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Capítulo 11 - A fazenda

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Acordei exasperada. Ao olhar pela janela, constatei que o sol nascia. Levantei-me e risquei mais um dia no calendário. Era uma segunda-feira do mês de julho. Fui ao banheiro lavar o rosto, escovar os dentes e tirar o curativo. Ao olhar a ferida, me assustei com o quanto ela estava melhor. A pomada era realmente boa... Vesti-me e fui ao quarto de Nathan para aplicar a pomada e enfaixar.

Ao sair do seu quarto, paralisei por um momento, olhando para o local onde estivemos ontem. A simples memória fez meus pelos eriçarem. Alisei meu braço e sacudi a cabeça para retirar aquela imagem e sensação de minha pele.

Tomei a chave antiga em minhas mãos e fui até o quarto secreto. Uma volta apenas e eu escutei o clique de abertura da fechadura. Respirei fundo e entrei. Tomei um susto ao ver que a senhora já me esperava lá dentro, sentada em seu banco e com o livro antigo em mãos. Percebendo minha presença, ela guardou o mesmo em seu pedestal e me cumprimentou com um gesto de cabeça. A mesma postura sóbria e imponente de ontem.

– Bom dia, pequena. Bem, como prometido, estou aqui. O que você quer saber?

Seus olhos e sorriso no canto da boca me traziam uma personalidade mais desafiadora e poderosa. Definitivamente alguém que eu não queria ter como inimiga.

– Aliat foi real, certo? – Ela riu da minha pergunta. Podia até ouvir um "sua bobinha" no vibrar do riso.

– Aline me contou da conversa de ontem. – Ela segurou minhas mãos nas suas. – A pior coisa que pode acontecer a um povo é esquecer seu passado. E isso aconteceu com Rheyk. Aliat existiu, mas foi brutalmente assassinada por Victor, por causa do desejo dele pela Coroa. Após sua morte, o reino inteiro caiu em depressão. Afinal, como rainha, era dela a energia vital que mantinha aquele universo.

– Essa história está nesse livro?

– Não só. – Ela ajeitou o óculo, olhos pensativos imersos em um passado. – Estou envolvida com Rheyk há mais tempo do que imagina. Ouvi várias fábulas e aprendi a diferenciar mitos de verdades. Quer um exemplo? É verdade que Victor mandou queimar tudo público que contasse a história dela, que desse esperança ao povo, reduzindo-a a uma lenda contada ao redor da fogueira. Sem rosto, sem identidade... Uma mera ilusão. Porém, não acredito que tenha se desfeito realmente de tudo que a pertencia. O vestido que você usava ontem... Era seda. Nobre. E naquele castelo... De quem mais seria?

Percebi que em frente ao seu banco tinha a manta de Victor, com a qual ele me cobrira ontem. Era de cor musgo e tinha um brasão dourado e preto em formato de uma ave. Fui até o objeto e o tomei em minhas mãos. Aproveitei e lhe devolvi a chave.

Pole cashomeron o topínir capon arb pole aliat pole henny ahim copetiko.

As palavras gravadas na chave atravessaram minha boca involuntariamente, ditas em uma cadência e sonoridade não familiares para mim. Senti como se a voz sequer fosse minha, marcada por um sotaque pesado com um R mais anasalado e um N estalado. Em choque, pus os dedos sobre os lábios.

– Perfeito! Nunca escutei um novato falar com tanta maestria a língua Rheykfordiana. Sabe o que isso significa, pequena? – Seus olhos monitoravam cada expressão corporal minha, insatisfeitos ao captar o meu negar. – "A Senhora da Luz é a aliança entre a vida e a morte".

Fui invadida pela memória do rompante de fúria de Victor, dizendo que Aliat tinha planejado tudo, repetindo as últimas palavras, dizendo que eu era uma peça na jogada dela. O que ele poderia estar querendo dizer com isso? 

– Há anos, existem rumores que A Senhora da Luz voltará para vingar o estrago que o o Senhor das Trevas causou a Rheyk.

– Mortos não voltam. – Meu tom seco deixava clara a incredulidade. Ou até pior, meu medo do que essa volta pudesse significar.

– A Senhora da Luz é um cargo. A pessoa que o possuía morreu, mas é natural a função renascer. – Sua voz deixava claro que, para aquela, essa informação era óbvia. – Sem uma das forças tríades que regem essa dimensão, Rheyk afundaria na inexistência.

