39 | Fora de Si
Cadu
15/03/2018
Quinta-Feira, 21:58
Enquanto lia a mensagem que o Esquilo enviou com uma explicação do que está rolando, respirei fundo, tentando controlar a raiva que sentia subir só de imaginar esse bando de incompetentes incapazes de cuidar de um ômega no cio, qual a dificuldade?
Eles só tinham um trabalho e mesmo assim, fizeram merda.
Em um segundo, minha mente fervilhava com uma infinidade de possibilidades: ele correndo por aí e se ferindo ou atropelado por algum carro; sendo encontrado por algum alfa maluco; sendo encontrado por aqueles traficantes humanos que adoram pegar alfa ou ômega por aí pra mandarem pra algum bordel;
Me inclinei, sentindo a cabeça até doer só de imaginar ele traficado pra algum bordel como eu fui antes e enquanto verificava as mensagens que a família dele e aquele Esquilo me enviaram, apertei o celular, incrédulo.
Segundo o Esquilo, só o deixou sozinho por alguns minutos pra buscar algo no apartamento dele e quando voltou, Henri já não estava. A empregada que contrataram pra cuidar dele não o viu e pelas câmeras, sabiam que ele foi direto pro elevador, mas não o encontraram ali também.
Então, Henri está no cio e perdido por aí.
Eu sabia. Devia ter ficado com ele, levado pro apartamento que o velhote me deu e deixado no meu quarto seguro, ele com certeza estaria melhor e mais seguro comigo.
— Cara, qual é a dessa cara? Era só zoeira. — Cauã disse, mas o ignorei, mandando Puf ver onde Henri estava. Ele sempre sabe onde Henri está e a bolinha sumiu do meu bolso no mesmo instante.
— Eita, que voltou a ficar bravo com qualquer provocação… — Bruno disse e ergui o olhar, vendo que eles pareciam até cautelosos enquanto me encaravam.
— Victor, me dá a chave do seu carro. — ir buscar Henri de moto está fora de questão e ele é o único que veio de carro.
— Sem chance, é um Maybach. — o idiota riu e arqueei uma sobrancelha. — Pra quê? Vai de moto, uai… — uma nova notificação chegou e ao abrir o WhatsApp, entrou direto numa conversa com a Madu.
💬 Madu: Seu pinscher raivoso fugiu, vem buscar ele. | 21:59
E então veio uma foto do Henri usando um pijama cor de rosa, pendurado no portão da minha antiga casa e quase ri por saber que mesmo no cio, ele só saiu por aí pra me procurar.
— É, qual foi, agora estava parecendo que ia bater em alguém e agora tá sorrindo, para com isso. — Cauã me deu uma cotovelada na perna.
— Não importa, Victor...
— Nem fodendo, não vou emprestar meu carro. — Victor negou. — Só eu seguro aquele volante, tive de economizar por sete meses pra…
— Eu não estou pedindo, Victor. — meu sorriso aumentou depois de digitar pra Madu ficar de olho no Henri e não deixar ele vagando por aí, já até comecei a discar o número dele quando Victor fez uma careta, arremessando a chave.
— Se bater ele, vou ficar com aquele carro que seu pai te deu quando fez dezoito! — retorquiu quando eu já passava pela porta e acenei com descaso.
É algum carro esportivo, verde neon que não dirigi uma única vez. Fica lá no estacionamento do prédio pegando poeira. Agradeci ele pelo presente, mas não gosto de dirigir carro e sou um ímã de assaltantes. Perdi aquela minha moto velha toda capenga, se eu brincar com um esportivo caro por aí, seria sequestrado e desmembrado por um resgate milionário que eu nem tenho pra pagar.
Já estava tirando o carro da garagem quando Henri finalmente atendeu a chamada.
— A-alô? Cadu, cadê você?! — sua voz estava trêmula e embargada, mas só consegui sentir alívio por ele estar tecnicamente seguro.
— Onde está agora, Henri? — não posso deixar ele desligar, vai que corre pra outro canto por aí? Madu não conseguiria segurar ele. — Você está melhor?
