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Capítulo 2- Ascende O Protetor III

Logo após esse o começo de dia, eles saíram daquele lugar marcado pela dor e pela luta. Foram andando, sem serem vistos, em direção à casa isolada na floresta. Entretanto, antes que se afastassem muito de onde houve o confronto, José recobrou um resquício de sua sanidade, sendo carregado nos braços de seu pai, com isso conseguiu ver o que ocorria depois que saíram do local.

Um ser espectral surgiu lá; fisicamente, parecia com Tamíres, mas suas vestes possuíam a cor cinza. Com um mero aceno de mão, ele varreu a realidade, como se voltasse no tempo e mudasse o passado, reescrevendo-o.

Todos os humanos junto com os animais voltavam à posição anterior ao começo do conflito. Os bichos da floresta não se mostravam mais em cena, os aliados do prefeito e as máquinas jaziam em perfeito estado, tudo retrocedeu ao início... A não ser pela pequena marca de explosão causada pela primeira granada acidental, apenas aquele detalhe continuou e ao redor da marca, no solo, havia vestígios de roupas como se dois seres humanos tivessem morrido ali.

Então esse será nosso futuro... — matutou o rapaz, que não possuía forças o suficiente nem para se expressar.

Depois de fazer tudo aquilo, o mais novo bruxo viu o homem desaparecendo magicamente daquele local e entendeu o que ele havia feito. Observou tudo isso antes de desmaiar novamente nos braços de seu pai, enquanto esse caminhava em direção à sua casa.

Algumas horas depois, José acordou em seu quarto, no qual havia um papel de parede feito da junção das cores azul-claro e preto, além de algumas estrelas brancas, estava lá desde quando seu dono possuía apenas seis anos.

No cômodo também se via um guarda-roupa marrom que aparentava um bom estado, uma pequena mesa, na qual eram feitas suas atividades escolares e sobre a essa havia livros e cadernos de estudo. Além, é claro, de sua cama de casal com panos azuis escuros e lençóis da mesma cor, onde ele encontrava-se naquele momento, em sonolência. Sem falar na perceptível bancada de troféus escolares que ganhou graças a sua inteligência, algumas medalhas de ouro e prata também existiam ali.

Olhou pela janela entreaberta, o dia lá fora não emitia tanta claridade, na verdade, a noite chegou despercebida para quem dormia. Já eram 18h00min, ou seja, dormiu por onze horas seguidas e para ele ainda pareceu pouco, talvez por não ter dormido o suficiente na noite anterior. Sentou-se na cama apoiando suas costas no travesseiro da cabeceira, sentia dor em todo seu corpo, principalmente na cabeça que parecia chacoalhar de tontura.

Bruxo... O que isso significa realmente? E por que eu fui escolhido? — Na verdade, imaginou que poderia ter sido apenas um grande sonho fértil, mas a dor corporal que sentia lhe comprovava a veracidade do ocorrido.

Ainda estava sentado pensativo quando Joseph entrou em seu aposento sem fazer barulho algum. Ele ia em direção à janela, até perceber que era observado.

— Ah! Oi, filho, você acordou! Está bem? — perguntou desajeitado, parando no meio do percurso até a abertura.

— Estou — respondeu baixinho, mas com muito esforço. — O que aconteceu depois que apaguei?

— Não se esforce para falar, eu estou aqui apenas para fechar a janela que deixei aberta. Desculpa por isso. — Seu pai apressou-se e fechou-a, por ela entrava um vento frio e forte, foi o que acordou o dorminhoco. — Descansa um pouco mais, enquanto termino o jantar. Quando tiver pronto, eu te chamo. Lá podemos conversar melhor e explicarei tudo.

Saiu do cômodo em seguida, deixando porta e janela fechadas. Deixou também um jovem sonolento que somente pensava, sem se mover ou emitir som algum por certos minutos, ele estava apenas existindo, somente ocupando espaço entre as moléculas; se deixasse de existir por alguns segundos, ninguém saberia.

O garoto possuía uma grande capacidade de esconder o que sentia enquanto sua mente se agitava como uma tempestade em alto mar. Como uma bomba relógio prestes a explodir, mas que era impossível saber o que poderia vir de seu estouro.

Sua consciência maquinava imparável, até ser interrompida:

— José? José? — Alguém chamava fora do quarto, através da porta. — Você está aí? Está bem?

— Safira?! — O rapaz se surpreendeu com aquela voz e questionava-se a possibilidade de estar delirando, sem respondê-la. — Aqui?!

— Oi! Eu vou entrar... — Avisou antes de invadir. — Olá, como você está?

— E-eu estou bem, mas e você, por que está aqui? — Transparecia confuso com a presença dela, mesmo que a apreciasse.

