Capítulo quarenta e três
Sofia
Fomos ao museu de gelo. E também ao Chena Hot Spring Resort. Ele disse que a grande piscina é legal, mas que não entrava nunca. Apenas gostava de ver as pessoas se divertindo na água, principalmente os idosos e as crianças. E confessou que as vezes participava de uma competição de arte no gelo, onde as pessoas fazem esculturas, inclusive, com iluminações. Pegou um álbum de fotos no carro e me mostrou algumas de suas esculturas. Eu não levo muito jeito, mas gostaria de ajuda-lo a fazer alguma dessas. Será que é tão divertido como mostram em filmes?
Isso me fez até esquecer a conversa tensa que tivemos há alguns dias. Timmy perguntou se eu gostaria de conhecer algumas cidades do Alasca ou até no Canadá. Estou disposta. Vou aceitar tudo. Agora não tenho mais razão para fazer bico e cara feia. Decidi viver um dia de cada vez. Ele parecia estar se esforçando para mostrar que não era uma pessoa ruim e que queria o meu bem estar e felicidade.
Depois de conhecer alguns pontos principais de Fairbanks ele me levou para Juneau, a capital. Conheci rapidamente a cidade, que é pequena, costeira, com montanhas e repletas de pinheiros. Aliás, toda a vegetação naquela região é de coníferas. Foi então que sugeriu ir para o Canadá, que em um outro momento ele voltaria ao Alasca e me levaria para conhecer outras cidades do Estado. Ele prometeu que eu iria adorar tudo. Imagino que sim. Como já disse, sou o oposto da minha mãe. Adoro lugares rústicos e calmos.
Finalmente eu ultrapassei os limites do Alasca. E acabamos chegando ao Canadá, já que ele sempre julgava o Alasca como um lugar em que as pessoas deveriam vê-lo com menos frequência, para evitar tantas especulações, pois tinham negócios importantes naquele local e eles viviam por lá. Portanto, era o lugar em que eles deveriam se esconder mais.
De qualquer forma, eu teria neve. Sempre tive esse sonho, essa loucura para conhecer uma das maravilhas da natureza e que o homem simplesmente não consegue reproduzir. E estou amando. É lindo. Eu não me canso de ver. Outra coisa que eu sempre quis: poder esquiar e vestir aquelas roupas próprias para o frio! Parece bobagem, mas sempre achei que deveria ser o máximo.
Não precisávamos estar tão super agasalhados, mas era importante não andar de havaianas e roupas leves, ou seríamos considerados ETs. E como eu já estava conseguindo suportar um pouco mais as baixas temperaturas, eu poderia aliviar o volume e o peso com as roupas internas. Engraçado como as minhas células trabalham a energia também regulando a temperatura.
Toda a família do Timmy ficou no Alasca. Fomos somente nós dois até o Canadá. E já que as estações de esqui duram até o meio do ano, ele resolveu que deveria me levar para conhecer os locais prediletos dele. E também os que seriam mais seguros para nós.
Os lugares escolhidos foram as montanhas de Whistler e Backcomb. Eu jamais tinha ouvido falar em nenhum desses lugares, mas ele explicou que lá tem altitudes mais baixas, e como estava ainda me acostumando com as trocas da minha temperatura corporal, eu provavelmente sentiria menos falta de ar. Se fossemos para lugares mais altos eu iria sofrer e aproveitaria menos as nossas "férias". Existem lugares ainda mais baixos. Só que não seria tão divertido. Ademais, ele gostava do lugar por não ser tão grande. Vilarejo com poucas ruas, embora por lá tenham lojas, bares, restaurantes e hospedagens excelentes.
Eu estava radiante com o lugar. Era tudo tão branco, cinza e um pouco de verde escuro por causa da vegetação coberta de neve. As vezes tínhamos dias de céu azul com um sol que deixava tudo tão mais brilhante! Quando o céu estava cinza, era porque estava caindo muita neve. Nesses dias eu me sentia um pouco triste. Depressiva. Talvez porque eu associasse datas tristes à situação climática. Nunca descobri a razão real da melancolia que até me dava enjôos.
Uma coisa conseguiu tirar-me desses pensamentos negativos: andar de teleférico.
