Capítulo vinte e nove
Timmy
Tê-la em minha casa, com a minha família foi algo tão extraordinário que a surpresa me deixou... Eu nem sei explicar. É surreal. Nunca tivemos um ser humano hospedado aqui. Recebemos visitas sociais eventualmente, mas sempre com empresários para manter a postura de humanos normais. Geralmente marcamos em locais requintados, hotéis, restaurantes... As vezes até diretamente nos nossos próprios clientes. Nós que vamos a eles. Mas como falei, precisamos a todo instante parecer normais. Uma vez por ano acontece algum evento aqui. Mas nunca ninguém veio para dormir ou passar uma temporada. Claro, a situação exigiu que isso acontecesse, entretanto me deixou desconfiado de como a minha família reagiria, mesmo sem ter opção, eles poderiam ser indiferentes a ela. A curiosidade deles foi maior.
Nicolle é tão mais humana que lidou como uma pessoa responsável e prestativa. Mas senti a desconfiança dela e todas as tentativas que ela fez para disfarçar o medo que sentia. Meus pais pareciam querer consertar um erro. Gabriel, bem, era Gabriel. Embora também tenha agido o mais educado que ele pode, tentou lidar como algo ruim no início, mas depois começou a julgar como um erro total. Acho que ele foi mais atingido com a presença dela, tanto que em vários momentos ele fez comentários grosseiros a ela. E ele não é assim, apesar de ser sempre o mais calado, mas concosco sempre foi aberto.
Independente de tudo isso, minha felicidade, talvez pelo meu egoísmo em quere-la tão perto, me fez deixar para lá tudo o que eles possivelmente estariam processando sobre Sofia. Eles sabem que eu não precisaria do apoio deles para nenhuma questão relacionada a ela. Vê-la aqui, tão pertinho, mostrando um pouquinho do meu mundo e, tentando deixa-la mais confortável comigo, era a minha meta. Ela sempre foi humana. Precisava ainda de muito tempo, com muita calma, absorvendo todas as informações. Embora eu confie nela, não posso provar aos outros que ela é confiável e que vai aceitar tudo o que vamos lhe explicar. Eu sei que ela sente o mesmo que eu sinto por ela. E os humanos são passionais.
Ela é uma garota ordinária, não era uma menina que possuía um corpo trabalhado por intensos exercícios físicos. Não era magra demais como eu sei que se sente. Sempre achei que ela estava em equilíbrio. Ao meu ver ela era perfeita ao natural, sem precisar se cuidar de forma alguma. É estranho pensar que nós poderíamos nos atrair por humanos dessa forma. Porque temos uma cabeça produzida em um outro planeta, com uma lembrança, além do contato, com seres totalmente diferentes dos humanos. Seria natural a nossa forma original, mas nós vivemos aqui desde sempre, então não sei se também pelo DNA ou principalmente pela convivência, nós aprendemos a ser humanos e gostamos também. É a nossa vida. Somos parte da Terra, nada mais natural pensarmos como os seres daqui em muitos assuntos. Na verdade nem fazemos muita distinção. Ou talvez sim, pelo fato de sabermos que não vai mais ser possível uma relação tão direta com o nosso povo.
Sofia tem um jeito leve de ser. Mesmo vivendo toda essa tensão. Ela é muito tranquila, muito razão. E apesar de saber que ela tem fome de informação, ela tem muita paciência. É como se ela fosse uma aluna e precisasse de um tempo razoável para processar as informações, absorver muito bem e finalmente entender tudo sem precisar repetir as coisas que dizemos. Gosto disso nela. Inspira confiança também. E se eu a enxergo tão bem assim, talvez seja por isso que sua beleza comum se torne uma beleza estonteante para mim. Ela tem aqueles olhos cor de mel maravilhosos, os lábios são equilibrados com a face. Se fossem pequenos demais não teria a menor harmonização com o resto do rosto. Os cabelos castanhos claros e longos. Uma pele clara. Um corpo totalmente no lugar certo. Ela tem uma curva muito bonita e feminina. Fico imaginando-a naquele vestido jeans, colado ao corpo. Uma deusa.
