça.

– Eu? – Na minha mente, Aliat me pedia para ser mais comedida, mas era em vão. – Fale mais.

– Admita, você é filha de Victor com alguma puta, não é? Esses seus poderes são das trevas! – Cruzei meus braços e andei em sua direção com uma expressão séria, enquanto ele ria com deboche. – Você salvou aqueles marcados. Condenou nossa localização e garantiu a identificação do rosto da maior parte de nossas tropas. Deve ser a filha dele. Trabalhar para ele!

– Eu os salvei porque vocês matavam a sangue frio. –  Meu corpo tremia de fúria com a memória daquele ataque.

Uma onda de vaias e xingamentos foi proferidos contra mim. Meus olhos encontravam o de Patcho Herquio. Ele parecia sondar minha reação, como se esperasse para dar um veredicto do meu valor. Contudo, minha atenção foi roubada quando uma lâmina encostou em meu pescoço. Movi sutilmente a cabeça para a direita, encontrando uma mulher de cabelos trançados segurando seu punhal. O semblante dela em fúria.

– Você acha que eles fazem o que conosco? Não seja tola! – Ela me mostrava os caninos. – O General Monteiro vem lhe poupando de muito se acha que eles fazem algo diferente conosco. Nosso sangue é derramado todo santo dia. E nós somos vilões porque queremos justiça?

– Justiça ou vingança? – Retruquei, a provocando.

– Quando os corpos estão empilhados, isso não faz diferença.

Era essa a resposta que eu não queria ouvir. Fechei os olhos e inspirei profundamente, sentindo que Aliat usou os dons do anel para lançar o punhal para longe. Ao abrir as pálpebras, encarei a mulher, que estava surpresa e com medo pela sua vida.

– Eu não sou uma assassina. – Murmurei e comecei a andar até meus dois amigos, falando com força e imponência: – Então vocês assumem? Assumem que estão se tornando a mesma escória que os servos de Victor?

Eles tentaram gritar comigo, me humilhar. Porém, movi minhas mãos rapidamente e gritei, fazendo uma corrente de ar circular pelo ambiente com violência, apagando todas as tochas e afastando os que tentaram se aproximar de mim. Gargalhei em um misto de escárnio e tristeza.

– Sabem o porquê da rebelião está afundando? O povo tem medo de vocês! Se consideram tão melhores, mas se comportam da mesma forma que os marcados! – As palavras gritadas assustaram os mais próximos. – Em Gark, conheci um homem que foi escalpelado e perdeu uma orelha a mando da rebelião. A única coisa que ele me implorou foi para não revelar o nome dele para vocês, para não ser caçado até a morte tal qual Thomas tentou fazer comigo e Jane hoje!

Ofegante, fechava minhas mãos com tanta força que eu podia sentir o sangue dos cortes feitos pelas minhas próprias unhas.

– Então, eu pergunto: quantas mais mutilações e torturas vocês ordenaram em nome de uma causa que vocês já corromperam?! Sendo tão monstruosos quanto aqueles que condenam! Lavando sangue com mais sangue!

Comecei a andar até General Herquio, parando do outro lado da mesa e batendo fortemente. General Alberto se assustou, ficando de pé com a arma em mão, porém o mais velho nem piscou, mantendo um vislumbre de sorriso no canto da boca.

– Victor é o Senhor da Trevas e tomou Rheyk. Mas foram vocês da rebelião que decidiram abandonar a luz. E, se é esse o caminho que escolheram, não contem comigo.

– O que sugere? – Patcho disse em baixa voz. – Mal temos para nos alimentar. Vamos fazer prisioneiros? Para os submeter à morte por inanição? Ou tiramos a comida das nossas crianças para os manter?

– É esse o problema? Suprimentos? – Respondi no mesmo tom e o senhor maneou a cabeça, indicando que seria o principal. – Faça sua lista de exigências e eu garantirei o que precisarmos. Chega de sangue derramado. Essa não é a Rheyk que eu quero reconstruir.

Patcho Herquio se colocou de pé, olhando para mim firmemente, mas erguendo a mão para os demais se calarem. O senhor assentiu e selamos nosso acordo em um aperto de mãos.