Eu andei pela primeira vez na vida em um teleférico. Fiquei emocionada por estar sentada naquela cadeira, ao lado de um homem tão lindo. Sim, para mim ele era cem por cento humano. Cem por cento lindo. Tinha até orgulho de ser uma mulher tão comum, desfilando com um gato de suspirar. Talvez, para outras mulheres ele fosse até comum. Mas não para mim. Ele estava se transformando no meu pequeno Sol, embora eu não confessasse.
A atenção que ele me prestava era algo tocante. Ele ria tanto quanto eu, parecia estar tão feliz quanto. Realmente era sincera a alegria dele. Vê-lo no meio de tanto branco, realçava ainda mais a cor dos olhos dele, que começava a se tornar muito azul a medida que ficava mais frio. Os cabelos adquiriam uma claridade também. A pele branca. As bochechas dele eram rosadas e eu achava isso muito bonito. Sempre achei esse detalhe bonito nas pessoas de pele clara.
Passamos o dia subindo aquela montanha de Whistler. Timmy conhecia alguns instrutores. Tanto que eles o chamavam pelo nome. Até que um deles veio ao Timmy, extremamente feliz por vê-lo acompanhado, já que ele não disfarçou:
- Olá Timmy!
- Ei, Thomas! Como vai? Muitos alunos nesta estação?
- Alguns. Mas estou vendo que você está querendo roubar meu emprego... - Falou isso olhando para mim com um sorriso largo.
- Ah, esta é Sofia. Ela é brasileira, nunca esteve em um lugar com neve, então está tendo alguma dificuldade.
- Olá! É um prazer conhecê-lo. Mas o Tim está sendo gentil.
Foi o que imediatamente falei para o rapaz, só que olhando para o Timmy e fazendo uma careta ao mesmo tempo. E continuei:
- E dificuldade? Nossa! Eu estou levando uma surra de um monte de gelo!
- Então, vocês se conheceram no Brasil? Eu não sabia que você tinha ido para terras tropicais amigo! Porque não me levou com você?
- Ah, eu adoraria, mas foi uma viagem rápida e de negócios.
- Como assim negócios? Não vai me dizer que está levando peixes para o Brasil! Sofia, lá vocês não pescam?
Achei bem pertinente, inteligente e engraçada a pergunta.
- Sim. Mas o Salmão é deles.
- Ah, muito bem, muito bem, faz sentido. E você está de férias no Canadá com o Timmy... – É claro que ele estava especulando.
- Sim, ela está de férias no Canadá. Mas irá morar comigo nos EUA.
- Opa! Espera um pouco, espera um pouco! Quer dizer que meu amigo Tim, está apaixonado? Explique-me direito!
- Pois é, caro amigo, eu precisei ir ao Brasil buscar o meu grande amor – Meu pai eterno! Por que ele falou isso? Assim, na lata? E daquele jeito? Sem nem termos conversado nada sobre isso!
- Então se é assim, Sofia, você precisa saber que este homem sempre foi um cavalheiro! Nunca o vi com mulheres. Sempre as respeitou e nunca brincou com os sentimentos de nenhuma delas. E se ele a trouxe aqui e está falando em alto e bom som que você é o amor da vida dele, então essa união está mais do que abençoada!
Timmy deu uma gargalhada e o recriminou um pouco, porém em tom de brincadeira:
- Nunca me viu com mulheres? Tá insinuando o que? Pegou mal heim?
- Quis dizer namoro sério garotão! – E riu.
- Ah! Moreno, você só fez piorar minha reputação... Agora virei galinha?
E os dois começam a rir um com o outro, dando murrinhos em seus ombros. E logo depois um high five. Percebi que os dois possuíam apelidos carinhosos: Um era o garotão e outro moreno. E quando o "moreno"olhou novamente para mim, tive que continuar a conversa.
- Eu acredito em você. E posso dizer que meus sentimentos por ele é recíproco.
Tim virou-se para mim enquanto eu dizia aquilo e eu fiquei sem coragem de olha-lo nos olhos, embora eu tenha visto que ele tinha um olhar tão afetuoso e que parecia estar radiante com aquilo que eu acabara de dizer. E olha que eu falei exatamente o que o meu coração sentia, sem mentiras e sem medo de errar.
