Capítulo Trinta e três
Sofia
- Tim, você resiste ao frio, não é?
- Sim.
- Então o que está acontecendo comigo? Eu cheguei aqui, senti muito frio. Depois muito calor. E sei que não estava com febre ou coisa parecida. Agora estou achando que a temperatura está agradável. O que acontece afinal?
- Você foi...
- Fui o que?
- Afetada por nós.
- De que forma? Como?
- Antes me responda uma coisa. Você tem sentido aquelas dores do seu problema de saúde?
- Na verdade, não! – Parei um pouco para pensar sobre isso - E já tem algum tempo que nem venho tomando meus remédios, aliás, nem os tenho aqui. Desconfio que foi aquilo que você me deu para tomar. Foi aquilo, não foi?
- Sim... – Timmy respondeu pensativo, como se tivesse mais alguma coisa em mente.
- E do que aquilo é feito?
- Das nossas plantas.
- Do seu planeta?
- Sim.
- Mas essas plantas conseguem sobreviver aqui? No nosso meio ambiente? Elas também foram modificadas?
- Elas não vivem neste ambiente e não foram modificadas. Nós as recebemos de lá. Estamos sempre em contato com os nossos semelhantes que nos trazem o que precisamos e recebem de nós tudo o que eles precisam por lá. Embora estejamos tentando reproduzi-las aqui. Isso também é uma das nossas tentativas em paralelo. E é a única coisa que fazemos sem exatamente a ajuda dos nossos, já que eles lá trabalham muito mais com a descoberta da cura para o nosso problema principal. O nosso medo é que nossas pesquisas caiam em mãos erradas.
- Então as plantas chegam através de naves espaciais? É isso?
- (risos) Nem sempre fica fácil esconder nosso meio de transporte.
- Imagino que não! Será que um dia eu poderei ver? Isso tudo é fantástico. E eu nem estou acreditando estar pedindo isso! Até porque em outro tempo eu teria medo...
- Teria medo? (risos) Quem sabe eu te mostre logo? Não é? Eu acho que talvez os meus semelhantes queiram te conhecer mais rápido do que o seu desejo em conhecê-los, porque certamente essa sua pergunta não demonstrou interesse e sim preocupação.
- De fato estou temerosa... Você descreve seus semelhantes como seres muito bons. Nós temos a cultura de explorar a possibilidade da existência de extraterrestres. Dá para perceber pela quantidade de filmes que falam sobre outros seres inteligentes além de nós humanos. E você sabe que são muitos filmes mesmo! Talvez a minha aceitação e facilidade de estar entre vocês seja grande justamente porque vocês são como eu fisicamente. Vocês estão na nossa forma humana. Mas... mas não sei se essa relação seria sempre tranqüila, digo, de aceitação, não é? Não sei se... se aconteceria caso vocês não estivessem nessa forma...
Timmy me ouvia atentamente, mas sem alterar suas feições. Continuava com o mesmo olhar, sereno. E me envolvia com esse jeito carinhoso dele, de me tocar, segurar minhas mãos enquanto eu falava, as vezes mexia no meu cabelo com a desculpa de tirá-los de perto do rosto. Eu ficava um pouco nervosa porque não conseguia nem imaginar o que ele possivelmente estaria pensando sobre tudo o que eu falava. Ele não demonstrava. Era difícil desvendá-lo as vezes. E ele não se esforçava em continuar nada do que eu estava falando. Ele ficava absorto em seus pensamentos.
Até que eu me desconcentrei, comecei a desacelerar o assunto e quando já estava perdendo a noção do que falava ele então me deu um beijo tão puro e tão tranqüilo, sem pressa, apenas encaixando os lábios dele nos meus. Sempre tocando em mim, ora no rosto, ora nos ombros, ora na cintura... Puxando-me pra perto... Eu não esperava por isso, não depois do jantar em que ele nada fez. E agora que chegamos em casa ele toma essa atitude.