— Joseph não me deixou ir, acho que ele vai nos explicar tudo durante o jantar... — sanou, sentando-se vagarosamente na cama, com cuidado para não perturbar a dor do jovem. — Mas se fosse pra chutar, digo que nunca mais seremos vistos por ninguém que conhecemos... que seremos dados como mortos. Isso explicaria o fato de que não podíamos deixar que eles nos vissem.

— Talvez... — A verdade é que aquilo não possuía tanta importância na vida dele. Estar morto não parece ser tão ruim assim... — Aquela mulher estranha também está aqui ainda?

— Não... — Era perceptível que a ativista também trazia o mesmo ar preocupado que o loiro de cabelo curto.

— Como você está tão bem, se usou seus poderes tanto quanto eu? — Buscou assunto para interferir na turbulência que eram suas mentes.

— Acho que é porque sou mais resistente... e inteligente, olha só essa bancada com poucos troféus e medalhas de prata. — Adotou o mesmo clima descontraído dele. — Você sempre fica com elas porque as de ouro já estão garantidas para mim.

— Até parece, você não se lembra daquela vez que eu... — O rapaz foi parado pelo chamado de seu pai.

— José! O jantar está pronto! E, Safira, ajude-o nas escadas, por favor, querida! — Gritava da cozinha.

— Querida?! — repetiram um para o outro, franzindo o cenho, dando altas gargalhadas.

— Me ajuda levantar também, por favor, querida — pediu o bruxo, ainda sorrindo.

— Sinceramente, amei seu pai. — A garota de olhos azuis comentou ajudando o ferido. — Ele parece ser legal, pelo menos foi legal comigo.

— Joseph é legal... a não ser que machuquem seu filho, aí ele vira uma fera. — O rapaz afirmou depois de ser levantado pela senhorita, a qual tocou no seu ombro, machucando-o.

— Desculpa.

Desceram as escadas da moradia que parecia ser pequena, mas também aconchegante. Havia nela poucos cômodos: dois quartos no andar de cima; uma sala de estar, uma cozinha, um banheiro e outro cômodo usado para guardar bagunças, no andar de baixo. Além de duas belíssimas varandas cheias de plantas, floridas ou não, uma no segundo andar e a outra na frente da casa, sendo a primeira coisa visível para convidados.

Enquanto eles desciam, José percebeu que havia sido preparada uma comida, que já estava sobre a mesa, muito colorida de legumes e frutas como sempre comiam, mas algo estava diferente.

— Deixa eu te ajudar. — Joseph foi ao encontro deles, segurou no braço de seu filho junto com Safira e levaram-no à mesa de seis assentos. O anfitrião sentou-se na cadeira da ponta, de costas para a porta de entrada, e os outros dois se acomodaram cada um ao seu lado, o rapaz do lado direito.

Aquela sala era simples, pois além de ter a mesa no centro, havia apenas uma estante encostada na parede, do lado direito para quem a adentrava pela frente, na qual vários quadros pequenos, pinturas do mais velho, foram colocados. O pintor preferia desenhar as pessoas, pois as fotografias ainda eram em preto e branco naquela época.

— Você não costuma fazer essas coisas, pai. — José afirmou curioso, depois de todos se servirem com saladas e outras coisas vegetarianas. — Ou você só fez isso por causa da Safira?

— Na verdade, ela preparou a comida, eu só ajudei — revelou indicando a moça. — Mas obrigado mesmo assim.

— Obrigado? Ele não disse nenhum elogio a nossa refeição! — A jovem contestou sorrindo, bem prestativa as palavras. — Nem ao menos comeu ainda.

— Tá bem, tá bem! — O garoto pegou a talher, tentando encerrar o assunto e comeu algum tipo de mistura de frutas. — Hum! Muito bom... — encenou sua reação com sarcasmo, até perceber o quão saboroso aquilo era realmente —, muito bom mesmo!

— Pois bem... — Joseph tomou a palavra, era chegada a hora de explicar tudo que precisariam saber dali em diante. Finalmente chegou o dia em que posso contar ao meu filho o que ele precisa saber, não preciso mais esconder nada... — Já entendi que vocês querem que eu vá direto ao ponto...

— Exatamente! — confirmaram juntos, aparentemente ansiosos.

— Vou obviamente começar do início... Bem, em nosso mundo existem pessoas com habilidades mágicas... — O grisalho logo foi interrompido por insinuações.

— Eu me lembro dessa história, você já me disse isso — revelou José, com a boca cheia.

