Capítulo trinta e um
Sofia
Como sempre, Nicolle me salvando. Eu não tinha interesse de sair toda arrumada. Por isso perguntei ao Tim onde iríamos. Falei que não sabia se queria me preocupar com roupas, que poderíamos ir a algum lugar discreto. Ele não quis me contar, mas disse a Nicolle onde iríamos. Ela achou que seria adequado um vestido de veludo, com o busto livre, de mangas compridas, todo preto. Fiz um penteado super discreto, assim como a maquiagem. Tudo emprestado dela. Timmy, vestido com esporte fino.
Realmente o local não era muito amplo. Parecia ser um restaurante de bairro, apenas para as pessoas que moram muito próximas ao restaurante. Era simples, mas extremamente organizado e limpo. As pessoas eram receptivas e pelo visto já o conheciam, pois estavam sempre com amplos sorrisos para ele e a recíproca era verdadeira.
Tim me apresentou o dono do estabelecimento. Ele trabalha com a avó, que é responsável pelas receitas de família, segundo eles. Conversamos um pouco, onde fiquei sabendo que eles são esquimós, na realidade. Há alguns anos resolveram mudar para aquela parte da cidade, onde se estabeleceram. Fiquei tentada a descobrir a ligação deles com o Timmy.
Depois de uma rápida conversa, o proprietário nos conduziu para nossa mesa. Foi então que Tim sorriu quando viu minha reação de confusão ao me mostrar um piano de canto de sala, bem próximo de onde ficaríamos. E foi aí que entendi tudo. Ele queria que eu tocasse! Claro que sim. Estava bem claro a escolha do local. E eu não fiquei chateada, achei até bonitinho da parte dele, me proporcionar um momento íntimo entre nós. Tocar piano é algo muito meu, eu não gosto de tocar para um público, mesmo que seja de poucas pessoas.
- Você não precisa tocar. Eu apenas achei que aqui seria um local adequado. De fato, como você viu, conheço esse restaurante. Gosto muito das pessoas daqui, somo amigos há muito tempo. Percebeu como são discretos? Eu nunca trouxe ninguém aqui e eles não fizeram qualquer pergunta sobre quem é você.
- Eles são educados de fato. Você apenas disse meu nome e de onde eu era. Eles não questionaram nada, não foram invasivos, pelo contrário, falaram apenas deles mesmos.
- Pois é. Eles são amigos da nossa família desde sempre. A família inteira trabalha conosco. Eles são alguns dos membros que sabem quem somos. Como te falei, precisamos de aliados. E nós somos gratos por toda a ajuda. A filha deste rapaz que você conheceu hoje, de apenas 11 anos, toca piano. É por isso que ele mantém um piano aqui. Ela gosta de tocar para os clientes que são regulares no restaurante.
- Ela é mais corajosa que eu – Dei um sorriso encabulado, já me achando ridícula por me sentir assim, diante de qualquer pessoa que me veja tocando.
- Mas como falei, só temos nós dois aqui neste ambiente. É um pequeno salão reservado. Resolvi fazer a reserva porque queria que você se sentisse bem, caso queira tocar alguma coisa.
- Quem sabe depois de algumas taças de vinho? – Ele sorriu e já foi nos acomodando e fazendo os pedidos.
Depois de pedir as bebidas, ele gentilmente conversou sobre o que eles serviam ali, decidimos juntos o que iríamos comer e rapidamente ele começou a conversar mais um pouco sobre a vida deles aqui na Terra.
- Nós também precisamos evitar que sejamos descobertos pelos humanos. Embora tenhamos humanos ao nosso lado, pessoas que trabalham em agências com boa tecnologia estão cada vez mais certas da existência de outros seres no universo. Não acho que vocês estejam errados em pensar que seriam únicos. Até aí tudo bem. Nós já sabemos que não existem apenas nós, vocês e os "outros". Porém cada um em seu universo, em seu lar, sem precisar importunar, mesmo que por curiosidade, todos os planetas que estejam ao alcance. Por aqui já passaram alguns diferentes de nós. Até mais semelhantes fisicamente dos humanos do que a gente. Nosso problema é vocês descobrirem que de fato existimos e ainda coabitamos neste planeta! Não sei se lembra, mas os EUA em sua corrida pela hegemonia, uma vez lançou uma aeronave que foi vista pelos civis. A partir desse dia, todos associaram o formato dela com disco voador. E tudo começou a ficar ainda mais questionável. É muito difícil e desgastante tentar ser humano, Sofia... Você não faz ideia.
