Sofia

Acordei ainda cansada. Dolorida. Há muito tempo não me sentia assim. Milla não demorou nada para perceber que eu havia acordado e veio a mim. Ela tinha um olhar materno. Ela estava preocupada, embora tenha dito que não me queria perto.

- Você está bem, Sofia?

- Ainda estou cansada. Tonta.

- Está com fome? Eu preparo algo para você agora.

- Não, estou um pouco enjoada também. E com dores. Deve ser efeito colateral após ter sido sugada a minha energia.

- Sim. Faz parte mesmo. Eu sempre me sentia mal. Depois eu me recuperava. Comia e ficava bem. Os alimentos aqui possuem algo a mais. Estão misturadas com os alimentos dos nossos planetas. Gregory consegue tudo. Ele é o espião na Terra, das duas famílias, embora esteja mais infiltrado como Condro.

- Faz sentido. E esses alimentos misturados... Isso ajuda na cura mais rápida?

- Sim.

- Foi o que aconteceu com você?

- Sim.

- Mas não te matou...

- Eu ainda não sei as consequências disso. Ainda não sei Sofia. Tenho minhas dúvidas. Talvez certezas. Mas ainda não posso te falar o que penso sobre essas transferências de energia. Gostaria de te fazer uma pergunta pessoal, posso?

- Sim, afinal, com quem mais devo conversar – Ela deu uma risadinha, baixando a cabeça e fitando o chão, mas ainda com um sorriso nos lábios, voltou a me olhar nos olhos.

- Como aconteceu seu envolvimento com o Timmy? Afinal, na época em que se conheceram você era apenas uma humana. Eu fiquei curiosa. No meu caso, bem, eu e Gabriel tínhamos a certeza de quem éramos e por convivência, acabamos nos gostando – Ela parou um pouco para um suspiro – Nos amando, na verdade. Usando o termo que vocês humanos tanto apreciam. Mas você? Antes do Jullian descobrir sobre você, Timmy te achou.

Eu não quis falar nada sobre os sonhos que o Timmy tinha comigo, antes mesmo de me conhecer. Nem os meus sonhos com eles, em suas formas reais. Portanto, apenas contei a historia a partir da trombada no museu. É claro, ela sabia já que Jullian havia descoberto minha árvore genealógica, e que decobriu antes mesmo do Timmy, a razão para eu estar me adaptando ao DNA deles.

- No fundo foi genuíno, Sofia. O amor de vocês.

- Assim como o seu e do Gabriel – Ela assentiu, mas com tristeza no olhar.

- Tem uma coisa que eu ainda sinto. Mas que Jullian, por mais esperto que seja, não consegue vê, Sofia – Franzi a testa em curiosidade – Eu sei porque sua energia está cada vez mas forte. E eu não seria uma boa mãe se tentasse ajudar meu próprio filho destruindo o filho de alguém.

- Eu não entendi. Você está falando algo sobre o Timmy? Ele está em perigo? Tem alguma coisa que eu não sei? Por favor, não me negue o direito de saber!

- O Timmy é um bom rapaz. Sempre foi. Mas ele é lento mesmo, mas não é culpa dos Orvril. Meu filho que veio com um poder e inteligência maior por ser híbrido com grandes espécies. Jullian não mentiu sobre isso. Mas estou falando do filho dele – eu estava vermelha, querendo explodir com a afirmação. Tenho certeza que estava assim.

- Que filho?!

- Você também é lenta. Se merecem mesmo!

- Para de rodeios. Que porra você está querendo dizer?

- Você está grávida! Logo você sentirá isso. E se for igual a mim, vai correr para o frio. Não vai durar muito para você ter certeza. Sua vida estava uma maravillha e virou do avesso. É natural não prestar atenção. Mas está sim, tenho certeza.