- Ótimo. Esta noite vocês serão meus convidados. Vamos celebrar esta união! E eu espero ser convidado para a cerimônia de casamento ou eu cobrarei todas as aulas de esqui que te dei de graça, seu malandro! Thomas fez uma gracinha dando uns tapinhas na barriga do Tim.
Tim riu muito com o comentário do Thomas. E concordou com a celebração oferecida pelo amigo, que logo nos deixou a sós para que continuássemos nos divertindo na neve.
Thomas era um homem moreno, com um belo sorriso. Tinha dentes perfeitos e bastante brancos. E deu para perceber que era musculoso, mesmo por baixo de tanta roupa. Pessoas grandes se destacam com facilidade. Estranho era imaginar um grandalhão sendo instrutor de esqui, já que não parecia ter muita flexibilidade.
E por falar em flexibilidade, Tim era muito paciente comigo, considerando o fato de eu ser uma principiante. Eu não conseguia ficar em pé mais do que cinco minutos. O primeiro dia foi um horror. E santo era o remedinho verde! De qualquer forma, foi maravilhoso.
Decidimos então subir mais um pouco, então fomos à montanha de Backcomb, que era bem maior, com várias pistas de esqui. E por incrível que pareça, a geleira de lá proporcionava uma prática de esqui até agradável. Não era tão frio e tão alto ao ponto de nos deixar sem fôlego ou cansados demais.
Pelo menos não para nós.
Eu tive muita sorte em estar me divertindo em uma época tão boa, pois a neve estava sempre fresca e em uma profundidade muito boa. Amei conhecer, inclusive, cascatas congeladas. Incrivelmente fantástico de tão lindo.
Pratiquei snowboard acreditando que seria como andar de skate. Ledo engano! Ficar com os dois pés presos em uma taboa não era fácil. Então, logo desisti da ideia, embora estivesse fazendo Timmy rir muito. Eu preferia estar com meus dois pés livres e ainda ter os bastões em ambas as mãos para um maior apoio.
O "Tube Park" foi um dos meus preferidos. É excitante deslizar naquelas bóias gigantes montanha a baixo. Lembrei de um parque aquático em São Paulo que fui certa vez com a minha família. Eles tem um brinquedo semelhante, que para mim, é o melhor de todos.
Eu gritei inúmeras vezes de emoção. Fui repetidas vezes. Eu tive que me conter porque parecia que Tim não era tão apaixonado assim pela bóia. Acho que ele preferia snowmobiling. Como nunca fui fã de motorizados, tive que acompanhá-lo para sermos democráticos nas diversões. Eles com snowmobiling e nós, Brasileiros, com Jet-ski. Não que eles não tivessem isso lá, mas com certeza no Brasil não temos este motorizado no gelo!
Até escaladas no gelo nós tentamos. Tudo bem que aquelas botas com ferros ajudavam, mas eu simplesmente não conseguia usar os machados para o gelo. Eu não tinha muita coordenação motora. Poderia até tentar mais um pouco, mas estava sendo tão tedioso que Tim logo percebeu que demoraríamos muito para encontrar a diversão nesse esporte. Desistimos.
Inclusive eu nunca imaginei o quanto é complexo os acessórios para brincar na neve. Alguns diferem com o sexo, com o tipo da prática, ou seja, se eram para turismo ou para esportes. Incrível a variedade de tudo, principalmente de roupas.
E por falar em roupas, enquanto Timmy escolhia as roupas mais escuras como um preto ou azul escuro, eu decidia por cores mais interessantes, mais vibrantes. Ora usava totalmente branco, ora totalmente rosa ou totalmente verde-limão. Eu queria estar ou totalmente igual a neve ou completamente destoante dela.
Ele achava essa ideia interessante, para mim apenas.
A noite eu tentava ficar em lugares um pouco mais aquecidos, para poder pelo menos me livrar daquelas roupas que só me deixavam desengonçada para andar e me mover. E quando eu precisava ir ao banheiro? Era uma novela mexicana. Quase impossível mudar essa situação desagradável e de certa forma patética. Foram dias muito legais. Ele sempre disposto a me deixar feliz.