- Sim, claro. Entendo perfeitamente. Sinto muito de ser tudo tão complicado.
- Não sinta, não é sua culpa. Como eu te falei, fomos escolhidos para sermos geneticamente modificados. Nós adquirimos a forma de vocês. Eu tenho um coração, assim como você tem. Eu tenho sangue vermelho, como o seu. Embora tenha mais coisas na constituição da minha célula, eu consigo dominar a energia que existe dentro de mim... E isso é a explicação para o que você viu lá na cozinha de casa.
- Mas não com os mesmos componentes sanguíneos... – Repeti a informação a fim de entender mais.
- Como falei, nossas células são definitivamente diferentes das células de vocês. É como se elas fossem inteligentes e independentes aos mesmo tempo. E elas também seguem nosso comando. Temos um poder consciente de todo o nosso corpo, assim não adoecemos com facilidade. E também podemos nos adaptar de forma muito rápida, embora tenhamos limites sérios. E isso tudo é razão para termos laboratórios também. Inclusive os comuns, onde as pessoas vão fazer exames rotineiros. Só que ninguém sabe que nós somos os donos. Essa é uma das formas de conseguirmos despistar os humanos sempre que nos são solicitados esses tipos de exames.
- Isso é bem inteligente... Mas vocês utilizam alguma coisa desses laboratórios comuns?
- Nada. Utilizávamos no início para entender o funcionamento de vocês. Hoje não precisamos mais disso.
- E você conseguiria viver com este corpo no seu planeta?
- Não. Tudo ficou ao contrário.
- Ao contrário? Como assim?
- Antes éramos "moldados" para termos o tamanho certo e encaixarmos em corpos humanos. No nosso caso em específico, para virmos aqui teríamos que estar preparados. Fomos escolhidos e também escolhemos estar aqui. Meus avós foram concebidos lá e enviados para cá jovens, porém nesta capa de humano. E isso aconteceu com muitos outros até que nós conseguimos evoluir ainda mais e permanecermos mais tempo aqui neste planeta. Meus pais foram concebidos lá, mas já com a genética humana e, deixados em um lugar propício, ou seja, semelhante a terra. Foram posteriormente enviados para cá. E nós também, nascemos lá, porém ao contrário deles, nos desenvolvemos aqui, desde bebês. E foi trabalhoso, porque fomos criados neste planeta com todo o cuidado para não sermos descobertos.
- Você estava apagando pistas dos seus avós quando eu te conheci?
- E também dos outros que vieram coletar tudo o que precisavam para criar meus pais, no nosso planeta. E posteriormente, a gente. Aquela estátua que você viu no museu... Eu já comprei e já mandei destruir. E todas as fotos dela postadas, também já conseguimos apagar ou proibir a reprodução por direitos autorais.
- Nossa! Explica como seus avós conseguiam vir já que não poderiam sobreviver ao nosso planeta? – A pergunta era mais importante do que o sumiço da estátua.
- Eles simplesmente não ficavam expostos. Estavam sempre utilizando uma forma de proteção. Mas não poderiam ficar muito tempo, já que estavam apenas disfarçados de humanos. Antigamente a Terra era menos populosa, portanto, mais fácil de entrar sem ser notado. E eles tinham tamanhos maiores, eram estranhos. Eram considerados quase aberrações. As pessoas tinham receio, os achavam estranhos. O que era bom, porque assim, eles acabavam ficando mais isolados. Porém, não poderiam ficar muito próximos, por medo de algo dar errado. Desde sempre o ser humano evita o "diferente". O problema acontecia quando alguns jovens decidiam importunar propositalmente. Nesse caso, era hora de sumir. A caça às bruxas existiu naquela época, mas hoje não mudou muito. Assim como matar qualquer pessoa que possivelmente estivesse doente. E se nós fôssemos pegos, mesmo com pouca tecnologia, as pessoas iriam notar uma diferença. Ou seja, tentamos entrar na Terra bem antes dos meus decendentes mais próximos. Assim como outros, de planetas diferentes. Estou pesquisando justamente sobre esses que vieram antes de nós. Todos eles deixam algum rastro na Terra.