– Não faz sentido. Você disse que a Senhora da Luz morreu há tempos. Esse universo já está sem uma das forças.

No seu semblante tranquilo, sabia que essa pergunta já esteve em sua mente outrora. Ela caminhou lentamente até o livro e começou a folhear.

– Sabia que até hoje não consegui ler todo esse livro? Ele foi escrito na língua Rheykfordiana. O dialeto se tornou praticamente extinto nos 400 anos desde que Rheyk entrou em contato com esta Terra. Todo dia, venho estudar e traduzir um pouco mais. Estou nessa missão há mais de 10 anos. É, no mínimo, exaustivo. Mas isso me fez a terráquea que mais sabe sobre Rheyk.

– Do que vale todo esse conhecimento se você não ajuda a quem está lhe pedindo socorro? – Minha alfinetada lhe tirou uma risada. – Eu estou presa e preciso de você, tia Lúcia. O que a senhora está me escondendo?

– Por que o cargo só pode ser ocupado por uma pessoa? Por que não um objeto? Tão distante de Rheyk e de Victor que não poderia ser corrompido.

– Meu anel... – Minha mente começou a trabalhar desenovelando teorias que falei sem sequer pensar direito. – Então... Esses surtos de poderes realmente não são meus! Sou como um receptáculo. Um objeto.

Os olhos úmidos faziam esforço para conter as lágrimas de terror frente às conclusões que minha linha de raciocínio levava. 

– Victor disse que Aliat permitiu minha vinda para cá. – Falei exasperada. – O que isso significa? Sempre achei que tinha sido ele, por causa de Petrik. Mas e se foi Aliat? Chamando o anel, chamando a Senhora da Luz? E, se ela estiver me usando para lutar? Para ser a carcaça que vai lutar a guerra que ela perdeu?

– Quebrar o véu intacto para a Terra Central requer muita energia. Talvez Aliat tenha agido do seu lado, enfraquecendo o equilíbrio para a romper no momento certo. Precisaria de meses ou até anos. Mas é possível...

Meses? As minhas visões tinham começado meses antes de Petrik invadir meu mundo. Então foi isso? Aliat e esse anel destruíram pouco a pouco a minha sanidade para me jogar nesse novo mundo para terminar uma guerra dela? E por q...

– Por que só aconteceu essa droga agora? Essa joia está há três gerações na minha família. 

– Pequena, eu poderia lhe dizer minhas teorias. Mas seria apenas lhe torturar com hipóteses. – Ela colocou uma mecha do meu cabelo atrás de minha orelha. – Há somente duas pessoas que sabem com certeza essa resposta. Victor e Aliat.

Aliat era um mistério para mim. Aparecia quando bem queria e me deixava mais confusa a cada interação. Ao menos, nesse sentido, Victor era uma opção melhor. Mesmo com sua loucura, eu conseguia avançar, trilhar um caminho para descobrir o que precisava fazer para voltar para casa. É, cada vez mais me parece factível ter que o ver novamente, por mais assustadora que essa ideia possa ser.

– E sobre outras joias? Existe algum registro? 

Ela fez uma negativa com a cabeça e pediu desculpas. A senhora pegou a manta de Victor, dobrou e me entregou.

– Me responda uma dúvida, pequena. Por que Victor lhe teve tanto... Apreço? Ele disse algo?

– Vai dizer que não sabe? – Sorri com escárnio. – Sim, ele me ofereceu aliança. Bem... Essa ferida deixa bem claro de qual lado eu decidi ficar. Sei que não me conhecem há muito tempo, mas uma das poucas qualidades que eu tenho é a lealdade. Só peço... Me ajude a descobrir como posso voltar para casa.

A senhora ponderou bastante. Por fim, ela me deu um sorriso caloroso.

– Eu vou procurar todas as informações que puder para lhe ajudar, pequena. Inclusive, lhe ensinarei um pouco da língua Rheykfordiana. Mas, por favor, lembre-se do sigilo deste quarto. Os meninos precisam amadurecer ainda, e prefiro que certas verdades eles nunca precisem saber, por proteção.

– E quem me protege no final dessa história?

