Capítulo 5
Neil caminhava com orgulho pelos corredores do hotel onde anteriormente haviam estado os tributos dos Jogos deste ano. Os seus tributos eram um dos cinco distritos que ainda tinham os dois tributos vivos. Tinha parado de olhar para o projetor quando o tributo do distrito 9 tinha ido buscar água, deixando uma Rubi calma a preparar o acampamento.
- Hora de brilhar.
Com 25 anos, a sua vida estava relativamente boa. A sua família renunciou-o quando viram a sua prestação no décimo primeiro Jogos da Fome. A forma como matava as pessoas e enganava-as era cruel e ao voltar a casa, a sua mãe chorou não por saudades mas por medo.
Magoado e enfurecido, Neil saiu de casa, regressando ao Capitólio a pedir para viver lá. Em 7 meses iria tornar-se mentor dos tributos do ano seguinte mas decidiu por bem adiantar a sua ida para o Capitólio. Nunca mais voltou a falar com a sua família.
Então começou a viver bem, como um autêntico habitante da região mais poderosa de Panem. Ia a festas, conhecia imensas personalidades famosas e quase todas as noites se divertia com homens e mulheres, saindo das suas casas aos primeiros raios da madrugada. Era uma celebridade de Panem, mantinha a forma física e tinha boa capacidade social. Estava feliz.
- Eu olho para os anos anterior e vejo perdedores. Eu próprio, num certo sentido, o sou. Sou o passado. Estes jovens que estão a lutar agora na arena são o presente. Olhem bem, estão a viver num bairro do Capitólio, estão a aprender o seu poder e a compreender que não têm o mais ínfimo poder ou destaque nas decisões políticas de Panem ou sequer do seu próprio distrito e... - Neil levanta os dois indicadores à altura da cara, como se se preparasse para dizer algo extremamente importante – quem sabe, nas suas próprias vidas.
Os 9 ouvintes que o rodeavam no sofá aplaudem, espantados pelo seu discurso. O mentor de Rubi e Ónix tinha passado a última meia hora a convencer aquele grupo de Patrocinadores a escolher Ónix como o recetor de alguns alimentos e uma pomada para as queimaduras.
- Extraordinário, caro Neil. Muito bem dito!
Internamente, Neil ria-se. Na verdade não tinha dito nada de especial, apenas insultado os tributos e elogiado o Capitólio mas a sua fama ofuscava a realidade do seu discurso. Em meia hora Neil tinha conseguido o patrocínio para Ónix, não pela prestação do tributo mas pela sua própria fama como vencedor dos Jogos.
De volta ao quarto, encontra a estilista de Rubi a festejar no sofá, bebendo de uma só vez a bebida roxa que se encontrava na mesa da sala. Neil faz uma cara de nojo, nunca havia gostado da bebida.
- O que se passa?
- A Rubi! Ela escapou!
Neil estranha a resposta e senta-se ao lado da extrovertida mulher. Com o comando, usa o ecrã 4 para voltar atrás e observa com espanto e orgulho a destreza da ruiva em apanhar despercebida a tributo do distrito 4. Fogem com sucesso na direção da mansão rosa, deixando para trás uma caçadora extremamente enfurecida.
- Estou surpreendido. Não estava nada à espera.
Por momentos, Neil pensa se errou em apostar no tributo errado para o patrocínio mas não se preocupa tanto. Se a ação dela for tão inesperada como Neil acha, haverá Patrocinadores, que sem o empurrão do mentor, irão enviar alimentos e armas para a tributo do distrito 1.
- Chamem o Joshua. – Neil pede a um Avox à porta do apartamento. O Avox sai e minutos depois regressa com o mentor do Distrito 4.
O seu corpulento corpo aproxima-se ameaçadoramente de Neil, os seus cabelos negros em sintonia com os olhos também cor de carvão fixam o jovem mentor, uma raiva parece crescer dentro dele e quando Joshua ameaça atacar Neil, o mentor do distrito 4 abraça-o calorosamente.
- Neil! Bem jogado da parte da tua tributo. – sentando-se no sofá e servindo-se da repugnante bebida roxa, Joshua sorri por ver o amigo. – Pensava que a Ophelia a iria matar. Sabes, eu treinei-a para nunca hesitar mas não resistiu a umas piadinhas.
- Foi essa a desgraça dela. – Ophelia, a tributo feminino do Distrito 4 era uma caçadora nato. Tinha tido 10 valores na pontuação e tinha morto um tributo no Banho de Sangue, fugindo de seguida para a mansão amarela.
- Achas que a Rubi irá sobreviver? Eles estão em fuga, é gorda e está a ajudar um miúdo de 15 anos. As chances estão contra ela e estou a receber muito dinheiro nas apostas pela morte dela.