— E-estou... eu só... onde... p-por que não disse que se mudou? Onde está morando? Por que não me mandou uma mensagem? — como se ele fosse ver alguma…
— Achei que aquele Esquilo te diria já que o Victor é fofoqueiro.. não me diga que está aí na frente da casa da Dona Carmen… — verifiquei no mapa a rota mais rápida, mas tudo parecia congestionado, então acabei pegando uma rota mais longa, deixando o celular no viva–voz enquanto digitava uma mensagem avisando a família dele e pedindo pra Madu afastar e deixar ele em paz.
Ele não gosta dela, a presença dela pode incentivar ele a fugir dali.
— Não, não estou! — mentiu depois de hesitar um pouco e ri.
— O Esquilo avisou desesperado falando que você fugiu. Pra onde vai, hein? Ainda não está totalmente recuperado, precisa continuar de repo…
— Tinha uma mulher estranha no meu apartamento, Cadu! — exclamou, a voz até falhando. — Mexendo na sua cozinha! Eu não ia ficar esperando uma facada lá! — deve ter se assustado e fugiu sem pensar, esse bando de incompetente nem pensou em como ele reagiria com um estranho por perto nesse estado? Apertei as mãos no volante, respirando fundo e tentando manter a calma pra não alarmar ele.
— Ela deve ser a nova funcionária. Se ninguém te informou, fui demitido. — e ele ficou em silêncio por um longo instante. — Henri?
— O-o quê? — é, ele não deve estar pensando direito, até reage devagar…
— Que tal ir pra um local seguro primeiro? — tentei soar o mais natural possível, ultrapassando alguns carros lentos pela rua, cortando caminho por outra rua que parecia menos movimentada. — Estou indo te buscar, não fique do lado de fora...
— Eu posso ir de uber… — minha essência escapou só por imaginar esse horror.
Ah, mas não vai nem fodendo!
Mandei outra mensagem pra Madu, só pro caso dele tentar pegar mesmo um uber, ela arrastar ele pra casa dela.
— Não, é perigoso. — ele ficou em silêncio outra vez e soltei o ar devagar, percebendo que meu tom pode ter soado estranho. Arranhei a garganta, abrindo as janelas do carro pra dispersar minha essência pra ela não impregnar no carro. — Se está perto da casa da Dona Carmen, estou indo te buscar.
— Eu não quero ir pra casa!
— Não vou te levar pra casa, vou te apresentar meu novo cafofo. — o apartamento que o velho me deu antes e, literalmente, o melhor lugar que eu posso ficar agora que estou desregulado. Não queria ir pra lá já que é fora do meu orçamento bancar aquilo, mas é melhor ter um lugar seguro pra enfrentar meu cio que pode começar a qualquer momento do que estar em algum lugar aleatório e sem controle nenhum. — Está com fome? Vou fazer janta pra você, alimentar esse monstrinho nessa sua barriguinha sem fundo... — e ele continuou quieto, sua respiração parecia superficial. — Tem certeza de que está bem? Como se sente?
— Hm... Eu estou com fome. — soou manhoso e encarei frustrado o trânsito que seguia lentamente à minha frente, rindo ao lembrar que esse é quase seu bordão sempre que acorda. — Eu estou falando sério.
“Eu achei ele, papai!” a voz de Puf soou de repente e suspirei aliviado ao ouvir isso. “Ele está bem, mas tão magrinho, judiado… mataram nosso porquinho de fome! Eu quero matar esses malditos, papai! Deixaram nosso porquinho com fome!” e seguiu reclamando disso, pra minha irritação.
É claro, além de deixarem ele fugir, ainda o deixaram com fome… custei pra engordar ele que tem metabolismo acelerado e emagrece um quilo até se pular uma única refeição…
— Acho que eu vou desmaiar de fome… — choramingou baixo e senti meu peito até se apertar ao ouvir esse muchucho. — Cadu…
— Já estou indo te buscar, Puf está com você agora. — avisei, ele exclamando um “oh, está mesmo!” num sussurro adorável, antes de soltar uma risadinha gostosa de se ouvir.