- Sabe, não é uma coisa do outro mundo!
Timmy falou isso logo após o nosso beijo, na maior naturalidade. Nem percebeu que o que ele estava falando era exatamente o que estava acontecendo entre nós. Então eu fiquei segurando um riso. Mas assim que ele percebeu a besteira que tinha dito, começamos a gargalhar. Esse foi um momento de descontração interessante.
Assim que nos recuperamos a nossa conversa voltou ao ritmo normal. Foi então que ele deu continuidade no raciocínio dele.
- Eu compreendo esse seu pensamento. É muito mais fácil ter medo e ficar na defensiva numa situação como esta. Não vou te julgar por isso, até porque de uma certa forma também nos sentimos assim em relação a vocês, principalmente no início de tudo, no momento em que eu comecei a ter mais contato com os humanos quando criança. E a aparência realmente é algo que pode chocar. Você vê um urso polar na TV e acha que eles são lindos, dóceis. Porque você os vê se relacionando entre si. Você está acostumada a vê-los inclusive brincando e se divertindo, assim como seus animais de estimação. Não é?
- Claro.
- Mas imagine esse mesmo animal, antes dócil, bem na sua frente. Apenas vocês dois, cara a cara. Ele pode muito bem não se importar com a sua presença e não se assustar. Mas imagine uma situação em que ele se sinta em perigo, em que ele esteja faminto? Quando eles ficam sobre duas patas, dependendo da idade deles, podem ficar duas vezes o seu tamanho! Eles possuem uma força enorme e dentes muito grandes. Em uma situação assim, o que você pensaria?
- Com certeza não os acharia nem bonitos e nem dóceis!
- E se você estivesse nessa situação de perigo e estivesse portando uma arma?
- Acho que eu a usaria.
- Em outras circunstâncias você cogitaria atirar no urso?
- Com certeza não! Mas talvez eu desse um tiro para o alto apenas para assustá-lo.
- Pois é! Em cada uma das circunstâncias você mudaria de opinião sobre um ser que você já conhece e que já viu antes. E ele poderia ficar na mesma posição, mas na realidade sem intenção de te fazer mal. Só que você a essa altura, com a arma na mão, já estaria usando-a, porque não trocaria o certo pelo duvidoso. Mas independente disso e de qualquer forma, você teria no mínimo uma reação de medo e de tentativa de defesa ou de fuga. Correto?
- Corretíssimo. É exatamente assim que qualquer pessoa poderia se sentir.
- Agora imagine ficar frente a frente, com um ser também duas vezes maior que você, mas que você nunca viu antes? Um ser completamente diferente do que já viu ou ouviu falar!
- Provavelmente as sensações e reações seriam as mesmas.
- Pois é Sofia. Tudo muito normal. Não dá para prevenir a reação de ninguém. E dessa forma, não temos motivos para ficarmos especulando e nem tentando criar situações. Isso só nos prejudicaria. O universo é grande demais. Existe muito mistério, inclusive para nós, que já conseguimos descobrir vidas diferentes das nossas, em planetas diferentes. Por enquanto, existem apenas especulações dos seres humanos sobre nós ou quaisquer outros seres vivos. E o humano que já tem a certeza, que já viu algum óvni, não faz muita diferença para o restante de vocês. Porque nesses casos ou ele é desacreditado ou vira um livro, ou um filme ou os dois, ou um documentário, ou está seguramente escondido pelo governo para não criar pânico na população. Tudo para não afetar o relacionamento entre as pessoas, não afetar a vida de vocês. Porém, se nós fizéssemos o que os filmes mostram, como alguns colocam discos voadores, espaçonaves gigantes etc. por cima de cidades, por exemplo, estaríamos causando o caos, mesmo que viéssemos de fato em missão de paz.
- Eu entendo e concordo plenamente com vocês.
- Sofia, eu estou vendo que você está cansada. Está aí quase fechando os olhos de sono. Hoje foi um dia realmente cansativo. Vou te levar para dormir.