E pensando nela assim, vou a cozinha tentar observar como ela está se saindo sozinha. Ah, que delícia que é ve-la tão natural, sem vergonha, cantando e dançando, ali, na minha cozinha! Não conseguia tirar os olhos dos movimentos delicados que ela fazia. Percebi que ela dançava, mas ainda acanhada. Ou talvez dançar não seja o forte dela, mas notei que a música é fundamental para ela, porque ela apertava os olhos sempre que vinha uma frase ou momento da música que ela mais gostava. Era como se ela viajasse em sentimentos trazidos pela mensagem da música. Uma coisa linda de ver.
E então, tudo muda.
Ela está começando a passar por alterações. Agora é oficial. Está acontecendo e ninguém aqui tem mais dúvidas. Só não sabemos tudo o que pode acontecer. Mas com certeza entendemos que não serão mudanças ruins de fato. Teoricamente serão fantásticas. Mas ainda assim não alivia o que fiz com ela. E tenho medo dela não me perdoar. Começamos a nos conhecer de uma forma estranha, tudo acontecendo rápido. Com escolhas unilaterais. Isso me apavora. Ela pode nunca mais querer saber mim. Tenho medo das represálias dos meus semelhantes no meu planeta. Temo, inclusive, que queiram machuca-la... Tento afastar a ideia, confiando sempre na bondade do meu povo e o desinteresse pelo ser humano.
****
Sofia
Tim correu comigo nos braços direto para o lago com a ajuda do pai. Todos os outros acompanharam, mas ficaram em silêncio por um tempo e depois iniciaram uma pequena discussão sobre o que seria certo para mim. Estavam simplesmente decidindo se Timmy deveria pedir ajuda aos superiores. Mas ele estava irredutível. Não iria deixar que eles também decidissem sobre quem ele deveria se envolver ou não. Embora soubesse que, se a situação saísse do controle ele iria precisar na verdade de ajuda. Ninguém sabia ao certo o que poderia acontecer comigo.
Gabriel estava disposto a recorrer aos seus, na tentativa de que eles intervissem. Timmy não suportou a ideia do próprio irmão estar contra ele, já que ele mesmo o apoiou quando ele mais precisou. Gabriel, por sua vez, retrucava dizendo que era exatamente isso que ele estava fazendo, agradecendo. Tim ficava cada vez mais nervoso porque achava um absurdo o que o irmão dizia.
Timmy tinha os olhos ainda mais azuis e o cabelo mais loiro. A pele dele estava perfeita. Bochecha e lábios rosados. Mesmo estando com fácies de raiva, ainda assim, possuía o rosto bonito e belo. Uma característica da nova genética.
Em meio a tanta discordância entre eles, fui acordando aos poucos, ouvindo vozes perto de mim. E percebi rapidamente o que estava acontecendo. Fui começando a distinguir quem estava falando. Tim e Gabriel estavam praticamente gritando um com o outro.
Kate pedia aos dois que parassem aquela discussão porque não iria resolver nada, que o que havia acontecido não poderia mais voltar atrás. Que o que estava feito, estava feito. E ainda se lamentava que isso nunca havia acontecido entre eles, que não aceitava aquilo. Ela estava indignada, pois eles estavam deixando a parte ruim do DNA humano sobrepondo ao deles. Esse desequilíbrio emocional não deveria existir.
Mas Gabriel ainda parecia inconformado. Não dava ouvidos à mãe e continuava a dizer que o irmão não poderia ter arriscado a vida deles cometendo o mesmo erro que ele cometeu. E repetia "você não aprendeu com os meus erros". Nesse momento eu pensei que realmente eu poderia estar em perigo.
Além disso, ameaçava acabar com tudo aquilo, sempre dizendo que Timmy estaria pondo em risco todo o objetivo deles no planeta Terra para salvar o deles. E que não permitiria mais essa situação, pois Timmy estaria sendo egoísta em pensar nele ao invés de todos os outros que dependiam dele.