Eu não tinha palavras. Comecei a mentalizar todas as vezes que tivemos relação, bem como o fato de eu ter tomado anticoncepcional. Fiquei tranquila com isso. E tem poucos dias que iniciamos a relação sexual, não tem como saber, tem?

- Seus sintomas, Sofia, mais a sua energia. E não vai durar muito para Jullian descobrir! Seu filho está bloqueando que você libere toda a sua energia. Ele também precisa proteger você, até mesmo para se proteger. Mas ele não irá conseguir isso sozinho por muito tempo.

- Meu Deus! E agora? O que eu faço? – Fiquei feliz, mas eu estava em uma situação de perigo. E se ele tirasse minha energia poderia matar meu bebê.

- Eu vou te ajudar. Você vai aprender a usar sua energia em seu favor. Eu não sei porquê os Orvrils não pensaram nisso. Que burrice não te ensinar tudo!

- Sim, pensei sobre isso. Mas estávamos tão preocupados em aceitarmos tudo. E eu em acreditar no amor dele por mim, depois os Condros nos perseguindo, querendo contato, depois a revelação da existência do Jullian... Tudo isso nos tirou um pouco o tempo.

- Mas não te roubaram o tempo para agirem como coelhinhos, não é? – Corei.

- Se eu estiver esperando um filho do Timmy...

- E está...

- Será que ele será igual ao Jullian?

- Olha, honestamente, concentre-se em fugir. Vamos trabalhar sua energia para isso. Depois você irá lidar com isso.

- Um filho...

- Acorde do transe, Sofia! Vamos, vou te preparar uma comida. Geralmente o Gregory prepara, mas as vezes, quando estou bem, eu mesma faço. E é você que também está me passando energia boa, ou estaria mais moribunda do que me apresento. Portanto, poderei fazer isso e tentarei repor sua energia. E ainda assim, tentarei te explicar como conseguirá sair daqui. Eu preciso agir rápido. Precisamos despistar Jullian.

- E depois de tudo o que ouvi você falar, eu vou confiar em você?

- Eu aceito as coisas que Jullian porque ele é mais forte que eu, mas claro, comecei a ajuda-lo por amor. Mas as coisas mudaram, hoje tenho amor, mas também medo. Na frente dele não posso me comportar com compaixão a outros seres. Além disso, penso sempre que ele vai entender que o que ele faz não resolve nada. Já tentei muitas vezes explica-lo, mas ele não quer aceitar. Estou lhe ajudando por outras razões e ele não vai saber disso. Você tem que confiar em mim. Você não tem opção, tem?

- Apesar de estar com medo e ainda não acreditar nesta possibilidade de estar grávida, eu aceito a sua ajuda. Mas preciso que você vá me dando instruções de como fugir daqui, enquanto você prepara meu corpo.

- É extamente isso o que eu vou fazer, mas hoje você não irá tentar nada. Vai ser difícil não tentar, mas você precisa também se esforçar. Não só por você, mas pelo seu bebê.

- Sim, tudo por ele. Eu tenho uma razão de viver agora, muito mais importante do que o amor que tenho pela minha família e até mesmo pelo Timmy.

- Fico feliz. Você ainda nem tem seu filho nos braços e já tem esse sentimento. E isso é tão humano. E eu amo essa parte humana nossa. E acho que agora você vai começar a me entender um pouco. E confesso que você me deu esperanças. Vou lhe confessar algo...

Eu não conseguia mais juntar peças. Antes eu tinha ideias sobre tudo, nesse dia, tudo começava a me surpreender de outra forma. Eu tinha certeza. Nem mais poderia focar nos assuntos de família com Timmy, quando eu tinha um bebê só nossol para dar quase total da minha preocupação e atenção. Comecei a me sentir envergonhada do pensamento, como se tudo fosse girar ao meu eixo a partir de agora... As atitudes da Milla fizeram total sentido... Embora fosse tudo muito errado.