— Eu sei de algumas coisas também, já que sempre fui uma poderosa. — Safira comentou convicta do que havia descoberto naquele mesmo dia. Nunca fui amaldiçoada como me fizeram acreditar por toda minha vida, eu sou uma poderosa...

— Você já tinha poderes?! — O adolescente se mostrava surpreso. — Pensei que você havia ganhado como eu!

— Silêncio! Vocês queriam que eu falasse, agora vão escutar calados! — O homem expressou sua indignação por ser interrompido. Havia muitas coisas sérias a serem explicadas e muito pouco tempo para isso. — Eu já contei essa história para você, mas isso não é um conto de ninar, é real — dirigiu-se ao filho e depois voltou seu olhar à moça de cabelos castanhos. — E eu posso explicar muita coisa ainda, coisas que você nem sequer imaginaria.

— Tá certo... — Os jovens redimiram-se igualmente.

— Como eu dizia... Todos os humanos possuem chakra em seu interior, que é a força e energia que usamos no dia a dia para andar, falar, pensar, sentir... Mas outras desenvolvem esse mesmo chakra como uma magia, tendo ou ganhando superpoderes, sendo assim, chamados de poderosos. — Tentou explicar o mais didático possível. — Como nós, eu e Safira, somos poderosos.

— Qualquer pessoa pode se transformar em um poderoso? — questionou a ativista de olhos azuis.

— Qualquer pessoa não... — Não havia jeito fácil de explicar o universo no qual viviam, mas teria de fazer aquilo. — No entanto, existem três tipos de poderosos: Os humanos, como nós dois... — Enquanto engolia a comida, indicou a si mesmo e a garota. — E, além deles, têm os espectros e as feras...

— Feras?! — interrogou o rapaz loiro, impaciente. — São como monstros?

— Por muito tempo acreditava-se que sim. — Segurou o riso para que não engasgasse e interrompesse a explicação. — Entretanto, eles são apenas animais que entraram em contato direto com os Sentimentos e ganharam a forma humana, também possuindo poderes igualmente nós... — Joseph parou um pouco, parecendo pensativo. — Inclusive, é assim que nós ganhamos essas habilidades. Não éramos animais, é claro, mas enquanto recém-nascidos fomos invadidos e preenchidos por um Sentimento...

— Sentimento?! — Os dois jovens indagaram ao mesmo tempo.

— Depois explicarei sobre eles... — Há muito que aprenderem e um escasso tempo para ensinar. — Logo após terem seus corpos tocados por um Sentimento, os animais modificam-se para seres humanos, mas podem voltar a se transformar em suas formas anteriores sem perder sua consciência humana adquirida no processo.

— Eles podem ter os mesmos poderes que vocês e ainda se transformam em animais? — José iniciou, ponderando. — Eles, então, são mais avançados que os poderosos humanos.

— Ei!

— Está certo e errado ao mesmo tempo! — O anfitrião interviu na exclamação de Safira. — Aliás, eles estão em maior número entre todas as espécies, pois existem mais animais do que seres humanos e eles ainda podem se transformar em sua forma primária, isso os ajuda na hora de se camuflar na sociedade, o que nós fazemos muito aqui na Terra. Sem falar na possibilidade de evoluir sua espécie de transformação... Ouvi histórias de um chimpanzé que se tornou um fera e agora possui mais de 4 metros.

À medida que Joseph falava, os outros dois iam deixando o queixo ser levado pela gravidade: José buscava uma forma de imaginar um primata tão grande; Já Safira caçava uma forma de tentar digerir as informações.

— No entanto, filho, infelizmente sua afirmativa também está errada... — O clima tenso os alcançou quando o grisalho apresentou seriedade. — Muitos deles recebem seus poderes um pouco depois de se tornarem humanos, porém, sua grande maioria desenvolve as habilidades sem uma consciência humana. Alguns, mesmo sem a inteligência e racionalidade, são inofensivos, mas outros fazem acontecer terremotos, furacões, erupções vulcânicas, tsunamis... Nesses casos de feras deficientes, poderosos especializados, como eu e Tamíres, devem agir para amenizar os perigos existentes, na maioria das vezes retirando seus poderes. Mas saibam que, quando nós não conseguimos isso, devemos... acabar com a deficiência.

— Vocês matam os animais?! — A ativista exclamou com surpresa e acusação no tom exaltado.

— Você ouviu a parte dos terremotos, furacões...?

— E ainda usa a palavra deficiência para isso! — José apoiou a garota.

— Olhem só — requisitou a palavra com a voz baixa, tentando trazer a calma —, nós sempre buscamos ao máximo salvar todos sem machucá-los, mas...

— Da próxima vez, tente mais. — Safira colocou um ponto final, afastando o prato de si, assim como os outros dois fizeram.




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