— Oi, neném. — sussurrou do outro lado.
Os pais do Henri me enchiam de mensagens querendo saber onde ele está para irem buscá-lo, mas nem pensei muito ao bloquear seus contatos, além de mandar pro Esquilo que eu iria cuidar do Henri a partir de agora. É surpresa Henri não ter sido sequestrado nesses anos todos se ficou sob os cuidados desse povo.
Madu me enviou outra foto, Henri estava do outro lado da rua, apoiado contra o muro e encolhido numa bolinha, apoiando o telefone contra o ouvido, o rosto vermelho.
💬 Madu: Estava chorando horrores aqui. E se está no cio e ainda veio te buscar, é um sinal mais que claro que gosta de você. Deixa de ser panaca, seu ex foi um maluco, mas não significa que esse aí vai ser. Se não for cuidar dele, vou roubar pra mim ;D | 22:19
Bloqueei a tela sem querer ver mais dessas perturbações dela, não preciso dessa lavagem cerebral dela pra decidir alguma coisa.
Pela merda do trânsito, demorei quase uma hora pra estacionar na frente da casa da Madu. Tentei distrair Henri falando qualquer abobrinha pra ele não desligar enquanto Madu me enviava fotos dele de vez em quando.
Uma dele desmaiado na calçada depois que parou de me responder, outra dele no quarto dela e então, ele no telhado da casa dela segurando uma vassoura como arma. Salvei todas porque mesmo descabelado, de pijama, magrinho de fome e ameaçando os outros com uma vassoura em cima do telhado, ainda parece lindo.
Quando desci do carro, podia ouvir uma gritaria do outro lado do portão da casa da Madu e mal bati duas vezes quando o portão se escancarou e Heloisa, irmã caçula da Madu surgiu, me encarando com os olhos arregalados, face vermelha e suada. Nem precisou dizer nada a respeito da cara de pânico.
Atrás dela, ainda no quintal, a mãe da Madu usava um cobertor pra tentar cobrir meu porquinho raivoso. Madu tentava fazer ele soltar o cabelo dela e meu porquinho usava uma almofada com estampa florida pra bater nela, que também puxava o cabelo dele, os dois se engalfinhando feito duas galinhas, uma hora era um tapa, outra hora era uma bicuda.
— Olha só, o Edu chegou! — Heloísa berrou, saindo do caminho e já ia dizer que não precisava desse berro quando dona Janete me encarou como se visse um salvador, como se largasse de mão e Madu tentou recuar, mas o porquinho aproveitou pra derrubar ela e os dois rolaram no chão se enchendo de tapas.
Me aproximei, pensando que teria de erguer o Henri e acalmar ele, mas foi só erguer o olhar e me encarar que sua cara raivosa se desfez num segundo, parecendo confuso por um instante antes de sorrir, exibindo aqueles dentinhos de coelho, os olhos se fechando um pouquinho enquanto soltava o cabelo da Madu, que arfava vermelha e suada no chão, me encarando com os olhos arregalados.
— Vem cá, deixa essa boca de sacola aí… — estendi as mãos, me inclinando pra ajudar ele a se levantar, mas como uma criança, ele estendeu os braços e não pensei muito ao erguê-lo até que ficasse de pé, mas mal se pôs de pé e se aninhou nos meus braços, praticamente desabando em cima de mim ao envolver minha cintura.
O segurei com força, sentindo seu calor febril, aquela irritação angustiante se desfazendo enquanto uma paz que nem sabia que precisava me inundava. Apoiei seu peso, o erguendo quando não parecia capaz de se manter de pé, sua essência escapando enquanto alisava seu cabelo, tentando arrumar esse ninho quando Dona Janete se aproximou, colocando o cobertor ao redor dele.