- E por que vocês não ficaram assim, vindo apenas disfarçados para coletar o carbono necessário? Por que precisaram sacrificar uma família inteira?
- Porque o processo químico e a quantidade que precisamos não pode ser retirado com rapidez. Se fizéssemos isso de qualquer jeito, estaríamos entrando em conflito com vocês, que são os donos. Além de não conseguirmos fazer de forma discreta, até porque tem um problema grande de entrar e sair do planeta. Não pense que é fácil disfarçar sempre as nossas espaçonaves nesse processo. E vocês estão evoluídos agora, ao ponto conseguirem detectar a gente. Chamaríamos mais atenção porque hoje todos tem identificações. Vocês vivem uma tecnologia bem mais avançada. Antes, apenas um papel para identificar alguém. Ou nem isso. Hoje, qualquer pessoa carrega um celular que tira foto. Há identificação por rosto, você sabe disso.
- É verdade. Dava para se esconder mais naquela época. Fale-me mais sobre o que está acabando com o planeta de vocês. Não é devastador em curto prazo?
- Como já disse, para nós, sim. No seu tempo, não.
- É como um vírus, não é?
- Como um vírus...
- E quanto ao que você me falou sobre a contribuição de vocês para nós... Eu fiquei cogitando tanta coisa. Pensei até em conspirações de empresas farmacêuticas.
- Nós temos uma tecnologia e um bom laboratório, que infelizmente não pode ser aberto para vocês ou iríamos ser descobertos. Em nossas pesquisas conseguimos descobrir a cura de algumas doenças de vocês. E nós repassamos de forma anônima. Geralmente quando alguém aparece com a cura ou a vacina de alguma doença, somos nós os responsáveis que liberamos o estudo, ou seja, nós damos aquele empurrãozinho que faltava em algum cientista. Eles recebem o crédito e nós nos sentimos felizes em ajudar.
- Então algum cientista recebe um trabalho e executa. Depois recebe o crédito que seria de vocês? Assim sem mais nem menos?
- Não, Sofia. Não entregamos a qualquer um as nossas descobertas. Nós sabemos a quem entregar as respostas. Normalmente para algum cientista que já estava trabalhando a algum tempo em determinada doença. E sempre damos a resposta como em um sonho. Depois vou de mostrar como fazemos isso. O cientista já está bem próximo da descoberta, então falta algum detalhe que ele não consegue enxergar. Só isso.
- Obrigada por nos ajudar. Mas... E quanto ao Gabriel, o que ele fez que poderia ter prejudicado vocês? Não pode ser só o fato de ter se apaixonado!
Ele riu. Foi então que chegou nosso jantar e ele disse que preferia que continuássemos depois de comermos. Acabamos falando um pouco mais sobre o restaurante e a amizade dele com os donos. Achei tudo muito legal. Bebemos um pouco mais. E quando estávamos relaxados após o jantar, ele segurou a minha mão e comentou:
- Suas mãos são bonitas. Combinam com as mãos de uma pianista. Na verdade você é toda perfeita Sofia.
Eu fiquei corada, com certeza. Mas invadiu uma coragem descomunal em mim e quis retribuir todo o carinho e também toda a confiança dele em mim. Então, levantei e perguntei se de fato eu poderia usar o piano. Ele disse que sim, com um sorriso enorme. E foi aí que toquei um pouco para ele, pela primeira vez. E isso foi tão maravilhoso para mim. Até pensei que eu estava fazendo aquilo muito mais por mim do que por ele!
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