A referências às apostas relembram Neil da perda exorbitante de dinheiro que apostou no tributo do seu distrito, quatro anos antes. Era a primeira vez que apostava e Joshua, o vencedor do ano anterior ao dele, tinha começado um centro de apostas dos Jogos da Fome. Neil nunca mais cometeu o mesmo erro quando viu o tributo do distrito 1 a morrer com uma flecha no olho e, com ele, todo o seu dinheiro a entrar nos bolsos do mentor do distrito 4.
- Ela surpreendeu-me. Admito isso mas concordo contigo, ela num combate corpo a corpo deve ser morta e mesmo a fugir neste momento de Ophelia, basta um descuido para morrer.
Conversam mais um pouco e bebem enquanto provam alguns frutos secos do distrito 9, falando da morte do tributo do distrito 4, que morreu queimado na mansão vermelha, ao explorar o edifício.
- Foi uma estupidez, admito. Ele merecia morrer. Sim, percebeu a lógica rapidamente mas foi burro.
- Ele não ia atrás de outro tributo? – Neil pergunta enquanto prova uma fatia de bolo de cenoura.
- Sim, o tributo do 8, mas ele escapou a tempo. Saiu pela porta das traseiras e desapareceu no bosque. O meu tributo, estupido como sempre, em vez de o perseguir, desistiu e ficou a explorar a casa.
Ao longo da conversa, Neil ouve a narração de Ludovic, que narra a fuga de Rubi e Alexander.
"Muito bem. Estamos a meio da tarde do segundo dia. A tributo do distrito 1 e o tributo do distrito 9 estão em fuga, enquanto a avaliada de 10 valores os persegue, a tributo do distrito 4. Correm em direção à mansão rosa, por entre o bosque e atrevo-me a dizer que eles podiam ter sucesso mas não será possível."
A camera passa para o grupo de Sylas, Ónix, Jack e Bart, que caminham pelo bosque descontraidamente, com Sylas na liderança.
"Rubi e Alexander em poucos minutos irão encontrar-se com o grupo de predadores do distrito 1, 2, 5 e 11. Será interessante ver como o tributo do distrito 1, Ónix, irá reagir quando vir a sua antiga colega de distrito, Rubi, no lado oposto da sua equipa."
Neil fica tenso, ignorando por completo as provocações de Joshua sobre a eminente morte de Rubi. A verdade é que a jovem está encurralada. Ophelia persegue-os por trás e a numerosa aliança aproxima-se rapidamente pela frente. A barreira está a um quilómetro de distância mas não deve ser suficiente para eles escaparem.
OPHELIA – Distrito 4
As memórias do seu treino um ano antes passavam pelos olhos de Ophelia como um filme. A sua mãe a obrigá-la a entrar no centro de treino pela primeira vez, contra a vontade da filha, a face dos outros alunos ao rirem-se dela pela sua forma física e, mais tarde, a motivação que inundou o seu corpo quando decidiu que não iria mais aturar aquilo nem demonstrar fraqueza.
O cabelo foi o primeiro. Para mostrar que estava mudada. Cortou o cabelo pelas orelhas, pintou-o de azul escuro e no dia seguinte apareceu no centro de treinos pronta a derrotar qualquer um. E foi o que aconteceu. Todos os dias treinava em casa, fazia exercício físico e procurava novas técnicas de combate que agora lhe seriam importantes.
"Onde raio é que eles se meteram?"
Ainda com os olhos vermelhos, Ophelia esforça-se para ver o melhor possível à sua frente sem tropeçar em nada. A vadia da rapariga do distrito 1 tinha algumas cartas na manga. Ao fim de alguns metros, ouve finalmente as vozes de algumas pessoas, com toda a certeza, não só dos dois que ela perseguia.
- Olha olha, a miúda gorda e o bebé choramingas.
A voz de Sylas destaca-se e Ophelia sabe no que se está a meter. Corre sorrateiramente até um arbusto alto, tornando-a invisível. Observa preocupada a aliança de 4 tributos. A probabilidade de existir outro grupo tão grande é escassa e se não forem derrotados rapidamente, irão matar todos até chegarem ao fim, custo o que custar.
- Estavam a correr de alguém ou de alguma coisa? – Sylas roda a espada na sua mão, sempre atento a algum movimento por parte dos dois tributos mais fracos.
- Não queremos problemas, não somos uma ameaça.
A voz de Rubi fraqueja a meio da frase, claramente assustada. Ophelia queria matar os dois tributos mas sabendo da aliança de 4 pessoas, o que lhe preocupa agora não são os dois tributos mais fracos.
- Tu tens uma espada e o miúdo ali um machado. Não interessa a vossa idade, vocês são uma ameaça.
- Podemos chegar a um acordo. Eu... eu sou boa a fazer armadilhas, podemos apanhar tributos assim.
- As coisas não funcionam assim, fofa.