O ergui já que parecia fraco, incapaz de se manter de pé e franzi o cenho, sentindo seu peso mais leve do que a última vez que o segurei, a irritação voltando ao lembrar daqueles… respirei fundo pra manter a calma, usando uma mão pra enrolar ele no cobertor, ouvindo Dona Janete rindo meio exasperada e explicando que ao acordar na casa delas, Henri tentou fugir desnorteado e acabou no telhado acuado e só desceu quando Madu voltou da farmácia, tendo que provocar ele de propósito.
Henri não conhecia a Dona Janete ou Heloisa, deve ter achado que foi sequestrado.
Agradeci elas por cuidarem dele, Madu ainda estirada no chão ergueu um braço, estendendo o polegar pra cima.
— Você está me devendo uma. — falou cansada e antes mesmo de responder, Henri bufou, começando a reclamar dela, xingando ela de tudo quanto há palavrão.
— Sei, está bem, ela é mesmo… — dei alguns tapinhas em suas costas e Madu me xingou enquanto eu seguia em direção ao portão.
Suas reclamações saíram da existência irritante da Madu para como acordou e tinha uma estranha na casa dele, como ficou preso no elevador, esqueceu as chaves, fugiu com um uber, tentou saltar o portão da minha casa e nem quis me soltar quando tentei deixá-lo no banco traseiro do carro, então tive de me sentar no banco até ele se acalmar, mas não pareceu funcionar também já que começou a chorar, soluçando por que me mudei e me demiti, acho que a memória seletiva dele atacou outra vez.
— Ainda está muito instável. — Madu disse e ergui o olhar, vendo ela, descabelada, se aproximando com uma sacola. — Não dei nenhum supressor pra ele e…
— Sai! — Henri gritou com a voz embargada, afundando o rosto no meu peito e se encolhendo, chorando mais alto e sinalizei pra Madu recuar um pouco. — Não fala com ela, você não pode! — ainda me deu uns beliscões entre as costelas e sorri.
— Ela te ajudou, Henri.
— Não ajudou! Não fala com ela! Você é meu! Não pode falar com ela, eu estou mandando! — ouvi Heloísa rindo e suspirei, ajeitando ele no meu colo.
— Está bem, não falo, fica calmo. — tentei ajeitar seu cabelo outra vez, vendo Madu cruzando os braços e se apoiando contra o portão. — Fica quietinho, pode dormir. — e ele ergueu a cabeça, me encarando indignado e até abriu a boca, provavelmente pra mandar eu não falar com a Madu de novo. — Não vou falar com ela agora, prometo.
E então ele se aquietou, parando de chorar e se encolhendo um pouco, antes de afundar o rosto na minha camisa.
— Ele vai ficar bem? Pobrezinho, estava muito assustado antes… — Dona Janete disse, olhando ao redor por um momento. — Felizmente nenhum alfa o seguiu, seria muito perigoso… me dá um medo ver um ômega nesse estado sozinho por aí, onde está a família dele? — sua preocupação era genuína e pra evitar de xingar esse povo, desconversei mencionando que tinha de levar Henri pra descansar logo.
— Obrigado por cuidarem dele. — sorri, aliviado por ele não ter nada além de alguns arranhões da briga com a Madu.
Madu não podia falar um “a” que ele se agitava e chorava outra vez, então ela ficou quieta até ele começar a cochilar e mesmo com ele apagado, foi difícil fazer suas mãozinhas me soltarem. Quando consegui colocá-lo no carro, estava impregnado de sua essência.
— Eu. Te. Falei. — a bocuda da Madu soltou pausadamente e a encarei, impaciente.
— Vai continuar insistindo com isso? Deixa de ser doida…
— Doida nada, Helô, você é ômega, diz aí se procuraria outro alfa no seu cio. — ela deu um empurrãozinho na irmã que ainda olhava pro Henri preocupada.
— Nem se eu fosse louca. Só chorar e me humilhar por pica no meu quarto é suficiente. — contive o riso vendo a mãe dela a encarando com os olhos arregalados, espantada. — Por que fala de mim se você também é ômega?