– Se você for realmente o receptáculo do poder do anel, ninguém pode lhe salvar além de você mesma. Salvar a si e a Rheyk. Essa será a sua responsabilidade para com este novo mundo.

Ela me beijou na bochecha e abriu a porta.

– Venha, farei umas panquecas para nós. Como está seu braço? Erick ontem estava perguntando por você, disse que vinha te visitar.

Ao sair daquele quarto, era quase como se outra personalidade assumisse a pessoa de Tia Lúcia. Ela se tornou quase uma senhorinha que passa o dia fazendo doces para os netos e que tinha paixão por jogar baralho. Há cinco minutos, teria medo de a enfrentar em um duelo e ser morta por algum dom oculto que ela viesse a ter.

Mas ela era assim... O tipo de pessoa que você desconfia cem por cento, entretanto não consegue deixar de gostar. Sabia que me escondia coisas, tanto quanto tinha certeza que se eu precisasse, ela estaria comigo.

Como Tia Lúcia disse, Erick apareceu para me visitar. Ficamos conversando, junto da minha benfeitora. Por volta das duas da tarde, a senhora desceu para o restaurante e disse que esperava Erick às 16, sem atraso. Eu e ele assistimos a um filme antigo sobre vampiros porque o garoto gostava. Péssimo gosto! Oras, o que é um vampiro? Um morto-vivo que bebe sangue e tem medo de alho, estacas de madeira e do sol. Soa ridículo uma criatura tão poderosa ter tantas fraquezas fúteis. Patético, no mínimo.

– Nossa! Olha a hora! – Comentei de forma demasiadamente agitada quando notei que ele estava me olhando intensamente. – Quinze para as quatro.

O rapaz pigarreou e ajeitando o cabelo, pegando a louça suja.

– É melhor eu ir mesmo. Vou dar só uma arrumada aqui. Não se levante. Você está machucada. Quero que melhore logo. Sinto sua falta no restaurante. – Ele sempre tinha um sorriso amigável para mim. A campainha tocou enquanto ele lavava os copos. – Descanso acabou. Vai abrir. A casa não é minha.

– E nem minha também. – Ri de maneira traquina ao vê-lo revirar os olhos.

Gemi, lamentando ter que me levantar. Ao abrir a porta, a primeira pessoa que apareceu foi Jane – com os olhos inchados de obviamente chorar –, seguida por Luna, Aline, Tracy e um Nathan, claramente de ressaca. Exalava álcool. Luna e Tracy trocaram olhares quando viram Erick na cozinha, e ele enxugou as mãos para vir falar com elas.

– Oi, pessoal! Não é porque vocês chegaram, não, mas tenho que ir. Melhoras, catástrofe. – Ele me deu um beijo na bochecha. 

– Catástrofe é sua vida amorosa. – Estirei a língua enquanto ele dava um beijo na bochecha de Aline.

– Muito engraçado. A suja falando do mal lavado. – Ele andava de costas e acabou batendo em um Nathan que fez questão de não desviar. – Desculpa, cara. 

Assim que os cinco adolescentes entraram, fechei a porta. Ao virar sob os calcanhares, notei que Nathan estava fechando a porta de seu quarto enquanto Aline consolava uma Jane no sofá e Tracy e Luna surtavam de emoção, olhando da porta para mim. 

– O que... – Me interrompi ao ver o olhar duro de Aline que parecia uma mão tapando minha boca.

Tracy, com seu espírito fofoqueiro, me chamou para meu quarto com o pretexto de pegar de volta uma roupa emprestada para tomar banho. No percurso, ela fez sinal para Luna, que nos seguiu – outra fofoqueira. Assim que a loirinha trancou minha porta, falou:

– Eu te disse! – Ela olhou para mim como se estivesse revoltada.

– Tracy, não começa. Vai fofocar já? Deus está vendo. – Luna, apesar da fala repressiva, sorria.

– Depois pede perdão a Deus por nós duas que eu sei que você quer falar também. – Ela sorriu para amiga. – Enny, ainda bem que você não foi hoje. Que papelão! Foi gritaria, choro... – Eu tentei desconversar. – Escuta, guria! A gente encontrou Nathan em um beco, podre de bêbado. Jane teve que dar um banho nele.

Senti minhas bochechas corarem e um desconforto no peito com essa informação. Não soube dizer se era vergonha ou ciúmes. Será que já caminhavam para um regresso do namoro?