- Veja, Sofia, Jullian tirou tanto da minha energia que eu achava que ele havia matado todo o DNA extraterrestre e que eu havia me tornado humana. Ele que veio com essa teoria. Eu também achei isso. Então... – Ela deu uma breve pausa - ...ou isso é impossível ou ele não conseguiu eliminar tudo. E foi graças a você que consegui um pouco mais de saúde e de energia. Foi justamente a energia do seu bebê, uma segunda energia que eu consegui captar. Eu não sei por quê Jullian ainda não sentiu isso. Talvez isso seja coisa exclusiva de nós mulheres. Mas o fato é que está acontecendo! E estou muito feliz de ainda me sentir Condra também. Tenho que te agradecer por isso – ela veio junto a mim e me deu um abraço tão afetuoso, tão carinhoso... Eu senti um amor muito grande e feliz. Senti um choque gostoso, uma pequena descarga no meu corpo com aquele abraço. Tive a certeza de que ela não estava mentindo.

- Mas preciso te falar uma coisa – A pausa foi com um suspiro – Vou te ajudar e nada que ele pedir vai me fazer parar de fazer o certo. Não vou compactuar com mortes. Eu prefiro a minha do que deixar algum de vocês correndo risco. E estou falando da vida do Jullian também. Não irei fazer nada que possa sair prejudicado vidas, entendeu? Fazer coisas erradas, não mais. Não permitirei!

- Olha Milla, o fato de estarmos todos tentando achar o Jullian, não significava que queríamos fazer mal a ele. Pelo contrário. Queríamos entende-lo e tentar traze-lo para nós. Gabriel, por exemplo, fica se culpando, achando que a ausência do pai que o fez ficar assim, fazendo essas coisas ruins. Ele soube um pouco da infância do Jullian na Russia. E garanto que doeu muito nele.

- Sério? Eu fico tão feliz! Eu não imaginava outra coisa diferente do Gabriel, porque o conheço profundamente. Quer dizer, nem tanto. Meu orgulho foi enorme e me deixou cega. E entendi tudo errado. Estou surpresa de todos os outros estarem interessados em te-lo por perto. Como uma família.

- Sim, como família. Eu percebi que vocês Condros também são ligados a família. Se não fosse assim, seus pais e seus irmãos não estariam tão empenhados em fazer aliança com os Orvril. Principalmente para te trazer de volta. Você é amada.

- Os Orvrils não estavam tão errados sobre nós, Sofia. De fato, não estávamos interessados na Terra. Os que ficaram no nosso planeta não são tão legais. Talvez, o fato de eu ter conhecido o Gabriel, de todos nós termos um pouco dos humanos em nós... tudo isso pode ter mudado alguma coisa. O que o Peter sempre dizia sobre estarmos presos aqui e termos que nos adaptarmos a nossa nova realidade é a mais pura verdade. Iniciamos conflitos com os nossos e até acho que eles já estavam preparados para isso. O Gregory não foi um simples erro genético dos humanos. Ele foi um erro proposital dos Condros. É por isso que ele nunca teve escrúpulos.

Toda a conversa foi acontecendo enquanto Milla preparava algo para nós comermos. E foi esclarecedor para nós duas. Depois que comemos, ela me puxou para uma das camas, sentou no meio e pediu para que eu fizesse o mesmo em frente. Pegou minhas mãos, segurando pelos dedos. Ela me contou que Jullian não tinha como bloquear de fato a nossa saída, mas que conseguia bloquear a energia momentaneamente, nem sempre ele poderia estar fazendo isso. Se ele fizesse, ele também perderia a dele. Tudo era sobre energia. Os Orvrils possuíam uma tecnologia melhor, que permitia que eles pudessem ficar invisíveis sem usar a própria energia deles, mas os Condros não. Por isso ele conseguiu acessar o espaço deles e bloquear a energia deles também. Ele é uma mistura dos dois. Porém, ele sabia que eu ainda não viajava sozinha, que ainda não tinha o domínio e que Timmy ainda não havia praticado comigo. Além disso, ele sabia que eu tinha muito mais do que todos poderiam imaginar. E tudo começava a fazer sentido, finalmente!

