A minha primeira experiência com Elijah foi naquele maldito festival. A segunda... Bem... Isso é história para outro capítulo.

Lá estava eu vagando por entre as pessoas no centro de Geestville. Havia todos os tipos de fantasias, e a animação de todos era muito contagiante. Me aproximei de uma barraca, onde havia uma mulher com aparência indígena e um sorriso simpático.

ㅡ Olá. ㅡ Disse com o sotaque forte. ㅡ Deseja algo? Tenho as delícias mais famosas do Brasil! Aceita um acarajé?

Franzi as sombrancelhas, mas ela apontou para algo que parecia um sanduíche. Balancei a cabeça negando.

ㅡ Obrigada. Talvez uma bebida, o que tem?

ㅡ Bom, eu tenho caipirinha. ㅡ Ela riu e eu a acompanhei. ㅡ Se preferir algo mais leve, tem essa batidinha de vinho.

Ela apontou para uma jarra com um líquido lilás e eu assenti. Me lembrava iogurte. Ela colocou aquilo em um copo cheio de desenhos de aranhas e teias.

ㅡ Me vê um deste também, por favor. ㅡ Uma voz rouca e familiar surgiu atrás de mim. A moça da barraca somente o serviu e notei que estava ruborizada. Somente quando encarei o dono da voz entendi o motivo.

Ele era simplesmente lindo. Ele sim parecia um deus grego. Nunca havia visto alguém tão pálido daquele jeito, mas isso não o deixava nem um pouco menos atraente e os cabelos cor de ébano dava um contraste simplesmente perfeito.

Ele deve ter notado que estava sendo observado, pois se virou para mim e eu segurei o ar. Aquelas íris alaranjadas me encararam de uma maneira tão profunda, que pensei que poderiam ver através de minha alma.

Talvez pudesse mesmo.

Me lembrando agora, eu me pergunto: como eu não reconheci aqueles olhos na hora? Como eu não me lembrei de todas as histórias que li? Como pude ser tão burra?

Ele franziu levemente o cenho e quando olhou para o meu colar, me olhou de uma forma intrigada.

ㅡ Seria a senhorita um anjo? ㅡ Ele me perguntou segurando o copo.

ㅡ Uma deusa. ㅡ Respondi e beberiquei minha bebida. Tinha o gosto de vinho, mas era extremamente doce. Apreciei a bebida e fiz uma nota mental de aprender a receita.

ㅡ Interessante. ㅡ Ele disse. ㅡ Turista?

Assenti. ㅡ Sou de Berlim.

ㅡ Imaginei. ㅡ E soltou um riso seco. ㅡ Prazer, Elias.

Ele me estendeu a mão e eu rapidamente apertei.

ㅡ Daphne.

Sua pele era extremamente fria e o choque térmico que senti ao toca-lo me fez suspirar.

ㅡ Agora entendo os louros. ㅡ Soltou um riso curto soltando minha mão. ㅡ Criativo.

Sorri sem graça. ㅡ Obrigada.

Ele me encarou por alguns breves instantes antes de olhar em volta novamente.

ㅡ Aceita a companhia de um estranho, senhorita? ㅡ Ele perguntou voltando seus olhos peculiares para mim.

ㅡ Por que não?

E eu sorri antes de sair andando pelo festival com aquele completo estranho. Repito: como pude ser tão burra? Eu caí feito uma patinha nas garras daquele monstro e nem se quer percebi nada na hora.

Passamos horas vagando pelo lugar experimentando os variados pratos e eu ria a cada careta que ele fazia ao provar algo que não agradava seu paladar. Eu estava me sentindo bem depois de vários meses escuros. Eu pensei estar encontrando a luz que precisava naquele lugar, com aquele estranho de olhos lindos.

Mas eu me enganei.

E eu só descobri isso quando ele se revelou. Deus, como fui burra!

Estávamos cansados de explorar o mundo das comidas e decidimos sair do centro. A cidade estava vazia, um silêncio escurecedor. Eu ria a cada piada sem graça dele e ele parecia realmente orgulhoso do que fazia.

Hoje eu sei porquê.

O caçador sevando a caça.

ㅡ Vem, quero te mostrar algo. ㅡ Ele disse me puxando pela mão. Seu olhar era malicioso e eu na hora entendi o que ele quis dizer.

Ou pelo menos achava que tinha entendido.

Ele me levou para um beco escuro e eu mal conseguia vê-lo. Ele encarou cada traço do meu rosto antes de me beijar. Seus lábios eram macios e tinham gosto de pecado, de perigo e de quero mais. Foi um beijo calmo que ao pouco foi se intensificando. Logo suas mãos estavam em meu cabelo e puxavam levemente. Arfei em deleite. Paramos para procurar ar e ele novamente me encarou como se quisesse memorizar cada traço.