– Mãe Damnora não estava tão errada sobre você, não é? – Ele perguntou, sorrindo, em uma voz tão baixa que duvidava que alguém mais tivesse escutado.

– Não faço ideia do que está falando. – Meu sorriso duro denunciava a mentira.

De alguma forma, aquele homem e sua mãe pareciam saber que eu era a Herdeira de Aliat e a Senhora da Luz. Mas, como? Seria por isso que ele sempre parecia me testar? E, se sabia e desconfiava de mim, por que simplesmente não me denunciava aos demais?

Sem mais, virei sobre meus calcanhares e rumei para fora do Salão. Usei o controle do ar para fechar a porta atrás de mim. Os fofoqueiros de plantão, ao encararem meu semblante de poucos amigos, se dispersaram. As vozes dentro, voltaram a ressoar. Comecei a andar de volta a casa de Nathan, mas, no caminho, me entreguei ao cansaço físico e psicológico, caindo de joelhos e chorando copiosamente.

– Enny. – A voz preocupada de Nathan anunciou sua chegada. – O que houve? Sente dor? Consegue se levantar?

Ele se ajoelhou ao meu lado e me abraçou com zelo, tendo cuidado para não tocar nas queimaduras e me amparou por minutos enquanto o choro acalmava.

– Como estão os machucados? Doendo? – Perguntava, acariciando meus cabelos.

– Estão. Mas os poderes do anel estão cicatrizando já. Deve passar logo. – Desvencilhei-me de seu abraço. – Não precisa se preocupar comigo.

O rapaz olhou cada cantinho da minha face. Seus dedos acariciaram um curativo em minha testa que eu só notei a presença agora.

– Eu sempre me preocupo. Pelo que vi, lutou muito bem hoje.

– Tive um bom professor. – Sorri timidamente e me movimentei para tentar ficar de pé. – Acho que preciso me deitar. Me acompanha até a sua casa, a qual eu e Jane monopolizamos?

Nathan concordou, se levantando e me ajudando a fazer o mesmo. Em passos curtos, seguimos o rumo enquanto conversávamos.

– Obrigada por salvar a vida de Jane. Luna me contou que ela criou coragem para falar de Ethan. Jane... Ela mudou após a morte do pai. Sempre foi grossa e um pouco prepotente, mas, quem a conhecia, sabia que ela tinha um bom coração.

– Deve ser algo doloroso... Perder quem ama desse jeito. – Concluí.

– E foi... Depois que desmaiou ao receber a notícia da morte de Ethan, Jane nunca voltou ao normal. Sempre fechada, triste e não sorria mais. Se trancou para si. Eu e Angel tentamos a ajudar no começo... Sabe... Existem batalhas que só a própria pessoa pode lutar por si.

Nathan parecia imerso em suas memórias com um traço de pena em meio ao carinho.

– Sabe o que é mais louco? A última conversa que eu tive com Ethan, ele pediu que eu cuidasse da filha e de JP. Realmente gostava do senhor Lopes, ele me tratava como família... Acho que me mantive naquele namoro muito mais pela minha promessa do que por qualquer outra coisa...

Ele deu uma risada anasalada, seus olhos finalmente me encontrando. Paramos um de frente ao outros, relativamente próximos de sua casa.

– Por não entender que cuidar dela não significava que eu teria que estar com ela, continuei um namoro que nos fazia mais mal que bem. No fim, não estou cumprindo muito bem minha palavra e, para piorar, sou o único a se culpar por isso.

– Nathan, é nítido que ela confia em você para a proteger. – Lembrei da última vez que os vi na casa de tia Lúcia. – Foi você quem ela chamou para a ajudar quando JP surtou com a mãe, não foi? Jane se sente segura contigo por perto, tanto quanto as outras garotas.

– E você?

Ele olhava no fundo dos meus olhos e acariciava minha mão. Aquela conversar ia para outro rumo se eu não intervisse.

– Aqueles pássaros que apareceram são...? – Perguntei após segundos.

– Hurmias. – Nathan riu, notando minha estratégia e voltando a andar. – Sua saliva é capaz de derreter o material mais rígido do universo, mas não ossos. Roubamos os ovos dos ninhos e criamos as aves para nos servirem. Elas, se não criadas com bastante respeito, matam facilmente seus tutores. São agressivas.