O quarto que eu estava trancada era nada mais do que intimidação.

Fiquei curiosa, porque eles com tanta tecnologia não tinham câmeras espalhadas pela casa, escutas etc. Como ela poderia falar tudo tão abertamente? Não tinha medo?

- Ele conseguiu a casa de um humano para o trabalho. E acabou tendo problemas com ele. A outra casa estava completa. Tinha tudo, mas era longe demais do Hotel em que vocês se hospedaram e a energia do Timmy estimula a sua. Jullian sabia que vocês estavam a procura dele. Fez contato com uma pessoa influente em hotéis. Até ele ter problemas com o cara. Mas não antes do Jullian conseguir este local enorme, reformado. Também imóvel dele. Fez adaptações para você.

- Mas que maquiavélico! Desculpe... – Ela fez um gesto para mim de quem não se importava – Mas você soube que um funcionário morreu enquanto estávamos hospedados... Eu não consegui descobrir muita coisa...

- Sim... – E baixou a cabeça e tristemente me contou – Foi o Jullian. Ele o deixou preso para morrer de hipotermia. E foi aí que eu fiquei bastante decepcionada comigo.

- Com você? Não deveria ser com ele?

- Comigo, Sofia. Eu falhei com ele. Afinal, sou a mãe dele. Tive meus limites. Aprendi com eles da pior forma possível. Todos nós. Exceto Gregory e Jullian. Eu os segui, mas porque queria estar perto do meu filho. Tentei mostra-lo que ele deveria acompanhar a mim e seus familiares e não o Gregory. Ele tinha que tentar salvar o nosso planeta e saber viver na Terra entre os humanos, afinal, também temos o DNA deles! E entender que mesmo que falhemos em nossa tentativa de salvar o nosso planeta de origem, tínhamos essa nossa vida aqui. Exatamente tudo o que os Orvrils tanto falavam, tudo o que Gabriel me fez entendender, mas que meu orgulho não deixava até isso tudo acontecer. Sabe... Eu ouvi uma conversa do Gregory... – Ela hesitou.

- Que conversa, Milla? Agora você não vai omitir nada! QUE CONVERSA?

- Ele falava com o nosso líder Condro... E ele disse que talvez haja um planeta habitável para nós e para os Orvril, mas que todos eles teriam que se adaptar ao novo habitat. Que era bem diferente do nosso, mas que pelo menos a atmosfera era extremamente semelhante. Então, não faz mais sentido estarmos correndo atrás de uma cura quando eles já estão dispostos a mudar de planeta. E isso eles não iriam dizer aos Orvrils, com certeza.

- Mas será que eles não poderiam levar a "doença"junto?

- Eu não sei. Mas pareceu que não. Pela tranquilidade deles em relação a isso. E foi por isso que eles deram apoio ao Gregory e ao Jullian para que eles se tornassem fortes e dominassem nosso povo aqui. Condros e Orvrils. No fim, nossos planetas queriam usar a Terra para reconstruir o novo planeta. E isso nos destruiria também. Mas Jullian e Gregory logo entenderam e tiveram o plano de se tornar mais fortes, ao ponto de destruir os planos deles. Mas para isso, ele teria que nos destruir também. Ou melhor, nos transformar em humanos.

- E como ele iria destrui-los com nossas energias já que ele está aqui e ele lá? Não seria mais fácil eles enviarem mais alguns deles para cá e tentar nos destruir?

- Eles conseguem, mas eles não duram muito tempo na Terra. Eles colocam os soldados suicidas em corpos humanos que conseguem se transformar neles mesmos, mas pouco tempo duram aqui.

- Não temos mais tempo. Você precisa me tirar daqui, precisa me ensinar. Eu preciso avisar a todos!

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