Capítulo 13- Encontros E Reencontros I
O Brasil já transmitia sua animação logo pela manhã que avizinhava o céu que clareava. Os civis tumultuavam São Paulo com sua pressa. Em consonância, José ainda se encontrava entre seus devaneios internos. Discutia consigo mesmo a possibilidade daquele homem à sua frente ser seu pai adotivo, o qual provavelmente nem sabia da existência de um filho.
Qual a chance? — Quantos Edsons poderiam enganá-lo? Quão misterioso poderia ser o destino daquele bruxo? — Preciso me acalmar...
— É... Você está bem, meu jovem? — O estranho perguntou com gentil preocupação, desvencilhando-se dos seus braços. Porém o rapaz catatônico estava paralisado, por isso nada respondeu.
— Senhor Edson! — A moça finalmente os alcançou ali na esquina da rua movimentada. — Sabe que não deve sair assim...
— Ora, não me repreenda! Vim apenas procurar uma coisa que na minha casa estava faltando — explicou a situação com a voz um pouco alterada.
— O que veio buscar? — indagou esperançosa. Os outros dois apenas os olhavam, curiosos.
— Eu vim procurar... É... — Parecia se esforçar ao máximo, entretanto, seu semblante mostrava absoluta confusão. — Não lembro bem, mas sei que era alguma coisa muito importante.
— Quando o senhor lembrar, eu mesmo venho procurar, tá certo? — concluiu, gentilmente, e o grisalho assentiu com a cabeça. Afinal, a moça pareceu perceber os olhares intrusos que os cercavam. — Muito obrigada por segurá-lo. Meu nome é Jhennifer, posso saber os seus?
Os jovens nada responderam, pois entenderam apenas o nome dela, a qual havia falado tudo em português. Suas expressões mostraram a falta de compreensão que se tornava um impasse ali, e a senhorita logo entendeu, olhando para seus rostos não tão comuns entre os dos brasileiros.
— Olá! Prazer, meu nome é Jhennifer e esse é o senhor Edson — apresentou em inglês, na esperança de que a entendessem, tinha um sotaque que os estrangeiros consideraram engraçado. — Como vocês se chamam?
— Ah! Meu nome é José e essa é Safira — respondeu aliviado e apertou a mão direita da jovem, a qual segurava o homem com a esquerda.
— Olá, prazer! — Finalmente alguém que fala inglês... Não poderia desperdiçar a chance que lhes surgiu. — É... Você conhece algum estabelecimento, como um hotel ou pensão, aqui próximo?
— Bem...
— Podem ir lá para casa. — O indivíduo interrompeu avoado, e a mais nova o censurou com o olhar, assim como foi censurada pelo mesmo.
— Desculpe, não queremos ser um incômodo. Ela está certa, não deve receber estranhos em sua moradia assim. — A poderosa afirmou sorridente, mas sem muita veracidade.
— Então está decidido, vocês vão conosco até nossa casa. — O homem reafirmou, gentilmente, com insistência.
— Vamos então... — A brasileira concordou, por fim. Não queria parecer mal educada, estava sendo apenas precavida. Pegou na mão de Edson e se viraram para voltar, porém, esse a soltou de súbito. — O que foi, senhor?
— Não preciso que me segure, sei muito bem andar sozinho — decretou rispidamente, e José interviu na situação.
— Pode deixar, eu o acompanho. Seguro ele apenas se precisar — garantiu para Jhennifer, tranquilizando-a.
Assim saíram os quatro em direção à residência. O jovem presunçoso caminhava ao lado de Edson, pronto para segurá-lo caso algo inesperado acontecesse. O homem não aparentava ter uma idade avançada, devia ter uns 40 anos aproximadamente, todavia, seu corpo parecia dizer o contrário. Safira ia um pouco mais atrás, acompanhada por Jhennifer, a qual não tirava os olhos do mais velho que andava à sua frente.
— Vocês são o quê, um do outro? — A estrangeira de cabelo castanho preso inquiriu com curiosidade.
— Bem, eu o conheço desde que era criança. Ele sempre foi assim, meio... Sempre precisou de ajuda — completou observando-o. — Lembro-me que minha mãe cuidava dele e quando ela se foi... Bem, eu passei a fazer o que ela fazia — comentava com pesar. A história da vida deles não parecia ser a mais feliz, longe disso.
— Sinto muito...
— O senhor é daqui? — José interrogou a Edson. Preciso descobrir...
— Na verdade, nasci no Ceará, outro estado do Brasil — esclareceu o sujeito que matutava seu passado. — Porém, desde que vim para cá, para um evento que reunia diversos artistas, nunca mais senti vontade de voltar.
— Então é artista? — O rapaz indagou. — Qual arte pratica?