- Está bem, você nem precisaria ser vidente ou ler mentes para perceber que estou mortinha de cansada. Vou me render, mas não pense que você ficou livre das explicações. Ainda não me falou como fui "afetada".
- Eu sei. Mas acho até importante estarmos todos juntos para você entender melhor. Pode ser?
- Sim. Também concordo.
- Vou levá-la ao seu quarto.
Eu estava realmente com muito sono. Parecia que eu tinha passado um dia inteiro na praia, nadando, correndo na areia ou coisa do tipo. Todas as vezes que eu ia à praia, quando retornava para casa e tomava banho, no momento em que colocava roupas secas e limpas, batia um marasmo, um sono gigante.
Não era um sono de exaustão física, como as de depois de mais de doze horas de plantão como farmacêutica. Era um sono gostoso e ao mesmo tempo incontrolável. Na verdade, parecia que eu havia tomado algum ansiolítico ou coisa parecida.
Assim que ele me deixou no quarto, deu um beijo de boa noite e fechou a porta. Fui direto para o banheiro e vi que eles haviam deixado tudo o que eu precisaria para minha higiene pessoal. Dormir sem escovar os dentes sempre foi algo inconcebível para mim. Ainda bem que tudo estava perfeito.
Como extraterrestres, eles realmente fizeram a lição de casa! Agradeci muito por isso. Fiquei inclusive satisfeita ao extremo por eles terem uma cama tão confortável. Mais ainda de saber que sobre esse aspecto eles eram tão humanos quanto nós.
Normalmente, quando eu me deito, mesmo que com muito sono, demoro a dormir. Desta vez foi diferente. Eu nem lembro como aconteceu porque minha última lembrança foi ter puxado o edredom para me cobrir e depois mais nada. Não deu tempo nem de repensar em tudo o que eu havia escutado e vivido hoje.
Porém, nem tudo é perfeito e, para não sair da minha rotina de crises de insônia, acordei no meio da madrugada. E sei que fui dormir em um horário relativamente cedo, já que havia anoitecido, jomos jantar e não demoramos tanto assim no restaurante, então eu tinha ido dormir antes de meia-noite.
Então a sensação era que não era tão tarde. Naquele instante eu não tinha noção ainda do fuso horário, não sabia a diferença entre meu país e aquela cidade naquela escuridão. De qualquer forma, não era dia. E isso era notável devido à escuridão através da janela.
Não quis acender a luz assim que acordei. Imaginei que assim não iria conseguir ver nada através dos vidros da janela por causa do reflexo. E também não queria que ninguém soubesse que eu estava acordada.
Sempre tive medo de andar pela casa enquanto todos dormiam. As portas e as janelas eram os lugares em que eu sempre olhava quando passava. Fazia um esforço tremendo de não olhar na tentativa de evitar ver alguém, justamente por medo. Não seria legal ver alguém do lado de fora. Se houvesse alguém tão próximo, durante a madrugada, provavelmente não seria amigável. Portanto, era melhor nem ver! Só que meu instinto de segurança acabava me vencendo e eu tinha que olhar muito bem o lado de fora da casa. Eu precisava ter certeza que não havia ninguém me observando.
E confesso que sou medrosa para isso. Sempre fui. Estar rodeada de pessoas-alienígenas não mudava esse medo que me acompanha desde a infância. Talvez até piorasse. Não por eles, mas pela situação em que eles se encontravam.
Eu nem sabia definir sensação de a tentação.
Por mais maluco que tudo possa ser e mesmo tendo tanto medo, eu nunca deixei de andar pela casa durante a madrugada enquanto todos dormiam. Só que nesse caso, o medo era em dobro. Eu estava em uma casa onde não conhecia quase nada. Estive em poucos cômodos. E ainda por cima em um país que nunca estive antes.
E acabei decidindo por me aventurar.
****Não sei... não me parece boa ideia. Será que Sofia vai ter problemas?
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