— Eu nem tenho cio, sou praticamente uma beta. — ela deu de ombros, cruzando os braços. — Estou te avisando, Edu: se deixar ele escapar, vou roubar pra mim.
— Cria vergonha na cara, não estava me enchendo o saco pelo número do Victor antes?
— O negócio é atirar pra todos os lados pra ver quem está sem colete. — sorri, vendo essa descarada usando os dedos como se fosse uma arminha e fingindo atirar na direção do Henri, mas fechei a porta pra evitar que o tiro pegue nele.
Ela fez uma careta pra mim e prometi pra Dona Janete voltar pra agradecer direito depois que o Henri melhorar. Mal liguei o carro e meu celular começou a tocar, era o Esquilo e nem me incomodei em atender, só mandando pra ele que já estava com Henri, mas não pretendia deixar com eles de novo.
Levar ele de volta pra perderem ele de novo? Nem pensar, eu vou cuidar dele a partir de agora.
Henri
15/03/2018
Quinta-Feira, 23:18
Acho que em algum momento eu cochilei e acordei no susto dentro de um carro.
Pisquei com força, atordoado, podia sentir minha cabeça até pesando enquanto tentava entender o que estava acontecendo antes da ideia de ter sido sequestrado na calçada me atingir, mas o gritinho de Puf me tranquilizou.
Podia sentir um aroma pelo carro, algo forte e distinto, não sei do que é, mas é muito bom e enrolado como um burrito em um cobertor, mal conseguia abrir os olhos outra vez, completamente imerso na essência calmante que preenchia o ar ao meu redor.
Quando abri os olhos outra vez, estava em um corredor em um movimento suave, como se estivesse sendo carregado nos braços de alguém, minha pele quente me causando incômodo. Um instante de pânico me invadiu e tentei me soltar, mas senti uma mão alisando minhas costas, percebendo que meu rosto está apoiado contra um ombro, erguido como uma criancinha.
— Fica calmo, já estamos chegando. — me encolhi com um sussurro bem próximo do meu ouvido e senti o que tinha de forças indo embora, reconhecendo que era o Cadu e escondi o rosto em seu ombro, todo o meu corpo relaxando de forma inconsciente.
— Eu estou com fome... — murmurei e o ouvi rir baixo, sua mão acariciando minhas costas gentilmente. — Cadu...
— Eu sei, vou preparar algo rápido... — ele parou por um instante e ouvi o som de uma porta abrir, mas não consegui erguer o rosto pra olhar ao redor, sendo carregado pra dentro, antes de ser deixado em uma superfície macia e aconchegante, meu corpo bem enrolado em um cobertor.
— Vou terminar o jantar, espera aqui. — acenei, me encolhendo no sofá e observei sua figura desaparecendo ao se enfiar por um arco.
Acho que cochilei de novo, pisquei e acordei com Puf ronronando alto enrolado no meio da minha testa, a claridade fraca da sala me permitindo acostumar aos poucos com o ambiente enquanto me levantava.
O cheiro da comida e o tempero familiar mais do que bem–vindos me atraíram pra fora do sofá em que estava, não reconhecia o ambiente em que estava, até chegar na entrada de um arco, vendo uma cozinha com bancadas altas, os armários eram mais altos ainda e franzi o cenho.
Parece sob medida pra um gigante. E o gigante usava um avental á beira do fogão mexendo em algumas panelas e senti aquele calorzinho no peito, se espalhando pelo corpo todo. Pensei em não chamar atenção, me aproximando da bancada e apoiei as mãos ali, tomando impulso pra me sentar em cima, mas nem saí do chão. Ia tentar de novo, mas parei ao ouvir uma risadinha e olhei por cima do ombro, o Cadu me encarava com graça.
— Se acha tanta graça, me ajuda aqui. — exigi e ele diminuiu o fogo do fogão, se aproximando e me estendendo os braços.