Eu tentei abrir meus olhos, mas não consegui. Eles pareciam estar colados. Percebi que eu não estava mais com calor e que estava dentro da água. Senti também alguém comigo, me ajudando a flutuar. Na verdade, estava nos braços de alguém e desejei que fosse do Timmy.
Comecei a recobrar a minha memória. Lembrei do que havia acontecido antes de perder a consciência e de tudo o que ouvi. Confirmei que era o Timmy comigo. E quando comecei a erguer minha mão em direção aos meus olhos, ouvi a voz do Peter:
- Silêncio! Ela acordou!
- Não se mexa Sofia! Falou Tim segurando minha mão evitando que eu tocasse nos meus olhos.
Então senti um líquido escorrendo pelo meu rosto e percebi que alguém estaria derramando esse líquido propositalmente, já que senti também os dedos que massageavam delicadamente a região dos meus olhos. E no instante que estes dedos tocaram meu rosto levei um susto. Foi então que Tim disse que eu tivesse um pouco de paciência, logo iria poder abrir meus olhos.
Aguardei então o momento certo para que eu pudesse abri-los ao comando dele. Eu já não ouvia mais a voz do Gabriel. Nem de qualquer outra pessoa. Foi então que Tim falou baixinho, praticamente sussurrando:
- Pronto, tente abrir os olhos, mas bem devagar.
Aos poucos fiz o que ele mandou. Fui abrindo e comecei a enxergar onde eu estava. E não pude acreditar no que via. Não era possível estar onde eu estava e nem mesmo da forma que eu estava.
Olhei para ele que estava me segurando dentro da água com um olhar de culpado. Estava sério, mas com certeza não parecia ser comigo. Afinal, depois do que tinha acabado de ouvir, imaginei que ele estaria chateado consigo mesmo. E isso também me deixou preocupada. Essa minha preocupação era muito maior do que acordar onde eu tinha acabado de acordar. Mesmo sem entender o que havia acontecido comigo, estar tocando no braço dele, tendo a certeza que tudo aquilo era real, não me dava tanto medo, afinal, viva eu estava. E com alguém especial.
Depois de recobrar todos os meus sentidos percebi que, inacreditavelmente, eu estava no colo do Timmy, dentro do lago congelado em frente a casa. Ele achava que talvez eu estivesse com a memória um pouco confusa, por isso explicou onde eu estava. Não sei se por causa do choque térmico que eu havia tomado, ele ficou com medo de eu ter queimado meu juízo!
Parte da família do Timmy decidiu se aproximar novamente. Eles haviam quebrado o gelo do lago em um círculo suficientemente grande para Timmy e eu. Vi apenas Nicolle e Peter em pé, ao redor daquele gelo que cobria o lago. Não vi nem Gabriel nem a Kate, embora eu soubesse que eles estavam ali a pouco.
- O que aconteceu?
- Sofia, você desmaiou de tanto calor que seu corpo emanava. Sua temperatura estava muito alta, então resolvemos trazê-la para cá.
- Como assim? Eu estava com febre? Por que não um chuveiro? Mas como pode? Como é que agora não estou sentindo frio? Eu deveria estar com hipotermia! O que tinha nos meus olhos? – disparei com tantas perguntas que quase fiquei sem fôlego.
- Calma, vou te explicar tudo. Vamos sair daqui, você vai trocar esta roupa molhada e vamos conversar.
- Isso mesmo Sofia. Eu já separei algumas roupas secas que estão no meu quarto. Disse Nicolle que nos acompanhava junto ao Peter, logo atrás de nós.
Não respondi ao que havia acabado de ouvir e nem dei muita atenção. Eu não conseguia tirar os olhos do Tim. Ele também não olhava para nenhum outro lugar que não fosse meu rosto. Ele parecia saber exatamente onde pisar e a direção que ia, logo após ter me tirado da água com toda a facilidade do mundo e me segurando nos braços.
****Não esqueça que clicar na estrelinha! Obrigada e até o próximo capítulo!
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