ㅡ Você é realmente muito linda. ㅡ Ele sussurrou. Fechou os olhos brevemente, e quando abriu me arrepiei. Seus olhos estavam frios e duros. Senti que algo não estava certo. ㅡ É uma pena. ㅡ Ele me encarou de uma maneira enigmática e afastou uma mecha de cabelo prendendo atrás da minha orelha. ㅡ Mas talvez eu possa aproveitar isso depois.

Seu tom era neutro e seu olhar vazio. E então tive um choque de realidade. Eu estava sozinha com um estranho em um beco escuro. Quão maluca eu estava sendo?

ㅡ Eu acho melhor voltarmos...ㅡ Tentei dizer algo, mas ele me calou colocando o dedo indicador em meus lábios.

ㅡ Shhh. Prometo ser o mais breve possível. ㅡ Encarou o pingente em meu peito e me olhou novamente. ㅡ Você é muito intrigante.

Sua frase pairou no ar e a essa altura do campeonato meu coração estava parecendo tambores. Ele me encarou no fundo dos olhos e minhas pernas viraram gelatina.

ㅡ Revele a mim o seu pior pesadelo. ㅡ Ele sussurrou e o que eu vi a seguir eu nunca pensei que viveria para ver algo assim.

Suas íris alaranjadas cintilaram e se transformaram em duas lanternas hipnotizantes. Não estou usando metáforas, estavam definitivamente brilhando. Eu não conseguia desviar os olhos, era como um imã. O mesmo imã que me atraía para o colar.

E em segundos senti meu mundo desmoronar ao visualizar uma das piores cenas da minha vida. Tudo a minha volta sumiu e me vi parada em uma rodovia. Um sandero preto familiar passou por mim e eu pude ver a loira da direção.

Mamãe...

Em seguida um caminhão preto surgiu batendo no carro e quando ele se afastou eu pude ver o olhar sem vida da mulher da minha vida.

Meu pior pesadelo. Ver minha mãe morta. E eu tinha acabado de ver. Derrepente tudo sumiu e voltei ao beco escuro com o estranho me observando. Caí de joelhos chorando igual criança.

ㅡ Elijah... ㅡ Foi a única coisa que consegui sussurrar.

Elijah se abaixou ficando da minha altura.

ㅡ Vejo que fez a lição de casa. ㅡ Disse com sarcasmo. Quando o encarei vi seu olhar satisfeito sobre mim. ㅡ Agora acho que vou aproveitar um pouco.

Ele sorriu maliciosamente e tocou meu rosto, mas eu rapidamente esquivei.

ㅡ Eu acho melhor você se comportar. Não gostaria de ter que te machucar. ㅡ Ele disse se aproximando mais.

E então eu fiz algo terrível. No que estava pensando? Eu cuspi na cara dele e ele estapeou meu rosto com força.

ㅡ Você é abusada. Irei de ensinar a não ser mais.

Ele me empurrou para o chão e eu até tentei lutar, mas ele era mais forte. Ele rasgou meu vestido e quanto mais eu lutava, mais ele me machucava. Após me despir completamente, ele segurou minhas mãos, e minhas pernas estavam presas com algo invisível aos olhos.

ㅡ Seu pior pesadelo será outro a partir de hoje. ㅡ Ele sussurrou baixinho em meu ouvido antes de me penetrar com força.

E ele tinha razão. Meu pior pesadelo mudou depois daquele dia. E ele era quem protagonizava todos eles.

Eu gritei muito. Pelo menos achava que sim, já que não saía som nenhum. Eu chorei como nunca havia chorado antes. Eu implorava para ele parar, mas ele não me dava ouvidos. Parecia que aquilo só o excitava mais. Em nenhum momento Elijah desviou os olhos dos meus. E eu jamais esqueci daquele olhar frio se satisfazendo da minha dor.

Eu não sei ao certo quanto tempo aquele pesadelo durou, mas para mim pareceu ser uma eternidade. E quando ele se levantou satisfeito, eu não tinha forças para mover um músculo se quer. Encarei Elijah uma última vez e ele fez o mesmo. Olhou meu estado deplorável e estalou os dedos fazendo um vestido surgir no meu corpo.

ㅡ Aceite isso como um obrigado. ㅡ Ele disse simplesmente antes de sair andando como se nada estivesse acontecido.

Demorei mais meia hora para tomar coragem para me levantar. O vestido que usava era igual minha alma depois daquilo. Preto. Escuridão total. Me arrastei pelas ruas de Geestville com os olhos vazios e depois disso nunca mais fui a mesma.