– Então a gente começou a ouvir uma gritaria e fomos ver. Eram os dois. Ele lá... – Tracy estava animada demais contando a história.

Mas não tanto quanto Luna, acrescentando mudamente a palavra "peladão", como se fosse um pecado falar em alta voz. Revirei os olhos, tentando manter o foco em Tracy.

– Dizendo que não queria nada dela. E eu tinha razão no que te disse ontem...

– Como assim? – Luna ficou por um segundo confusa.

Enquanto isso, Tracy pegava uma muda de roupa limpa e se despia sem qualquer vergonha.

– Eu disse pra Enny que ele ia pra Rheyk pegar alguma rapariga. Dito e feito. Ele jogou na cara de Jane que tava com outras nos braços ontem, disse que não se sentia tão bem com alguém fazia tempo... Ai foi quando virou circo. Ela usou os poderes dela nele. Tivemos que separar os dois. Foi baixaria! Ainda bem que Aline ficou responsável por o vestir. Deus me livre!

– Duvido fazerem essa palhaçada na frente de Angel. – Minha voz fria foi por saber que ele estava com outra em Rheyk e eu, um tonta, pensava direto nele.

Tracy não me escutou, já tinha fechado a porta do banheiro para tomar banho. Luna se sentou na minha frente e perguntou qual era da minha relação com Erick. Simplesmente neguei, e ela perguntou se eu estava interessada em outra pessoa. Neguei com demasiada rapidez e ênfase, deixando bem claro a mentira. A ruivinha me cubou de cima a baixo e aos poucos seu semblante foi mudando, entendendo a verdade não dita. 

– Meu Deus! Você e...? Foi contigo? Não! – A incredulidade tomando seu sussurro. Eu fiz um "shii" em desespero. – Como foi...? Quer saber? Não importa. Cai fora dessa. Eles terminam e voltam direto.

– Não ficamos. Mas foi quase... Ele disse que se apaixonou por mim. – Foi a única coisa que fui capaz de dizer. Precisava de ajuda. Luna abriu a boca, a resposta óbvia parecendo travar em sua língua.

– Você gosta dele? – Dei de ombros pra sua pergunta. – Garota, você tá numa fria. Não sei se Nate é babaca como homem... Mas se lembre que as pessoas mentem para terem o que quer...

Luna se calou com o desligar do chuveiro. Pedi sigilo, e ela concordou sem hesitar. Nós três saímos do quarto e fomos para sala, ficar com Aline e Jane. A garota de cabelo curto pediu para ver meu curativo e me sugeriu trocar.

– O kit tá no banheiro de Nathan... – Respondi. A simples menção do nome fez Jane encolher.

– Então espera a gente ir embora. – Aline estava sem qualquer paciência. – Chega de drama por hoje. Angel merece um prêmio.

– Ele me trai e você fica do lado dele? – Era tangível a mágoa de Jane. Minha conversa com ela ontem me fez ter pena da sua atual fragilidade e, claro, culpa. – Esperado, sempre foi mais amiga dele do que minha.

– Te preserva, Jane. – Tracy interveio, sem qualquer filtro. – Ele te dispensou e, na real, entendo sua dor de cotovelo. Mas é a vida! Daí, ele age feito um escroto, vai pra Rheyk beber e pegar geral e a trouxa aqui decide dar um banho no cara? Cadê o amor próprio? 

O rápido olhar acusatório que surgiu em Aline me passou a percepção que ela não comprava a conversa da pobre Jane. Foi tão fugaz que me questionei se tinha sido real. Bem, verdade seja dita, Aline era muito boa em esconder suas reais opiniões para evitar conflito.

– E só trai quem está junto. – Luna parecia receosa ao acrescentar, tentando mediar a situação na sua cabeça. Ela não conseguia me olhar. – Vocês são ambos solteiros.

– Foi cedo? Sim. Mas vamos dar a César o que é de César. Não traiu. Está achando ruim? Dá o troco! Não é você que diz que não falta garotos atrás de você?  – Aline, apesar do usual tom prático, parecia estar propositalmente alfinetando Jane. – Fica com Felipe. Ele já te ofereceu uma vez de ficarem secretamente em um dos términos, não foi? Vá lá, pegue o melhor amigo de Nathan, lave seu ego.