— Eu gosto de pintar em telas. Confesso que esboçava mais quando era mais novo. Quando tinha disposição para vendê-las pelo exterior — revelou olhando os carros exclusivamente pretos passarem pela rua. José o ajudou a atravessar na faixa de pedestres junto de várias pessoas apressadas.
— Então viajava pelos outros países? Quais já visitou? — O adolescente não perdia a chance de saber cada vez mais a respeito do homem.
— Me recordo apenas de alguns lugares. Minha mente também já não é a mesma coisa que foi... — Edson informou tristonho. — Lembro-me de conhecer a Itália e um pouco da França; alguns países da América do sul e... tenho uma memória vaga de já ter ido aos Estados Unidos.
— Como assim, memória vaga? — O bruxo interrogou excedendo seu tom de interesse.
— Jovem, você é muito curioso. Cuidado para não acabar descobrindo aquilo que não deseja. Algumas respostas não precisam existir, a menos que pessoas como você façam as perguntas. — O censurou com o olhar, mas, ainda assim, sorrindo de modo gentil. — Entretanto, é claro que nunca vai saber quais foram seus erros se não errar.
— Então eu posso fazer mais perguntas? — Com um sorriso presunçoso, José indagou, sem entender o que ele queria dizer com aquele comentário.
— Estamos quase chegando à minha casa. Depois que tomarmos café, conversaremos mais...
— Senhor Edson! — Jhennifer chamou atenção à suas costas. Estava parada junto com Safira. — A casa é essa aqui.
Ela apontou para uma residência com aspecto de velha, porém, bonita. Seus tons em ciano-claro lembravam os do céu, eram bem chamativos e confortantes aos olhos.
— Ah, é! Havia me esquecido...
Os quatro adentraram a moradia e logo se acomodaram na sala de estar, a qual era muito aconchegante mesmo sendo pequena. Lá, a senhorita, de cabelos cacheados presos por um elástico, serviu chá para Edson e José. Depois se serviu, junto com a poderosa, de um pouco de café.
— E então, já falamos um pouco de nós. Agora só falta vocês... — A moça os incentivou a falar. — De onde são?
— Nós somos dos Estados Unidos. Estamos apenas viajando por alguns lugares para conhecê-los. — Omitindo algumas partes, Safira respondeu com sinceridade.
— Vocês já passaram por quais países? — questionou o homem, comendo um pedaço do bolo que havia na mesa.
— Na verdade, esse é o primeiro país que visitamos. Nossos pais não queriam que viajássemos sozinhos ainda novos. — O loiro esclareceu o impasse, prestativo.
— Quantos anos têm? — Jhennifer indagou à estrangeira.
— Nós dois temos 17 anos — respondeu depois de um gole de café.
— Nossa, eu também! Bem que eu queria viajar assim, como vocês. Mas não posso porque tenho que cuidar... — dizia inocentemente, até perceber as palavras que saiam por sua boca. Olhou para Edson, o qual não disfarçava seu semblante abatido. — Bem, eu...
— Não! Você está certa. — Inesperadamente, o grisalho levantou e pegou a louça suja em cima da mesa. Todos já haviam terminado de comer.
— Pode deixar que eu...
— Não precisa! — exclamou e se retirou carregando as xícaras para a cozinha.
— Desculpem-me... Eu não devia ter falado isso. — Jhennifer redimiu-se para o casal ainda ali na mesa.
— Qual o problema dele? — Safira interrogou mirando a porta da cozinha, pela qual Edson passou.
— Bem, ele já passou por vários médicos. Muitos disseram não saber o que ele tem, mas, com novos exames, os médicos o diagnosticaram com Alzheimer — explicou olhando fixamente para o bolo. Aquele não era um assunto agradável. — Não sei se vocês conhecem, é uma doença considerada nova.
— Já ouvi falar...
— Quando isso começou? — José inquiriu com pressa.
— Ele é assim desde que me conheço por gente. — Jhennifer informou sem detalhes precisos. — Minha mãe dizia que ele sempre foi muito agitado, muito bem humorado. Ela era apenas vizinha dele. Porém, depois que voltou de uma viagem rápida que ele fez para os Estados Unidos, nunca mais foi o mesmo. Como se sempre tivesse faltando algo em sua vida...
— Ela te disse o que ocorreu nessa viagem? — O bruxo não controlava seu anseio por respostas. Safira já desconfiava do interesse excessivo de seu namorado, não se lembrava dele sendo tão empático assim com desconhecidos.
— Aí é que tá. Minha mãe falou que ele também não lembra — revelou com pesar, baixando o tom da voz para que não fosse escutada por Edson.