Nem tive tempo de dizer que estava só brincando, fui segurado e erguido tão rápido que fiquei sem reação já em cima da bancada, o encarando surpreso, o coração quase saindo pela boca de tão rápido que batia e por um momento, temi que ele pudesse ouvir essa algazarra que ele fazia no meu peito.
— Se importaria... de fingir que eu peso alguma coisa?
— Uma almofada pesa mais que você. — dizia, tocando minha testa, sua palma fria me surpreendendo por um instante, antes de descer e tocar minha bochecha.
Inclinei um pouco mais o rosto, até ele tocar meu pescoço com a outra mão e um som de contentamento involuntário escapou. É como... uma bolsa de gel, geladinha e refrescante.
— Ainda está febril.
— Não estou. — suspirei, segurando sua mão quando ele tentou afastar e apoiei o rosto em sua palma. Nunca reparei antes, mas sua mão é grande. — Eu estou bem.
— Você está febril. Dormiu no meio da rua e apagou outras três vezes no carro. — murmurou e ergui o olhar pra retorquir, mas ele apertou minha bochecha e independente do meu protesto, me soltou pra voltar a fazer o jantar.
Bufei, encarando Puf no meu colo, a bolinha completamente negra me encarando com um misto de alegria e saudade e me contentei em mimar ela um pouco até o jantar ser servido. Também senti saudades dessa bolinha, como se não a visse por meses.
Quando o vi servindo a mesa, tentei descer da bancada e ele se aproximou, estendendo os braços. Franzi o cenho confuso, até comecei a dizer que não precisava de ajuda, mas espremi os lábios ao perceber que seria estúpido fazer isso. Eu gosto de ser mimado.
Fui carregado e sendo deixado na mesa, bem diante da comida, minha boca até salivou ao sentir o cheiro da comida, batatas recheadas e arroz temperado com costelinha e salada de triguilho, com limonada de sei lá mais o quê.
Quando terminei, estendi o prato esperando mais e ele colocou mais um punhado de batata recheada no meu prato, seu olhar tão intenso que me senti hipnotizado, incapaz de desviar o olhar, ele parecia muito satisfeito com alguma coisa me empurrando mais e mais comida e a consciência de que praticamente fugi pra casa de um alfa ainda no cio me fez enrijecer, ainda mais ao perceber que minha essência permeava todo o ambiente como se fosse algum aromatizante de casa.
Fugi pra toca de um lobo, eu devo ter demência.
Não gosto de alfas. Detesto, na verdade. Morro de medo e ainda sinto asco por lembrar daquele "beijo" com o Daniel, o estômago até embrulha só de lembrar disso.
Mas eu não tenho medo do Cadu.
Não consegui pensar em nada pra dizer, mais concentrado em comer como se não tivesse visto uma comida de verdade por dias e ele seguiu colocando comida no meu prato até me sentir satisfeito.
— Você quer ver tevê? Tem todos os serviços de streaming que você gosta. — ele sorriu enquanto retirava a mesa e acenei estendendo os braços pra ele, antes de reparar no que fazia e tentei recuar, mas o desgraçado riu e me carregou mesmo quando me debati e tentei fugir e só me soltou quando estava no sofá.
Ele desapareceu pelas escadas e voltou alguns minutos depois com um cobertor e alguns travesseiros, os empilhando e me empurrando até estar enrolado no cobertor e no amontoado de travesseiros.
Fiquei encarando uma enorme tevê suspensa a quase dois metros de distância do sofá passando minha série no último episódio que vi, antes de olhar rapidamente ao redor. A sala espaçosa tinha mobília clara, desde os tons do piso e das paredes as cortinas e mobília, tudo variando entre verde claro, azul, branco, amarelo, um lugar quente e aconchegante, o tipo de ambiente que nunca pensei que faria o estilo dele.
Nem sei exatamente quando dormi, mas acordei no susto quando fui colocado em uma cama, tentei me mexer, mas ouvi a voz do Cadu sussurrando para voltar a dormir e o pouco de consciência que tinha se esvaiu outra vez, me sentindo seguro o suficiente pra não pensar em mais nada.
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