– Super apoio. – Tracy falou animada e continuou quase que suspirando. – Mais bonito que Nathan, com aquele sorriso de cara safado que só com um beijo coloca você na terapia por uns três meses.

Jane, apesar de saber que as amigas falavam com boas intenções, não controlava uma ou duas lágrimas que, por vezes, escorriam pelo seu rosto. Aline, olhando o relógio, avisou que precisava ir para o trabalho. Ela pediu para eu avisar a Nathan que ele ia fazer o fechamento sozinho hoje. As outras três se levantaram, dizendo que iriam para casa, descansar para a aula que começaria no próximo dia. Apenas Luna veio me abraçar para se despedir, aproveitando para sussurrar em meu ouvido: 

– Conversa com ele. 

Assim que as meninas saíram, decidi ir dar logo o recado de Aline. Bati duas vezes e, sem esperar qualquer autorização, entrei. Nathan estava de banho tomado, o seu perfume tomando o ambiente, e arrumava uma mochila com algumas armas. Assim que passei a mensagem de Aline, ele tirou o relógio de ponteiro e marcou o temporizado para daqui a quatro horas e meia. Fui ao seu  banheiro, peguei o kit e troquei rapidamente o curativo. Apoiei-me na soleira da porta no caminho de saída, de braços cruzados e o encarando com uma sutil carranca.

– As meninas já te contaram de hoje... Quem foi?

– Tracy. – Ele arqueou as sobrancelhas com minha resposta, colocando a mochila nas costas. – Espero que tenha curtido muito sua noite. Não acredito que fiquei preocupada.

Saí do quarto, deixando a porta aberta atrás de mim. Ele me seguiu, segurando meus ombros e me rodando em meu eixo para o encarar. Havia contentamento em seu olhar.

– Isso é ciúmes? – Me soltei dele com brutalidade e sequer ousei responder. – Aliás, não vi você preocupada. Parecia bem ocupada com o leso do Erick. Atrapalhamos algo?

– Isso é ciúmes? – Dei o troco, propositalmente não respondendo sua pergunta. – Para onde você vai?

– Resolver uma coisa na propriedade de um conhecido perto da cidade rural de Gomno, em Rheyk. – Assim que ouvi sua resposta, peguei meu par de tênis ao lado da porta e o calcei. – O que você está fazendo?

– Dificultando sua vida. – De pé, bati as palmas uma única vez. – Vamos?

– Você não vai comigo, Enny. Está ferida. E eu preciso desopilar um pouco. Ontem...

– Parece que está fugindo de mim. Então é simples. Ou você me leva contigo e eu tenho uma chance de ficar segura. Ou te sigo, caio em uma armadilha e viro lanchinho de Petrik. Sua escolha.

Ele riu com malícia, curvou-se sobre mim e ambas as suas mãos repousaram em meu pescoço, aproximando seus lábios da minha orelha para dizer, quase como um rosnado baixo:

– Tem uma terceira opção. Eu posso te amarrar na cama e só te soltar quando voltar. Confie em mim, Enny Scott, sou muito bom com cordas.

Arfei, sentindo o rubor ascender à face. Porém, não recuei e, quando ele voltou a postura ereta, o encarei com firmeza. Nathan suspirou com desistência e tirou uma adaga para me entregar.

– Já te disseram que você é cabeça-dura? Agora, só fale quando eu autorizar.

***

Tive que sair praticamente escondida com ele, para que as meninas não descobrissem e o repreendessem. Nathan me guiou para um portão diferente daquele que usamos ontem para voltar. Entramos em uma floresta densa com característica que me lembrava uma floresta temperada, repleta de árvores que me recordavam pinheiros.

Ele fez sinal para que eu me mantivesse em silêncio enquanto caminhávamos. Meia hora depois, chegamos em um pasto com uma casa de madeira logo atrás. Fomos até a residência, onde um homem calvo, magérrimo e de pomo de adão saliente morava com suas 3 filhas. A mais velha tinha o corpo torto com as mãos atrofiadas e grunhia no lugar de falar. As outras duas cuidavam dela com carinho, apesar da secura em suas palavras. Não podia julgar, vidas difíceis forjam pessoas seca; ou é isso que ouvi falar.