O amigo do Tim, o instrutor, nos levou para um bar de gelo. O bar era literalmente feito de gelo. Era uma espécie de caverninha. Não precisava de refrigeradores ou qualquer local onde normalmente armazenamos as bebidas.
Era gelo puro. Mesa, cadeira, balcão... As bebidas eram servidas a menos vinte e quatro graus Celsius. E o lugar parecia estar mais frio do que nas próprias montanhas! Embora eu estivesse desconfortável com o fato de não estar acostumada com as minhas mudanças de temperatura corporais, não posso negar que o lugar era realmente super interessante. Eu não sei explicar. Eu sentia frio, percebia as diferenças na temperatura, mas não sentia incômodo.
Como nem eu e nem o Tim gostávamos de badalações e nem de ingerir muita bebida alcoólica, aceitamos o convite desse amigo do Timmy apenas para nos socializarmos e para que os contatos dele com os humanos permanecessem sempre normais.
Nos outros dias apenas saímos para jantar em um restaurante agradável e menos agitado. Esses lugares, onde íamos, todos conheciam o Tim. E eram clientes a muitos anos da família dele. Portanto, éramos sempre muito bem vindos em todos os locais que íamos. Imaginei o quanto ele era conhecido no Canadá. Frequentador de restaurantes. Será que ele ia com alguma das mulheres citadas pelo amigo? Será que tinha a tal rotatividade mesmo?
Além das estações de esqui, Tim também quis mostrar outro lugar que ele gostava de ir. Um lugar chamado Tofino. Essencialmente aquático. Lindo. Vimos muitas baleias. Duas pularam na nossa frente enquanto estávamos em um barco. Assustador, mas divino. Havia muita diversão nesse lugar, mas também muita coisa que ele gostaria de me ensinar. Principalmente depois do que eu havia descoberto na piscina.
Só que para isso, ele precisaria de tempo. E como ele havia decidido primeiro me deixar feliz matando a minha curiosidade com a neve, essa outra etapa ficaria para depois. Afinal, eu precisaria mesmo de tempo para me acostumar com a nova condição de vida.
Ficou claro que eles não são seres essencialmente aquáticos. Apenas possuem uma habilidade que possibilita a eles uma resistência maior em vários tipos de ambientes. Aquáticos ou terrestres. E o mais importante é que não era algo vital, ou seja, eles sempre possuíram a habilidade, mas não dependiam dela. Essa habilidade tem duração de algumas horas, pois com o passar do tempo as células do pulmão não conseguem mais manter esse tipo de respiração.
Eu fiquei muito feliz dele ter me explicado isso e também ter decido como nós dois iríamos começar a nossa nova vida juntos. Primeiro, "nos conhecermos melhor", em uma situação que pudéssemos ficar mais a vontade e íntimos um do outro, para nos sentirmos mais confortáveis com essa nossa realidade. E sozinhos, sem a interferência de familiares.
Acho que foi por isso que ele escolheu como nosso primeiro passeio no Canadá um teleférico enorme. Achei muito romântico.
Muitas pessoas pensam em gôndolas, Veneza... Acho que comercializaram e idealizaram muito este passeio como o ideal para um passeio romântico. Meu passeio com o Timmy foi inesquecível! Lindo e muito romântico. Apenas nós dois.
Estávamos apaixonados. O visual e a grandiosidade eram incomparáveis.
Imaginei que essa mesma viagem em outra época do ano também deveria ser muito bonita. E com uma paisagem completamente diferente. Muito branco em uma estação e muito verde em outra. Tudo em Vancouver era lindo.
A viagem ao Canadá se tornou o nosso segundo encontro e ao mesmo tempo nossa primeira viagem a sós. Confesso que eu não parava de pensar no momento em que fôssemos descansar, ao cair do dia. Mas não por estar querendo descansar de fato...
Naturalmente iríamos dormir no mesmo quarto. Mas o que aconteceria? E se houvesse alguma coisa diferente no corpo dele? E se ele mudasse e se transformasse em alguma outra forma? Tantas ideias na minha cabeça, mas nenhuma concreta. Teorias, apenas teorias. Não dava para visualizar nada além da forma humana... Sim, eu estava pensando em sexo, afinal, a proposta era ficarmos sozinhos por alguns dias. O que esperar dele, que até então sempre foi tão respeitoso e paciente?
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