Um barulho do estilhaçar de objetos requisitou a atenção dos jovens na sala. Jhennifer disparou às pressas correndo em direção à cozinha, deixando o casal assustado a sós. Depois do susto repentino, Safira pôs-se a olhar com a sobrancelha levantada para seu namorado.
— Que foi? — José perguntou confuso, usando seu cinismo.
— Estou esperando você me explicar o porquê desse interesse todo na vida do senhor Edson — abordou em sussurros acusativos. O de olhos verdes acostou-se um pouco para mais perto de sua namorada, desejando falar o mais baixo possível.
— Estou achando que ele é o meu...
— Filho! — O anfitrião da casa atraiu os olhares à abertura que levava a cozinha. Os dois jovens mais uma vez se assustaram e voltaram-se para ele. O rapaz sentiu algo preencher seu peito quando ouviu aquela palavra súbita.
— S-sim?! — atendeu estupefato.
— Venha comigo. Tenho algo a lhe mostrar — convocou e dirigiu-se a escadaria que havia ali na sala. O jovem o seguiu, deixando sua mochila junta a de Safira.
Enquanto se encaminhava as escadas, percebeu sua namorada indo à cozinha. Assim, os dois subiram, encontrando um corredor com algumas portas. Escutando o ranger do piso sob seus pés, caminharam até o fim.
— Pode puxar aquilo, por favor? — pediu apontando para cima.
— Isso? — José questionou indicando uma cordinha presa ao teto e Edson assentiu com a cabeça.
Quando puxou a corda, a pequena porta do teto forrado se abriu e uma escada desceu disparada até seus pés. Quase os acertou, mas, com um reflexo rápido, o mais novo impediu que ela os incidisse em cheio.
— Um sótão! — Surpreendeu-se com o óbvio. O homem rapidamente pôs o pé no primeiro degrau, porém, o loiro interviu segurando em seu braço. — Vou antes do senhor. Pode ter alguma coisa nesse quarto, além de que está extremamente escuro lá em cima.
— Esses jovens e suas manias de achar que sabem tudo — resmungou retirando a mão de seu braço. — A Jhennifer também acha que não consigo fazer nada, que sou inválido, mas ela está errada! — esbravejou subindo.
O rapaz subiu logo atrás do que rezingava, por precaução. Não queria que ele se machucasse na escadaria, ou em alguma coisa que estivesse naquele cômodo sombrio.
— Tem um interruptor por aqui... — Quando adentraram, o anfitrião alegou tateando os móveis indecifráveis.
— Fique parado para não se machucar em alguma coisa, vou achar rapidinho... — O bruxo enunciou e respirou fundo. De dentro dele se manifestaram vários Runks que iluminaram parcialmente o quarto. Tudo isso apenas na visão dele, já que pessoas normais não conseguiam vê-los.
Era apenas uma sala preenchida por telas espalhadas para todo lado, cobertas por tecidos sujos de tinta; havia também alguns baldes e recipientes menores, cheios de tintas coloridas e, com certeza, já passadas da data de validade; sem falar nos diversos tipos de pincéis jogados por todo o recinto. Era assustador, porém, ao mesmo tempo, artístico.
José caçou com o olhar, algum interruptor. Andou entre as telas, afastou outras de seu caminho, até que encontrou o que procurava. Estava pendurado no teto por um fio elétrico desencapado.
— Ah! Olha só o que eu encontrei! — Edson exclamou entusiasmado e, repentinamente, ligou uma lanterna velha. A luz foi direta nos olhos do garoto, o qual se ofuscou um pouco e se desconcentrou. Quando os Runks retornaram para seu interior, tudo se tornou escuro para ele outra vez, exceto pela claridade da lanterna. E, por reflexo, rapidamente ligou a lâmpada do cômodo, clicando no botão do interruptor.
— Nossa! Foi rápido. — O anfitrião elogiou sorrindo, soltou a lanterna que desligou e sumiu entre as telas, vasculhando.
— O que tá procurando? — indagou com curiosidade.
— Alguma obra que eu considere interessante mostrar — esclareceu jogando alguns tecidos sujos no chão empoeirado, como tudo ali.
— Posso procurar também? — perguntou ansioso.
— Claro, fique à vontade...
Com isso, os dois iniciaram um tour pelas artes do homem. Algumas telas grandes, outras pequenas; desenhos de paisagens ou de pessoas em seus afazeres rotineiros; cidades e às vezes sítios; com diferentes tipos de tintas. Todas belíssimas, feitas com os mínimos detalhes possíveis.
No meio de tantas pinturas, o adolescente esperançoso parou quando notou uma obra que lhe parecia... familiar. Era uma tela pequena, na qual estava retratada apenas a metade de um rosto masculino. A face de Joseph cobria boa parte daquela tela, no entanto, esse possuía uma fisionomia jovial, de quando ele era mais novo.
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