Nathan me apresentou como uma colega de farda em treinamento e o senhor limpou a mão na calça desgastada antes de me ofertar para uma saudação. Os quatro membros daquela família pareceram gratos ao ver o General, ofertando a nós dois o melhor do pouco que tinham para si. 

– Velho Elm, não se preocupe conosco. Comemos bem na Rebelião. Recebi sua mensagem. Qual foi o problema? 

Com um olhar, o senhor ordenou para as duas mais novas levarem a irmã para um dos dois quartos do recinto. Assim que elas saíram, o ancião se debruçou sobre a mesa, seu corpo tomando ângulos doentios que projetavam seus ossos, e falou como quem conta um segredo:

– Nathan, uma tragédia! Uma besta das montanha comeu metade dos filhote du rebanho. Num sei o que faço mais. Logo logo num tenho carne pa enviar nem pa Victor. Ai cê já viu. Vão querer levar minhas menina como pagamento das taxa. Já te devo muito, eu sei. Mai é um pedido de um pai desesperado.

Nathan segurou a mão do homem e a apertou com zelo e um sorriso na face.

– Hoje não posso ficar até muito tarde. Mas garanto que virei até resolver seu problema, Velho Elm.

E foi assim que nós dois acabamos sentados com apenas a luz da lua e das estrelas sobre nossas cabeças e um abrigo de galhos e folhas secas nos escondendo na margem da floresta. A cidade de Gomno era bem distante da cidade de Rheyk e isso parecia fazer com que as sequelas das mazelas criadas por Victor fossem amenas. O cheiro de enxofre era muito sutil e a leve neblina não tinha a típica tonalidade avermelhada, mantendo a cor esbranquiçada tão comum. Vendo este mundo assim, fez-me crer que sem o vilão, talvez Rheyk fosse, de fato, um lugar incrível.

Nathan me entregou um cantil. Com receio, bebi, notando que era o mesmo líquido que Aline me trouxe ontem na enfermaria da rebelião. Quase que imediatamente, meu estômago, que roncava, se silenciou, como se eu estivesse satisfeita após uma farta refeição.

– O Velho Elm. Como o conheceu? – Perguntei enquanto lhe entregava o cantil e o vi bebericar antes de me responder.

Nathan ponderou se falaria ou não, sentando-se de costas para mim. 

– Um dia, vim procurar uma... Amiga desaparecida na casa da família dela. Um bando de escroto que a vendeu quando era uma criança para o bordel da Madame Kia. Não esperava a encontrar, mas era um dos únicos locais que ainda não tinha procurado. Assim que cheguei lá, encontrei Genevive, a filha mais velha de Elm, acorrentada que nem um animal... 

– O que você fez? – Mordia meu lábio, reconhecendo o lado mais sombrio de Nathan.

– Nada que me orgulhe, mas, também, nada que me arrependa. – Ele suspirou, deixando claro que não entraria em detalhes. – Descobri quem era a família de Genevive e a trouxe para casa. Conheci o velho Elm e, há mais de dois anos, temos uma parceria de suprimentos em troca de proteção.

Fiquei em silêncio sem saber o que fazer ou dizer. Há mais de dois anos... Ele tinha minha idade e já vivia com tanta responsabilidade e, pela sombra em seu olhar, um passado carregado de mágoas. Queria poder dizer as palavras certas e aliviar o peso em seus ombros. 

– Estamos aqui. – Ele coçava o nariz, fungando. – O que tanto você quer conversar?

Essa súbita mudança de assunto fez, instantaneamente, uma raiva se instaurar em meu peito ao lembrar do que Tracy me contou e, consequentemente, trazendo sarcasmo à minha voz.

– Se divertiu muito em Rheyk? Pelo que contou a Jane, foi bem quente a noite. – Peguei algumas pedrinhas e comecei a atirar, olhando para qualquer direção, exceto a dele.

O seu riso lhe escapou pelo nariz e percebi, pelo canto dos olhos, que o rapaz também recusava a me mirar.

– Era de você que eu estava falando. – Seu maxilar travava e relaxava de maneira compulsiva. – Acho que seu ponto de vista deve ter sido outro, já que me assumiu como uma posse de outra pessoa...

– Quantas vezes vocês já reataram, hein? Com quantas garotas você já ficou nesses intervalos de namoro? É isso que eu seria para você, não é? Só mais uma na sua lista. Só mais uma para fazer ciúmes nela. – Nathan me encarou com uma triste surpresa em sua face. 