– Engraçado... – Bufei. – Tanto respeito com pássaros e tão pouco com a vida de outros humanos.

Senti o corpo do meu protetor gelar, acariciando o projeto de barba que ele tinha nascendo, e começou a falar:

– C-como era o o homem em Gark? – Sua pergunta foi dita assim que entramos em sua casa.

– Ah! Enny contou. – Tracy parecia aliviada, me beijando a bochecha. – Ele tinha umas tatuagens entranhas e a parte branca do olho era vermelha. Bizarro! Lembram o nome dele? Ma-ma...

Fiquei calada propositalmente e vi que Luna fez o mesmo, mas Tracy não ia conseguir conter o ímpeto de fofocar, sabendo que Nathan era um porto seguro, nosso amigo.

– Ele e a filha deram nome falso. – Luna, deveras agitada, se intrometeu. – Não sabemos o verdadeiro. Tracy, Aline, me acompanham até o refeitório? Estou faminta. Enny e Nathan podem cuidar de Jane, certo?

As duas garotas foram quase postas para fora pela ruiva antes que alguém pudesse sequer discordar dela. Caminhei até a cama, sentando-me nela. Porém, antes de deitar, reparei na rigidez e semblante sério do rapaz.

– Nate, relaxa. Naquele salão, eu falei da rebelião, não de você. – Tentei o tranquilizar com um sorriso, mas foi ineficaz, então fui até ele, falando: – Sei que jamais faria algo assim. Você é bom. Bem... Idiota e imaturo quando o assunto é garotas. Mas seu coração é bom. Isso foi umas principais coisas que me fez gostar de ti.

Ao notar que falei demais, senti meu rosto corar. Porém o semblante do rapaz se agravou em sua rigidez. Sem dizer qualquer coisa, ele foi até Jane e checou os batimentos e a respiração dela. Baixei a vista, um pouco enciumada - verdade seja dita. Seria a demonstração do meu afeto que o deixou tão sisudo?

– Você a ama, não é? – A pergunta saiu temerosa pela resposta.

– Como amo cada uma das outras quatro. – Ele a olhava, mas não tardou em me mirar. – Eu te disse logo no começo, formamos uma família aqui. Porém, acho que sua pergunta correta seria: você pretende voltar com ela? – Nathan riu ao me ver engolindo em seco. – Não vou.

Uma tontura me atingiu e eu procurei a cadeira para me sentar. O rapaz pegou um copo d'água e uma barrinha de cereal, não me dando margem para negar.

– Patcho vai mandar uma lista de exigências para as mudanças que eu reclamei no salão. Me ajuda?

– Não é algo que precise pedir, Enny. Estarei sempre contigo para o que precisar.

– Obrigada. – Engoli em seco, as lágrimas regressando aos olhos. – Até as coisas mudarem... Eu não quero voltar para cá. Ainda sinto o textura do sangue do homem-cobra em mim. Naquele salão era esse o único cheiro que eu sentia. Preciso esquecer isso antes de pisar aqui de novo.

– Tudo bem. A gente vai pensar em uma logística para cumprirmos as missões e te deixar confortável. Só quero que fique bem, tá?

Assenti, grata, e Nathan pegou minha mão, a beijando em sinal de afago. Por mais que eu quisesse dizer que não havia uma conotação romântica, o simples contato de sua pele com a minha me causava um frenesi. Respirei fundo, procurando uma forma de mudar de assunto até que uma memória veio a mim.

– Thomas... Ele tinha uma tatuagem de uma flor no ombro... O que poderia ser?

Nathan suspirou. Do nada, ele pegou a blusa e a retirou, exibindo a tatuagem nas costelas similar a de Thomas, só que menos desbotada. Eu estiquei inconscientemente a minha mão e toquei onde o desenho estava. Ao me atentar ao que tinha feito, recuei a mão, sem querer passando os dedos em seu abdômen, e corei. Através do cansaço, notei um meio sorriso surgir em Nathan. Ele estava satisfeito com meu toque.

Porém, logo regressou a um semblante mais sério.

– É a Flor da Rebelião, nosso símbolo. – Ele suspirou novamente. – Thomas era um dos nossos e nos traiu.

***

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