Ophelia é uma lutadora, não uma estratega mas precisava de agir. Não estava a ajudar a tributo do 1, apenas estava a pensar no futuro. Procura rapidamente por uma pedra no chão, encontrando uma quase do tamanho da sua mão e outra do tamanho de um polegar.
"Perfeito. Agora preciso de ter pontaria."
A jovem de cabelo azul sabia que só tinha uma oportunidade. Tudo podia correr mal, não só dependia dela mas também do instinto de sobrevivência dos dois tributos.
Prepara a pedra pequena na mão direita, a mais ágil e lança-a contra uma árvore, à sua direita mas a uma distância segura de si. Por entre os arbustos vê o tributo do distrito 5 a olhar, curioso pelo barulho.
- Sylas, ouvi um som qualquer vindo dali. Eu e o Ónix vamos confirmar.
Os rapazes afastam-se e Ophelia sabe que tem apenas alguns segundos para lançar a segunda pedra. Sem demoras, ela prepara-se, sai do arbusto mas sem ser vista e faz um lançamento certeiro.
- Filha da mãe... - Sylas põe a mão na sobrancelha esquerda, onde a pedra havia acertado. O sangue escorre em pouca quantidade, mas o suficiente para o atordoar. O plano não podia ter corrido melhor. Os dois tributos começam logo a correr na direção oposta à sua, provavelmente para o centro da arena e agora é a vez de Ophelia fugir.
- Vem cá, vais morrer!
A ameaça de Sylas perde-se no meio da floresta, enquanto a tributo do distrito 4 corre por entre a vegetação, esperando escapar às garras daquele grupo. Está contente. O plano resultou e pôde vingar-se de um grupo de bullies. Ver a tributo do 1 a ser gozada pela sua forma física, fê-la lembrar dos treinos do seu distrito e o quão gozada era pela sua falta de agilidade e timidez.
"Não penses que sou tua amiga, tributo do 1. Irei matar-te assim que tiver a chance."
RUBI – Distrito 1
O seu olhar de horror não consegue transpor o que o seu coração está a sentir naquele momento. Ver o seu colega de distrito na aliança inimiga, prestes a matá-la, parte o seu coração. Tudo bem que não se conheciam nem sequer tinham falado muito antes da arena mas continua a ser do seu distrito.
- Vai correr tudo bem. – a jovem tenta acalmar Alex que agarrava no machado com imensa força, receoso com a luta que se aproximava.
- O que vais fazer Ónix? Matar-me?
- Eu...
Ónix cala-se imediatamente quando Sylas e Jack o fulminam com o olhar. Claramente ele está ali apenas para sobreviver, não porque gosta deles.
- Olha olha, a miúda gorda e o bebé choramingas.
O tributo do 11 aproxima-se ameaçadoramente. A espada na mão de Rubi torna-se pesada, como se estivesse a carregar 10 sacos de farinha ao mesmo tempo. Sente que a morte está próxima e tenta negociar um acordo, num último ato de desespero quando uma pedra voa na direção da cara de Sylas.
Rubi olha para trás, a tempo de ver a tributo do distrito 4, a sua perseguidora. Sem perder tempo, Alex agarra na mão da jovem e ambos correm para longe dali e da morte eminente. Estavam rodeados de inimigos e nem se deram conta.
"Somos péssimos nisto, vamos morrer rapidamente se não fizermos nada."
Chegam por fim, ao centro da arena. Sentam-se junto à parede da mansão rosa. Têm vista para a Cornucópia mas estão escondidos de algum tributo que os persiga pela direção que vieram.
- Temos de esconder-nos, se eles nos estiverem a perseguir, em pouco tempo chegam aqui.
- Não sei, talvez uma mansão? – Alex bebe sofregamente quatro goles de água, acabando com o conteúdo de uma garrafa-
- Não, algo me diz que elas são perigosas. Se calhar se nos escondermos na Cornucópia, não nos encontram. É o centro de tudo, ninguém se esconderia lá.
- Mas estamos visíveis a todos a partir das mansões. Pelas janelas e assim, eles podem ver-nos a correr para lá.
Rubi pensa um pouco. É verdade, podem ser apanhados ainda antes de chegarem ao centro mas...
- Que outra opção temos?
Alex concorda e depois de arrumarem a comida e as garrafas, recomeçam a correr, desta vez para o parque infantil enorme no centro da arena. O som da areia a ser pisada marca a mente de Rubi e ela sabe que se sobreviver aos Jogos, o som da areia neste momento irá permanecer na sua mente durante anos. Quem sabe, causar algum trauma.
- Vamos esconder-nos ali em cima, a meio da subida para o topo.
Após instalados, cada um toma uma posição de vigia em cantos opostos do parque, de forma a confirmar se não existe nenhuma ameaça.
- Rubi... Eles... eles vêm aí.
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