– Droga, Enny. Claro que não! Eu te disse ontem, eu gosto de você. Eu quero você. – Ele desviou o olhar, aparentemente constrangido. Um semblante de tristeza o tomou quando ele baixou a cabeça, fincando repetidas vezes seu canivete no solo. – Falou tanto sobre minha falta de confiança ontem, mas foi você quem tremeu de medo quando cheguei perto. O que achou que eu fosse fazer? Te forçar a algo?

Ele riu com um pesaroso escárnio. Em parte, fiquei triste por o deixar assim, a verdade não poderia ser mais oposta. Querendo me justificar, eu disse:

– Nathan, jamais pensaria isso de você. Estava nervosa. Claro! Por causa de Jane e do que as meninas falariam se soubessem. Mas, principalmente, foi porque seria meu primeiro beijo, não tinha ideia do que fazer, e... Porque eu percebi que gosto de...

Calei-me ao sentir um fungar animalesco em minhas costas, na altura do meu pescoço. Era como se pedras de gelo corressem pelas minhas veias. Alfinetadas de pânico na nuca deixavam evidente o risco eminente da presença atrás. Meu ofegar chamou a atenção de Nathan, que lentamente se colocou de pé, cada movimento milimetricamente calculado, me indicando que o perigo que eu não via era real.

– Enny, tem uma raposa da montanha atrás de você. Se vire lentamente para ela, a encare e se afaste sem desviar o olhar. – Sua voz era calma e baixa. – Preciso de uma distância segura para a abater sem colocar você em perigo.

Fiz a primeira parte como ele mandou. Assim que vi o animal, meu sangue fugiu de tal forma que perdi a sensibilidade das pernas. Era enorme! Sob quatro patas, ele já era maior que eu. A pelagem branca lembrava uma raposa-do-ártico, mas seu focinho negro era largo como uma onça. Os seus olhos inteiramente amarelos encontraram meu curativo e o animal aproximou seu nariz de lá, farejando possivelmente o sangue seco.

Então, fui puxada para trás de forma tão abrupta que caí e Nathan entrou na minha frente, lançando uma flecha com uma balestra no peito do animal que, ferido, correu para dentro da escuridão, grunhindo. Após o silêncio nos cobrir, o rapaz largou a arma e me ergueu sem qualquer esforço, abraçando-me com urgência. Retribuí com toda força que tinha em meu corpo, deixando algumas lágrimas de medo caírem. Ele, então, ajeitou a postura, afastando-se sutilmente de mim.

– Bom saber que minha protegida realmente gosta de mim. – A malícia em sua zombaria me fez corar. Em resposta, dei um grande passo para trás.

– Nate... Não consegue ver que só vamos nos magoar? Eventualmente, eu irei embora.

Ele mordeu os lábios, suprimindo um sorriso amargo. Suas mãos alisaram sua barba a fazer enquanto o rapaz parecia reunir coragem para dizer o que realmente passava em sua mente.

– Tá. E daí? Sua estadia aqui pode durar mais um mês, um ano ou uma vida. Se quiser, eu posso te esperar até que mude de ideia e nos dê uma chance nesse meio tempo. Mas, quanto tempo de nós você está disposta a perder, Enny?

Minha boca se abriu e fechou sucessivas vezes, sem conseguir achar uma resposta. Definitivamente não esperava por aquelas palavras. Ele me esperaria. Isso deve significar algo a mais além de um beijo casual, não é? Ou estaria me iludindo? Era difícil demais pensar corretamente estando inebriada pelo cheiro de seu perfume.

Por fim, acabei balançando positivamente minha cabeça e Nathan me conhecia tão bem que entendeu perfeitamente o que eu mudamente dizia. Agora eu não queria nada além dele. Meu coração dançava seu próprio samba, cada célula do meu corpo parecia atraída por aquele rapaz e minha razão desfalecia frente àquela íris verde como as florestas de Rheyk. 

Dei um passo mais perto dele e alisei seu rosto. As mãos dele cobriram as minhas e, girando meu pulso, ele encontrou a marca remanescente de quando encontramos Katerine.

– A cicatriz está quase sumindo. – Ele beijou o local e depois segurou minha mão em sua bochecha, fechando os olhos com deleite ao contato de nossas peles. – Enny, você nunca beijou? Quer que eu te mostre como é?

Só tive forças para murmurar um quase inaudível "sim". Meu peito subia e descia com força, tentando inutilmente reequilibrar a razão. Nathan mandou que eu fechasse meus olhos, retirou minha mão de seu rosto e a colocou ao lado do meu corpo. Logo depois, seus dedos velozes tiraram meu cabelo do meu rosto e, com a mão direita, ele segurou, com um pouco de força, as mechas para trás, fazendo com que eu erguesse minha cabeça em sua direção. Me ouvi arfar com esse toque e pude escutar seu sutil riso contido em resposta.

Enquanto isso, a sua mão esquerda descia pelo meu pescoço, passando pela clavícula – seus dedos acariciando cada centímetro de pele tocada –, traçando caminho pelo meu braço até minha mão, local onde ele entrelaçou nossos dedos com força. Seu toque era tão gentil e cuidadoso que, quando passou por cima do curativo, não teve qualquer dor. Na verdade, me senti em êxtase, tomada por uma sensação de zelo. Então, pude sentir seus lábios oscularem minha bochecha e, logo em seguida, irem percorrendo sutilmente a minha pele, roçando os contra os meus, mas sem me beijar.

Entreabri minha boca, ansiando por Nathan, porém ele me torturou, se afastando, beijando minha outra bochecha e regressando à provocação, mordiscando sutilmente meu lábio inferior. Eu teria avançado e consumado o ato, mas aquela mão em meu cabelo era firme – um aviso singelo que existia uma outra face dele tomada pela luxúria por debaixo de toda aquela ternura.

Sua mão soltou a minha e apertou meu quadril, puxando-me firmemente para si. Somente então, ele me beijou. Havia uma urgência no seu toque. Puxei-o pra mim com o mesmo desejo, meus dedos se agarrando ao tecido de sua camisa cinza, tentando trazer seu corpo cada vez mais para mim, como se pudéssemos nos fundir. Senti o frenesi de sua língua contra a minha, os leves chupões e mordiscadas em meus lábios, seu corpo pressionando o meu, minha mão em seu cabelo, o bagunçando... O tempo parecia ter parado para nós ali ou até se dilatado frente àquela cena. Não conseguia imaginar algo mais perfeito.

Mas, infelizmente, o temporizador tocou. Ele abriu um sorriso sem desgrudar sua boca da minha e, após dar um selinho – e apertar meu corpo ao seu com um abraço –, se afastou para pegar o relógio na mochila, desativando o alarme. Quase caí nesse momento, percebendo que minhas pernas estavam bambas e meu rosto formigava, certeza estar vermelha.

– Hora de irmos. Vamos nos despedir do Velho Elm. – Nathan me olhou de cima a baixo, parando ao encontrar meus olhos e dando um sorriso que nunca tinha visto vindo dele. Timidez. – Sabe... Eu posso colocar mais cinco minutos. O que acha? Ou não curtiu muito a experiência do primeiro beijo?

– Você acha que cinco minutos vai bastar? – Minha pergunta retórica o fez arquear rapidamente as sobrancelhas e rir. Sabia, pelo seu semblante, que seus pensamentos foram para além do que eu esperava. Revirei os olhos, balançando a cabeça. – Não foi isso que eu quis dizer! Bora logo.

Voltamos para casa do Velho Elm, onde Nathan contou que acertou o animal invasor e provavelmente esse não voltaria mais. Atravessamos o portão e pegamos o mesmo caminho para casa de Tia Lúcia. Chegando no prédio, Nathan não entrou direto para o restaurante, fez questão de me levar até a porta do elevador, tentando me beijar como despedida. Tensa, eu desviei da sua aproximação, olhando ao redor para ver se Aline ou Tia Lúcia não estavam presentes. Entendendo meu receio, ele tomou uma distância maior e disse:

– Enny, amanhã a gente conversa, tá? Não fica preocupada com as meninas e Jane. Vai dar certo. Pode ser? – Concordei com um movimento de cabeça e ele me osculou na testa. – Eu te quero bem. Vá descansar, protegida.

***

(Iludi no capítulo passado, mas honrei dessa vez. Conta ai se curtiu esse casal)

Foi aqui que pediram uma raposinha da montanha?

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